por José do Vale Pinheiro Feitosa




Viva junto à alma mais próxima e compreenda que a proximidade é a medida da distância. Que a distância que os separa é este movimento maravilhoso da matéria e da energia. A maravilha é apenas esta surpresa porque esta proximidade é tão diminuta entre os dois e é a inesperada distância.

José do Vale P Feitosa



segunda-feira, 15 de agosto de 2011

UM SUBLIME MAGO CHAMADO MÁRIO LAGO

TRÊS COISAS

(Mario Lago)

“Três coisas pra mim no mundo
Valem bem mais do que o resto
Pra defender qualquer delas
Eu mostro o quanto que presto
É o gesto, é o grito, é o passo
É o grito, é o passo, é o gesto
O gesto é a voz do proibido
Escrita sem deixar traço
Chama, ordena, empurra, assusta
Vai longe com pouco espaço
É o passo, é o gesto, é o grito
É o gesto, é o grito, é o passo
O passo começa o vôo
Que vai do chão pro infinito
Pra mim que amo estrada aberta
Quem prende o passo é maldito
É o grito, é o passo, é o gesto
É o passo, é o gesto, é o grito
O grito explode o protesto
Se a boca já não dá espaço
Que guarde o que há pra ser dito
É o grito, é o passo, é o gesto
É o gesto, é o grito, é o passo
É o passo, é o gesto, é o grito”


Dia dos solteiros - Por Socorro Moreira



O que é uma balzaquiana? O que é ficar pra titia? O que é ficar no caritó? O que é ficar solteirona ? O que é ser sozinha? O que é assumir a solteirice?

"A expressão foi cunhada após a publicação de um livro do francês Honoré de Balzac. Em As Mulheres de 30 Anos, o escritor realiza uma análise do destino das jovens na primeira metade do século XIX, em particular dentro do casamento. E faz uma apologia às mulheres de mais idade, que, amadurecidas, podem viver o amor com maior plenitude. É o que acontece à heroína da narrativa, Júlia. Ela se casa com um oficial do exército, mas depois descobre que a relação está longe de ser o que imaginava. Vê-se, então, presa a um matrimônio infeliz. Quando se torna uma trintona, porém, a moça consegue encontrar o amor nos braços de Carlos Vandenesse. "

A minha geração, depois dos 15 anos, inconscientemente ficava um tanto aflito com a possível possibilidade de ficar balzaquiana, antes do casamento. Sonhávamos com príncipe encantado, casamento com véu e grinalda, e lua de mel, longe das vistas de todos os conhecidos. Quando os noivos retornavam, a curiosidade era grande. A gente queria saber em detalhes como tudo acontecera.
Só entendi o sentido real da lua de mel, depois de encará-la mais de uma vez. Viver em lua de mel é conseguir construir um sentimento amigo, no dia a dia. Minha mãe é quem diz: vida de casada tem encontro, no decorrer, com várias formas de amor. A cada fase de vida, um tipo de amor diferente é experimentado para compensar a exaustão de outro. O amor maior é o amor zelo. E o zelo pode acompanhar a relação desde o começo. Acho que, a gente precisa mesmo é ter vocação para o casamento. E olha que, muitas vezes passamos anos, nos enganando, e achando que casar é o principal ideal de vida.
Eu tenho vocação verdadeira para o celibato. Conclui depois que defini minha solteirice como irrevogável. Mas as trocas, problemas nos relacionamentos continuam a existir. A consorte mais exigente que exige, somos nós mesmas. Difícil ser inteira, sem uma diferença complementar.
O primeiro casamento condensa todas as possibilidades. Quem não quiser casar outras vezes, por tentativa e erro; quem não quiser encarar o preço da solidão, a opção facilitadora é permanecer na primeira união. Admiro os casamentos que não terminam, e que não vivem de aparências. Feliz é quem vive o amor calmamente!
Mas existe certa felicidade, na solteirice. Aliás, só achei a verdadeira serenidade do coração, quando em mim , esta situação foi definida. Não sou contra nem a favor... Só desejo que todo mundo se encontre, e viva feliz com a sua realidade solitária ou não.


Socorro Moreira

* Ficar pra titia : é ser mãe dos sobrinhos.
* Ficar no caritó é nunca arranjar um casamento.
* Ficar solteirona é escolher demais , e acabar sozinha.
* Ser sozinha é uma viuvez voluntária  ou não.
*Assumir a solteirice é ficar sozinha por opção !
Em qualquer dos casos é possível ser feliz sozinha , contrariando a canção do Tom..." o resto é mar !"

Palavrões - de Millôr Fernandes




Os palavrões não nasceram por acaso. São recursos extremamente válidos e criativos para prover nosso vocabulário de expressões que traduzem com a maior fidelidade nossos mais fortes e genuínos sentimentos. É o povo fazendo sua língua. Como o Latim Vulgar, será esse Português Vulgar que vingará plenamente um dia. "Pra caralho", por exemplo. Qual expressão traduz melhor a idéia de muita quantidade do que "Pra caralho"? "Pra caralho" tende ao infinito, é quase uma expressão matemática. A Via-Láctea tem estrelas pra caralho, o Sol é quente pra caralho, o universo é antigo pra caralho, eu gosto de cerveja pra caralho, entende?

No gênero do "Pra caralho", mas, no caso, expressando a mais absoluta negação, está o famoso "Nem fodendo!". O "Não, não e não!" e tampouco o nada eficaz e já sem nenhuma credibilidade "Não, absolutamente não!" o substituem. O "Nem fodendo" é irretorquível, e liquida o assunto. Te libera, com a consciência tranqüila, para outras atividades de maior interesse em sua vida. Aquele filho pentelho de 17 anos te atormenta pedindo o carro pra ir surfar no litoral? Não perca tempo nem paciência. Solte logo um definitivo "Marquinhos, presta atenção, filho querido, NEM FODENDO!". O impertinente se manca na hora e vai pro Shopping se encontrar com a turma numa boa e você fecha os olhos e volta a curtir o CD do Lupicínio.

Por sua vez, o "porra nenhuma!" atendeu tão plenamente as situações onde nosso ego exigia não só a definição de uma negação, mas também o justo escárnio contra descarados blefes, que hoje é totalmente impossível imaginar que possamos viver sem ele em nosso cotidiano profissional. Como comentar a bravata daquele chefe idiota senão com um "é PhD porra nenhuma!", ou "ele redigiu aquele relatório sozinho porra nenhuma!". O "porra nenhuma", como vocês podem ver, nos provê sensações de incrível bem estar interior. É como se estivéssemos fazendo a tardia e justa denúncia pública de um canalha.

São dessa mesma gênese os clássicos "aspone", "chepone", "repone" e, mais recentemente, o "prepone" - presidente de porra nenhuma. Há outros palavrões igualmente clássicos. Pense na sonoridade de um "Puta-que-pariu!". E o que dizer de nosso famoso "vai tomar no cu!"? E sua maravilhosa e reforçadora derivação "vai tomar no olho do seu cu!". Você já imaginou o bem que alguém faz a si próprio e aos seus quando, passado o limite do suportável, se dirige ao canalha de seu interlocutor e solta: "Chega! Vai tomar no olho do seu cu!". Pronto, você retomou as rédeas de sua vida, sua auto-estima. Desabotoa a camisa e sai à rua, vento batendo na face, olhar firme, cabeça erguida, um delicioso sorriso de vitória e renovado amor-íntimo nos lábios.

E seria tremendamente injusto não registrar aqui a expressão de maior poder de definição do Português Vulgar: "Fodeu!". E sua derivação mais avassaladora ainda: "Fodeu de vez!". Você conhece definição mais exata, pungente e arrasadora para uma situação que atingiu o grau máximo imaginável de ameaçadora complicação?

Expressão, inclusive, que uma vez proferida insere seu autor em todo um providencial contexto interior de alerta e auto-defesa. Algo assim como quando você está dirigindo bêbado, sem documentos do carro e sem carteira de habilitação e ouve uma sirene de polícia atrás de você mandando você parar: O que você fala? "Fodeu de vez!". Sem contar que o nível de stress de uma pessoa é inversamente proporcional à quantidade de "foda-se!" que ela fala.

Existe algo mais libertário do que o conceito do "foda-se!"? O "foda-se!" aumenta minha auto-estima, me torna uma pessoa melhor. Reorganiza as coisas.Me liberta. "Não quer sair comigo? Então foda-se!". "Vai querer decidir essa merda sozinho(a) mesmo? Então foda-se!". O direito ao "foda-se!" deveria estar assegurado na Constituição Federal. Liberdade, igualdade, fraternidade. E...foda-se!"
(Texto de Millôr Fernandes)

Cisnes

A vida, manso lago azul algumas
Vezes, algumas vezes mar fremente,
Tem sido para nós constantemente
Um lago azul, sem ondas sem espumas!
.
Sobre ele, quando, desfazendo as brumas
Matinais, rompe um sol vermelho e quente,
Nós dois vagamos indolentemente,
Como dois cisnes de alvacentas plumas!
.
Um dia um cisne morrerá, por certo:
Quando chegar esse momento incerto,
No lago, onde talvez a água se tisne,
.
Que o cisne vivo, cheio de saudade,
Nunca mais cante, nem sozinho nade,
Nem nade nunca ao lado de outro cisne...

( Julio Salusse )

SOBRE SAUDADES, APARTAMENTOS E CLARIDADES - por José do Vale Pinheiro Feitosa


Não tive tempo suficiente para esclarecer se a palavra latina solus tem o mesmo significado que o de solis. Desta origina-se o nome da estrela que aprisiona o nosso sistema planetário e do qual a maior parte da vida depende. Já da primeira palavra, que significa a um só, solitário, deriva para solitas, solidão, unidade, desamparo, retiro...

Sendo o sol único e solitário, tendo a achar que ambas são palavras latinas com o mesmo significado. E se não me engano, passo então ao que venho. Refiro-me a outra palavra derivada de solitas, que é “saudade”.

Saudade que muitos compreendem como um sentimento de incompletude, motivado pela memória de eventos acontecidos ou pelo apartamento das terras, coisas e pessoas amadas. Há quem diga que historicamente a palavra “saudade” seja coisa tipicamente do Português. Que as outras línguas não têm a mesma compreensão.

Um sentimento criado na foz do Tejo, desde a Torre de Belém, com velas sumindo na linha do horizonte. Quem nelas singra, o faz deixando para trás um mundo milenar, um chão de gerações, um céu de sonhos e desejos. Quem fica no porto é como o guerreiro que perdeu a perna na batalha e daí em diante firmou-se num galho morto de uma árvore.

Quando tratamos dos tempos idos temos críticas a eles. Eram tempos de hierarquias familiares exacerbadas, de muita pobreza, sem proteção social. A virgindade se tinha como condenação prévia de toda a sexualidade feminina. A rebeldia era contida na inteireza do controle da renda no pai de família. O ensino era uma dádiva de quem possuía um pouco mais. O cinema para quem tinha trocados no bolso. Existiam duas praças: a dos ricos na Siqueira Campos e dos pobres a de São Vicente (Juarez Távora?).

Por isso quando dizemos “saudade” estamos entre o “apartamento” de um tempo e espaço e a “claridade” do sol. O sol que permite a fotossíntese e desta, a exuberância de toda vida como matriz de energia e proteína. Simultaneamente se diz perda e achado. Pronunciam-se cânticos de amor ao mundo em elisão como se procura nesta mesma manhã que a todos igualmente diz dia, o eixo que dignifica toda existência.

Afinal não somos saudades para aceitar as formas arcaicas do passado, mas para que os presentes não achem do momento uma eternidade que dure. Achem a eternidade que existe e por existir se aparta da sua necessária cessação no tempo. O tempo não é a questão. A questão somos nós. E a percepção de que estamos numa multiplicidade que precisa ser decifrada a cada passo. Uma saudade que traduza para as novas gerações que forjam as próprias saudades que nada se resume a esquema do tipo o “bem” e o “mal”.

"Mamma Mia" - Por Zélia Moreira



.
Não foi por acaso que fiz a minha escolha de hoje. Sábado, final de semana, merece uma dica alto astral.
Antigamente fazia-se muitos musicais. O gênero ficou esquecido por muito tempo. Encher a telinha de muita ação, violência, passou a dar maior bilheteria. Uma pena...
Nos últimos tempos vi alguns musicais maravilhosos, entre eles destaco Mamma Mia, onde foi usado na fórmula: Alegria, humor, amor (romance), lindas paisagens, bons atores e muita música boa... É claro!
Essas características fazem de Mamma Mia um dos melhores que vi nos últimos tempos.
Duas razões especiais me encantaram vendo esse filme: a interpretação de Meryl Streep. Ela está sensacional! É incrível ver a versatilidade dessa atriz em papéis completamente diferentes nos últimos tempos (Dúvida, Mamma Mia, O Diabo Veste Prada, Terapia do Amor) e em toda sua trajetória cinematográfica (Pontes de Madison, Entre Dois Amores, etc.).
A segunda razão é mais relevante e é realmente o que conta: a música do grupo Sueco ABBA, grande sucesso nos anos 70, 80.
O filme é ambientado numa ilha grega e conta a história de Sophie (Amanda Seyfried), uma jovem sonhadora e romântica, que está prestes a se casar e por não conhecer seu pai biológico, envia convites para Sam (Pierce Brosnan/007), Harry (Colin Firth) e Bill (Stellan Skarsgard), para que os três compareçam a seu casamento.
É que sem sua mãe saber, Sophie leu seu diário e viu que um dos três homens pode ser de fato seu pai, e mesmo ela não sabendo qual deles é de fato, quer que eles presenciem esse momento de felicidade em sua vida ao seu lado, só que a reação da sua mãe, a destemida Donna (Meryl Streep) quanto a isso, não é das melhores.
O desenrolar da trama, só mesmo assistindo.
Garanto que é entretenimento da melhor qualidade, garantido pra quem gosta do gênero, claro!

*Ficha técnica:
Musical
Ano 2008
Estados Unidos /Reino Unido
Direção: Phyllida Lloyd
Roteiro: Catherine Johnson
Produção: Judy Craymer e gary Goetzman
Música:Stig Anderson, Björn Ulvaeus e Benny Andersson
Fotografia:Haris Zambarloukos
Desenho de Produção;Maria Djurkovic
Direção de arte:Dean Clegg, Rebecca Holmes e Nik Palmer
Figurino: Ann Roth
Edição:Lesley Walker

Elenco:
Amanda Seyfried: Sophie
Meryl Streep: Donna
Pierce Brosnan: Sam
Colin Firth; Harry
Stellan Skarsgard: Bill
Lulie Walters: Rosie
Christine Baranski: Tanya
...e muitos outros.

Confiram!






A Assunção de Maria ao Céu




A cristandade acreditou na Assunção da Virgem Maria logo desde os primeiros séculos da sua história e, assim, a tradição da festa oficial da Assunção remonta provavelmente já ao século VI.

Como Mons Michel Dubost (bispo de França) diz no seu livro "Marie" (ed. Mame, Paris 2002): "A festa da Assunção nasceu em Jerusalém, mas é difícil saber em que época. A origem da festa talvez venha da consagração de uma igreja a Maria pelo bispo Juvenal (422-458), em Kathisma (suposta etapa da Virgem entre Nazaré e Belém). É mais provável que tenha como origem a consagração de outra igreja em Gethsemani, ao lado de Jerusalém, no século VI. Seja como for, a festa foi alargada a todo o Império pelo imperador Maurício (582-602) sob o nome de Dormição da Virgem Maria. A festa foi sempre celebrada no dia 15 de Agosto. Como o ano litúrgico dos Orientais começa no 1º de Setembro, ele inicia-se verdadeiramente com a Natividade da Virgem e termina com a sua entrada na glória a 15 de Agosto. Mas será apenas nos meados do século XX que a Assunção da Virgem Maria virá a ser proclamada "dogma da Igreja", em 1950, pelo papa Pio XII :

"Por fim a Virgem imaculada, preservada por Deus de toda a mancha do pecado original, tendo concluído o curso da sua vida terrestre, foi elevada à glória do céu em corpo e alma, e exaltada pelo Senhor como Rainha do universo, para assim ser mais inteiramente conforme ao seu Filho, Senhor dos senhores, vencedor do pecado e da morte" (LG 59).
A Assunção da Virgem Santa é uma participação singular na Ressurreição de seu Filho e uma antecipação da ressurreição dos outros cristãos [...]"



________________

A equipe de Maria de Nazaré


Privilégio do mar - Por Drummond





Neste terraço mediocremente confortável,
bebemos cerveja e olhamos o mar.
Sabemos que nada nos acontecerá.

O edifício é sólido e o mundo também.

Sabemos que cada edifício abriga mil corpos
labutando em mil compartimentos iguais.
Às vezes, alguns se inserem fatigados no elevador
e vem cá em cima respirar a brisa do oceano,
o que é privilégio dos edifícios.

O mundo é mesmo de cimento armado.

Certamente, se houvesse um cruzador louco,
fundeado na baía em frente da cidade,
a vida seria incerta... improvável...
Mas nas águas tranqüilas só há marinheiros fiéis.
Como a esquadra é cordial!

Podemos beber honradamente nossa cerveja.

Carlos Drummond de Andrade

Por Stela Siebra



BISAFLOR CONTA HISTÓRIAS

Olá pessoas queridas: venham para a roda de histórias de Bisaflor, a fogueira já está acesa, Sia Maria já fez um bolo de milho e agora está passando o café. Trago hoje uma história chinesa que li em um livro de Ítalo Calvino. É uma história muito boa, sei que vocês vão gostar.

E atenção: quem na roda, depois, recontar a história vai ganhar três cafunés.


A SENHORA NÚMERO TRÊS

Há muitos séculos atrás, numa cidade da China, havia uma hospedaria – a Taberna do Pontilhão – administrada por uma mulher de cerca de trinta anos, conhecida como a Senhora Número Três. Supunha-se que esta mulher era viúva, sem filhos e sem nenhum parente. Na verdade, não se sabia quem era nem de onde viera; mas todos concordavam que sua hospedaria tinha boas instalações e que ela era uma pessoa de posses, pois além da hospedaria, possuía uma excelente tropa de burros, constituída por animais fortes, bonitos e resistentes.

A Senhora Número Três era, também, conhecida por sua generosidade; costumava cobrar preços mais baixos, caso o viajante alegasse que estava com pouco dinheiro, motivo pelo qual não faltavam hóspedes na Taberna do Pontilhão.

Aconteceu um dia que um viajante chamado Chao Chi Ho, em viagem à capital, parou para pernoitar na Taberna do Pontilhão e acomodou-se com mais uns seis hóspedes num amplo dormitório. A Senhora Número Três o tratou muito bem, como era do seu costume e na hora de dormir ofereceu vinho a todos e tomou, também, uma taça. O senhor Chao Chi Ho agradeceu, não costumava beber vinho, e foi deitar-se numa última cama, junto à parede que divisava com o quarto da hospedeira.

Os hóspedes que tomaram vinho, logo adormeceram e a Senhora Número Três recolheu-se ao seu quarto um pouco mais tarde da noite, fechou a porta e apagou a vela.

Chao estava inquieto, não conseguia pregar o olho e, lá por volta da meia noite, escutando um barulho no quarto da hospedeira, percebeu que ela havia acendido a vela. Olhou por uma fresta que havia na parede e viu a mulher retirar de dentro de uma caixa, pequenas peças de madeira com cerca de quinze centímetros de altura: um vaqueiro, um boi e um arado, depositando-as em chão de terra batida, numa pequena área perto do piso da lareira. Depois colocou um pouco de água na boca e borrifou nas figuras que, de imediato ganharam vida, o vaqueiro esporeou o boi que fez movimentar o arado para frente e para trás, arando a terra. Quando o chão estava preparado, ela entregou um pacote de sementes de trigo-mouro ao vaqueiro, que as semeou. Em poucos minutos as sementes brotaram, floresceram e deram grãos maduros, que foram colhidos e debulhados pelo vaqueiro. A mulher os moeu num pequeno moinho. O vaqueiro, o boi e o arado voltaram a ser figuras de madeira que a Senhora Número Três guardou na caixa. A última tarefa da hospedeira foi fazer bolos com o trigo moído naquela noite.

Ao amanhecer todos os hóspedes se levantaram e se preparavam para seguir viagem, quando a Senhora Número Três os convidou para tomarem o café da manhã, oferecendo-lhes os bolos que fizera à noite.

Chao agradeceu e saiu da Taberna do Pontilhão, mas procurou um jeitinho de olhar para trás e, sem que a mulher percebesse, viu que cada hóspede que comia o bolo, caía de quatro e começava a zurrar. A mulher se apossava dos seus pertences e, cada vez mais, aumentava sua tropa de burros.

O homem observou tudo que acontecera naquela noite na Taberna do Pontilhão, mas não comentou nada com ninguém. Quando retornava de sua viagem à capital, teve que fazer um novo pernoite na hospedaria da Senhora Número Três. Ele vinha munido de uma boa porção de bolos de trigo, fresquinhos e do mesmo formato e tamanho dos da hospedeira, que o recebeu muito bem.

Naquela noite não havia outros hóspedes na Taberna. Antes do senhor Chao se recolher, a hospedeira perguntou se ele queria algo para comer ou beber. Ele agradeceu, queria só no café da manhã comer alguma coisa, e a mulher lhe prometeu uma boa refeição.

Durante a noite Chao observou a mulher repetir a mesma mágica de arar a terra, do plantio e crescimento do trigo e a feitura dos bolos, que a hospedeira colocou na mesa do café da manhã, no dia seguinte.

Chao aproveitou-se de um instante em que a mulher saiu da sala e trocou um dos bolos que trouxera por um feito por ela. Quando a Senhora Número Três retornou à sala, admirou-se que seu hóspede ainda não estivesse se alimentando:

- Mas você ainda não comeu dos meus bolos!

- Eu estava aguardando sua volta. Eu trouxe uns bolos da capital, gostaria que você experimentasse.

- Dê-me um.

A mulher estendeu a mão e recebeu um dos seus bolos mágicos, aquele que Chao retirara do prato. Mordeu o bolo e caiu de quatro, zurrando, transformada numa bela e vigorosa jumenta, na qual Chao colocou cabresto, montou e retornou para sua cidade, levando consigo a caixa com as figuras de madeira, pensando em usá-las em seu proveito.

No entanto, ele nunca conseguiu dar vida às peças porque não sabia das palavras mágicas, por isso não pode transformar pessoas em burros, mas tinha a seu serviço a jumenta mais resistente e vigorosa da região, que era capaz de viajar muitas léguas por dia, em qualquer tipo de estrada.

Alguns anos depois, montado na sua jumenta, o senhor Chao passava na frente de um Tempo, quando, de repente, um velho começou a dar boas risadas, bater palmas, fazendo grande alarido:

- Mas é a Senhora Número Três, da Taberna do Pontilhão! O que lhe aconteceu?

O velho se aproximou, segurou nas rédeas da jumenta e falou para Chao:

- É certo que ela tentou lhe fazer algum mal, eu sei, mas lhe garanto que ela já foi plenamente castigada por seus pecados. Deixe que eu a liberte.

Dizendo isso, o velho retirou o cabresto da cabeça da jumenta, que imediatamente largou a pele de animal e se transformou em gente.

A Senhora Número Três saudou o velho e sumiu.

Nunca mais se soube dela.

Por Domingos Barroso


Blues
Não há como
esgrimir contra o sol:

sempre encontra uma maneira
de lançar seus raios
com trancinhas
enrubescendo
meus travesseiros.

Meus dias deveriam
ser melhores
com menos apelos
e o batimento cardíaco
nem tão desumano.

A varanda espera
que eu me debruce
sobre as plantinhas
assobie uma canção
estale os dedos
corte as unhas.

Em vão,
inútil.

Sequer tenho olhos
para vislumbrar o sorriso
marcado pelas duas rachaduras
na borda da minha xícara.

CINEMARANA, SESC CRATO, 15 de agosto, às 19h - Por Elvis Pinheiro


AS AVENTURAS DE AZUR E ASMAR (Azur et Asmar, Dir. Michel Ocelot, França, 2006, 99min)
Os meninos Azur e Asmar foram criados juntos pela mesma mulher, Jenane. Azur é loiro e tem olhos azuis, além de ser filho de um nobre. Já Asmar tem olhos e cabelos pretos, sendo filho de Jenane, ama-de-leite que cuida de Azur. Eles cresceram como se fossem irmãos, até serem separados quando Jenane parte com o filho. Uma bela animação que nos ajuda a refletir sobre as semelhanças e as diferenças entre cristãos e muçulmanos, entre ocidentais e orientais.
Adicionar uma descrição
CINEMARANA, SESC CRATO, 15 de agosto, às 19h AS AVENTURAS DE AZUR E ASMAR (Azur et Asmar, Dir. Michel Ocelot, França, 2006, 99min) Os meninos Azur e Asmar foram criados juntos pela mesma mulher, Jenane. Azur é loiro e tem olhos azuis, além de ser filho de um nobre. Já Asmar tem olhos e cabelos pretos, sendo filho de Jenane, ama-de-leite que cuida de Azur. Eles cresceram como se fossem irmãos, até serem separados quando Jenane parte com o filho. Uma bela animação que nos ajuda a refletir sobre as semelhanças e as diferenças entre cristãos e muçulmanos, entre ocidentais e orientais.

Vamos Correr? - José do Vale Pinheiro Feitosa



Aviso: qualquer semelhança com algum antropônimo do passado, presente ou futuro é mera coincidência. Estes fatos são uma ficção e nada tem a ver com a realidade, especialmente a brasileira.

Zuleica com roupas de jogging, serelepe para algumas voltas correndo no Parque de Exposições, em pleno das 4h30min dos galos cantantes. Passa na frente da casa de Antonio de Selma. Antonio, para surpresa geral, está com uma mangueira aguando suas plantas desidratadas. É costume esquecer, mas naquele dia, no calor dos eventos jornalísticos da noite passada, ele, o maior repórter do interior (não só do estado, é do Brasil, mas há quem diga que do mundo e eu concordo) não estica a soneca do amanhecer. Vai para suas roseiras com mangueira e tudo.

Zuleica pára e diz: vamos?

Ho..ho...ho... – é a resposta do nosso De Selma. Seu olhar de persiana arriada, como o de Luiz de Borba, é mais expressivo do que todas as reportagens que fez o ano todo.

Zuleica, continua: e a Erenice?

- É Guerra!

- ???? – isso estava estampado no rosto de Zuleica e De Selma continua:

- Tropa perdendo, no recuo é pior do que animal na armadilha, vale tudo: bala dundum, gás mostarda, o negócio é matar, esfolar, não deixar nem rastro.

- E o tribunal de Genebra? – Zuleica brinca.

- Já viu a Bósnia? Com sangue nos dentes só existe o instinto de matar. Depois vem o arrependimento quando o sangue jorrou para o lado deles. Aí vai dizer que só fez o que lhe mandaram. Foi a mídia que trouxe a munição. Foi o inimigo que lhe provocou o ódio irracional. Viu Hitler, suicidou-se para não assumir a história.

Zuleica com os olhos arregalados repete se ele não quer pôr um tênis e ir correr para espalhar o sangue.

- Vou não. Não. Não vou mesmo. Interrompe as negativas um pouco enquanto reflete algo e continua: Nem que o papa peça. Arrematou na língua do “P”.

Zuleica adora provocar De Selma para ouvir as tiradas deles e pergunta o porquê.

- Não vou porque disseram que fazer exercício rejuvenescia. Então fiz esteira com o Doutor, comprei tênis, meias apropriadas, até estes spray de tira chulé eu comprei. E sai com a esperança de que com uma semana, já tivesse rejuvenescido pelo menos um mês. Como são cinqüenta e duas por ano, num ano eu teria voltado no tempo quatro anos. Mas o quê? Qual o quê? Todo mundo era velho. Aquilo faz é envelhecer as pessoas. Não vou mais. Não me chame para corrida que eu deito.

Azul Musical


Oscar Peterson



Oscar Emmanuel Peterson (Montreal, 15 de agosto de 1925 -- 23 de dezembro de 2007), foi um pianista de jazz canadense. Oscar Peterson é considerado por muitos críticos como um dos maiores pianistas de jazz de todos os tempos (Scott Yanow, 2004)

Seus parceiros musicais mais constantes são os contrabaixistas Ray Brown e Niels-Henning Orsted Pedersen e os guitarristas Herb Ellis e Joe Pass.

Euclides da Cunha



Euclides Rodrigues da Cunha (Cantagalo, 20 de janeiro de 1866 — Rio de Janeiro, 15 de agosto de 1909) foi um escritor, sociólogo, repórter jornalístico, historiador, geógrafo, poeta e engenheiro brasileiro.

ORESTES BARBOSA- por Norma Hauer


Era o dia de Nossa Sra.da Glória; nessa data (15 de agosto de 1966) chega ao fim a vida de um dos mais férteis letristas de nossa música popular : ORESTES BARBOSA.
Autor de versos maravilhosos, muitos musicados por Francisco Alves (14), outros por Sílvio Caldas (também 14) e inúmeros outros compositores.

ORESTES foi autodidata e muito cedo começou no jornalismo, sendo sempre um lutador pela democracia, a ponto de, em 1945, fundar um jornal exatamente com o nome de "Democracia", que não durou muito, mas foi combativo quando estávamos saindo da ditadura Vargas e enfrentaríamos as primeiras eleições livres.

A primeira gravação de uma composição sua foi "Flor do Asfalto", com J.Thomaz, gravada por Francisco Alves em 1928. Chico só passou a fazer parceria com Orestes em "Abelha da Ironia"(1932).
Seguiram “”A Mulher que Ficou na Taça; “Não Sei”; “Romance”;. “Dona da Minha Vontade”; “Por Teu Amor”...

Somente em 1936, Sílvio começou a gravar Orestes Barbosa, com "Santa dos Meus Amores".
No ano seguinte gravou, pela primeira vez, o clássico "Chão de Estrelas", tendo na outra face do disco de 78 rotações outra valsa: “Arranha-Céu”.
Seguiram várias outras tais como “O Nome dela eu Não Digo”;“Quase que eu Disse”; “Serenata”... e em 1938 “Suburbana”.
Nesse ano, tiveram uma desavença e a valsa "Vestido das Lágrimas" , foi gravada por Floriano Belhem, tendo na outra face a também valsa da dupla “Soluços”,composta em 1934.
Por coincidência, um cantor que pouco gravou, fez parte da primeira e da última composição da dupla.

Somente em 1952 Sílvio gravaria “Vestido das Lágrimas”, em seu primeiro LP.

Quando do centenário de nascimento de Orestes (7 de maio de 1994) a Caixa Econômica, pelo fato de ele ter uma composição com esse nome, fez uma homenagem especial a Orestes, em sua agência no Boulevard, na qual Sílvio Caldas, já com 86 anos, interpretou "Chão de Estrelas "(o óbvio) e "Serenata"(outra valsa da dupla Orestes e Silvio Caldas, de difícil interpretação).

Foi a última vez que vi Sílvio Caldas e penso que foi sua última apresentação em público.
Nessa mesma festa, Roberto Barbosa, neto de Orestes, lançou um livro sobre seu avô, com o nome de "Passeio Público", no qual se podem conhecer as várias etapas da vida de Orestes e a relação de todas suas composições.
Ali confirmamos que a primeira gravação de uma composição sua foi exatamente "Flor do Asfalto", com J.Thomaz, gravada por Francisco Alves .

Na capa do livro de Roberto Barbosa tem o manuscrito de "Chão de Estrelas", que desmente uma informação que Sílvio Caldas gostava de repetir dizendo que o nome "Chão de Estrelas" fora dado à composição por Guilherme de Almeida, porque a música chamar-se-ia "Sonoridade que Acabou".
Conversando a esse respeito com Roberto Barbosa, ele disse que Sílvio gostava de "inventar" histórias.

Ambos e mais Francisco Alves hoje se encontram “do outro lado da vida” , mas suas passagens por este mundo foram de grande riqueza para nossa música popular.

Norma


“Para que levar a vida tão a sério se ela é uma incansável batalha da qual jamais sairemos vivos?“

Bob Marley