por José do Vale Pinheiro Feitosa




Viva junto à alma mais próxima e compreenda que a proximidade é a medida da distância. Que a distância que os separa é este movimento maravilhoso da matéria e da energia. A maravilha é apenas esta surpresa porque esta proximidade é tão diminuta entre os dois e é a inesperada distância.

José do Vale P Feitosa



segunda-feira, 3 de janeiro de 2011

Janela do Impreciso





Um amor
para todas as janelas do vazio
Senão é tudo chuva , e falta de improviso
Parece que faltou luz , na praça do impreciso
Um jornal molhado , lembra por acaso
Notícia é passado , fato consumado!
Ando assim
sem jeito pra ficar.
Esperança , probabilidade
Fórum - eternidade
Uso a matemática
para me encantar.
Estou acordada em todos os sentidos
Meus sentidos vivem ,
dentro de um cochilo
Abro as janelas do meu infinito
E fico esperando um olhar passar !

Histórias da Dona Valda



Tenho visitado a minha mãe todos os dias, muito mais agora, depois da sua cirurgia. Sei que ela está cada vez melhor, e sem sequelas, porque voltou a contar de forma engraçada, as suas histórias.
Melão , apelido de um peão da fazenda de Chico Nunes , no interior do Piauí, chamava qualquer mulher de "Meloa": meloa nova, meloa baixa, meloa gorda...!
E por conta disso recebeu a alcunha que o personalizou .
Minha mãe passava férias na fazenda do pai, e estudava no Crato, na casa dos avós. Depois que concluiu os estudos , tornou-se professora, casou com meu pai, e foi ficando nas terras do Cariri.
Um belo dia , voltando da Escola, uma grande algazarra lhe chamou a atenção.Disseram-lhe que um doido do Piauí estava procurando a casa de uma Meloa nova, filha de uma Meloa gorda. O coitado estava faminto, sujo e maltrapilho , pelos vários dias de viagem, em transportes diversos: cavalo, jegue, caminhão...Nos seus "delírios , afirmava em tom desesperado, que não estava inventando prosa, que a mulher procurada existia, e deveria ter um endereço certo, porque era gente fina.
Minha mãe aproximou-se ,já de orelha em pé , reconheceu o caboclo, e foi logo gritando com toda sua força :
"Melãooooooo!!!!!!!!!!!!!!!
E Melão responde , com toda doçura, já com os olhos marejados : Meloaaaaa ...!
Trocaram um abraço, diante do olhar encismesmado de todos !
Levou Melão para nossa casa ( eu tinha uns 7 anos de idade), e com muito prazer escutei a história, e conheci Melão.
Ele sorria desdentando, e dizia: "E o povo pensou que eu fosse doido... Taí, eu na casa de Meloa, conhecendo uma Meloazinha ! "
P.S. Lembrei a alegria e expressividade da nossa amiga Stella. Pareceu-me vê-la contando esta história !

A chuva aquieta ...



Tempos que a chuva não vinha pra ficar quietinha. Escureceu o céu, nublou o pensamento , pediu pão com café e um bom papo. Mas a chuva nos deixa introspectivos.Fico sentindo o friozinho que saiu da barriga , e se espalhou pelos braços.Gosto da rua molhada e solitária . É como o recreio da alma, que passeia livre , e se embriaga
Acabei de fazer uma lista dos mestres do passado para serem lembrados na festa do Cariricaturas. Foi como se estivesse me matriculando no passado, mas podendo escolher a aula. Quero reprise das aulas de Dr. Zé Newton; as histórias das viagens de Dona Lurdinha Esmeraldo;o conhecimento científico de Dona Ivone;as aulas expressivas de Alderico, e aquele desenho leve, perfeito de Dr.Zé Nilo.Na vitrola do meu pai , umas valsas, em tom baixinho. Um bilhete amoroso , guardado nas caixinhas das saudades, e aquela pétala de flor, que eu não quis voando, mas dentro de mim.
Vou calçar meu par de meias furadas , me enrolar no lençol de algodãozinho estampado, e ler , pelo menos uma página, de um livro de Jorge Amado.

Lápis e Papel



Teu olhar se atenta numa estrada

onde barulhos normais escondem teu sorriso.

Paciente,recolho o absorto,

e solto da tua gaiola meu pássaro escondido.

Cada vez mais estreito é o caminho que nos liga

Tua rubrica é o passaporte dos meus sonhos.

Força poética ,

onde teu lápis e o meu papel ,

versam !

Tia Rosa



Acanhada , aluada , órfã de pai e mãe , tinha o semblante de um anjo desmantelado , mas de luz intensa !
Chegava e saia calada . Ficava de cócoras num canto da cozinha , a espera de um prato de comida , de um cumprimento , de um mimo. Maltrapilha e rota , minha mãe , que a chamava de Roseira , dava-lhe um trato ; unhas , cabelo , e banho de cheiro . Ficava tão linda , como uma rosa vermelha ! Tem gente que parece bicho do mato pelos maltratos ...
Tia Rosa era minha tia marginal , pela pobreza e simplicidade . Culpo-me por todas as vezes que deixei de lhe pedir a bênção, ou senti vergonha daquela velhinha com aura de santa !

O inexplicável


O caminho é cheio de surpresas,
e  percalços,
que marcam,
nossa aprendizagem contínua.
E se não fosse
a paixão,
os bens inexplicáveis,
as emoções,
sinalizadas,
pela nossa sensibilidade...?
a vida seria uma desbotada
e vazia estrada...
sem terra, sem água,
sem sol, sem ar,
sem verdes folhagens...

e em tudo isso,
as cores primárias,
se movimentam,
pra compor uma aquarela sonora,
onde tudo vira instrumento,
pincel,
na mão da criatura,
que também é criador !

Jornal de Ontem


Eu gosto de aproveitar jornais de ontem , para limpar vidraças, embalar as peças das minhas mudanças, fazer papel machê.
Mas, em se tratando desta música , Dona Valda tem uma história a contar.
Brigou com meu pai, passou 2 anos morando em Teresina, sem contudo esquecê-lo... Voltou para o Crato , já com o anel de professora, e foi visitar a ex-futura sogra. Meu pai a cumprimentou formalmente, e a deixou na sala , proseando com a minha avó Donana. Poucos minutos depois, escutou a sua voz , vinda do banheiro, em alto tom, interpretando maravilhosamente "Jornal de Ontem", que ele aprendera na voz de Orlando Silva. Minha mãe é avessa a esta música, mas eu sempre gostei de ouvi-la e cantá-la, desta feita, sem esquecer o cantar de troça ou mágoa do meu pai. Claro que foi apenas , um gesto de despeito... Meses depois não resistiram à força do amor, voltaram a namorar, casaram, e me fizeram assim como sou... Doida por música !

Zeus



Todos os eus conscientes
se encaminham para o encontro
dos eus desconhecidos.
Um afim, em potencial,
é sempre um pedaço da gente,
que se descortina...
do nós conosco,
do vós convosco
dos eus
com nossos ( Z) EUS superiores

armadilhas



Sexo, droga, dinheiro
são iscas?
eu sei fugir das armadilhas?!
aprendemos sempre,
e tardiamente...
que o que conta pra gente
é o poema !
por favor não esgotem
a beleza do tempo
deixem o perfume na rosa
esperem o por-do-sol
nesta tarde única,
e rezem olhando a lua,
nesta noite de junho !

Namorados



Saiam pra tomar sorvete
Sentem no banco da praça
Mergulhem os olhos no amar !
Não resistam ao carinho,
na ponta da orelha...
Afaguem-se,
apertos de mãos amadas.
Brinquem de conversar com o riso
ele sabe palavras que nunca são ditas
e nunca vão ser contadas
Beijem a boca do amor
Fiquem assim (e)namorados !

Naquele tempo...




Rua da minha meninice
Dos primeiros amassos
Dos namoros na calçada
Do sol , na farda pregueada
De baixo dos braços
Um livro sem capa
Uma carta de amor
Um beijo roubado
Um vizinho que canta
Um menino que toca
Uma moça feia
Umas pernas tortas
Um cabelo comprido
outro usando bobies.
Serenatas , tertúlias
Calças de veludo
Cotelê, laquê,
Perfume da Mirurgya
Magnólias brancas,
organdi azul.
Acabou , chorou...
Se formou , casou ?
E a vida segue
e a rua muda
casas se desmancham
pessoas se encurvam...
O luar sozinho ,
vive nesse luto
Cadê a festa de tantos anos ?
Cadê nossos pais
e suas censuras ?
Cadê nossos sonhos
tão desajeitados?
Cadê aquele tempo ,
que eu não vi sumir...
Ainda espero um rosto
que eu nunca vi...
- O meu
No espelho da sala,
Cantava " a primeira lágrima "
sem saber sofrer.

Quem pensa não casa...



"Quem pensa muito não casa ". Quem pensa muito vive cansado. Quem vive o dia, no caminho do sol, tem a esperteza dos mascotes.
Dias amenos, nos convidam a fazer algo diferente. O apetite é voraz, olhamos menos para o espelho, nos desapaixonamos .
Hoje estou assim ... Desativada da minha energia natural. Caminho pesadamente , entre o térreo e o primeiro andar... Parece que tenho tamancos nos pés. O céu tem cheiro de lavanda ; minha roupa tem cheiro de lama , e perfume do passado.
Escrever , ainda é uma boa saída. Até porque , oferece passagem de ida e de volta , num vai e vem constante.
Visito um recanto , que apenas imagino. Busco o concreto imaginável ,sendo invisível.
Subo no elevador. É o apartamento de um pintor. Respiro terebentina e tintas frescas . Imagino afrescos , e telas espalhadas pelos cantos. O dono está ausente. Viajou com um baú de desenganos , esculpindo pedras no caminho. Rasgando a matéria , como se ela fosse molambo, deixando nela , o produto do seu pranto. ..
Faço a vistoria , tateando pela intuição. Um sofá confortável , mas cheio de marcas; sala íntima com cheiro de " vetiver ";um relógio de pulso atrasado ; canetas e papéis , numa escrivaninha de cedro, escritos em negrito...Uns esquecidos , e outros amassados.
Falei com seu short , largado na cadeira do quarto. Ele olhou para mim meio intimidado (desconfiou que eu não era uma ladra comum, e de nada ali me apossaria, a não ser com o olhar e alguns dos sentidos) e disse-me : ele sempre me deixa assim , quando se cansa de mim. Meu dono viajou . Volta com um sorriso enfadado , e um brilho novo no olhar.
Sai do cenário. Não olhei em volta , nem fui até a janela , descobrir em qual cidade estive. Desprezei a personalidade física de um lugar... De um lugar , provavelmente conhecido.

A luz



A luz
seja do olhar
seiva do luar

seja difusa
nesta vida confusa

seja fria
lâmina que arbitra

seja forte
mesmo na hora da morte

seja opaca
quando o amor se apaga ...

- Conseguir descobri-la
na escuridão do nada.

extravio


Hoje malhei em ferro frio
viajei na maionese
conversei fiado
passeei no futuro
reencontrei o passado

O presente foi longo
mas não vi resultados
vou dormir sem
escrever nas estrelas,
apagando na lua
um verso extraviado.

Oração

Poema contrito
Verdade descrita
Imagens que se formam
na mente enlouquecida 
 
 Coração !
Oração !
O poeta adormece,
e amanhece esquecido.

Fator previdenciário



Penso muito , no daqui pra frente, embora continue vivendo poeticamente o presente : apaixonada pela vida e pelas pessoas !
Quando eu era muito jovem, diziam-me que meu espírito era antigo, e eu sentia-me orgulhosa ! isso significava maturidade, sabedoria.
Alguns me achavam louca , e eu sabia que desse atributo, gozavam as pessoas felizes !
Agora não quero que me digam que o meu espírito é jovem ...Não gosto que me digam, que estou no formol... Isso não é verdade !
Preocupam-me as aposentadorias miseráveis ,injustas, sistema de saúde público deficitário, velhinhos esperando nas filas dos postos de saúde para serem atendidos..Inexistência de clínicas especializadas, onde os de sem posse possam terminar seu tempo de vida com cuidados, respeito e carinho.
Não seria de nossa responsabilidade votar diferente, exigir, ficar atentos ?
Afinal estamos cuidando da nossa futura velhice.
Pensei em tudo isso, quando li a manchete : "Ministros recomendam o veto para aumento de 7,7% dos aposentados".
A cada ano , perco quase um salário, na minha aposentadoria. Em poucos anos ele se restringirá a um salário mínimo! E eu paguei um percentual , em cima de mais de 20 salários mínimos, no meu tempo de trabalhadora ativa.
Não me aflijo com as marcas do tempo. Não penso em plásticas rejuvenecedoras, nem me aterroriza o espelho. Não gasto com cosméticos, e clínicas de estética...Só quero ter uma cabeça leve !
Um dos últimos textos de José do Vale, vem bem a calhar: especialmente belo e amoroso .
Ele estimula o ser humano a amar e ser amado em todas as idades !
Visão de homem inteligente, sensível, e acima dos preconceitos. Esse texto teve muito, o nosso agrado!

Nós , madrugada e música



Uma voz que arrepia
um toque de violão
delicadeza no som
poesia no coração

Ébria de sua intenção
Nossa história vive enfim,
mais um capítulo de prosa ,
nos confins da emoção

Eu queria ser tocada
Como toca o violão
Eu queria ser beijada
Como canta uma canção

E a lua , copulada
em mim, também se espalha ...
Eu sinto que as tuas águas
inudam a minha alma

A brisa que tudo afaga ,
carrega no seu carinho,
O desejo consumido,
quando o dia vem mansinho

Ruídos do amor se calam
Agora somente escuto ...
O canto dos passarinhos !
O sol despontou, um tanto zarolho. Parece um pirata, cheio de asas. As ruas escondem suas sombras, e clareiam os movimentos de quem passa.Atravessei a praça, adiantando e retardando compromissos diários. Enfrentei filas. Comprei frutas nas calçadas. Olhei vitrines, experimentei vestidos floridos. Aspirei meu próprio cheiro, no vento dos meus cachos. Ideias enroladas ... Dispenso os babados. Amigos encontro ao acaso. Sorriem perguntas formais. Sem casos. Problemas escondidos, no banco de trás. Arrasto tempo e sandálias . Compro um brinco , na lojinha da esquina ... Balançam meu juízo , mas emprestam-me charme. Café com bolo não posso ... Mas traço ! E saio requebrando , na minha saia estampada. Pés descobertos , evitam as águas paradas. Vestígios das chuvas , alocados nos buracos ... Eu passo ! Pulo feito gata ...Quando fui gata ? Era uma tonta mulherzinha trepidando saltos no asfalto. Hoje as sandálias me carregam, me levam pra onde os olhos não podem , nem querem.Tarde de malemolência. Sessão de cinema que adormece. Amores na tela , me acordam ... São quatro horas. Olho o espelho e vejo uma cara, traquinamente feliz ...Mentira de Abril. É quase cínico ou triste , o olhar que pisca , nuances de mim.

Sem você



Vejo esvaziado o baú das emoções
algumas
gastei desordenadamente
outras,
por desuso
se estragaram...
Meu guarda-roupa
comporta todas as minhas coisas
e o vazio das tuas

Esperando esperança



O descartável foi incinerado.
A essência é busca infinda,
no caminho do infinito
Meu presente é um sufôco
louco por suspiros...
Risos e lágrimas molham a minha estrada
Hoje é dia de estio ...
Nem lago , nem rio
Tudo foi pro mar, fugiu com o vento,
ou está dentro de mim?
Queria que o futuro esperasse
a minha esperança acordar!

quebra-cabeça



Nasci aprendendo coisas com o instinto e com a razão.Com ou sem razão, internalizei o que criei ou copiei.De tudo e todas , o que mais me interessou por encanto , foi a vivência do amor, em todas as suas formas, em todos os seus cantos.
Nos anos flores a gente arrisca, cai do pau pra ver o tamanho da queda , petisca, condor ou sem dor..Nos anos frutos , a gente colhe o que plantou , mas também é cansativo reunir o nosso amor.Ele já se espalhou, se desintegrou ... Enfim , nosso quebra-cabeça amoroso , tem pedras de todos os tamanhos, formas e cores.
Quando , no tempo das sementes , desejo semear o carinho, o faço sem alardes , e entre trovoadas ... Se retornar eu guardo, pra depois (re)espalhar !
Eu vivi intensamente meu potencial afetivo. Hoje ele é da paz, mas nunca foi desistente de um sentimento maior , curado de todos os defeitos que contrataram perdas e contraíram mágoas.
Hoje sem amargura, descubro que o meu amor está inteirinho, como se nunca tivesse sido exercitado, pronto pra passar pro lado de lá , e continuar do lado de cá , sem posse e com destino !
Não sei o que é o amor... Vocês sabem ?

Não respondam com palavras !

Cegueira



Meus escuros se enchem de mistérios
Ficam loucos , ficam cegos
e as respostam se distanciam de mim.
Quando nasce a lua ...
Não sei o lado que me aclara
quero colher toda luz
num só olhar
Mostro o céu
pra minha alma
Toco no imaginário
distante de mim.

torpedos



Meu filho mais velho completará esse ano 40 anos. Acho que se presenteou, antecipadamente, com um fusquinha.
Aos 10 anos começou a me aperriar por uma mobilete. Pra ficar livre, negociei : moto, mobilete é perigoso... Quando você completar 18 anos , ganha um carro. Ele apostou na minha palavra e se aquietou.
8 anos depois voltou o lenga-lenga : " eu quero o carro que você me prometeu !"
Entreguei-lhe um fusca novinho !
Ele trocou por um fusca mais velho ( bem mais velho!) e com a grana do trôco, começou a bancar suas pequenas farras. Um dia virou o carro , na madrugada. De tão velho que era se transformou em sucata. Vendeu por uns poucos trocados. Um pouco mais de um mês não existia nem carro, nem dinheiro.
22 anos depois ele liga contando a novidade: "comprei um fusca dos anos 80 por 1.000,00. Vou investir e deixá-lo zerado.' Gastou uma boa grana , e eis que, nesta manhã , me aparece com um fusca novinho , para uns raros passeios , no final de semana.
Estava quites com o desperdício do passado!
Os filhos não crescem, quando ainda continuam a gostar dos mesmos brinquedos. A diferença é que podem bancar , e cuidam bem melhor do que lhes custa suor !
Confesso que fiquei feliz e aliviadíssima , desta feita ...CAIU A FICHA : Meu filho cresceu !

Revolvendo lembranças



Meu corpo resolveu madrugar

Revolver lembranças e lençóis

Preciso verbalizar o quê , se apenas sinto ?

O entendimento pleno de si ,e do outro

é instântaneo !

Tudo passa , mas deixa um rastro

A gente pode retroceder como João e Maria ...

Sem bagagem , com fome de aventura ,

e a leveza dos meninos .

É possível amar sozinha ...

Sob todos os sentidos !

Em pedaços



Lua de gêmeos. Eu absorvo a minha própria loucura, em raios, na noite em claro. Pra que antecipar a madrugada ? Quero mais é que ela chegue devagar , e se instale por todas as noites de futuros escuros.

Cabe uma festa de afetos, nesse céu imenso. Meu Crato do mês de Maio, querendo as estrelas de Junho.

Entrego-me aos abraços da vida.Um cheiro de rosas, e coração perdido... Quem me diz onde encontrá-lo?

Fugiu aos pedaços, ou se inteira por aí , pra depois voltar?

Avós maternos



Ele de Itambé (Pe); ela de Pedra do fogo(PB). Cidades fronteiriças.

A família dela transferiu-se na década de 20 para o Crato. Seu Lima começou uma indústria caseira de vinhos e doces, e assegurou a subsistência da sua prole. Mas naquele tempo a varíola comia de esmola. Quando um adoecia, os outros também caíam doentes.

Chico Nunes, viajante de medicamentos, parou no Crato, e tomou conhecimento de que uma família das suas bandas estava sofrendo horrores, vitimada pela bexiga . Resolveu fazer-lhes uma visitinha para prestar apoio, e conferir, se os conhecia.

Encontrou a filharada deitada no chão, em folhas de bananas. Maria Lima , mesmo coberta de feridas e olhar febril, não escondeu a beleza aos olhos do rapaz. Nas revisitas foi-se apaixonando, e logo a pediu em casamento. Voltou poucos meses depois para a celebração do matrimônio. Pedro Maia, que tinha o melhor ,ou quase único, carro de aluguel da cidade, conduziu a noiva até à Igreja. Disse na ocasião que fora a noiva mais bonita que o Crato já conhecera.

Depois da festa partiram para uma nova vida , numa fazenda de carnaúba, no município de Picos(PI).

Ali, Maria passou 20 anos , sem ver pai, nem mãe. Nos dias de feira, Seu Chico Nunes trazia-lhe de presente, caixinhas de pó, que ela usava sem parcimônia, noite e dia. Por conta disso, ganhou do marido , o apelido de Maria Caixa de Pó !

Do casal nasceram 9 filhos. Á medida que completavam 7 anos saiam pra estudar na cidade. Foi assim com a minha mãe.

Dona Valda lembrou-me hoje, quando a visitei, essas passagens , dando ênfase ao atributo maior de Maria, que salva guardava a sua beleza : a paciência !

Durante todos aqueles anos rogou à Santa Rita, a graça de poder voltar para o convívio dos seus. E antes de morrer, aliás, muito antes, alcançou tal graça.

Hoje a lição me foi repetida : ter paciência ! Qualidade da minha avó, herdada p0r minha mãe, que eu desejo também aproveitar, nos anos que me restam.

'Quem deseja, e espera ...Sempre alcança !"

Diz a minha mãe, justo para mim, sempre tão inquieta, irreverente , impulsiva ,e imediatista !Terei jeito ? Confio na velhice !

mulheres



A nossa essência é um poema...
O caminho para atingi-la é uma fábula!
Temos na mistura feminina
o ingrediente de todas as manhas e dons:


A pureza de Maria;
O olhar de Dulcinéia;
A graça de Isadora;
e, principalmente...
Os mistérios de Clarissa!
Teresa é muito dividida;
Marina só pensa em passar batom;
Januária ganha o mundo na janela;
Carolina não tira o cisco,
que a deixa triste;
Luiza é uma fotografia,
num prisma de sete cores;
A Rita leva o sorriso do povo,
e deixa um violão calado ;
Isaura tem que deixar o outro trabalhar,
afrouxar o laço do abraço;
Doralice já encontrou uma saída,
e deixou de achar que o amor é tolice?
Luciana , e o casaco marrom já poído,
das andanças, em busca da alegria;
Dora precisa entregar a faixa
de rainha do frevo...
Ainda requebra melhor do
que muitas?
Laura , e o sorriso ameninado ,
a flor que não murcha...
Laura, cadê seu amor?
Rosa , imagem de mulher
por Deus esculturada...
Irene, aquela louca ,
que vive no prozac!
E Beatriz?
Por ela,
alguns vivem por um triz !

Luz e Sombra




O choro esgota a tristeza
Brota na lembrança
das águas passadas !

O outro
colhe a poesia na boca ;
Os outros , a colhem ,
na tecla da nossa alma.
Ela nasce tímida , desamparada ...
Por simbiose , encontra fertilidade !

O tom de voz é inesquecível
Doce , rouco ou irritado

E o riso ?
É a nódoa da saudade ...
Cantinela que se gasta
pelas vezes já tocada !

Primeiro amor



Junho sempre foi pra mim o mês mais gostoso do ano.
Sinto as suas boas energias. Amenidade no clima, e na vida.
Gostaria de repassar essa sensação de perfume de flores para todos !
Acordo no céu azul
e durmo num chão de estrelas...
Os jardins que visito estão sempre coloridos
e com gosto de verde
Até a minha planta caseira,
parece que pelos ares, se enfeita !
Sinto disposição de botar a mão na massa
e fazer pão !
Amanhã faço aniversário de um instante engraçado...
Coração descompassado, ousou por querer,
seu primeiro amor.
Agora é 2010,
e eu ainda guardo a vontade tímida
de viver a pureza de um sempre
novo amor !

Caderno de músicas




Hora de dormir !
Assisti o jogo, no meu canto. Minhas mãos não ficaram frias, nem meu coração disparou. Um jogo que não emocionou, exceto na hora dos gols. Aí os olhos se enchem de lágrimas, parecem dissolver uma emoção antiga.Fiquei sem acreditar muito na vitória final do Brasil. Mas, jogo é jogo. Podemos contar com o azar ou a sorte, e a vontade reunida de uma grande torcida. Pensei que todas as pessoas que conheço estavam ligadas , no mesmo espetáculo. Era como olhar o mesmo céu estrelado.
Noitinha, fiquei na calçada a procurar estrelas no céu, do jeito que fazia, quando eu era menina, sentada numa cadeira de balanço com um caderninho de músicas na mão.Daí cantava todas que eu podia, até o canto começar a ficar sonolento , e a cama gritar por mim: vem pra casa, menina ! Não precisa engolir leite morno com canela... Você já tomou o líquido de todas as canções.

Fim de noite



Fim de noite
é o dia amanhecendo
Olhos sonolentos
querendo mais vida ao relento
Quando o músico guarda o instrumento ,
quero a saideira em doses , em notas ,
e no guardanapo molhado ,
mais um tonto poema .


Fim de noite
é droga que se evapora
voz rouca , coração cansado
transformado em saudade


"Olha , fecha os olhos meu amor ...
é noite ainda ..."


Céu escuro que vai clareando
Murmúrios no silêncio
de uma noite que cala .

Havia tantas estrelas ,
e tão pouco céu ...
Agora existe um sol cor-de-rosa
e o infinito imenso pedindo uma rede ,
e a benção da aurora !

Noite caipira




Enquanto fazia as tapiocas para o café da manhã, voei para a Granja de Pe. Frederico, aonde passei longas férias com a minha avó Donana e as minhas irmãs Verônica e Zélia. Todas , nos curávamos de uma resistente coqueluche.Lembrei a minha intimidade com as fruteiras, os banhos na piscina rústica, e as bolachinhas e tapiocas do café da manhã, que eu tanto apreciava. Naquela fase, Dona Anilda Arraes também estava lá, hospedada.Nas manhãs fazíamos umas caminhadas por entre as levadas , pés de manga e siriguelas ...Mas, de vida mansa a gente se cansa ! Foi com grande alívio que vi chegar o dia de voltar pra casa. Saudade de pai e mãe era imperiosa !
Relembro os passeios da escola, no transporte de Seu Duzentos para a mesma localidade. O terreno abrigava um monte de esconderijos. E aqueles , eu conheci palmo a palmo.
Hoje é noite de São João. A simplicidade das comidas juninas, músicas, folguedos, colorido das bandeirolas, enfeitam meu dia com tantas memórias !
Vou na feira, lá embaixo, atrás de carimã pra fazer pelo menos um bolinho, com tudo que a receita exige : leite de coco, manteiga, ovos, queijo ralado, açúcar, leite de vaca e a massa puba. Quando sair do forno , faço um cafezinho, e convido vocês para um lanchinho.
Feliz noite de São João, pessoal !
Não sejam noivas de quadrilha... Dizem que, quem casa de mentira, não casa de verdade !

Namorado

Depois de alguns meses de flerte incerto, ora olha, ora não olha, ora o cruzar do olhar, naquela noite de domingo, enquanto rodava na praça Siqueira Campos de braços dados com a vida e as amigas, Clara escutou o boa noite de Paulo. Todas se entreolharam, mas foi o coração de Clara que fez zoada, no descompasso !

Parou, e as amigas entre sorrisos assustados, se afastaram.

Paulo arranjou coragem, num cigarro "Capri"?

Ou foi a música da Frigidaire , que detonou o avanço ?
" Coruja, o nome que eu dei a um certo alguém, que passa e nem sequer olha ninguém, pensando só tá ela , no lugar..."




Olhos nos olhos, e a pergunta clássica , entrecortada : " quer namorar comigo"?
Uma resposta evasiva . Um sim decisivo por dentro, e um talvez cheio de pudores , na voz do momento.
- Sou nova, 13 anos incompletos... meus pais não vão aprovar. Morro de medo de uma surra; morro de medo de me apaixonar... Mas os olhos disseram sim , e o romance começou a se encaixar. Conversas doces, nervosas, palpitantes. Clara pela primeira vez, anrranjara um namorado.
Naquela noite , antes de dormir, escreveu no seu diário :
Ele encostou. Estamos namorando, e marcamos novo encontro, no Cine Moderno , sessão das 4 h, para assistir Elvis Presley !
Ao som de "love me tender " , o primeiro momento de intimidade : um simples roçar de braços ! E começou o mundo de encantos, lágrimas, prazer, e o cheiro das saudades !
-Era o dia 2 de Junho de 1964 !

Mestre- Cuca




Crato e a Gastronomia, nos anos 60. Dona Valda, minha mestre-cuca!

Ainda há pouco, desci para almoçar, o feito por mim! Tava legal, porque faço pensando no paladar do meu filho, Victor. E se eu morasse sozinha? Com certeza comeria muito mal.
Entre a sala e a cozinha, eu me senti vestida de farda, boca cheia d’água, estômago roncando, correndo pra almoçar , depois do expediente escolar.
Todos os dias, o cardápio era previsto:
Na segunda-feira, um baião de dois escuro (muito feijão), soltinho, porque era refogado com torresmo. Carne de sol assada, no fogareiro a querosene, paçoca, banana da casca verde.
Na terça-feira, nos aguardava um cosido com todos os legumes (batata doce, macaxeira, jerimum, cenoura, etc); um arroz branco soltíssimo (minha mãe só comprava arroz velho);
Macarrão refogado na nata de leite, e pirão feito com o caldo do cosido.
Na quarta-feira tinha sempre lombo assado, recheado com pequenos pedaços de toucinho; salada de ovos cosidos com tomates, feijão mulatinho, do caldo grosso, bem temperado. Minha mãe fritava rodelinhas de batata-doce, que pareciam deliciosas bolachas. Adorávamos!
Na quinta-feira tinha bifes batidos no cepo, acompanhados de jerimum bem verde; arroz com pequi, macarrão de forno com queijo ralado e ovos batidos.
Na sexta-feira era o dia do peixe ou bacalhau ao molho de coco, e aqueles temperos verdes . Tinha sempre um molhinho separado com pimenta malagueta. Aí cabia o purê de batata, e o feijão verde temperado com nata.
O sábado era o pior ou o melhor dos dias. Detestávamos carne de bode ou carneiro, mas ela tinha que agradar ao velho... Então fazia nas paralelas costelas de porco assadas, uma frigideira de carne moída, uma titela de galinha, na chapa.
Aos domingos, o cardápio era sagrado: galinha (só existia a caipira) ou peru, ao molho pardo, salpicão de legumes, arroz refogado, polenta de milho verde.A mesa era colorida e farta !
Os jantares é que lembro com mais saudades: arroz topado, sopa de feijão, canja de galinha, arroz com tripa de porco torrada, fígado, arroz com ovo caipira e lingüiça caseira. Hum... Que saudades de todos aqueles pratos!
Dos lanches também: das 9 h e das 14 h.
Só não gostava quando ela inventava gemada de ovos caipira com mel de abelha. Achava enjoado! Mas os suspiros, sequilhos, doces no tacho com queijo de manteiga, banana frita, bolos diversos, umbuzada, mangusta... Vixe, bom demais!
Minha casa tinha esse movimento de festa na cozinha.. Eu me criei gostando de sentir os cheiros, e pegar na colher de pau, pra mexer o vatapá.
Nada de pizas, lasanhas, parmegianes, nem salmão defumado. Lagosta? Só conhecíamos, no máximo, cioba e cavala. No mais era traíra, piau... !
Não tínhamos musses, nem gelatinas de sobremesas. Minha mãe fazia o tradicional pudim de leite, e batia o mamão com maracujá ou laranja, colocava uma calda de ameixa, e ficava lindo e delicioso!
Valda querida, obrigada por ter cuidado tão bem da nossa família. Hoje estamos presos aos grelhados, descartamos os temperos de porco, e aderimos aos azeites de oliva, mas tua comidinha( cem por cento natural) , ficou na memória de todos os meus sentidos !

Corpos de papel




construímos tantos corpos de papel...
pichamos muros
pintamos telas no céu
fizemos abrigos subterrâneos
descobrimos mapas de labirintos
nossa floresta era imensa...
nos perdemos no caminho
catando flores
e destruindo ninhos.

olhei demais pro céu
pensando que você,
fosse um passarinho !


Você corta o filme
amarga o recado
deixa o mel
na porta do enxame
deixa a flor
na madrugada aberta
morrer na manhã


Sono que se vai
O lado vazio e silencioso da cama
Arrumo o lençol que fala...


Presente com tinta
Futuro sem papel
Passado amarrado
Pipas voam alto do além para cá...
Conquistam espaço
Na janela do quarto
vejo um pedaço do céu!

Casa abandonada x Vida restaurada



Beira de estrada. Horta , pomar e jardim , consumidos pelo mato.Sumiu aquela mistura de verde e encarnado, salpicado de rosa. Ocre tom...verde-fechado e amarrotado !
Quero gritar pelos de casa , pedir-lhes um copo d'água ... Um silêncio fúnebre , quebrado pelo vento, num mato sem cachorros , responde.
Passo e enxergo o abandono , igualado com uma magia estranha. Tudo caindo aos pedaços : a casa, esperanças , .e um sol desnecessário ! Paro e adentro em pensamento , destarte o cansaço da estrada .
Na sala um banco de cimento; um chapéu de palha rasgado ;uma carta queimada , e uma placa descascada , onde se pode ler : "Lar , Doce Lar..."
O corredor é estreito , escuro e úmido ; telhas quebradas , espalham-se no chão de mosaicos; quartos amplos, móveis corroídos pelo cupim; colchão destruído pelas traças. No outro quarto , um brinquedo de borracha , mistura-se aos farrapos. Na cozinha um fogão de lenha, uma chaleira amassada, esquecida do último café que esquentou ! Uma caneca de Ágata , um pote de barro, uns caixotes de madeira, cobertos de mofo e poeira . No teto , um império de aranhas. Ministérios, templos , castelos, pontes e jardins suspensos por teias ... tênues linhas , que se invisibilizam . Tudo negro, sem vida e sem cor ! Banheiros primitivos ; uma cacimba , e a mata virgem , com não sei quantos hectares , sem caminhos.
Como construir nesse casebre um doce amanhã ?
No primeiro dia seriam recortados os caminhos. Limpa do terreno , transformado em avarandado com cestos de samambaias.; chão e paredes vassourados , sem sequer um pé de lixo , nem uma única folha , trazida pelo vento . Novas telhas , novo cal , água no piso ; janelas e portas, enfim desferradas ! De lá sairá um caminhão de poeira , e outro de fantasmas !
Dia seguinte , portas e janelas pintadas; fechaduras novas , , vitrais com motivos florais , jardineiras com sementes de gerânio e beijo americano . No quarto uma cama de ferro , uma cortina de renda , e uma colcha de retalhos; um baú de guardados , com saches de patchuli. No banheiro uma violeta , um armário com sais e sabão de alecrim ! Sala com sofás de cipó , almofadas de chita , uma cadeira de palhinha , uma mesinha de canto , aonde teu óculos , teu livro e teu licor , descansam !
Um velho piano , espera uma serenata , em noite de lua ...Uma lareira crepitante , espera uma noite de Julho !
Na cozinha , a alquimia de todas as ervas; potinhos de geleia e farinha , e um monte de lenha , pra não faltar fumaça , na chaminé . Copos de alumínio areiados , espelhando teu rosto. Cheirinho de feijão temperado com uma folha de louro, e um velho papagaio , a te remedar ... " não quero outra vida.Nessa paz eu morro "!
Flora revitalizada , cachoeira jorrando água pros banhos matutinos e vesperais . Amigos chegando , cerveja gelando , pipocas e castanhas estalando ... lua pairando , e iluminando a poesia !
Quem neste sonho pára , toma café com Dona Maria , e ainda ganha outro agrado : pedaço de sonho , pintado num arco-íris !

A Dama de olhos azuis
Para Dona Anilda Arraes

Desde criança conheço aquela moça. Intimidava-me a sua elegância, o porte de nobresa. Fugia da minha tanta admiração.Corria da conversa, da aproximação. O casarão de esquina, bem perto das minhas moradas. O Jardim da casa, palco dos meus contos de fada.
Tenho quebrado a distância. Ontem entrei no seu quarto.Tudo lindo, tudo em ordem, tudo em paz.
Na semi inconsciência , seus olhos acordavam para um breve reconhecimento.Perguntou meu nome... Respondi, e ganhei o mais valioso dos sorrisos.
Depois, a contínua pergunta :
Tá chovendo muito grosso?
Preciso voltar pra casa...
Caíra outra vez, num instante da eternidade.
Ela Educadora , deixou-me um traço forte de precisar fazer, sendo a simplicidade .

Delicado



ALFREDO MOREIRA MAIA - meu avô paterno.

Filho do Caboclo Moreira e esposo de Donana - O mais terno avô do mundo !
Morreu de aneurisma , desgostado , quando teve que sacrificar seu cachorro "Tupã". Eu contava 6 anos.
Cuidou das minhas mamadeiras , adoçou minha boca com balinhas de umburana , carregava-me nos braços , quando eu adormecia , no colo de Donana. Aperriava aquele homem , o dia todo ... Vô , quero dois mil réis pra comprar pirulito. A sua caixinha de moedas , ficava sempre vazia .
Era dotado de uma inteligência privilegiada. Nada existia que , nas suas mãos não tivesse conserto , nem se transformasse em arte. Era um artesão de primeira. Consertava o relógio da Sé , da Pça da Estação , fazia bolas de bilhar para o "Bar Ideal " , joias ; fundia qualquer metal , e transformava numa peça útil ou ornamental.
Elegante e belo , vestia-se no cáqui ou no linho branco , chapéu combinando , relógio de algibeira , suspensórios e alfinetes na gravata.
Que sorte teve a minha avó , de ser amada por aquele homem !
Ficou na minha memória o seu assobio : Delicado ...Um choro lindo - Sua canção preferida !

Cheiro de café


A cozinha é a sala de visita dos íntimos. O cheiro de café está sempre no ar... Um dos preferidos de todos . Só perde pro cheiro de chuva e empata com o do jasmim!
Todo mundo tem sempre algo para contar. De instante em instante , alguém toca a campainha ou o telefone chama . Todos estão sempre pendurados no celular, ou ligados na internet... Se duvidar , têm até namorado virtual!
Juscelino Kubitschek não é mais o Presidente da República. Inventou Brasília ,e o Rio deixou de ser a Capital da República . Copacabana é só dos nossos sonhos, e dos boêmios cariocas!Deixei de fazer roupas de bonecas, de ler estórias da Carochinha , de levar lancheira pra escola, de ganhar bombons do Pe.Frederico ,no Instituto São Vicente Férrer; de dançar a quadrilha gritada por Zenira Cardoso, de soltar balão, chuvinha e cebolinha na calçada, em noites de S.João ; de brincar de roda (só de combinação...) , de ler romances em voz alta pra minha avó Donana ; de assistir novelas de rádio, de participar de programas de auditório na Educadora ( subir aquela rampa ...era pura magia!); de dançar nas tertúlias da Pedro II ; de ouvir as serenatas de Peixoto e Zé Flávio ; de usar mini-saias, laquê no cabelo e passar baton com gosto de caramelo, café com leite ou hortelã ; de "aprender" latim com Vieirinha, Ciências com Ivone Pequeno, história com Alderico Damasceno, Química com Pe Davi, Geografia com José do Vale Feitosa, Desenho com Dr.José Nilo , Português com Dr. Zé Newton ...etc,etc,etc!



Apaixonava-me, platonicamente, todos os dias, pelos primos, colegas de classe, e vizinhos! Não perdia a Pça Siqueira Camps nos dias de domingo. Levei lanche pra assistir "Os Dez Mandamentos" , no Cine Moderno. Colecionei álbum de figurinhas dos artistas de cinema. Flertei, indefinidamente, com o garoto dos meus sonhos, sem a menor esperança de namoro...
Senti a alegria do primeiro clarão de Paulo Afonso, e a invasão dos eletro-domésticos, em nossas casas! Ai, ai... Foi o fim da "muriçoca"... genial ! Li revistas de amor em quadrinhos: Capricho, Ilusão e Destino ... Comprei discos da Jovem Guarda. Pedi música por telefone no programa de Rádio de Heron Aquino: (Sou feliz/no trem que parte para o interior/feliz.../porque comigo vai, o meu amor/ e o trem.../ só chega quando o dia amanhecer...") ...E chegava mesmo, em Fortaleza!A gente viajava pra ver o mar, fazer exame de vistas, comprar o óculos, comer cachorro-quente, e tomar "Grapette" ( quem bebe Grapette, repete !).
Criança, adolescente, mulher e mãe,numa única década...inocente e abruptamente!


Feliz aniversário, André !
Hoje é dia de ir pra cozinha, bater um bolo, receber teus amigos...
Hoje é dia de te abraçar, te abençoar , e agradecer a Deus, porque tu nascestes!

Parabéns pelo canto, pelo jeito brejeiro de dançar, pelo idealismo profissional, por ser o pai de Bianca e Sofia.
Que a tua estrela sempre brilhe !
Um abraço amoroso , menino!

Limbo poético



estou no limbo poético
esperando a salvação da paixão
ela já não sabe me iludir
já vestiu todos os seus olhares
pra mim
agora , cega de brilho,
me espia de óculos escuros,
e eu digo...
bons, aqueles tempos,
em que me consumias !
O fim do encanto
É o início de outro encanto
Amor em meta(mor)fase !

dejá vu



o tempo brinca comigo
vivo o dejá vu
acordo e adormeço
num sonho contínuo
teu olhar me espreita
teu sorriso me enamora
depois a imagem some
e o meu coração vazio
habita uma nova história.
Desisto de esperar
um milagre que não volta !

Impasse



e a noite corre
na cidade em festa
aqui o sono já vestiu a camisola
e espera a camomila do repouso
o povo começa a chegar
com a intensidade
do que se quer
antes que a vontade fique fraca
e desista da vida....
impasse :
minhas pernas precisam passear !

Bonecas


temos a testa em comum
a mania de comer o que não pode
a gula de chupar duas bolas de sorvete

o pique de viver cantando e dançando,
eu perdi...
-ela só está começando!

ainda aproveito pouco , o tempo
deixo a oportunidade escapar
perdendo pela terceira vez
a leveza da infância:
a minha, a dele, a dela !

Quero o sorriso das meninas
antes que o meu se perca na terra
e o pó se espalhe na trsiteza
da falta de chuva.

nem demais, nem de menos...
tenho nenhum tempo
e estico o que fazer
pra ganhar sinergia
nas possíveis alegrias.

Alegria certeira
é olhar Bianca e Sofia,
brincando com as bonecas ...

"Cinderela sem sapatos" - por Socorro Moreira


Ontem rodei o comércio do Crato pra comprar um sapato novo. Fui parar na "Azteca", sapataria de Seu Modesto, mesma rua, mesmo prédio, mesmo número.
Aí lembrei da minha mãe, tão linda e tão moça, no início da década de 60. Ainda menina-moça, eu queria antes dos 15 anos, uma sapato de broto. Nada de meias curtas, e fivelas no sapato, com formato de boneca.Mas não tinha independência no querer. E a minha mãe comprou o modelo que eu rejeitei. Ela queria segurar a minha meninice, e conseguiu!
No decorrer dos anos, usei saltos Luiz XV, sandálias altíssimas, do jeito que eu quis.
Ontem eu podia comprar o que eu gostasse, preto, vermelho dourado...Mas a danada da diabetes, ordenou um sapato confortável.
Só tinha duas opções : ou ficava de saltos, sem circular na festa , ou comprava um sapato "moleca" pra caminhar pra todos os lados, e quem sabe, até dançar !
E sai com aquele pacote, no braço. Um sapato como usei aos 11 anos de idade, e como podem usar as "velhinhas" ,que precisam manter o caminhar aprumado..
É assim a vida ... Uma escada !
No começo a gente engatinha, depois pula os degraus de dois em dois... Mas,depois, começa a andar devagar, pra não cair , capengar, e ficar paralizada !

Amigos ! - por Socorro Moreira




Ontem, dia do amigo, tentei contar nos dedos, quantos amigos me fazem feliz.E na medida das lembranças , fui postando os convites para compor a lista de colaboradores do Cariricaturas.
Descobri que são muitos, na qualidade :
Minha amiga primeira (Valda, mãe);
Meu pai (Moreirinha) - o maior de todos.
Mas tem o fura-bolo, o cata-piolho ...
Amigos de infância, de escola, de Banco do Brasil, de blogs, amigos do virtual ,familiares , amigos que deixei nas cidades onde morei, amigos que me aconteceram agora .
Mais importante do que todos os meus amores , todas as minhas paixões - são os meus amigos de hoje , e de outrora.
Escolhi Joaquim para representar esse universo de afetos.
Foi no meu primeiro dia de aula. Eu tinha menos de 4 anos de idade , e estava naquela sala do Externato 5 de Julho , fardada , de lancheira e cartilha debaixo do braço , quando nos conhecemos.
Depois nos transferimos para o Instituto S.Vicente Férrer , onde concluímos o primário. De lá prestamos exame de admissão ao Ginásio , no Colégio S.João Bosco ... Treze anos de coleguismo , de vidas paralelas e tão unidas !
Não conversávamos , mas sabíamos tudo um do outro. Tudo !
Foi para Joaquim que eu escrevi meu primeiro bilhete( aos 5 anos de idade).
Brincando ele diz :
"Você sabia escrever, mas eu não sabia ler..."
Quarenta anos depois, a gente se reencontrou. Lembramos com detalhes nossa vida escolar : professores, colegas, festinhas, passeios, interesses, encantos ...De memória infinitamente mais prodigiosa do que a minha , montamos em muitas conversas o quebra-cabeça da nossas vidas.
E quando lhe pergunto ... Hei, por que nunca dançamos, nunca fomos camaradas, nunca trocamos confidências, nunca fomos ao cinema ...???
Ele responde : "Você era muito séria !"
Joaquim Pinheiro representa minha infância , adolescência , minha maturidade e jovialidade presente.

Apesar do distanciamento por tantos anos , descobrimos e reafirmamos a nossa irmandade , que eu digo que é eterna !
Hoje eu sei que ele não é apenas filho de Dona Almina e Seu César; irmão de Maria Amélia, Zé Almino , Maria Edite; sobrinho de Dona Anilda, Dona Alda, e Miguel Arraes ; primo de Dedé , de Fernando, Maria José ... Ele é o esposo de Raquel e pai de Raul e Renata ; avô de Miguel , que está pra chegar ... É o meu amigo novo e antigo; meu grande referencial de amizade !
Para Joaquim o meu abraço de respeito e carinho, extensivo a todos os meus amigos de todas a eras !

Para Ismênia Maia




amiga,
aquele poema que o vento levou,
que de tão leve deixastes escapar
era tua alma clamando o amor
lembrando-te que a razão
também em vãos, às vezes se distraí!

eu também tenho dessas fases
dá um branco, no papel em branco
as letras se escondem de mim
e os sentimentos confusos,
ficam resfriados,
e enrouquecidos,
não sabem falar.

amiga,
que informava a melodia
que solfejava o canto italiano,
e sem dizer o nome da matéria,
anotava no caderno
máximas de filosofia

não entendia tudo,
na tua letra minúscula,
que ocupava blocos e aerogramas...
eram cartas de amor
que seguaim pelos ares,
esperando a resposta ,
num efeito cascata.

também peguei a mania de escrever...
um dia era um bilhete
outro dia uma encíclica...
noutros tempos viraram memorandos
depois silenciaram,
e exigiram vida !

hoje eu lembro os meus ditados,
de menina de escola...
"é proibido começar uma frase com letras minúsculas "
e eu começo por irreverência
um poema em diminutas .

Dia de sol



A natureza troca carinho ,
no olhar do artista
Se encosta a flor,
na palmeira que dança,
quando o vento toca...
E as cores se misturam,
numa emoção vibrante...
Nada faz falta
na hora em que os olhos
se desfocam da vida
e apreciam o dia !

Poema Musicado - Por Ulisses Germano


Um dia foi visitar a casa de uma amiga que escreve poesia. Aliás ninguém havia combinado nada de se encontrar. Tudo expontâneo, sem veleidade .Chegando em sua casa ela me mostrou vários de seus poemas. Pilhas de papel! Uma pequena biblioteca poética pessoal, intransferível. O nome dessa amiga é Socorro Moreira. Musiquei algumas poesias quase que instintivamente, instantaneamente. Tudo gravado. Eis um belo poema transformado em chorinho!

POEMA MUSICADO
(Crônica de um Sentimento)
(Letra: Socorro Moreira; Música: Ulisses Germano)

Existem pessoas que parecem pregos
Nos colam em telas ou no céu da vida
Existem coisas já inatingíveis
Que se escondem sempre
Sem nenhuma pista

Perdi o desejo
De achar no outro
O olhar de encanto
Que me enternecia

Se já não suspiro
Ainda respiro
A paixão que um dia
Me deixou perdida