por José do Vale Pinheiro Feitosa




Viva junto à alma mais próxima e compreenda que a proximidade é a medida da distância. Que a distância que os separa é este movimento maravilhoso da matéria e da energia. A maravilha é apenas esta surpresa porque esta proximidade é tão diminuta entre os dois e é a inesperada distância.

José do Vale P Feitosa



sexta-feira, 31 de janeiro de 2014

LUIZ GONZAGA EM PARIS, DURANTE A DITADURA, VISITA VIOLETA ARRAES - José do Vale Pinheiro Feitosa

A ditadura mais duradoura do Brasil, com maior número de vítimas fatais e grande número de torturados e desaparecidos foi engendrada como uma luta contra o comunismo. Este pintado com todos os ingredientes semióticos da visão negativa da cultura brasileira de então. Ser comunista no Brasil, era igual à prisão, tortura e até morte. Era como ser acusado de bruxa pela Inquisição Medieval.

Como os comunistas brasileiros não eram tantos, o suficiente para fazer face ao arbítrio, o linguajar da ditadora, inclusive em atos institucionais e notas de imprensa ameaçadoras, adotou um estilo do tipo chocolate sonho de valsa. Usaram a palavra subversivo contra todos os opositores (inclusive liberais e ex-aliados como Lacerda) subentendendo que no núcleo duro estava o comunismo.

Entendido que ser comunista no Brasil era ser usurpado de todos os direitos humanos e políticos.

Ai vem a história que me contou ontem José Almino, o filho mais velho do grande político Miguel Arraes, uma vítima de destaque da perseguição do golpe militar de 64. A história aconteceu com Violeta Arraes e Luiz Gonzaga.

Seu Luiz era um sertaneja muito esperto, nunca foi de muita leitura, enquanto serviu no Exército, por mais de 10 anos, nunca prestou sequer um concurso para cabo. Foi soldado a vida inteira e ligado aos músicos dos quartéis. Mas isso não impediu de ser um dos homens mais reconhecedores da própria situação, que tinha um criatividade sem igual e que sozinho criou o estilo de música nordestina que pontuou nas cidades e ocupou as mídias fonográficas, o rádio e os shows.

Seu Luiz inventou o regional nordestino com uma oportunidade sensacional. Não podia correr as estradas carregando um bando de músicos. Inventou a formação da sanfona, o bumbo e o triângulo. Este último sendo um músico achável em qualquer canto do nordeste. Era a formação que poderia levar num automóvel de passeio.

Um gaúcho se apresentou, com sucesso, a caráter, num programa de auditório. Seu Luiz mandou comprar no Juazeiro a roupa de couro mais enfeitada que tivesse. Daquelas que os vaqueiros não usam. Fernando Lobo (pai do Edu Lobo) que tinha programa de auditório até proibiu seu Luiz de usá-la. Mas assim ele criou o estilo.

Seu Luiz se juntou à melhor safra de poetas com temática nordestina, com aquele estilo matuto, assim como já fizera Catulo da Paixão Cearense. Eram letristas da cidade e educados, mas criaram o estilo de qualidade. Um Patativa do Assaré seria mais autêntico que estes doutores da letra nordestina? Difícil dizer, tal foi a dimensão que a música de Luiz Gonzaga cobriu a cultura nacional.

A verdade é que seu Luiz sempre esteve junto aos políticos e os adulava mesmo. Como vinha da terra dos coronéis, ao político da linha ideológica de direita ele era mais próximo. Elogiou o golpe de 64 e os militares por trás dele. E participou de campanhas eleitorais contra Miguel Arraes, inclusive tirando frases da própria lavra.

Aí vem a história com Violeta Arraes. Gonzaguinha foi para a Europa e levou seu Luiz a tiracolo. Em Paris, na companhia de outro músico amigo da Violeta, quis visita-la. E foram os três, incluindo seu Luiz até a casa de Violeta. Quando chegaram a Violeta os recebeu com agrado mas pontuou que antes de tudo gostaria de lembrar a seu Luiz a campanha dele contra Miguel Arraes que era um político que representava os interesses do camponês nordestino. A mesma origem de Seu Luiz.

Seu Luiz com muita calma. Disse mais ou menos assim: Dona Violeta, eu sou um matuto pobre, de família pobre, nasci num lugar perdido do mundo chamado Exu, toco um instrumento que pouco valor tem no meio dos ricos e a senhora ainda quer eu seja comunista?

Ou seja, levar porrada da ditadura!

Todos riram da tirada de seu Luiz.


Naqueles idos Gonzaguinha fazia parte da música de protesto, à esquerda do regime, com o Movimento Artístico Universitário (MAU) e seu Luiz foi seu padrinho em alguns festivais. Acontece que seu Luiz tinha caído num ostracismo artístico tremendo nos anos 60 e quem os recuperou foram os músicos da geração de Gonzaguinha como Caetano, Chico, Gil, Alceu entre outros.