por José do Vale Pinheiro Feitosa




Viva junto à alma mais próxima e compreenda que a proximidade é a medida da distância. Que a distância que os separa é este movimento maravilhoso da matéria e da energia. A maravilha é apenas esta surpresa porque esta proximidade é tão diminuta entre os dois e é a inesperada distância.

José do Vale P Feitosa



sexta-feira, 4 de janeiro de 2013


Chove sem parar. O clima está fresquinho. As plantas respiram, suspiram e choram sorrisos.
Uma caneca de chá ou chocolate quente, cremoso... Vai bem!
Pensamentos vazios; coração sereno, batendo devagar, devagarzinho. Sinto-me dona de mim, e livre como um passarinho.
Passado, passado a limpo. Tudo claro, tudo limpo. Preparo-me para novos projetos de vida. Andar por aí, olhar o mundo, enxergar com consciência crítica, deixar que mudanças se operem em mim.
Convoco os amigos escritores para nos informar com seus textos, nos divertir, nos apaixonar.
Somos catadores de poesia.
Versos soltos, caiam dentro do nosso coração faminto, e umedeçam nosso teclado de emoções.
Estamos vivos!

PATATIVA DO ASSARÉ

Ontem, em meio a uma conversa informal me pediram que eu falasse um pouco sobre Patativa do Assaré. Me surpreendeu o súbito silencio que tomou conta de mim. Na realidade me quedei pensando se falava de Antônio Gonçalves da Silva ou de Patativa do Assaré.

Coincidentemente, nesses últimos dias tenho me debruçado em leituras. Ando atento e relendo algumas pérolas do grande Patativa do Assaré. Me encanta em especial o fato da não existência REAL, do Patativa do Assaré. Me encanta saber que o “PATATIVA” era na realidade um personagem criado pelo agricultor e cantador Antônio Gonçalves da Silva.

Adianto que são poucos os que sabem dessa diferença. Mas ela existe. E eu só pude perceber quando convivi mais tempo com o grande poeta. Houve um tempo em que os contatos pessoais se intensificaram e eu passei a frequentar a sua casa em alguns sábados, unicamente pra conversar.

Numa dessas visitas, descobri o arsenal de livros, já surrados pelo tempo, que foram lidos por ele. Acervos de poesias de Olavo Bilac, Juvenal Galeno, Catulo da Paixão Cearense, estavam guardados em meio a livros de Machado de Assis, e tratados politicos diversos. Só aí pude conhecer as duas faces; a do cidadão, bravo lutador e guerreiro Antônio Gonçalves, e a do personagem por ele criado e nominado pelo Jornalista José Carvalho como Patativa do Assaré.

A grandeza da poética de Antonio Gonçalves da Silva está na verdade escondida na sua capacidade de mimesis e de diégesis quando mistura o homem do campo com o personagem da sua própria poesia. Assim, advogo que emana do homem do campo Antônio Gonçalves da Silva, o personagem Patativa do Assaré e que este é o canal através do qual o poeta dá voz ao seu instinto poético/político/ativista.

Senão vejamos quando o próprio Antônio Gonçalves denuncia em suas rimas a sua onipresença nos versos creditados a Patativa quando canta evocando a sua origem sertaneja, a sua ligação com o campo:

Poeta, canto da rua,
Que na cidade nasceu,
Cante a cidade que é sua,
Que eu canto o sertão que é meu.

Na estrofe acima, vê-se Mimetizado e falando ao povo pela voz de Patativa do Assaré, em palavras recheadas de uma clara e invejável oralidade - não menos importante das erudições lusitanas - destacando as denuncias feitas por ele quando reclama da forma desigual com que é tratado o homem do campo. Fato este que caminha para as desastrosas consequências geradas pela desigualdade social como: miséria, fome, insalubridade, etc. Ou seja, através do personagem Patativa, ele fala das agruras sofridas pelo homem do campo. Classe na qual se insere Antônio Gonçalves da Silva.

Ou em outro trabalho quando deixa aparecer a sua visão social e politica, denunciando as causas do sofrimento dos sertanejos:

Não é Deus que nos castiga
nem é a seca que obriga
sofrermos dura sentença
não somos nordestinados
nós somos injustiçados
tratados com indiferença.
Sofremos em nossa vida
uma batalha renhida
do irmão contra irmão
nós somos injustiçados
nordestinos explorados
nordestinados, não.

De toda forma, Antônio Gonçalves da Silva foi um ser humano ímpar, singular. Patativa do Assaré permanece entre nós. Em livros, poesias, denuncias, etc. Consciente do seu papel social e com a clareza de pensamento que lhe distinguiu como poeta e como homem, Patativa do Assaré depõe a favor de sua própria arte diante de si mesmo, ao explicar seus versos no poema acima, eu Digo e não peço segredo, dizendo para Tadeu Feitosa: (Mª Socorro O. Brandão)





MEU PAI, A PRIMEIRA SEXTA-FEIRA DO MÊS E A BENÇÃO DE SÃO FÉLIX - por Stela Siebra Brito

Mesmo depois de vir morar no Recife, Joaquim Valdevino de Brito sempre conservou alguns dos rituais sertanejos aprendidos em casa com o pai, no sertão cearense da Ponta da Serra: acordava às 4 horas da manhã, fazia suas orações e depois ia até a varanda (agora substituindo o alpendre da casa) dar uma espiada na Estrela Dalva e saudar a manhã que já se irradiava. Só depois é que ia fazer o café. Fez isso até os noventa anos quando se mudou de vez para junto das estrelas.
Do meu pai guardo muitas recordações singulares, algumas engraçadíssimas, outras que demonstram seu valor de integridade e honradez, que falam do espírito de luta e, também, de religiosidade. Na nossa casa se rezava o terço toda noite, ia-se à missa todos os domingos e cumpríamos outros costumes religiosos, como o hábito de “fazer a primeira sexta-feira do mês” que consistia em ir à missa e comungar.
Mesmo beirando os noventa anos meu pai ainda ia à missa aos domingos e fazia, pelo menos, a primeira sexta-feira do ano.  Gostava de ir à Basílica da Penha, no Recife, receber a benção de São Félix, uma grande festa de fé cristã. A Basílica fica repleta de fieis a manhã inteira e os frades rezam missas e depois espargem água benta nas cabeças das pessoas, que vão pedir ou agradecer as graças recebidas, levam chaves de casa, do carro, exames médicos, carteira de trabalho, etc.
Hoje é a primeira sexta feira do ano 2013, por isso esta lembrança tão viva do meu velho pai, que amanhã, dia 5, completaria 102 anos; e por lembrar meu pai me vem o sertão inteiro com seus entardeceres de luz, com o silêncio das noites escuras claras de estrelas, das bocas de noites e do medo do guaxinim, das estórias de Trancoso, das trovoadas, das chuvas, das cheias do rio Carás, do cheiro do arrozal pendoado, das mangueiras floridas, das cajaranas maduras, bonecas de milho, banhos no açude... 

Sertão: um silêncio cósmico que nos integra ao Todo.
            Stela Siebra Brito – Recife, 4 de janeiro/13


"Hollywood" X "Oleúde" - José Nilton Mariano Saraiva

Ainda sobre as “homenagens” (algumas um tanto quanto “fora do prumo”) prestadas por pais-torcedores aos seus ídolos (principalmente do futebol, do cinema e da música popular), materializadas no batismo do filho com o nome de um deles, vale lembrar uma “sui generis”.
Como sabemos, durante muito tempo o cinema americano não tinha concorrente em termos de convincentes, belos a preparados atores/atrizes (e vamos acabar com essa frescura de que “homem que é homem não acha homem bonito”), qualidade técnica, recursos especiais, direção, produção e o escambau (hoje, outros países já conseguem produzir filmes com a mesma qualidade na direção, na produção e com “artistas” reconhecidamente convincentes na arte de representar). Mas, que foram os americanos que dominaram por muito tempo a “sétima arte”, isso ninguém há de contestar.
E aí quem se destacou foi o pequeno distrito de “Hollywood”, na cidade de Los Angeles, que serviu de abrigo aos grandes estúdios cinematográficos de então, que por sua vez detinham em seus “casts” o supra-sumo ou o filé-mignon na tarefa de representar; assim, os categorizados profissionais do cinema normalmente se vinculavam a um desses estúdios. Portanto, chegar a “Hollywood” (a “meca do cinema”) era o sonho, o ápice, o fim de linha de qualquer “artista” que pretendesse ser reconhecido como tal.
Pois foi para homenagear “Hollywood” ( “ninho” dos grandes atores do cinema) que os humildes e iletrados pais do nosso personagem resolveram dar-lhe o nome daquele pequeno distrito americano. E assim, quando veio ao mundo, o rebento querido recebeu um nome fora dos padrões tão usuais à época aqui no Brasil (José, Raimundo, João, Joaquim, Sebastião, Manoel e por aí vai); além de que, o “nobre” e pomposo nome o diferenciaria dos demais meninos e “mascararia’ a pobreza em que a família vivia atolada até o pescoço.
Só que, em razão da pouca vivência com as letras e do também despreparo do anotador-cartorário de plantão, a homenagem acabou saindo um tanto quanto esdrúxula, esquisita, estapafúrdia até: e assim veio ao mundo o nosso glorioso “Oleúde José Ribeiro”.
Depois de crescido, o agora tonificado e vigoroso negro “Hollywood/Oleúde” virou jogador de futebol e, atualmente, com o alcunha/apelido de “Capitão” tornou-se um suplício e tormento para os atacantes do time contrário, porquanto adotou o estilo-xerifão: “do pescoço pra baixo é tudo canela”.
Além do mais, ele é um “capitão” e, portanto, merece respeito. E tome porrada, a torto e a direito, pra cima e pra baixo.  

Um bolero, na madrugada...