por José do Vale Pinheiro Feitosa




Viva junto à alma mais próxima e compreenda que a proximidade é a medida da distância. Que a distância que os separa é este movimento maravilhoso da matéria e da energia. A maravilha é apenas esta surpresa porque esta proximidade é tão diminuta entre os dois e é a inesperada distância.

José do Vale P Feitosa



quarta-feira, 12 de março de 2014

Geléia Geral




J. Flávio Vieira


Cecília Melo e Castro
“Metamorfose”


                        Cecília Melo e Castro é uma artista plástica portuguesa, de vanguarda,   que trabalha com Infopintura, Ciberarte, Arte Fractal e Videoarte. Além de poetisa com três  livros publicados. Procedente de Estoril – agregada anteriormente ao Concelho de Cascais – Cecília  possui ainda uma profícua carreira universitária, tendo se aposentado após trinta anos de docência. Como pintora, ela soma, no currículo,  inúmeras premiações  internacionais, como o ArtMajeur Silver Award e o Prêmio UNESCO para Artes Eletrônicas. Pois bem, separados por todo um oceano , eis que , em pleno Carnaval, recebo um contato da ilustre artista portuguesa, através das redes sociais. Ela, delicada,  mas incisivamente, reclamava, com todas as razões desse mundo, da utilização que fiz de um dos seus belíssimos quadros (“Metamorfose”) , em um dos frontispícios de  meus artigos, sem sua expressa autorização e, mais: sem sequer ter lhe dado os devidos créditos pela obra exposta.  O artigo tinha sido publicado em diversos blogs da região, mas ela  captou  a apropriação indébita no Blog do Crato e me solicitou que fosse procedida à necessária identificação do autor e da obra.

                    Cecília trouxe à baila um assunto do dia  em tempos de Aldeia Global. A possibilidade de disseminação ampla da comunicação, proporcionada pelo Internet e afins, traz, consigo,  incontáveis efeitos colaterais.  Jogados (  textos, imagens, pinturas, vídeos, fotos)  num mesmo canyon , passa a ser propriedade, aparentemente,  de todos, perdendo-se o direito autoral, a identificação do autor e da obra. Tudo passa a fazer parte de uma imenso pântano , cada qual se sentindo no direito de pescar o que melhor lhe aprouver, achando-se, a partir daquele momento, proprietário da pesca e, muitas vezes, seu autor. Não bastasse isto, estabeleceu-se até o contra plágio, uma espécie de cyberbulling , quando frases , citações e poemas de gosto duvidosíssimo são pespegados na autoria de artistas famosos, alguns, já falecidos, sem lhes ser dado , pois, o direito da legítima defesa. Agora mesmo, abre-se enorme polêmica, a nível mundial, com a digitalização em massa de obras literárias, tantas e tantas vezes ferindo o direito autoral. A Internet trouxe , como irmã siamesa, a aparente impessoalidade, quebrando-se todas as regras históricas da autoria e da privacidade.  Para que criar,  se basta copiar e colar ? A nossa pintora, que transita , diretamente, com a Video e a Cibearte, mais que  ninguém, deve sofrer , na pele,  as freqüentes e contínuas conseqüências  dessa tendência  ao amorfismo  e à geléia geral . Fácil depreender daí, de onde brotam sua ansiedade e  inquietação.

                    Cecília Melo e Castro está coberta de razão quando clama pelos créditos às suas obras.  No fundo, se percebe, claramente, que esta tendência moderna à uniformização , à quebra da individualidade das pessoas e das coisas,  é um caminho perigoso e movediço. Quando tudo estiver perfeitamente uniformizado, quando já não houver aparente distinção entre uma e outra pessoa, todos seremos perfeitamente descartáveis e substituíveis. São Francisco será igual a Hitler, Fernando Pessoa equivalente a qualquer poeta de ponta de rua. O que faz bonita e resplandecente  a aquarela da vida são suas infinitas  cores e nuances  e não a tela branca, lívida e estática.

 

Crato, 10/03/14