por José do Vale Pinheiro Feitosa




Viva junto à alma mais próxima e compreenda que a proximidade é a medida da distância. Que a distância que os separa é este movimento maravilhoso da matéria e da energia. A maravilha é apenas esta surpresa porque esta proximidade é tão diminuta entre os dois e é a inesperada distância.

José do Vale P Feitosa



quinta-feira, 21 de fevereiro de 2013

Colaboração de Altina Siebra

Ivone Gebara
Escritora, filósofa e teóloga

Depois da louvável atitude do ancião Bento XVI renunciando ao governo da Igreja Católica Romana sucederam-se entrevistas com alguns bispos e sacerdotes nas rádios e televisões de todo o país. Sem dúvida, um acontecimento de tal importância para a Igreja Católica Romana é notícia e leva a previsões, elucubrações de variados tipos, sobretudo de suspeitas, intrigas e conflitos dentro dos muros do Vaticano que teriam apressado a decisão do papa.
No contexto das primeiras notícias, o que chamou a minha atenção foi algo à primeira vista pequeno e insignificante para os analistas que tratam dos assuntos do Vaticano. Trata-se da forma como alguns padres entrevistados ou padres liderando uma programação televisiva, quando perguntados sobre quem seria o novo papa saíssem pela tangente. Apelavam para a inspiração ou vontade do Espírito Santo como aquele do qual dependia a escolha do novo pontífice romano. Nada de pensar em pessoas concretas para responder a situações mundiais desafiantes, nada de suscitar uma reflexão na comunidade, nada de falar dos problemas atuais da Igreja que a tem levado a um significativo marasmo, nada de ouvir os clamores da comunidade católica por uma democratização significativa das estruturas anacrônicas de sustentação da Igreja institucional. A formação teológica desses padres comunicadores não lhes permite sair de um discurso padrão trivial e abstrato bem conhecido, um discurso que continua fazendo apelo a forças ocultas e de certa forma confirmando seu próprio poder. A contínua referência ao Espírito Santo a partir de um misterioso modelo hierárquico é uma forma de camuflar os reais problemas da Igreja e uma forma de retórica religiosa para não desvendar os conflitos internos que a instituição tem vivido. A teologia do Espírito Santo continua para eles mágica e expressando explicações que já não conseguem mais falar aos corações e às consciências de muitas pessoas que têm apreço pelo legado do Movimento de Jesus de Nazaré. É uma teologia que continua igualmente a provocar a passividade do povo crente frente às muitas dominações inclusive as religiosas. Continuam repetindo fórmulas como se estas satisfizessem a maioria das pessoas.
Entristece-me o fato de verificar mais uma vez que os religiosos e alguns leigos atuando nos meios de comunicação não percebam que estamos num mundo em que os discursos precisam ser mais assertivos e marcados por referências filosóficas para além da tradicional escolástica. Um referencial humanista os tornaria bem mais compreensivos para o comum das pessoas incluindo-se aqui os não católicos e os não religiosos. A responsabilidade da mídia religiosa é enorme e inclui a importância de mostrar o quanto a história da Igreja depende das relações e interferências de todas as histórias dos países e das pessoas individuais. Já é tempo de sairmos dessa linguagem metafísica abstrata como se um Deus iria se ocupar especialmente de eleger o novo papa prescindindo dos conflitos, desafios, iniqüidades e qualidades humanas. Já é tempo de enfrentarmos um cristianismo que admita o conflito das vontades humanas e que no final de um processo eletivo, nem sempre a escolha feita pode ser considerada a melhor para o conjunto. Enfrentar a história da Igreja como uma história construída por todos e todas nós é testemunhar respeito por nós mesmas/os e mostrar a responsabilidade que todas e todos que nos consideramos membros da comunidade católica romana temos. A eleição de um novo papa é algo que tem a ver com o conjunto das comunidades católicas espalhadas pelo mundo e não apenas com uma elite idosa minoritária e masculina. Por isso, é preciso ir mais além de um discurso justificativo do poder papal e enfrentar-se aos problemas e desafios reais que estamos vivendo. Sem dúvida, para isso as dificuldades são muitas e enfrentá-las exige novas convicções e o desejo real de promover mudanças que favoreçam a convivência humana.
Preocupa-me mais uma vez que não se discuta de forma mais aberta o fato de o governo da Igreja institucional ser entregue a pessoas idosas que apesar de suas qualidades e sabedoria já não conseguem mais enfrentar com vigor e desenvoltura os desafios que estas funções representam. Até quando a gerontocracia masculina papal será o doublé da imagem de um Deus branco, idoso e de barbas brancas? Haveria alguma possibilidade de sair desse esquema ou de ao menos começar uma discussão em vista de uma organização futura diferente? Haveria alguma possibilidade de abrir essas discussões nas comunidades cristãs populares que têm o direito à informação e à formação cristã mais ajustada aos nossos tempos?
Sabemos o quanto a força das religiões depende de desafios e comportamentos frutos de convicções capazes de sustentar a vida de muitos grupos. Entretanto, as convicções religiosas não podem se reduzir a uma visão estática das tradições e nem a uma visão deliberadamente ingênua das relações humanas. As convicções religiosas igualmente não podem ser reduzidas a onda de devoções as mais variadas que se propagam através dos meios de comunicação. E mais, não podemos continuar tratando o povo como ignorante e incapaz de perguntas inteligentes e astutas em relação à Igreja. Entretanto, os padres comunicadores acreditam tratar com pessoas passivas e entre elas estão muitos jovens que desenvolvem um culto romântico em torno da figura do papa. Os religiosos mantêm essa situação muitas vezes cômoda por ignorância ou por avidez de poder. Provar a interferência divina nas escolhas que a Igreja Católica hierárquica, prescindindo da vontade das comunidades cristãs espalhadas pelo mundo é um exemplo flagrante dessa situação. É como se quisessem reafirmar erroneamente que a Igreja é em primeiro lugar o clero e as autoridades cardinalícias às quais é dado o poder de eleger o novo papa e que esta é a vontade de Deus. Aos milhares de fiéis cabe apenas rezar para que o Espírito Santo escolha o melhor e esperar até que a fumaça branca anuncie uma vez mais o "habemus papam”. De maneira hábil sempre estão tentando fazer os fiéis escapar da história real, de sua responsabilidade coletiva e apelar para forças superiores que dirijam a história e a Igreja.
É pena que esses formadores de opinião pública estejam ainda vivendo num mundo teologicamente e talvez até historicamente pré-moderno em que o sagrado parece se separar do mundo real e pousar numa esfera superior de poderes à qual apenas alguns poucos têm acesso quase direto. É desolador ver como a consciência crítica em relação às suas próprias crenças infantis não tenha sido acordada em beneficio próprio e em benefício da comunidade cristã. Parece até que acentuamos os muitos obscurantismos religiosos presentes em todas as épocas enquanto o Evangelho de Jesus continuamente convoca para a responsabilidade comum de uns em relação aos outros.
Sabendo das muitas dificuldades enfrentadas pelo papa Bento XVI durante seu curto ministério papal, as empresas de comunicação católica apenas ressaltam suas qualidades, sua doação à Igreja, sua inteligência teológica, seu pensamento vigoroso como se quisessem mais uma vez esconder os limites de sua personalidade e de sua postura política não apenas como pontífice, mas também por muitos anos, como presidente da Congregação da Doutrina da Fé, o antigo Santo Ofício. Não permitem que as contradições humanas do homem Joseph Ratzinger apareçam e que sua intransigência legalista e o tratamento punitivo que caracterizaram, em parte, sua pessoa sejam lembrados. Falam desde sua eleição, sobretudo de um papado de transição. Sem dúvida de transição, mas de transição para que?
Gostaria que a atitude louvável de renúncia de Bento XVI pudesse ser vivida como um momento privilegiado para convidar as comunidades católicas a repensar suas estruturas de governo e os privilégios medievais que esta estrutura ainda oferece. Estes privilégios tanto do ponto de vista econômico quanto político e sócio cultural mantêm o papado e o Vaticano como um Estado masculino à parte. Mas um Estado masculino com representação diplomática influente e servido por milhares de mulheres através do mundo nas diferentes instâncias de sua organização. Esse fato nos convida igualmente a pensar sobre o tipo de relações sociais de gênero que esse Estado continua mantendo na história social e política da atualidade.
As estruturas pré-modernas que ainda mantém esse poder religioso precisam ser confrontadas com os anseios democráticos de nossos povos na busca de novas formas de organização que se coadunem melhor com os tempos e grupos plurais de hoje. Precisam ser confrontadas com as lutas das mulheres, das minorias e maiorias raciais, de pessoas de diferentes orientações sexuais e escolhas, de pensadores, de cientistas e de trabalhadores das mais distintas profissões. Precisam ser retrabalhadas na linha de um diálogo maior e mais profícuo com outros credos religiosos e sabedorias espalhadas pelo mundo.
E para terminar, quero voltar ao Espírito Santo, a esse vento que sopra em cada uma/um de nós, a esse sopro em nós e maior do que nós que nos aproxima e nos faz interdependentes de todos os viventes. Um sopro de muitas formas, cores, sabores e intensidades. Sopro de compaixão e ternura, sopro de igualdade e diferença. Este sopro não pode mais ser usado para justificar e manter estruturas privilegiadas de poder e tradições mais antigas ou medievais como se fossem uma lei ou uma norma indiscutível e imutável. O vento, o ar, o espírito sopra onde quer e ninguém deve se atrever a querer ser ainda uma vez seu proprietário. O espírito é a força que nos aproxima uns dos outros, é a atração que permite que nos reconheçamos como semelhantes e diferentes, como amigas e amigos e que juntos/as busquemos caminhos de convivência, de paz e justiça. Esses caminhos do espírito são os que nos permitem reagir às forças opressoras que nascem de nossa própria humanidade, os que nos levam a denunciar as forças que impedem a circulação da seiva da vida, os que nos levam a des-cobrir os segredos ocultos dos poderosos. Por isso, o espírito se mostra em ações de misericórdia, em pão partilhado, em poder partilhado, em cura das feridas, em reforma agrária, em comércio justo, em armas transformadas em arados, enfim, em vida em abundância para todas/os. Esse parece ser o poder do espírito em nós, poder que necessita ser acordado a cada novo momento de nossa história e ser acordado por nós, entre nós e para nós.

Fevereiro 2013.

Reinos de pó



Ricardo III ,da Inglaterra, reinou por um período curtíssimo : entre 1483 e 1485. Sua enviesada ascensão à coroa , historicamente, parece eivada de crimes e assassinatos, o que sempre foi comum nas monarquias absolutistas. Para chegar ao trono, na sucessão de Henrique IV que morrera subitamente, Ricardo precisou dizimar inimigos  e, também, candidatos naturais ao cargo, além de utilizar de manobras jurídicas e armações como a anulação do casamento do seu antecessor por suposta bigamia.  Coroado , Ricardo levou Ricardo V e o Duque de York , seus sobrinhos, à Torre de Londres de onde nunca mais voltaram. Mexendo no instável castelo de cartas dos interesses da aristocracia inglesa, rapidamente, se iniciou uma enorme campanha contra o rei, sob suspeita de usurpação do trono  e que culminou com a Guerra das Rosas , encabeçada pelo Duque de Buckingham e Henrique Tudor , o Conde de Richmond. Em agosto de 1485, as tropas leais ao rei e as revolucionárias do Conde se confrontam na Batalha de Bosworth Field e Ricardo III termina abatido no confronto; dando-se início à Dinastia de Tudor. Apesar do reinado meteórico, ele se tornou , por sua dúbia personalidade, um dos monarcas mais populares do Reino Unido, tendo sido, inclusive, tema de uma das mais importantes peças de Shakespeare. Além de tudo, aumentando a aura de mistério, seu corpo jamais tinha sido encontrado. Ficou célebre o epílogo shakespeareano em que Ricardo III , a pé, sendo perseguido pela sanha do exército adversário, cita, no desespero,  a famosa frase : “Meu Reino por um Cavalo !”
                   No último dia quatro de fevereiro, quinhentos e vinte e oito anos depois da fatídica batalha, escavações num estacionamento em Leicester, no centro da Inglaterra, encontraram um esqueleto que, depois, se confirmou pertencer a Ricardo III. Tinha 32 anos na época da morte, uma profunda escoliose , sinais de trauma craniano por objeto cortante  e uma ponta de flecha entre as vértebras. Exames científicos como Datação pelo Carbono 14 e DNA confirmaram o fim do mistério que já varava meio milênio.
                   Ricardo III estava inumado num simples estacionamento e seu esqueleto não carregava quaisquer diferenças que por acaso o distinguissem de qualquer um dos   mais humildes plebeus do seu reino.  A confirmação da sua identidade , pelo exame de DNA, foi através da comparação com um dos seus últimos descendentes : Michel Ibsen, um marceneiro canadense, radicado em Londres e que não carrega consigo nenhum traço de  nobreza esperado  para um remanescente da Casa de York. O pretenso sangue azul que por acaso teria corrido nas suas veias, também, não tingiu a ossada encontrada, nem a tornou mais colorida e menos opaca do que os remanescentes de qualquer mendigo da Inglaterra. Na morte não há castas: é de pó que são construídas todas as coisas. Vaidade, riqueza, poder , ambição, egoísmo acabam todos no fim da batalha, quando o golpe de misericórdia já está armado e nós trocaríamos todas elas por um  cavalo que nos levasse para bem longe do equitativo  reino do nada, da escuridão e do pó.

J. Flávio Vieira


Texto de Susan Andrews.

Você se lembra daquela linda história do livro “O Pequeno Príncipe”? Bom, existe uma história mais tocante ainda que aconteceu de fato com o criador do Pequeno Príncipe, o escritor francês Antoine de Saint-Exupéry. Poucas pessoas sabem que ele lutou na Guerra Civil Espanhola e, certa vez, foi capturado pelo inimigo e levado ao cárcere para ser executado no dia seguinte.

Nervoso, ele procurou em sua bolsa um cigarro, e achou um, mas suas mãos estavam tremendo tanto que ele não podia nem mesmo levá-lo à boca. Procurou fósforos, mas não tinha porque os soldados haviam tirado todos os fósforos de sua bolsa. Ele olhou, então, para o carcereiro e disse: “Por favor, usted tiene fósforo?”. O carcereiro olhou para ele e chegou perto para acender seu cigarro. Naquela fração de segundo, seus olhos se encontraram e Saint-Exupéry sorriu.

Depois ele disse que não sabia por que sorriu, mas pode ser que quando se chega perto de outro ser humano seja difícil não sorrir. Naquele instante, uma chama pulou no espaço entre o coração dos dois homens e gerou um sorriso no rosto do carcereiro também. Ele acendeu o cigarro de Saint-Exupéry e ficou perto, olhando diretamente em seus olhos, e continuou sorrindo. Saint-Exupéry também continuou sorrindo para ele, vendo-o agora como pessoa, e não como carcereiro.

Parece que o carcereiro também começou a olhar Saint-Exupéry como pessoa, porque lhe perguntou: “Você tem filhos?”. “Sim”, Saint-Exupéry respondeu, e tirou da bolsa fotos de seus filhos. O carcereiro mostrou fotos de seus filhos também e contou todos os seus planos e esperanças para o futuro deles. Os olhos de Saint-Exupéry se encheram de lágrimas quando disse que não tinha mais planos, porque ele jamais os veria de novo. Os olhos do carcereiro se encheram de lágrimas também. E, de repente, sem nenhuma palavra, ele abriu a cela e guiou Saint-Exupéry para fora do cárcere, através das sinuosas ruas, para fora da cidade, e o libertou. Sem nenhuma palavra, o carcereiro deu meia volta e retornou por onde veio.

Mais tarde, Saint-Exupéry disse: “Minha vida foi salva por um sorriso do coração”.

O que foi aquela “chama” que pulou entre o coração desses dois homens? Isso tem sido tema de intensa pesquisa atualmente, na medida em que os cientistas estão se dando conta de que o coração não é meramente uma bomba mecânica, mas um sofisticado sistema para receber e processar informações. De fato, o coração envia mais mensagens ao cérebro que o cérebro envia ao coração! Como disse o filósofo francês Blaise Pascal: “O coração tem razões que a própria razão desconhece”.

Estados emocionais negativos, como raiva ou frustração, geram ondas eletromagnéticas totalmente caóticas do coração, como se estivéssemos pisando no acelerador e no breque simultaneamente. Esse estado de batimentos desordenados é chamado de “incoerência cardíaca” e está ligado à doenças cardíacas, envelhecimento precoce, câncer e morte prematura.

Em estados de amor ou gratidão, nosso batimento cardíaco torna-se “coerente”. Isso diminui a secreção dos hormônios do estresse, reduz a depressão, hipertensão e insônia, melhora o sistema imune e aumenta a clareza mental. Essa é uma das razões pelas quais tem sido provado que as emoções positivas estão associadas à boa saúde física e mental – e à longevidade. Essa irradiação coerente do coração – essa “chama” de genuína afeição – pode afetar pessoas a uma distância de até 5 metros!

Logo, na próxima vez em que você estiver numa situação difícil, respire profundamente, lembre-se de Saint-Exupéry e do Pequeno Príncipe, e irradie a energia de seu coração. Como o Pequeno Príncipe nos lembrou, “somente com o coração podemos ver com clareza”!

By Susan Andrews.

 
MULHERES

    Janice Japiassu

 
Com um pano de seda encarnada

Costuramos as vestes do amor

Contra a negra descrença do amado

Acendemos uma vela sem cor

 
Replantamos no chão esse verde

Que a cultura do homem arrancou

Cultivamos sementes sozinhas

Com a certeza do céu e da flor

 
Não tememos a luz nem as trevas

Rastreamos a luz no escuro

Recolhemos a lágrima eterna

Não fechamos o céu com um muro

 
Não chamamos a dor de tolice

Nem o choro do amor de histeria

Não rimamos feliz com medíocre

Não fazemos do sexo, orgia

 
Do abandono fazemos os filhos

Retirando do corpo, alegria

Não compramos poemas vazios

Nem fazemos, do medo, teorias.



Onde, atados, os sonhos se partem

Fenecendo de pura asfixia

Impedidos da brisa da tarde

 
Habitamos o mar, o mistério

O profundo segredo da Terra

Conversamos com Deus, com o eterno

E jamais inventamos as guerras

 
Também nunca inventamos pecados

Nem serpentes, nem culpas, nem dor

Nem igrejas, governos, cadeias

Nós nascemos pras artes do amor

 
Somos antes, durante, depois

Dos infernos, dos céus, dos partidos

Nos encanta o corpo do mundo

Com sua alma de sangue e de viço
 

E rezamos pra Nossa Senhora

Jesus Cristo e pra Madalena

À Aristóteles, Comte ou Descartes

Preferimos a nossa Novena

 
É por isso que, em nós, o céu dança

E as estrelas também, se é preciso

Entendermos de tudo que é vida

De esfinges e de Paraísos.

 

Macabéa: essa moça não se conhece senão através de ir vivendo à toa.

Ela sabia o que era o desejo – embora não soubesse que sabia. Era assim: ficava faminta mas não de comida, era um gosto meio doloroso que subia do baixo-ventre e arrepiava o bico dos seios e os braços vazios sem abraço. Tornava-se toda dramática e viver doía. Clarice Lispector

Mais Clarice Lispector:  20/12/69  JB

Às vezes tenho a impressão de que escrevo por simples curiosidade intensa. É que, ao escrever, eu me dou as mais inesperadas surpresas. É na hora de escrever que muitas vezes fico consciente de coisas, das quais, sendo inconsciente, eu antes não sabia que sabia.

Exercícios regulares para deixar o cérebro em forma

Neuropsiquiatra de Harvard mostra como atividades físicas nos tornam mais inteligentes. Exercícios frequentes são mais potentes que remédios

Os exercícios nos deixam mais inteligentes. Quem afirma é o neuropsiquiatra John Ratey, professor da Harvard Medical School e autor do livro “Corpo ativo, mente desperta” (Editora Objetiva). Em entrevista ao GLOBO, ele diz que os exercícios são mais importantes que qualquer remédio para as funções cerebrais:

— Fabricamos novas células cerebrais todos os dias e os exercícios ajudam mais que qualquer outra atividade.

O GLOBO: O que atraiu seu interesse para esta área?

JOHN RATEY: Inicialmente os exercícios eram vistos como menos potentes que as drogas antidepressivas, mas hoje sabemos que são tão bons quanto e, em alguns casos, até melhores que os remédios. Sempre fui um atleta e percebi em mim a importância dos exercícios para manter meu cérebro, humor e motivação nos melhores níveis.

Como os exercícios melhoram as funções cerebrais?

RATEY: Os exercícios regulam ansiedade e níveis de estresse, além de otimizar o aprendizado de três maneiras: melhoram os sistemas de atenção, a memória, a capacidade de aprendizado e a habilidade de perseverar e superar as frustrações que o processo de aprendizado eventualmente produz; criam o ambiente certo para nossas cem bilhões de células nervosas, fabricando mais neurotransmissores e receptores para registrar novas informações; e promovem o surgimento de novas células no cérebro, um processo chamado neurogênese.

Então a atividade física regular também nos deixa mais inteligentes?

RATEY: Sim. O exercício otimiza as chances de aprendizado ao nos deixar mais prontos para aprender, ao fazer com que o cérebro esteja preparado para se desenvolver e talvez até adicionando novas células nervosas às áreas envolvidas com a memória e o aprendizado. Mas é especialmente importante por aumentar a liberação do fator neurotrófico BNDF, um verdadeiro fertilizante para o cérebro por encorajar nossas células nervosas a crescerem, que é a maneira como aprendemos.

Os exercícios estão ganhando respeito como uma opção de tratamento?

RATEY: As pessoas estão gradualmente reconhecendo o fato de que a atividade física é uma terapia auxiliar útil para desordens mentais e médicas. Hoje o primeiro tratamento para a depressão ou a ansiedade são exercícios regulares. Há dez anos a Câmara dos Comuns do Reino Unido disse que os exercícios deveriam ser o tratamento primário para a depressão, então eles estão na mente das pessoas e começando a ter aceitação na comunidade médica.

Os exercícios também podem aliviar o estresse?

RATEY: Sim, tanto em termos de diminuir a resposta a situações de estresse quanto aumentando a resistência ao estresse. À medida em que a pessoa melhora o condicionamento, é preciso uma ameaça maior para disparar seu alarme de estresse, pois a atividade física muda a neuroquímica do cérebro, assim como trabalha no nível celular para proteger as próprias células do estresse.

Quais são os melhores exercícios?

RATEY: É muito bom juntar artes marciais com dança, como na brasileira capoeira. A questão é aumentar os batimentos cardíacos e mantê-los altos por um tempo, adicionando complexidade e coordenação que vão desafiar mais áreas do cérebro, estimulando a liberação de fatores neurotróficos e desenvolvimento. Outras atividades que ganharam popularidade, como a ioga, também ajudam a desafiar o corpo e a mente, provocando mudanças magníficas no cérebro.