por José do Vale Pinheiro Feitosa
Viva junto à alma mais próxima e compreenda que a proximidade é a medida da distância. Que a distância que os separa é este movimento maravilhoso da matéria e da energia. A maravilha é apenas esta surpresa porque esta proximidade é tão diminuta entre os dois e é a inesperada distância.
José do Vale P Feitosa
quinta-feira, 28 de novembro de 2013
terça-feira, 26 de novembro de 2013
O "piscinão" - José Nilton Mariano Saraiva
Esses políticos brasileiros
não têm mesmo jeito. Rubens Ricupero, Ministro da Fazenda do Governo Itamar Franco, durante
o intervalo da gravação de uma entrevista, sem saber que o microfone se achava
aberto, confidenciou ao repórter global Carlos Monfort (seu primo) não ter mesmo nenhum
escrúpulo: se a notícia fosse boa, divulgava e, se não (se fosse má) jogava pra
debaixo do tapete. Como as “parabólicas da vida” captaram a sua fala, de repente
metade do mundo e mais a outra banda tomou conhecimento e, assim, o metido a
esperto acabou por perder o emprego.
Agora temos aí o
pseudo-valentão Ciro Gomes, que tomou de conta do Governo do irmão e literalmente
se autonomeou Secretário de Saúde do Estado; e chegou fazendo uma zoada danada,
ao anunciar que em 90 dias acabaria com o tal “piscinão” do Hospital Geral de
Fortaleza (para os que não sabem, “piscinão” é como ficou conhecido o local, localizado
no térreo daquele hospital, e onde, por falta de leitos, os doentes eram amontoados
em macas, no chão, nos banheiros e por aí vai).
Pois bem, de repente o “piscinão”
secou. Num instante, como num passe de mágica, os doentes e agregados sumiram
do local e isso logo foi divulgado como se fora a marca da eficácia e eficiência
do gestor Ciro Gomes que, recém-chegado, já resolvera o problema, que perdurara
anos. Tanto que a área do antigo “piscinão”
agora era um imenso vazio.
Mas, como a mentira tem
pernas curtas, algum repórter bisbilhoteiro descobriu que o “piscinão” ressurgiu
no segundo andar do mesmo edifício; ou seja, dando uma de malandro, o referido
senhor mostrou a área do “piscinão” desocupada, mas esqueceu de informar que seus
ocupantes apenas tinham sido transferidos, acomodados ou realocados dois
andares acima, longe dos holofotes.
E aí, para não
melindrar o nobre Secretário de Saúde, apenas se trocou a palavra “piscinão”
por “varandão”, já que localizado num andar superior.
sexta-feira, 22 de novembro de 2013
Lilliput
J. FLÁVIO VIEIRA
O mundo de Madalena era minúsculo. As
fronteiras percorriam-se facilmente sem atropelos. O centro do universo brotava no
pequeno sítio onde vivia e estendia-se , quando muito, À pequenina vila onde,
religiosamente, ia aos domingos fazer a feira. A cidade enchia-lhe o coração de
um certo travo, como se alcançasse a mordida final da polpa do caju. Tudo ali
lhe parecia desproporcional e barulhento:
o nanico arruado cintilava-lhe aos olhos como a metrópole , a capital do
seu mundo prenhe dos hipnotizantes
avanços tecnológicos : a luz elétrica, o calçamento tosco ( para ela ladrilhado
com pedrinhas de brilhante), a praça, a igrejinha. Todo domingo chocava-se o
mundo minimalista de Madalena com a
aparente grandiosidade da Vila,
dir-se-ia Gulliver saindo de Liliput e adentrando os portais de Brobdingnag.
Como não se emprenhar da pequenez do planeta, visto através do translúcido
filtro do sítio ? Para o pinto os
horizontes não terminam na casca do ovo
? Ali, a lua cheia beijava-lhe o terreiro em reverência quase que religiosa. As
estrelas refletidas na lâmina do açude podiam ser bebidas com a concha das mãos
e o sol , onipresente, morava no quarto da frente, envolto no seu cobertor de
fogo e de luz. Até o outro mundo percebia-se convidativo ,ali defronte, num cemiteriozinho improvisado, perto da casa,
com suas cruzes tronchas e suas flores murchas. Talvez, por isso mesmo, a vila
saltava-lhe aos olhos como um estorvo, uma outra longínqua galáxia.
Madalena
ouvia, vez por outra, falar de terras estranhas e distantes. Recife, Rio, São
Paulo...Na sua escala, no entanto, não deviam ser locais tão remotos. O Oiapoque
terminava no pequizeiro defronte da casinha de taipa e o Chuí iniciava-se longo
adiante , no fim do quintal. Os
feirantes , vorazes engolidores de estrada, falavam das terríveis e penosas
viagens a muitas lonjuras. Madalena, no entanto, assegurava-os, alimentando o
riso de muitos, que atrás de sua casa tinha uma veredazinha que era pertinho de
todo canto deste mundão de meu Deus. Na feira, o povo mangava daquela
pretensão, daquele portal particular da roceira e apelidaram a vereda de : “Caminho
de Madalena”. Queriam que algum fazedor
de mandado se apressasse? Sapecavam:
---
Vá pelo Caminho de Madalena, viu ?
Se
alguma pessoa chegava atrasado num trato, a pergunta fazia-se inevitável :
---
Por que não veio pelo caminho de Madalena ?
Diferentemente
de Liliput, no entanto, aos olhos de Madalena era o mundo que se revelava microscópico
e não as pessoas. Os homens e as mulheres desnudavam-se enormes e coloridas talvez como um contraste natural
ao opaco-cinza do restante da aquarela. Os sonhos, também, tantas e tantas
vezes, trespassavam as fronteiras daquele mundinho, a contragosto
da sonhadora, e deslindavam-se para além dos limites extremos do pequizeiro e do
quintal fazendo-se palco mais que
suficiente para o enredo de uma vida. E
aos poucos se ia aprendendo que nas muitas viagens, físicas e sentimentais, empreendidas na existência, nesta contínua
corrida de obstáculos , pode-se buscar,
sempre, um atalho menos penoso, uma via
mais expressa: um Caminho de Madalena.
Crato,
22/11/13
Namore um "barrigudinho" (transcrição)
Tenho um conselho valioso
para dar aqui: se você acabou de conhecer um rapaz, ficou com ele algumas vezes
e já estar começando a imaginar o dia do seu casamento e o nome dos seus
filhos, pare agora e me escute. Na próxima vez que encontrá-lo, tente disfarçar,
tente descobrir como é sua barriga. Se for musculosa, torneada, estilo
`tanquinho´, fuja! Comece a correr agora e só pare quando estiver a uma
distância segura. É fria, vai por mim. Homem bom de verdade precisa,
obrigatoriamente, ostentar uma barriguinha de chopp. Se não, não presta. Estou
me referindo àqueles que, por não colocarem a beleza física acima de tudo (como
fazem os malditos metrossexuais), acabaram cultivando uma pancinha adorável.
Esses, sim, são pra manter por perto. E eu digo por quê. Você nunca verá um
homem barrigudinho tirando a camisa dentro de uma boate e dançando como um
idiota, em cima do balcão. Se fizer isso, é pra fazer graça pra turma e
provavelmente será engraçado, mesmo. Já os `tanquinhos´ farão isso esperando
que todas as mulheres do recinto caiam de amores - e eu tenho dó das que caem.
Quando sentam em um boteco, numa tarde de calor, adivinha o que os pançudos
pedem pra beber? Cerveja! Ou coca-cola. Tudo bem também. Mas você nunca os verá
pedindo suco. Ou, pior ainda, um copo com gelo, pra beber a mistura patética de
vodka com `clight´ que trouxe de casa. E você não será informada sobre quantas
calorias tem no seu copo de cerveja, porque eles não sabem e nem se importam
com essa informação. E no quesito comida, os homens com barriguinha também não
deixam a desejar. Você nunca irá ouvir um ah, amor, `Quarteirão´ é gostoso, mas
você podia provar uma `McSalad´ com água de coco. Nunca! Esses homens entendem
que, se eles não estão em forma perfeita o tempo todo, você também não precisa
estar. Mais uma vez, repito: não é pra chegar ao exagero total e mamar leite
condensado na lata todo dia! Mas uma gordurinha aqui e ali não matará um
relacionamento. Se ele souber cozinhar, então, bingo! Encontrou a sorte grande,
amiga. Ele vai fazer pra você todas as delícias que sabe, e nunca torcerá o
nariz quando você repetir o prato. Pelo contrário, ficará feliz. Outra coisa
fundamental: homens barrigudinhos são confortáveis! Experimente pegar a tábua
de passar roupas e deitar em cima dela. Pois essa é a sensação de se deitar no
peito de um musculoso besta. Terrível! Gostoso mesmo é se encaixar no ombro de
um fofinho, isso que é conforto. E na hora de dormir de conchinha, então?
Parece que a barriga se encaixa perfeitamente na nossa lombar, e fica sensacional.
Homens com barriga não são metidos, nem prepotentes, nem donos do mundo. Eles
sabem conquistar as mulheres por maneiras que excedem a barreira do físico. E
eles aprenderam a conversar, a ser bem humorados, a usar o olhar e o sorriso
pra conquistar. É por isso que eu digo que homens com barriguinha sabem fazer
uma mulher feliz. CHEGA DE VIADAGEM! O mundo inteiro sabe que quem
gosta de homem bonito são os viados. Mulher quer homem inteligente, carinhoso e
boa praça. Chega de ter a consciência pesada após beber aquela cervejinha, ou
aquele vinho, e comer aqueles petiscos. Passe adiante para todos os barrigudos
e simpatizantes.
De Rosa Maria Guerrera para o Azul Sonhado
São muitas as pessoas que desfilam pelos corredores das nossas vidas. E
acontecem de maneira curiosa ,ora em forma de pequenos esbarros ,
ora em encontros que ficam para sempre em nossos corações.
Muitas representam luzes que piscam iguais aqueles enfeites de Natal , e que só duram realmente por um período de festas e alegrias. Outras trazem no olhar o brilho radiante do sol e que penetram de uma maneira rara os dias cinzas do nosso viver se infiltrando de tal maneira no nosso eu , que deixam cicatrizes profundas nas nossas lembranças.
Em cada coração ( penso eu ) existe um " você" que sentou ao lado dos nossos pensamentos e rabiscou frases de ternura que por muito tempo resistiu a vendavais , borrascas ,lágrimas e até despedidas..
Aquele você que nos ensinou a sorrir,a desbravar montes nunca antes escalados , a mergulhar sem receios em mares desconhecidos ,e a viver cada dia como fosse a primeira vez de um grande sentimento.
Aquele você que nos impulsionou a fugir do " eu sozinho", para conhecermos de perto a beleza do "nós ".
Essas pessoas não foram esbarros , foram encontros .
Encontro com a alegria , encontro com a pureza , encontro com o amor , encontro com a verdade.
E elas ficam , mesmo que tenham partido , por um golpe do destino ou até pela necessidade de um adeus.
E não importa o tempo em que tenham vivido conosco , mas o tempo que desafiando as correntezas da vida , se tornou para nós , um tempo imortal .
Muitas representam luzes que piscam iguais aqueles enfeites de Natal , e que só duram realmente por um período de festas e alegrias. Outras trazem no olhar o brilho radiante do sol e que penetram de uma maneira rara os dias cinzas do nosso viver se infiltrando de tal maneira no nosso eu , que deixam cicatrizes profundas nas nossas lembranças.
Em cada coração ( penso eu ) existe um " você" que sentou ao lado dos nossos pensamentos e rabiscou frases de ternura que por muito tempo resistiu a vendavais , borrascas ,lágrimas e até despedidas..
Aquele você que nos ensinou a sorrir,a desbravar montes nunca antes escalados , a mergulhar sem receios em mares desconhecidos ,e a viver cada dia como fosse a primeira vez de um grande sentimento.
Aquele você que nos impulsionou a fugir do " eu sozinho", para conhecermos de perto a beleza do "nós ".
Essas pessoas não foram esbarros , foram encontros .
Encontro com a alegria , encontro com a pureza , encontro com o amor , encontro com a verdade.
E elas ficam , mesmo que tenham partido , por um golpe do destino ou até pela necessidade de um adeus.
E não importa o tempo em que tenham vivido conosco , mas o tempo que desafiando as correntezas da vida , se tornou para nós , um tempo imortal .
quarta-feira, 20 de novembro de 2013
Nasce o Brasil talibã
Guilherme Fiuza, O Globo
O Brasil virou, definitivamente, um lugar esquisito. A última onda de manifestações reuniu professores em greve (e simpatizantes) por melhores salários para a categoria. Aí os professores cariocas receberam a adesão dos tais black blocs — nome pomposo para um bando de almas penadas em estado de recalque medieval contra tudo.
Os professores não só acolheram os depredadores desvairados nas suas passeatas, como declararam, por meio de seu sindicato, que aquele apoio era “bem-vindo”.
Deu-se assim o casamento do século: a educação com a falta de educação. Nem a profecia mais soturna, nem a projeção mais niilista, nem as teses do maior espírito de porco conceberiam esse enlace. O saber e a porrada, lado a lado, irmanados sob o idioma da boçalidade.
Mas o grande escândalo não está nessa união miserável. Está na cidade e no país que a cercam. Se o Rio de Janeiro e o Brasil ainda tivessem um mínimo de juízo, o romance entre profissionais do ensino e biscateiros da violência teria revoltado a opinião pública.
As instituições, as pessoas, enfim, a sociedade teria esmagado esses sindicalistas travestidos de educadores. O saber é o que salva o homem da barbárie. Um professor que compactua, ou pior, se associa ao vandalismo é a negação viva do saber — é a negação de si mesmo. Não pode entrar numa sala de aula nem para limpar o chão.
E o que diz o Brasil dessa obscenidade? Nada. O movimento grevista continuou tranquilamente — se é que há alguma forma tranquila de estupidez — bloqueando o trânsito a qualquer hora do dia, em qualquer lugar, diante de cidadãos crédulos que acreditam estar pagando pedágio pela “melhoria da educação”. Crédulos, nesse caso, talvez seja um eufemismo para otários.
Claro que uma sociedade saudável logo desconfiaria dos métodos desses professores. E os desautorizaria a lutar por melhores condições de ensino barbarizando as ruas. Os salários dos professores de verdade são uma tragédia brasileira, mas esses comparsas de delinquentes mascarados não merecem um centavo do contribuinte para ensinar nada a ninguém.
O problema é que a sociedade está revelando, ainda timidamente, a sua faceta de mulher de malandro. Apanha e gosta.
Na entrega do Prêmio Multishow, o músico Marcelo D2 apareceu no palco com sua banda toda mascarada, com uma coreografia simulando uma arruaça aos gritos de “black bloc!” Não se registrou nenhum mal-estar, reação ou mesmo crítica ao músico que fazia ali, ao vivo, um ato veemente de apoio ao grupo fascistoide que quebra tudo.
Está se formando uma opinião pública moderninha que não admite abertamente ser a favor da violência, mas que se encanta e sanciona essa rebeldia da pedrada. A vanguarda, quem diria, foi parar na Faixa de Gaza.
Caetano Veloso também posou com o figurino da máscara negra. Declarou ser a favor da paz, mas disse que a existência dos black blocs “faz parte”.
Quando um artista da magnitude de Caetano emite um sinal tão confuso como esse, não restam dúvidas de que os valores andam perigosamente embaralhados. Tem muita gente acreditando que a revolução moderna passa por esse flerte com o obscurantismo. O nome disso é ignorância.
A confusão de valores está espalhada por todo o debate público. Nas ruas, depredação é confundida com civismo; na internet, pirataria é confundida com liberdade.
A suposta “democratização da cultura” legitimou o assalto aos direitos autorais de grandes compositores brasileiros, com a praga do acesso gratuito às músicas. De impostura em impostura, chegou-se à inacreditável polêmica sobre a proibição de biografias não autorizadas — uma resposta obscurantista dos próprios artistas assaltados pela liberdade medieval da internet.
O dilema entre liberdade de expressão e direito à privacidade tornou-se o grande tema do momento. Um dilema absolutamente falso. Ambos são direitos sagrados e podem conviver tranquilamente, ao contrário da paz e da porrada.
É aterrador que gênios como Caetano Veloso e Chico Buarque estejam confundindo pesquisa séria e literatura biográfica com voyeurismo, fofoca e curiosidade mórbida. Guarnecer a fronteira entre esses dois campos é muito fácil — numa sociedade que não tenha desistido do bom senso, da justiça e da educação.
Mas numa sociedade que tolera educadores adeptos do quebra-quebra, não haverá mordaça legal que dê jeito. Não existe meio-obscurantismo. Entre os talibãs, por exemplo, a carta magna é o fuzil. E aí tanto faz a maneira de lidar com livros e músicas, porque eles não têm mais a menor importância.
Guilherme Fiuza é jornalista.
Definição de "avô" (transcrição)
Um avô é um homem que não tem filhos, POR ISSO GOSTA DOS FILHOS DOS OUTROS. Os avôs não têm nada para fazer, a não
ser estarem ali. Quando nos levam para passear, andam devagar e não pisam nas
flores bonitas nem nas lagartas. Nunca dizem: “some daqui, agora não, vai
dormir”. Normalmente são gordos, mas mesmo assim conseguem abotoar os nossos
sapatos. Advinham sempre o que a gente pensa. Só eles sabem como ninguém a comida
que a gente quer comer. Os avôs usam óculos e, às vezes, ATÉ CONSEGUEM TIRAR OS
DENTES. Os avôs não precisam ir ao cabeleireiro, pois são carecas ou estão
sempre com os cabelos arrumadinhos. Quando nos contam histórias nunca pulam
partes e não se importam de contar a mesma história várias vezes. Os avôs são
as únicas pessoas grandes que sempre têm tempo para nós. Não são tão fracos
como dizem, APESAR DE MORREREM MAIS VEZES QUE NÓS. Todas as pessoas devem fazer o possível pra
ter um avô, ainda mais se não tiverem televisão.
************************************
(Tomamos conhecimento que o Carlos
Eduardo Esmeraldo recentemente se tornou avô, daí a transcrição dessa autentica
“pérola”, de autoria de Ana Paula, menina de 8 anos, de Florianópolis-SC).
terça-feira, 19 de novembro de 2013
segunda-feira, 18 de novembro de 2013
O "recomeço" - José Nilton Maiano Saraiva
Pintor famoso, sessentão,
aposentado, família constituída, estabilizado na vida, eis que, de repente, se
vê tomado por um profundo desejo de “sumir do mapa”, dar um basta naquele vazio
imenso e doído que, sem mais nem menos, dele se apoderou. “Depressão” e
depressão da braba, que o leva até a adquirir uma arma visando acabar logo com
aquilo – para, quem sabe ? - encontrar um pouco de sossego, paz. Na hora de
apertar o gatilho, no entanto, reflui, não tem coragem de fazê-lo; e aí, resolve
sair pelo mundo no rumo que a “venta” (nariz) apontar. Logo se põe na estrada,
sem qualquer compromisso com horário ou destino, dia ou noite.
Numa parada momentânea,
em meio a uma chuva torrencial, batidas no vidro do carro lhe revelam o rosto apreensivo
de uma jovem, encharcada pela tempestade. Mesmo a contragosto, aceita dar-lhe
carona, “pra qualquer lugar”, conforme lhe determina a nova companhia.
De pronto, à sisudez do
sessentão deprimido, contrapõe-se o comportamento irrequieto e questionador daquela
adolescente que poderia ser sua filha e que, aos poucos, paulatinamente, consegue
fazê-lo “se abrir”. Contribui para tanto, o fato de também ela ter saído de
casa, expulsa pela mãe e padrasto, e não saber (ou não ter) pra onde ir.
Ao contrário do que
normalmente acontece em dramas análogos, aqui o “velho” não tenta aproveitar-se
da “jovem” de 17 anos, belíssima e desamparada. Pelo contrário, aos poucos cria
uma afeição paternal tão grande por ela, de tal forma que chega a enfrentar
alguns marginais (de rifle em punho) que tentavam abusá-la.
No dia a dia, Marylou (esse
o nome da jovem) inocentemente se sente à vontade para chamá-lo de “velho”,
reclamar da “cafonice” das suas roupas e por aí vai. E ele, que ultimamente não
suportava nem ouvir a voz da própria esposa, passivamente aceita tudo, no maior
bom humor. Chega, até, a sorrir das trapalhadas em que ela se envolve
(principalmente no quesito comida).
O divisor de água, no entanto,
se dá quando ela (que pensava ser ele um “pintor de paredes”) vê alguns de seus trabalhos e, de tão impressionada, o
estimula a “fazer mais”. Ela mesma, na praia, serve de modelo (bem comportada).
E aí ele redescobre, na pintura, o prazer pela vida, sente que “está vivo”.
De repente, a notícia
estampada no jornal, de que a mãe se encontra à beira da morte em razão das
agressões do padrasto, leva a “jovem” a fazer o caminho de volta, na companhia,
é claro, do “velho”. Que aproveita para reatar com a esposa.
Durante a longa permanência
da mãe na UTI, pra não deixar Marylou desamparada, de comum acordo com a “revigorada”
esposa, ele consegue na Justiça a “guarda” daquela menina que praticamente lhe trouxe
de volta à vida.
No final, com a mãe
restabelecida e o padrasto preso, os dois retornam às origens: numa despedida
pra lá de dolorosa para os dois, tão grande a afeição nascida, Marylou volta pra
casa da mãe; o “velho” (Taillandier é o seu nome) pra sua casa, sua família.
Renascido, por uma menina que lhe trouxe de volta à vida e que, a partir de
então, considerará sua filha.
Sem dúvida, “SEJAM
MUITO BEM-VINDOS” é um cativante filme e digno de se ver.
sexta-feira, 15 de novembro de 2013
"Desnecessidade" - José Nilton Mariano Saraiva
Como não somos
nenhum “murista”, meses atrás já havíamos nos manifestado aqui neste espaço sobre
a “desnecessidade” de criação de novos municípios, via emancipação dos
respectivos distritos. Na oportunidade, aludimos à falta de receitas da
pretensa nova comuna, porquanto incapaz de cobrir suas despesas, de par com a
divisão das verbas atualmente existentes entre os novos contemplados,
ocasionando uma espécie de “socialização da pobreza”.
Agora, como estudos do
Ministério da Fazenda concluíram que a “pancada” mensal no orçamento do governo
seria da ordem de portentosos nove bilhões de reais se a “porteira fosse
escancarada”, a Presidenta Dilma Rousseff, numa prova de responsabilidade
extrema, houve por bem vetar em sua totalidade a lei que lhe houvera sido
encaminhada pelo Legislativo, sobre o assunto.
Evidente que tal
decisão gerou certo mal-estar da parte de alguns aliados do governo e, dúvidas
não tenham, quando a poeira assentar (talvez às vésperas da eleição presidencial,
próximo ano) nova investida será feita, de vez que há muito político
carreirista tentando montar seu “curralzinho particular’ objetivando manter-se em
evidência e, mui principalmente, mamar nas tetas do governo.
Alguém duvida ???
Ingrizias sebastianas
J. Flávio Vieira
Mais de três anos sem
cair um pinguinho sequer. Os poços do rio Paranaporã já tinham batido a piaba
há mais de dez meses. Matozinho estava mais seca que língua de papagaio. De
bicho de quatro pés só havia restado tamborete e de avoador : pipa. Verde, na cidade, só se via em
solenidade da prefeitura quando hasteavam o panteão nacional, mesmo assim era
um verde velho desbotado mais puxado para cinza. Ah, havia, ainda, um outro
raro remanescente da antiga esperança : o
pano da sinuca do Bar do Godô. Quem
chegasse de fora, ficaria encafifado como era possível sobreviver em meio
àquela catástrofe. Não se lia, no entanto, nos olhos dos matozenses, nenhuma
aflição descabida. Estavam acostumados ao ciclo natural das intempéries.
Angustiavam-se quando viam os animais serem dizimamos, em série, pela fome e
pela sede, mas lia-se ,no fundo das retinas,
um longínquo verde de esperança, cover daquele que um dia já havia
engalonado as árvores e as vidas.
Afonso
Caititu morava no alto da Serra da Jurumenha nas cercanias de Matozinho, uns
quatro a cinco quilômetros mais perto do céu. Nos últimos dias, havia procedido
ao inventário final pós hecatombe. O que restava ainda para se desfazer e
transformar em víveres ? Deu , então, com um velho Rádio SEMP, ainda alimentado
a válvulas. Lembrou, então, que naqueles dias terríveis se celebrava, por ali,
a festa do santo da capelinha : São Sebastião . Havia um vuco-vuco danado de
gente indo e vindo para as novenas. Do alto de seus conhecimentos de Marketing
de pé-de-serra, teve uma idéia genial. Aproveitaria a festa religiosa e
promoveria um bingo do rádio, dava para arrecadar uns reais e transformá-los em
farinha e rapadura por mais alguns dias, até que outro santo , Pedro, resolvesse
colaborar.
A casa de
Caititu ficava na saída do arruado. Ele , então, providenciou os preparativos.
Varreu todo o terreiro, espalhou cadeiras disponíveis , posicionou o oratório,
do lado de fora, com a clássica imagem de São Sebastião amarrado e trespassado
de flechas ; contratou alguns meninos para fazerem a propaganda de boca em boca e melhorou a iluminação com
algumas lamparinas subsidiárias, movidas a querozene jacaré. De noitinha,
postou-se defronte, com o rádio colocado numa mesinha, em local bem visível, as
cartelas, a cumbuca e pedras em ponto de bala para o início do jogo.
Afonso
havia planejado tudo , detalhadamente. Escapou-lhe, no entanto, um fato
importante. Um vizinho --
Francalino Bemtevi – tivera uma
idéia parecida e pertinho dali promoveu um Forró numa latada improvisada, com o
grande Sanfoneiro da região : Cotozinho dos Oito Baixos. Eram eventos de sobra
para um arruado tão pequenino, mesmo envenenado com o turismo religioso.
Caititu postou-se em frente à casa, esperando, pacientemente, a clientela.
Alguns meninos e curiosos ficaram pelas beiradas esperando o desenrolar das
coisas. Aos poucos começou a chegar a freguesia, mas passava direto para o
Forró. Entre as cartas e o rela-bucho preferiram o esfrega coxa. O tempo foi
passando e, pouco a pouco, iam se dissolvendo as esperanças do nosso promoter.
De início, Afonso ainda tentou se convencer que as coisas mudariam, mas , por
volta de nove horas, caiu-lhe a ficha e o orelhão todo na cabeça. Afobado,
desistiu e começou a colocar as coisas para dentro de casa, numa penosa
desprodução. Enquanto ia e vinha, percebeu, entre os curiosos
que por ali ainda permaneceiam curruchiado. Estavam, cuidadosamente,
mangando dele. Numa das viagens , no leva-leva de coisas, trouxe, consigo, a
velha espingarda soca-soca. Firmou-a no chão, observou a platéia meio
desconfiada e ameaçou:
---
Tô botando as coisas tudo pra dentro. Mas tô avisando! O primeiro filho da puta
que armar um risinho de canto de boca , zonando comigo, eu meto bala. Querem
ver ?
Ninguém
queria, ao menos ali, defronte ao cano da soca-soca. Foram saindo rápido.
Caititu, no entanto, ficou ainda mais fulo da vida, quando ao longe, ouviu as
gargalhadas que se soltavam já fora da alça da mira. Quando pegou por fim a
imagem de São Sebastião, sobrou a raiva para
o santo guerreiro:
---
Vai timbora pra dentro de casa! Num fica olhando pra mim , não ! Devia ter
vergonha : com esses olhos pidão, revirados pra riba, como quem procura rola voando! Pezim levantado, munheca e rejeito moles, todo
flechado... Tome jeito de homem! Tu é loiça, é ? Num zone , não ! Tu nem pode
correr todo ingriziado de imbiriba pra
todo lado! Num venha não, seu fresco !Te
lasco chumbo no rabo!
15/11/13
quinta-feira, 14 de novembro de 2013
História de Juazeiro
PAULO MAIA DE MENEZES
“Nunca mais você mata um irmão de um homem”
(Pedro Maia).
Por Fernando Maia da Nóbrega
1 - SÚMULA
Nome: Paulo Maia de Menezes
Filiação: Aristides Ferreira de Menezes
Ana Leopoldina Maia
Nascimento: 1879 - Crato-Ce (01)
Morte: 09 de junho de 1914 – Juazeiro do Norte-Ce
Causa Mortis: Assassinato
Motivo: Vingança
Acusados: Nazário Landim (mandante), Mané Chiquinha (executor).
2- ANTECEDENTES
A morte trágica de Paulo Maia, também
alcunhado de Paulo Aires, ocorrida em Juazeiro do Norte no ano de 1914,
teve como fonte motivadora um acontecimento havido muitos anos antes do
seu nascimento, na cidade do Crato em 1856 , e que se desdobrou ao longo
de 72 anos. Essa é a história de um tempo em que muitas vezes a herança
deixada era um rastro de sangue...
O século XIX caracterizou-se no Cariri
por profundas crises sociais e políticas, imprimindo uma marca de
violência que se alastrou, além dele, por três décadas da centúria
seguinte. De início, a “Revolução de 1817” frutificou sérias inimizades
entre os políticos e líderes cratenses, tendo alguns sido presos
enviados para calabouços na Bahia. Em seguida veio a “Revolução do
Equador” em 1824 onde muitos morreram entre eles Tristão de Alencar
Araripe, membro de importante família da região. A “Guerra do Pinto” em
1832 fez florescer antigas desavenças cujo desfecho foi, anos depois, a
execução do chefe Joaquim Pinto Madeira. Culminando com essas
conturbações sociais, surgiu a “Revolução de Juazeiro” em 1914.
E foi justamente em um desses
acontecimentos sociais tão em voga, que se gestou a futura morte de
Paulo Maia. No dia 08 de setembro de 1856, às três horas da tarde, se
processava, dentro da igreja Matriz de Nossa Senhora da Penha, na
cidade do Crato, as eleições para as câmaras municipais e juiz de paz. O
clima emocional estava quente e pesado, posto que em Barbalha dias
antes ocorreram cenas de violência durante a apuração dos votos. No
Crato, duas facções do Partido Conservador disputavam com o Partido
Liberal os cargos disponíveis. Determinado momento, surgiu uma discórdia
entre os grupos rivais gerando uma briga generalizada entre os
participantes. Dr. Jaguaribe, presidente da eleição, pede a
interferência do corpo policial do município com o intuito de apaziguar
os querelantes. Com a chegada dos militares, sob o comando de José
Ferreira de Menezes os ânimos se exaltaram mais ainda havendo uma troca
de tiros de ambas as partes, vindo a falecer o coronel José Gonçalves
Landim. (02). O crime emocionou todo o Cariri a ponto do Vigário Geral
Forâneo Tomaz Pompeu de Sousa Brasil excomungar o Padre Manuel Joaquim
Aires do Nascimento, Pároco da Freguesia, bem como o delegado e dois
soldados. (03)
Com o passar dos anos, um dos filhos do
delegado José Ferreira de Menezes, de nome Aristides, tornou-se um dos
mais influentes políticos cratenses no final do século XIX, exercendo
vários cargos públicos de destaques, chegando a ocupar as funções de
promotor, deputado provincial pela região e candidato a senador da
república. (03) Ressalte-se que Aristides Ferreira de Menezes casara-se
com Ana Leopoldina Maia, filha do renomado Coronel Mainha, um dos
maiores políticos cratenses do século XIX. Partidário do prefeito local ,
Coronel Belém de Figueiredo, Aristides sofreu grande revés quando em
1904, Antonio Luiz Alves Pequeno tomou a prefeitura a “manu militari” e
passou a perseguir ferozmente seus adversários por meio da montagem de
uma violenta guarda municipal.
Investido na função de delegado e
comandante da Guarda Municipal do Crato, Nazário Landim cometeu toda
espécie de arbitrariedade possível. E em sendo neto do Coronel José
Gonçalves Landim, morto na igreja em 1856, ressuscitou a velha discórdia
entre as famílias. Certa feita, em meados de 1904, encontra-se numa
esquina com o velho e respeitável Coronel Aristides e o agride a socos,
pontapés, empurrões e lhe bate com a vareta da espingarda por várias
vezes. Segundo sua lógica, vingava assim a morte de seu avô numa pessoa
que à época tinha somente quatro anos.
Essa atitude inconseqüente viria a gerar
outra de igual teor. Paulo Maia, filho de Aristides, inconformado com a
agressão sofrida pelo seu genitor agiu rapidamente em represália: ao se
encontrar com o delegado aplicou-lhe violenta surra, prostrando-o
desfalecido por terra. Os cronistas narram que ao ser preso e
interrogado pelo juiz, houve o seguinte diálogo:
-"Moço, que parentesco tem com o delegado Nazário”? Perguntou o juiz.
- “Ele é meu avô!” Respondeu com firmeza Paulo Maia.
“Mas... seu avô?” Contesta o Juiz.
- “Se ele é de sua idade mais ou menos, talvez seja mais moço, como explicar isso”?
-"Se ele bateu em meu pai, se deu em meu pai, certamente que é pai dele; e sendo pai dele, é meu avô.” Foi a resposta (04).
3- A MORTE
É certo que após o desentendimento com
Nazário e cumprir prisão por mais de um ano, Paulo Maia foi residir em
Juazeiro. Além deste motivo outros contribuíram sua para ida: era primo
do Padre Cícero e sua mulher, Aurora Adélia, era parenta de José André
de Figueiredo, um dos líderes políticos da vila. Além do mais, cuidaria
das terras do sítio Muquém, naquele município, pertencentes a seu pai.
Pouco a pouco Paulo Maia foi-se inserindo na vida político-social de sua
nova terra.
Em 1910 Juazeiro já se consolidava como
um lugarejo em constante desenvolvimento graças à presença do Padre
Cícero Romão Batista e a repercussão dos milagres ocorridos em 1889. Com
uma população expressiva, sendo alvo de romarias freqüentes e de um
comercio se expandindo constantemente, a vila clamava pela sua
emancipação política. Objetivando chamar a atenção das autoridades,
Padre Cícero, Floro Bartolomeu, Padre Alencar Peixoto, Joaquim André e
tantos outros, pregaram a desobediência civil ao povo ao propor que
“(...) não se pagaria mais impostos ao Crato” (05) Tal movimento
culminou com uma passeata realizada no dia 07 de setembro de 1910, pelas
ruas de Juazeiro, em prol da independência da vila. À frente de todos,
Paulo Maia conduzia uma bandeira verde-amarela com os dizeres “Viva a
Independência!” (06).
Eis que em 1913 irrompe a chamada
“Sedição de Juazeiro” com o objetivo de depor o governador do estado,
Major Franco Rabelo. Para concretizar esse intento, Dr.Floro armou um
expressivo contingente de bandidos e cangaceiros, recrutando os mais
afamados pistoleiros de Pajeú das Flores, Paraíba, entre eles, Zé
Pinheiro, Senhorzinho, Antonio Godê, Mané Chiquinha, Côco Seco e
Quintino Feitosa. Para as funções de subdelegado foi nomeado o Major
Nazário Landim (07), “indivíduo de péssima conduta” (08).
Nos idos de 1913/14 imperou no nosso
Estado completa selvageria. No Cariri, principalmente, um número
incalculável de crimes foram praticados, com a conivência das
autoridades, sem nunca ter sido tomadas as providências legais cabíveis.
Após o término do movimento sedicioso de Juazeiro em março de 1914, a
cidade ficou totalmente lotada de facínoras remanescentes da guerra.
Bandidos de alta periculosidade, sem trabalho, perambulavam pelas ruas
bebendo, fazendo confusões, provocando brigas e matando pessoas.
Como a ociosidade é a mãe de todos os
vícios, Mané Chiquinha lembrou a Nazário Landim que seu desafeto, Paulo
Maia, andava impune na cidade. Não obstante as ponderações iniciais, o
subdelegado contrata o pistoleiro por 100 contos de réis e uma mula.
(09) Xavier de Oliveira insinua, nas entrelinhas, que um crime
envolvendo uma pessoa de prestígio como Paulo Maia tinha que haver o
consentimento do chefe, no caso, presumo eu, Dr.Floro Bartolomeu. (09).
Há alguma razão para se aceitar a tese, posto que tanto o Coronel
Aristides, pai de Paulo, quanto o cunhado Joaquim Inácio Figueiredo
faziam oposição ao Médico e ao Padre Cícero. (10)
Paulo Maia residia numa casa, hoje
demolida, localizada à Rua do Brejo, em frente à Matriz de Juazeiro. Na
noite de 09 de junho de 1914, enquanto conversava com o vizinho Doroteu
Sobreira, foi avisado por este que parecia haver alguém escondido no
matagal à frente da casa. Paulo Maia não levou à sério a observação do
amigo e continuou conversando alegremente. Mané Chiquinha, aproveitando a
escuridão da noite, escondido entre o pasto de bamburral, mirou a
carabina modelo 1908, dormiu na pontaria e disparou um certeiro tiro que
varou o peito da vítima indefesa.
4- VINGANÇA
Após o assassinato de Paulo Maia, Mané
Chiquinha enfronhou-se pela Serra do Araripe e vivia em lugar incerto e
não sabido. Porém, em decorrência da determinação do Governador do
Estado, Benjamim Barroso, em eliminar de vez o banditismo no Ceará,
convocou ao palácio o Coronel Medeiros e deu-lhe uma ordem seca: ”Você
vai ao Cariri e outras cidades do sertão. Não poupe bandidos. Execute-os
sumariamente.” (11). A mesma incumbência foi dada pelo Governador ao
Tenente Peregrino Montenegro quando o nomeou delegado de Campos Sales:
“Soube que é homem disposto. Liquide todo criminoso nato.” (12).
Seguindo as determinações recebidas, perseguindo a bandidos na Serra do
Araripe, o Tenente Peregrino executa sumariamente os cangaceiros Bimbão,
Caxeado, Pedro Paulo e Mané Chiquinha. (13).
Quanto ao autor intelectual, Nazário
Landim, este achou mais prudente se afastar da região e por muito tempo
não se soube de seu paradeiro. Há certa probabilidade que tenha se
refugiado na cidade de São João do Rio do Peixe, hoje Antenor Navarro,
na Paraíba, local onde seu primo e conselheiro Quinco Vasques fugindo de
uma briga em Lavras da Mangabeira, viveu sob a proteção do Padre
Joaquim Cirilo Sá. (14)
Após 72 anos dos fatos ocorridos na
Matriz de Nossa Senhora da Penha e 14 da morte de Paulo Maia, Nazário
Landim apareceu às caladas da noite, no Crato, com o intuito de pegar o
trem em rumo a Missão Velha onde viviam seus parentes. Enquanto
aguardava o passar das horas para o embarque, entrou em um quiosque, ao
lado da estação ferroviária, onde os passageiros tomavam
café,fumavam,conversavam, à espera da partida do trem. Nesse ínterim,
foi reconhecido por um padeiro que incontinentemente correu até a casa
de Pedro Maia, irmão de Paulo, bateu à porta e falou:
- “Seu Pedro, quanto o senhor paga pelas alvíssaras?”.
- “O que você quiser. O que foi?” Retorquiu Pedro (015).
-“ Nazário Landim está aqui no Crato. Na estação de trem.” Respondeu o padeiro.
Era início da madrugada do dia 28 de
julho de 1928. Pedro Maia, também conhecido por Pedro Aires dirigiu-se à
cidade de Juazeiro do Norte e foi ao encontro dos dois filhos homens de
Paulo Maia, Zezé e Odilon, e lhes falou:
“- O homem que matou seu pai está no Crato. Se querem vingar a morte dele a hora é essa.”
Em companhia dos jovens, Pedro se
dirigiu à estação ferroviária do Crato. Entregando um revólver à Zezé, o
mais velho, apontou o Nazário e disse:
-“É aquele o homem. Vá lá e mate-o!”.
Consta que Zezé titubeou. É verdade que teve medo de executar a tarefa. Vendo a indecisão do sobrinho, Pedro Maia falou ríspido:
- “Vejam como é que se mata um homem!”.
Secamente se dirigiu ao encontro de Nazário e para certificar-se que era ele mesmo, embora o conhecesse, indagou:
- “Com quem tenho o prazer de falar?”.
Pressentido o desfecho macabro daquele encontro, pálido e afásico respondeu:
-“Com Nazário, seu criado.”.
“- Eu sou irmão de Paulo Maia. Levante-se para morrer. Você nunca mais mata um irmão de um homem!”
Surpreso, Nazário não se levantou. Nisso,
Pedro Maia desfechou alguns tiros quase à queima roupa. Nazário caiu
emborcado na mesa do bar e exalou seu último suspiro.
Encerrava-se assim drasticamente uma
desavença costurada por tanto tempo. Durante 72 anos, vidas foram
ceifadas em nome de um tempo e costumes que queira Deus não se repitam
nunca mais.
NOTAS
01 - Os dados sobre a descendência,
nascimento e morte de Paulo Maia encontra-se no artigo de Bruno de
Menezes “Uma Parcela da Família Menezes do Cariri”, revista
Itaytera nº. 5, página 177 - Crato-Ce. 1959.
02 – Irineu Pinheiro, Efemérides do Cariri pág.142. Imprensa Oficial do Ceará. Fortaleza 1963.
“1856, 8 de setembro – Eleições na matriz
do Crato para juiz de paz e membros da câmara municipal. Morreu o
eleitor José Gonçalves Landim, pelo Partido Liberal, baleado na
igreja pela força pública comandada pelo delegado local que era
conservador (...)”.
Joaryvar Macedo in O Império do
Bacamarte, pág.25. Edição UFC. Fortaleza 1992 afirma:
“Acontecimento sangrento, de bastante repercussão, se deu em 1856, aos
8 de setembro. Por ocasião de eleições de membros da câmara
municipal e juízes de paz, no recinto da Matriz de Nossa Senhora da
Penha, no Crato, a força pública promoveu violentíssimo ataque aos
eleitores, visando o Partido Liberal. Da agressão, comandada
pelo próprio delegado substituto em exercício, José Ferreira de
Menezes, resultaram na morte do tenente-coronel José Gonçalves Landim
e ferimentos em várias pessoas (...)”.
03 – Guilherme Chambly Studart (Barão de
Stuart) & Newton Jacques Studart – Dicionário Biobibliográfico
Cearense 2ª edição, pág.305/306. Tipografia Progresso 1980.
Aborda sobre a vida do deputado Aristides Ferreira de
Menezes.
04 – Guilherme Chambly Studart. O.Cpág. 306.
05- Amália Xavier de Oliveira – O Padre Cícero que eu conheci. Pág.133 Rio de janeiro 1969
“(...) o padre Cícero incentivou o povo de não mais pagar imposto ao Município de Crato, desta vez, sem complacência.”
06 – Idem, ibidem.
“Paulo Maia, ardoroso revolucionário,
conduzia à frente a bandeira verde-amarela, com os dizeres ‘VIVA A
NOSSA INDEPENDÊNCIA’”.
07 – Joaryvar Macedo. Temas Históricos Regionais. Nota na pág.47. Secretaria de Cultura e Desporto. Fortaleza 1986.
08 - Joaryvar Macedo. Império do Bacamarte pág.72. Edição UFC. Fortaleza-Ce 1992:
“Indivíduo de péssima conduta, o major
Nazário Landim fruíra, entretanto, da confiança do coronel
Antonio Luís, que o investiu nas funções de subdelegado de polícia
do importante município de Juazeiro.”
09- Antonio
Xavier de Oliveira, Beatos e Cangaceiros pág.17 Rio de Janeiro. O autor
deixa aberta a possibilidade do assassinato de Paulo Maia ter sido do
conhecimento de Dr.Floro ou do coronel Antonio Alves Pequeno, este
último, inimigo político de Aristides Ferreira de Menezes,
pai de Paulo. De pronto, o autor elimina a hipótese do envolvimento do
padre Cícero:
“(...) Em geral, no Sertão, os
cangaceiros só cometem um crime, quando teem as costas quentes,isto
é quando teem patrão forte e de cima na política. (...) (um coronel,
ou um doutor, nunca um padre)” (sic).
10 – Ralph Della Cava. Milagre em
Joaseiro pág. 151. Paz e Terra. Rio de Janeiro 1977, apud
inéditos de Aires de Menezes.
“(...) não se tornando inimigos do padre
Cícero”... ficaram afastados... Aristides Ferreira de
Menezes, o velho João da Rocha, Pedro Jacintho da Rocha, Cel.Coimbra,
Joaquim Inácio de Figueiredo. (...) (sic)
11 – Abelardo Montenegro. Fanáticos e
Cangaceiros pág.pág.268. Ed.Henrique ta Galeno. Fortaleza
1973. Apud entrevista do Sr. Antonio Botelho Filho, presente
que estava na hora da recomendação do governador.
12 – Abelardo Montenegro, o.c.pág.269. Informações prestadas ao autor pelo próprio Peregrino Montenegro.
13 – Abelardo Montenegro. O.c.ibidem.
14 – Joaryvar Macedo, Império do Bacamarte pág.119, esclarece onde o coronel Quinco Vasques se refugia da polícia:
(...) Quinco Vasques (...) se refugia sob
a proteção Joaquim Cirilo de Sá, o célebre padre Sá do antigo São
João do Rio do Peixe, hoje Antenor Navarro, Paraíba (...)”.
Por essa razão somos levados a
crer que Nazário Landim após o assassinato de Paulo Maia tenha se
refugiado em Antenor Navarro.
15 - Os detalhes da vingança
perpetrada por Pedro Aires nos foi transmitida por
Odilon Figueiredo,filho de Paulo Maia, presente na hora do assassinato.
É fidedigno e tem exatidão o diálogo, posto que do conhecimento de
todos e por uma testemunha do caso, o português Ângelo de Almeida
que narrou os acontecimentos a meu pai Antonio Adil da Nóbrega.
BIBLIOGRAFIA.
Della Cava, Ralph. Milagre em joaseiro. Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1976.
Macedo, Joaryvar. Temas históricos regionais. Fortaleza, Secretaria de Cultura e Desportos, 1986.
Macedo, Joaryvar. Império do bacamarte. Fortaleza, Universidade Federal do Ceará, 1990.
Montenegro, Abelardo. Fanáticos e cangaceiros. Fortaleza. Editora Henriqueta Galeno, 1973.
Revista Ytaytera, Crato. Instituto Cultural do Cariri, 1959.
Oliveira, Antonio X. Beatos e cangaceiros. Rio de Janeiro
Oliveira, Amália X. O padre Cícero que eu conheci. Rio de Janeiro, 1969.
Studart, Guilherme C. & Studart, Newton J. Fortaleza, Tipografia Progresso, 1980.
PAULO MAIA DE MENEZES
“Nunca mais você mata um irmão de um homem”
(Pedro Maia).
Por Fernando Maia da Nóbrega
1 - SÚMULA
Nome: Paulo Maia de Menezes
Filiação: Aristides Ferreira de Menezes
Ana Leopoldina Maia
Nascimento: 1879 - Crato-Ce (01)
Morte: 09 de junho de 1914 – Juazeiro do Norte-Ce
Causa Mortis: Assassinato
Motivo: Vingança
Acusados: Nazário Landim (mandante), Mané Chiquinha (executor).
2- ANTECEDENTES
A morte trágica de Paulo Maia, também
alcunhado de Paulo Aires, ocorrida em Juazeiro do Norte no ano de 1914,
teve como fonte motivadora um acontecimento havido muitos anos antes do
seu nascimento, na cidade do Crato em 1856 , e que se desdobrou ao longo
de 72 anos. Essa é a história de um tempo em que muitas vezes a herança
deixada era um rastro de sangue...
O século XIX caracterizou-se no Cariri
por profundas crises sociais e políticas, imprimindo uma marca de
violência que se alastrou, além dele, por três décadas da centúria
seguinte. De início, a “Revolução de 1817” frutificou sérias inimizades
entre os políticos e líderes cratenses, tendo alguns sido presos
enviados para calabouços na Bahia. Em seguida veio a “Revolução do
Equador” em 1824 onde muitos morreram entre eles Tristão de Alencar
Araripe, membro de importante família da região. A “Guerra do Pinto” em
1832 fez florescer antigas desavenças cujo desfecho foi, anos depois, a
execução do chefe Joaquim Pinto Madeira. Culminando com essas
conturbações sociais, surgiu a “Revolução de Juazeiro” em 1914.
E foi justamente em um desses
acontecimentos sociais tão em voga, que se gestou a futura morte de
Paulo Maia. No dia 08 de setembro de 1856, às três horas da tarde, se
processava, dentro da igreja Matriz de Nossa Senhora da Penha, na
cidade do Crato, as eleições para as câmaras municipais e juiz de paz. O
clima emocional estava quente e pesado, posto que em Barbalha dias
antes ocorreram cenas de violência durante a apuração dos votos. No
Crato, duas facções do Partido Conservador disputavam com o Partido
Liberal os cargos disponíveis. Determinado momento, surgiu uma discórdia
entre os grupos rivais gerando uma briga generalizada entre os
participantes. Dr. Jaguaribe, presidente da eleição, pede a
interferência do corpo policial do município com o intuito de apaziguar
os querelantes. Com a chegada dos militares, sob o comando de José
Ferreira de Menezes os ânimos se exaltaram mais ainda havendo uma troca
de tiros de ambas as partes, vindo a falecer o coronel José Gonçalves
Landim. (02). O crime emocionou todo o Cariri a ponto do Vigário Geral
Forâneo Tomaz Pompeu de Sousa Brasil excomungar o Padre Manuel Joaquim
Aires do Nascimento, Pároco da Freguesia, bem como o delegado e dois
soldados. (03)
Com o passar dos anos, um dos filhos do
delegado José Ferreira de Menezes, de nome Aristides, tornou-se um dos
mais influentes políticos cratenses no final do século XIX, exercendo
vários cargos públicos de destaques, chegando a ocupar as funções de
promotor, deputado provincial pela região e candidato a senador da
república. (03) Ressalte-se que Aristides Ferreira de Menezes casara-se
com Ana Leopoldina Maia, filha do renomado Coronel Mainha, um dos
maiores políticos cratenses do século XIX. Partidário do prefeito local ,
Coronel Belém de Figueiredo, Aristides sofreu grande revés quando em
1904, Antonio Luiz Alves Pequeno tomou a prefeitura a “manu militari” e
passou a perseguir ferozmente seus adversários por meio da montagem de
uma violenta guarda municipal.
Investido na função de delegado e
comandante da Guarda Municipal do Crato, Nazário Landim cometeu toda
espécie de arbitrariedade possível. E em sendo neto do Coronel José
Gonçalves Landim, morto na igreja em 1856, ressuscitou a velha discórdia
entre as famílias. Certa feita, em meados de 1904, encontra-se numa
esquina com o velho e respeitável Coronel Aristides e o agride a socos,
pontapés, empurrões e lhe bate com a vareta da espingarda por várias
vezes. Segundo sua lógica, vingava assim a morte de seu avô numa pessoa
que à época tinha somente quatro anos.
Essa atitude inconseqüente viria a gerar
outra de igual teor. Paulo Maia, filho de Aristides, inconformado com a
agressão sofrida pelo seu genitor agiu rapidamente em represália: ao se
encontrar com o delegado aplicou-lhe violenta surra, prostrando-o
desfalecido por terra. Os cronistas narram que ao ser preso e
interrogado pelo juiz, houve o seguinte diálogo:
-"Moço, que parentesco tem com o delegado Nazário”? Perguntou o juiz.
- “Ele é meu avô!” Respondeu com firmeza Paulo Maia.
“Mas... seu avô?” Contesta o Juiz.
- “Se ele é de sua idade mais ou menos, talvez seja mais moço, como explicar isso”?
-"Se ele bateu em meu pai, se deu em meu pai, certamente que é pai dele; e sendo pai dele, é meu avô.” Foi a resposta (04).
3- A MORTE
É certo que após o desentendimento com
Nazário e cumprir prisão por mais de um ano, Paulo Maia foi residir em
Juazeiro. Além deste motivo outros contribuíram sua para ida: era primo
do Padre Cícero e sua mulher, Aurora Adélia, era parenta de José André
de Figueiredo, um dos líderes políticos da vila. Além do mais, cuidaria
das terras do sítio Muquém, naquele município, pertencentes a seu pai.
Pouco a pouco Paulo Maia foi-se inserindo na vida político-social de sua
nova terra.
Em 1910 Juazeiro já se consolidava como
um lugarejo em constante desenvolvimento graças à presença do Padre
Cícero Romão Batista e a repercussão dos milagres ocorridos em 1889. Com
uma população expressiva, sendo alvo de romarias freqüentes e de um
comercio se expandindo constantemente, a vila clamava pela sua
emancipação política. Objetivando chamar a atenção das autoridades,
Padre Cícero, Floro Bartolomeu, Padre Alencar Peixoto, Joaquim André e
tantos outros, pregaram a desobediência civil ao povo ao propor que
“(...) não se pagaria mais impostos ao Crato” (05) Tal movimento
culminou com uma passeata realizada no dia 07 de setembro de 1910, pelas
ruas de Juazeiro, em prol da independência da vila. À frente de todos,
Paulo Maia conduzia uma bandeira verde-amarela com os dizeres “Viva a
Independência!” (06).
Eis que em 1913 irrompe a chamada
“Sedição de Juazeiro” com o objetivo de depor o governador do estado,
Major Franco Rabelo. Para concretizar esse intento, Dr.Floro armou um
expressivo contingente de bandidos e cangaceiros, recrutando os mais
afamados pistoleiros de Pajeú das Flores, Paraíba, entre eles, Zé
Pinheiro, Senhorzinho, Antonio Godê, Mané Chiquinha, Côco Seco e
Quintino Feitosa. Para as funções de subdelegado foi nomeado o Major
Nazário Landim (07), “indivíduo de péssima conduta” (08).
Nos idos de 1913/14 imperou no nosso
Estado completa selvageria. No Cariri, principalmente, um número
incalculável de crimes foram praticados, com a conivência das
autoridades, sem nunca ter sido tomadas as providências legais cabíveis.
Após o término do movimento sedicioso de Juazeiro em março de 1914, a
cidade ficou totalmente lotada de facínoras remanescentes da guerra.
Bandidos de alta periculosidade, sem trabalho, perambulavam pelas ruas
bebendo, fazendo confusões, provocando brigas e matando pessoas.
Como a ociosidade é a mãe de todos os
vícios, Mané Chiquinha lembrou a Nazário Landim que seu desafeto, Paulo
Maia, andava impune na cidade. Não obstante as ponderações iniciais, o
subdelegado contrata o pistoleiro por 100 contos de réis e uma mula.
(09) Xavier de Oliveira insinua, nas entrelinhas, que um crime
envolvendo uma pessoa de prestígio como Paulo Maia tinha que haver o
consentimento do chefe, no caso, presumo eu, Dr.Floro Bartolomeu. (09).
Há alguma razão para se aceitar a tese, posto que tanto o Coronel
Aristides, pai de Paulo, quanto o cunhado Joaquim Inácio Figueiredo
faziam oposição ao Médico e ao Padre Cícero. (10)
Paulo Maia residia numa casa, hoje
demolida, localizada à Rua do Brejo, em frente à Matriz de Juazeiro. Na
noite de 09 de junho de 1914, enquanto conversava com o vizinho Doroteu
Sobreira, foi avisado por este que parecia haver alguém escondido no
matagal à frente da casa. Paulo Maia não levou à sério a observação do
amigo e continuou conversando alegremente. Mané Chiquinha, aproveitando a
escuridão da noite, escondido entre o pasto de bamburral, mirou a
carabina modelo 1908, dormiu na pontaria e disparou um certeiro tiro que
varou o peito da vítima indefesa.
4- VINGANÇA
Após o assassinato de Paulo Maia, Mané
Chiquinha enfronhou-se pela Serra do Araripe e vivia em lugar incerto e
não sabido. Porém, em decorrência da determinação do Governador do
Estado, Benjamim Barroso, em eliminar de vez o banditismo no Ceará,
convocou ao palácio o Coronel Medeiros e deu-lhe uma ordem seca: ”Você
vai ao Cariri e outras cidades do sertão. Não poupe bandidos. Execute-os
sumariamente.” (11). A mesma incumbência foi dada pelo Governador ao
Tenente Peregrino Montenegro quando o nomeou delegado de Campos Sales:
“Soube que é homem disposto. Liquide todo criminoso nato.” (12).
Seguindo as determinações recebidas, perseguindo a bandidos na Serra do
Araripe, o Tenente Peregrino executa sumariamente os cangaceiros Bimbão,
Caxeado, Pedro Paulo e Mané Chiquinha. (13).
Quanto ao autor intelectual, Nazário
Landim, este achou mais prudente se afastar da região e por muito tempo
não se soube de seu paradeiro. Há certa probabilidade que tenha se
refugiado na cidade de São João do Rio do Peixe, hoje Antenor Navarro,
na Paraíba, local onde seu primo e conselheiro Quinco Vasques fugindo de
uma briga em Lavras da Mangabeira, viveu sob a proteção do Padre
Joaquim Cirilo Sá. (14)
Após 72 anos dos fatos ocorridos na
Matriz de Nossa Senhora da Penha e 14 da morte de Paulo Maia, Nazário
Landim apareceu às caladas da noite, no Crato, com o intuito de pegar o
trem em rumo a Missão Velha onde viviam seus parentes. Enquanto
aguardava o passar das horas para o embarque, entrou em um quiosque, ao
lado da estação ferroviária, onde os passageiros tomavam
café,fumavam,conversavam, à espera da partida do trem. Nesse ínterim,
foi reconhecido por um padeiro que incontinentemente correu até a casa
de Pedro Maia, irmão de Paulo, bateu à porta e falou:
- “Seu Pedro, quanto o senhor paga pelas alvíssaras?”.
- “O que você quiser. O que foi?” Retorquiu Pedro (015).
-“ Nazário Landim está aqui no Crato. Na estação de trem.” Respondeu o padeiro.
Era início da madrugada do dia 28 de
julho de 1928. Pedro Maia, também conhecido por Pedro Aires dirigiu-se à
cidade de Juazeiro do Norte e foi ao encontro dos dois filhos homens de
Paulo Maia, Zezé e Odilon, e lhes falou:
“- O homem que matou seu pai está no Crato. Se querem vingar a morte dele a hora é essa.”
Em companhia dos jovens, Pedro se
dirigiu à estação ferroviária do Crato. Entregando um revólver à Zezé, o
mais velho, apontou o Nazário e disse:
-“É aquele o homem. Vá lá e mate-o!”.
Consta que Zezé titubeou. É verdade que teve medo de executar a tarefa. Vendo a indecisão do sobrinho, Pedro Maia falou ríspido:
- “Vejam como é que se mata um homem!”.
Secamente se dirigiu ao encontro de Nazário e para certificar-se que era ele mesmo, embora o conhecesse, indagou:
- “Com quem tenho o prazer de falar?”.
Pressentido o desfecho macabro daquele encontro, pálido e afásico respondeu:
-“Com Nazário, seu criado.”.
“- Eu sou irmão de Paulo Maia. Levante-se para morrer. Você nunca mais mata um irmão de um homem!”
Surpreso, Nazário não se levantou. Nisso,
Pedro Maia desfechou alguns tiros quase à queima roupa. Nazário caiu
emborcado na mesa do bar e exalou seu último suspiro.
Encerrava-se assim drasticamente uma
desavença costurada por tanto tempo. Durante 72 anos, vidas foram
ceifadas em nome de um tempo e costumes que queira Deus não se repitam
nunca mais.
NOTAS
01 - Os dados sobre a descendência,
nascimento e morte de Paulo Maia encontra-se no artigo de Bruno de
Menezes “Uma Parcela da Família Menezes do Cariri”, revista
Itaytera nº. 5, página 177 - Crato-Ce. 1959.
02 – Irineu Pinheiro, Efemérides do Cariri pág.142. Imprensa Oficial do Ceará. Fortaleza 1963.
“1856, 8 de setembro – Eleições na matriz
do Crato para juiz de paz e membros da câmara municipal. Morreu o
eleitor José Gonçalves Landim, pelo Partido Liberal, baleado na
igreja pela força pública comandada pelo delegado local que era
conservador (...)”.
Joaryvar Macedo in O Império do
Bacamarte, pág.25. Edição UFC. Fortaleza 1992 afirma:
“Acontecimento sangrento, de bastante repercussão, se deu em 1856, aos
8 de setembro. Por ocasião de eleições de membros da câmara
municipal e juízes de paz, no recinto da Matriz de Nossa Senhora da
Penha, no Crato, a força pública promoveu violentíssimo ataque aos
eleitores, visando o Partido Liberal. Da agressão, comandada
pelo próprio delegado substituto em exercício, José Ferreira de
Menezes, resultaram na morte do tenente-coronel José Gonçalves Landim
e ferimentos em várias pessoas (...)”.
03 – Guilherme Chambly Studart (Barão de
Stuart) & Newton Jacques Studart – Dicionário Biobibliográfico
Cearense 2ª edição, pág.305/306. Tipografia Progresso 1980.
Aborda sobre a vida do deputado Aristides Ferreira de
Menezes.
04 – Guilherme Chambly Studart. O.Cpág. 306.
05- Amália Xavier de Oliveira – O Padre Cícero que eu conheci. Pág.133 Rio de janeiro 1969
“(...) o padre Cícero incentivou o povo de não mais pagar imposto ao Município de Crato, desta vez, sem complacência.”
06 – Idem, ibidem.
“Paulo Maia, ardoroso revolucionário,
conduzia à frente a bandeira verde-amarela, com os dizeres ‘VIVA A
NOSSA INDEPENDÊNCIA’”.
07 – Joaryvar Macedo. Temas Históricos Regionais. Nota na pág.47. Secretaria de Cultura e Desporto. Fortaleza 1986.
08 - Joaryvar Macedo. Império do Bacamarte pág.72. Edição UFC. Fortaleza-Ce 1992:
“Indivíduo de péssima conduta, o major
Nazário Landim fruíra, entretanto, da confiança do coronel
Antonio Luís, que o investiu nas funções de subdelegado de polícia
do importante município de Juazeiro.”
09- Antonio
Xavier de Oliveira, Beatos e Cangaceiros pág.17 Rio de Janeiro. O autor
deixa aberta a possibilidade do assassinato de Paulo Maia ter sido do
conhecimento de Dr.Floro ou do coronel Antonio Alves Pequeno, este
último, inimigo político de Aristides Ferreira de Menezes,
pai de Paulo. De pronto, o autor elimina a hipótese do envolvimento do
padre Cícero:
“(...) Em geral, no Sertão, os
cangaceiros só cometem um crime, quando teem as costas quentes,isto
é quando teem patrão forte e de cima na política. (...) (um coronel,
ou um doutor, nunca um padre)” (sic).
10 – Ralph Della Cava. Milagre em
Joaseiro pág. 151. Paz e Terra. Rio de Janeiro 1977, apud
inéditos de Aires de Menezes.
“(...) não se tornando inimigos do padre
Cícero”... ficaram afastados... Aristides Ferreira de
Menezes, o velho João da Rocha, Pedro Jacintho da Rocha, Cel.Coimbra,
Joaquim Inácio de Figueiredo. (...) (sic)
11 – Abelardo Montenegro. Fanáticos e
Cangaceiros pág.pág.268. Ed.Henrique ta Galeno. Fortaleza
1973. Apud entrevista do Sr. Antonio Botelho Filho, presente
que estava na hora da recomendação do governador.
12 – Abelardo Montenegro, o.c.pág.269. Informações prestadas ao autor pelo próprio Peregrino Montenegro.
13 – Abelardo Montenegro. O.c.ibidem.
14 – Joaryvar Macedo, Império do Bacamarte pág.119, esclarece onde o coronel Quinco Vasques se refugia da polícia:
(...) Quinco Vasques (...) se refugia sob
a proteção Joaquim Cirilo de Sá, o célebre padre Sá do antigo São
João do Rio do Peixe, hoje Antenor Navarro, Paraíba (...)”.
Por essa razão somos levados a
crer que Nazário Landim após o assassinato de Paulo Maia tenha se
refugiado em Antenor Navarro.
15 - Os detalhes da vingança
perpetrada por Pedro Aires nos foi transmitida por
Odilon Figueiredo,filho de Paulo Maia, presente na hora do assassinato.
É fidedigno e tem exatidão o diálogo, posto que do conhecimento de
todos e por uma testemunha do caso, o português Ângelo de Almeida
que narrou os acontecimentos a meu pai Antonio Adil da Nóbrega.
BIBLIOGRAFIA.
Della Cava, Ralph. Milagre em joaseiro. Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1976.
Macedo, Joaryvar. Temas históricos regionais. Fortaleza, Secretaria de Cultura e Desportos, 1986.
Macedo, Joaryvar. Império do bacamarte. Fortaleza, Universidade Federal do Ceará, 1990.
Montenegro, Abelardo. Fanáticos e cangaceiros. Fortaleza. Editora Henriqueta Galeno, 1973.
Revista Ytaytera, Crato. Instituto Cultural do Cariri, 1959.
Oliveira, Antonio X. Beatos e cangaceiros. Rio de Janeiro
Oliveira, Amália X. O padre Cícero que eu conheci. Rio de Janeiro, 1969.
Studart, Guilherme C. & Studart, Newton J. Fortaleza, Tipografia Progresso, 1980.
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