por José do Vale Pinheiro Feitosa




Viva junto à alma mais próxima e compreenda que a proximidade é a medida da distância. Que a distância que os separa é este movimento maravilhoso da matéria e da energia. A maravilha é apenas esta surpresa porque esta proximidade é tão diminuta entre os dois e é a inesperada distância.

José do Vale P Feitosa



terça-feira, 11 de setembro de 2012




Língua
Caetano Veloso



Gosta de sentir a minha língua roçar a língua de Luís de Camões
Gosto de ser e de estar
E quero me dedicar a criar confusões de prosódia
E uma profusão de paródias
Que encurtem dores
E furtem cores como camaleões
Gosto do Pessoa na pessoa
Da rosa no Rosa
E sei que a poesia está para a prosa
Assim como o amor está para a amizade
E quem há de negar que esta lhe é superior?
E deixe os Portugais morrerem à míngua
"Minha pátria é minha língua"
Fala Mangueira! Fala!

Flor do Lácio Sambódromo Lusamérica latim em pó
O que quer
O que pode esta língua?

Vamos atentar para a sintaxe dos paulistas
E o falso inglês relax dos surfistas
Sejamos imperialistas! Cadê? Sejamos imperialistas!
Vamos na velô da dicção choo-choo de Carmem Miranda
E que o Chico Buarque de Holanda nos resgate
E – xeque-mate – explique-nos Luanda
Ouçamos com atenção os deles e os delas da TV Globo
Sejamos o lobo do lobo do homem
Lobo do lobo do lobo do homem
Adoro nomes
Nomes em ã
De coisas como rã e ímã
Ímã ímã ímã ímã ímã ímã ímã ímã
Nomes de nomes
Como Scarlet Moon de Chevalier, Glauco Mattoso e Arrigo Barnabé
e Maria da Fé

Flor do Lácio Sambódromo Lusamérica latim em pó
O que quer
O que pode esta língua?

Se você tem uma idéia incrível é melhor fazer uma canção
Está provado que só é possível filosofar em alemão
Blitz quer dizer corisco
Hollywood quer dizer Azevedo
E o Recôncavo, e o Recôncavo, e o Recôncavo meu medo
A língua é minha pátria
E eu não tenho pátria, tenho mátria
E quero frátria
Poesia concreta, prosa caótica
Ótica futura
Samba-rap, chic-left com banana
(– Será que ele está no Pão de Açúcar?
– Tá craude brô
– Você e tu
– Lhe amo
– Qué queu te faço, nego?
– Bote ligeiro!
– Ma’de brinquinho, Ricardo!? Teu tio vai ficar desesperado!
– Ó Tavinho, põe camisola pra dentro, assim mais pareces um espantalho!
– I like to spend some time in Mozambique
– Arigatô, arigatô!)
Nós canto-falamos como quem inveja negros
Que sofrem horrores no Gueto do Harlem
Livros, discos, vídeos à mancheia
E deixa que digam, que pensem, que falem

© Editora Gapa

Moça na Cama - Adélia Prado


Papai tosse, dando aviso de si,
vem examinar as tramelas, uma a uma.
A cumeeira da casa é de peroba do campo,
posso dormir sossegada. Mamãe vem me cobrir,
tomo a bênção e fujo atrás dos homens,
me contendo por usura, fazendo render o bom
. Se me tocar, desencadeio as chusmas,
os peixinhos cardumes.
Os topázios me ardem onde mamãe sabe,
por isso ela me diz com ciúmes:
dorme logo, que é tarde.
Sim, mamãe, já vou:
passear na praça em ninguém me ralhar.
Adeus, que me cuido, vou campear nos becos,
moa de moços no bar, violão e olhos
difíceis de sair de mim.
Quando esta nossa cidade ressonar em neblina,
os moços marianos vão me esperar na matriz.
O céu é aqui, mamãe.
Que bom não ser livro inspirado
o catecismo da doutrina cristã,
posso adiar meus escrúpulos
e cavalgar no topor
dos monsenhores podados.
Posso sofrer amanhã
a linda nódoa de vinho
das flores murchas no chão.
As fábricas têm os seus pátios,
os muros tem seu atrás.
No quartel são gentis comigo.
Não quero chá, minha mãe,
quero a mão do frei Crisóstomo
me ungindo com óleo santo.
Da vida quero a paixão.
E quero escravos, sou lassa.
Com amor de zanga e momo
quero minha cama de catre,
o santo anjo do Senhor,
meu zeloso guardador.
Mas descansa, que ele é eunuco, mamãe.

Os versos acima, publicados inicialmente no livro "O Coração Disparado", foram extraídos de "Adélia Prado - Poesia Reunida", Editora Siciliano - São Paulo, 1991, pág. 175.


"Sereno da Madrugada
Carlos Gonzaga


Sereno da madrugada
Caindo no meu caminho

Na rua abandonada
Eu ando triste sozinho

Sereno a minha amada
Se encontra
Em outro ninho e não no meu

Sereno da madrugada
Amigo que Deus me deu "

Para Aloísio- por Socorro Moreira ( dez/2010)
Esse mote
que o carteiro
na minha noite pingou
é sereno , o meu amigo,
um poeta de louvor !

Sereno me surpreende
quando o flagro numa flor
mas o sereno Aloisio
não perde nunca um repente
quando cumpre um desafio

Agora mudando a prosa
eu falo da serenata
com a música do Gonzaga
que a minha infância encantou
Começo a cantarolar
lembrando a praça molhada
quando uma estrela chorou

Considerando as estrelas
na contagem sideral
eu pergunto ao Deus do céu
pelo lenço que o sereno
não gosta nunca de usar
e fico embevecida
vendo a planta embriagada
de versos, rima e luar !
.
E antes do fechamento
eu lembro a velha canção
que o poeta da vila
deixou pra gente cantar
ele fala como a gente
que também se diz boêmio
e gosta de versejar :

"Sou do sereno
Poeta muito soturno
Vou virar guarda noturno
E você sabe porque
Mas você não sabe
Que enquanto você faz pano
Faço junto do piano
Estes versos prá você"(Noel Rosa)


Deixo uma nova palavra
pra alguém considerar
dentre as estrelas que vejo
uma delas é um olhar
que começa a serenar!





Futebol: a Seleção Maguila

Muitos daqui se lembram do simpático ex-pugilista Adilson Rodrigues, o Maguila, um bom boxeador em nível regional que alguns brasileiros espertos tentaram elevar a fenômeno internacional.
Para fazer cartel, como se chama no boxe (acumular vitórias), Maguila lutava contra sparrings e pugilistas inexpressivos, alguns barrigudos e flácidos, em lutas transmitidas como se fossem espetáculos inesquecíveis da Nobre Arte pelo locutor Luciano do Valle.
Quando ousou enfrentar pugilistas de destaque dos EUA, precisou de uma ajudinha dos juízes num resultado que entrou para a história do boxe, no Maracanãzinho, e foi à lona em lutas nos Estados Unidos. Tornou-se “campeão mundial” por uma obscura associação.
Pois bem, parece que a História se repete, e desta vez como segunda farsa. Estamos vendo nos gramados a Seleção Maguila.
Desde que o técnico Mano Menezes pediu à CBF para desmarcar amistosos contra a Espanha e a Itália, no final de 2011, optando por jogar contra Gana, Gabão e Egito e virando motivo de chacota internacional, a Seleção adotou a tática Maguila para permitir ao seu treinador fazer cartel e evitar derrotas humilhantes contra grandes adversários.
Quem acompanha a Seleção há décadas e já teve de conviver, infelizmente, com técnicos como Falcão, Lazzaroni e Leão, sabe que mesmo nos piores momentos nunca tivemos medo. Na linguagem futebolística, nunca fugimos do pau. Até a Era Mano Menezes. Até a Seleção Maguila.
O primeiro resultado dessa tática covarde, motivada em parte pela pior colocação da Seleção na história da Copa América, foi a perda de uma medalha de ouro fácil nos Jogos Olímpicos. E há dois anos não ganhamos de nenhuma Seleção importante.
Após o fiasco em Londres, Galvão Bueno, que faz o papel então reservado a Luciano do Valle, tentou convencer o País de entrávamos numa fase de “reinício de trabalhos” – e não, obviamente, de continuidade: o mesmo treinador, os mesmos jogadores, a mesma tática, os mesmos adversários.
Goleamos a China por 8x0 ontem.
Quem é a China?
Uma Seleção já eliminada da Copa do Mundo de 2014 num grupo de quatro Seleções que contava com Iraque, Jordânia e Cingapura. Iraque (do treinador Zico) e Jordânia se classificaram para a fase seguinte. A China ocupa atualmente a 78ª colocação no ranking da Fifa (África do Sul, penúltimo adversário da Seleção, ocupa a 74ª colocação).
Como a grande mídia não gosta de fazer jornalismo, nós fazemos. Vejam essa curiosa diferença de escalação inicial, do último jogo da China nas eliminatórias para o jogo da vitória maguiliana.
China 3x1 Jordânia.
C. Zeng, X. Sun, P. Zhao, L. Zhang, J. Liu, J. Hao , T. Chen , S. Qin, H. Yu, P. Lu., L. Gao. http://uk.eurosport.yahoo.com/football/world-cup-qualification-afc/2014/china-pr-jordan-464272.html
Brasil 8x0 China.
Isso mesmo. A Seleção que derrotamos por um placar patético não é sequer a Seleção principal da patética equipe chinesa (aliás, a Seleção com o pior ranking enfrentada na Era Mano).
Agora pensemos alto. Temos a Copa das Confederações em 2013 e a Copa do Mundo em 2014. Qual é a utilidade de jogar partidas em que ficamos 90% do tempo no campo do adversário? Testa-se a defesa, o meio de campo, o ataque – este, contra defesas eficientes?
Que conclusões podem ser tiradas sobre o desempenho dos jogadores se estamos jogando contra Seleções que não participarão dos principais torneios que precisamos ganhar? Como esses atletas jogarão contra grandes Seleções, aquelas que precisamos derrotar para conseguir títulos? Que treino é esse?
Seleções principais derrotadas na Era Mano: Estados Unidos, Irã, Ucrânia, Escócia, Romênia, Equador, Gana, Costa Rica, México, Gabão, Egito, Bósnia, Dinamarca, Estados Unidos, Suécia, África do Sul e China.
Esta é a nossa turma.
Só há duas utilidades efetivas nesses jogos: fazer cartel para o treinador e vender jogadores para o exterior.http://extra.globo.com/esporte/copa-2014/em-dois-anos-jogadores-convocados-por-mano-menezes-ja-renderam-1-bilhao-em-negociacoes-6032738.html
É esta a nossa outrora gloriosa Seleção Canarinho: a Seleção Maguila, a Seleção da Era Mano.
Fiquem certo os mais jovens: nunca foi assim. Nunca passamos vergonha por medo, nunca precisamos de vitórias questionáveis contra Seleções ridículas para segurar treinadores e dar confiança a jogadores.
Podíamos nem ter bons jogadores, mas ao menos tínhamos coragem. Éramos homens em campo.

Baião de Nós pra degustação


Petisco musical do meu novo CD, que está prestes a ser lançado. Trecho de uma das faixas e clima da produção. Sua visita à nossa página será bem-vinda: https://www.facebook.com/baiao.de.nos