por José do Vale Pinheiro Feitosa




Viva junto à alma mais próxima e compreenda que a proximidade é a medida da distância. Que a distância que os separa é este movimento maravilhoso da matéria e da energia. A maravilha é apenas esta surpresa porque esta proximidade é tão diminuta entre os dois e é a inesperada distância.

José do Vale P Feitosa



quinta-feira, 6 de janeiro de 2011

Para Rosa


Era uma rua comprida. Padaria numa esquina, e cinema no fim da linha. Na metade do caminho eu ficava, e na casa vizinha eu vivia. Subia umas escadas, tocava a campainha, e uma senhora de sorriso belo , abria a porta. Não entendo até hoje como a minha timidez era vencida. Nem sempre me encontrava com a filha da casa, mas eu sabia onde estava guardada a pilha de revistas que me apeteciam, e compulsivamente devorava. E não tinha fim... Mal terminava uma, a minha fada madrinha, já entrava cantando e assoviando com outra, debaixo do braço. Entre uma história e outra, o som do violão roubava a minha atenção. Cantava e dedilhava aquele instrumento, lindamente! Achava mágico o sotaque, caramelado com a língua italiana, que eu embevecida, absorvia, e em silêncio cantarolava , num dueto mudo : “ tu não conheces Nápoles, tu não sabes o que ela tem ...”. Depois do violão era um contar sem fim de histórias romanceadas – uma Sharazade, da Manoel Borba! Sua poesia, o jeito que expressava os amores vividos, dava-me a impressão que o maior sentimento do mundo, ela já tinha sentido.
Ledo engano... Embora já torcêssemos por finais felizes , o tempo ainda não editara nenhum epílogo.
Quando as férias terminavam, sentia-me inexplicavelmente triste. Fechava-se um círculo, e eu pressentia que uma nova vida começava para mim... E ousei, e vivi, quebrei a cara, e ressuscitei mil vezes, num intervalo intenso de absurdas e doces surpresas.
Quase pronta para o tempo dos registros, eis que... Um mar trouxe de volta, numa garrafa fechada, revistas, daquela época esquecida. As lembranças foram ficando claras, vivas, felizes!
Reencontro e confirmação da amizade.
Éramos as mesmas? A vida continuou, nas paralelas...
Estávamos novamente numa rua da mesma cidade.
Rua pacata
Rua de Rosa
Olhar de caçoada
Riso que desarma.
E a palavra sincera, no mesmo tom de carinho:
“Menina abelhuda , és tu de volta ?”

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