por José do Vale Pinheiro Feitosa




Viva junto à alma mais próxima e compreenda que a proximidade é a medida da distância. Que a distância que os separa é este movimento maravilhoso da matéria e da energia. A maravilha é apenas esta surpresa porque esta proximidade é tão diminuta entre os dois e é a inesperada distância.

José do Vale P Feitosa



sábado, 19 de novembro de 2011

Na Rádio Azul



Sofia completa 3 anos.



Hoje  está completando 3 anos  que ela abriu seus olhinhos claros  pela primeira vez.Entre lágrimas, risos, pula-pula, mamadas e frutas foi arteando passos , no começo do caminho.
Imita "Bibi" em todos os atos e palavras.. Nas cambalhotas, nos movimentos dançantes, nas sílabas mais fortes. Parece com o André quando tinha a sua idade... André inquieto, persistente nos desejos, e ao mesmo tempo resignado com as negativas finais, necessárias.
Arrancar-lhe um sorriso é a coisa mais fácil. Basta falar de bonecas, sorvete, passeios, e da chegada do pai..
Seu abraço é abandonado em meus braços. Ela reconhece um carinho de avó !.
Que você cresça, Sophia , antes que o mundo melhore em qualidade. Que a felicidade seja tua amiga inseparável, até nos dias sombrios, quando a chuva molhar  teus sapatos..
socorro moreira


"Quando a chuva molhar os teus sapatos, ó Sofhia,
É porque sereis mulher
E tua beleza nunca te permitirá
Sejas só,
Enquanto eu um solitário desse mundo
Estarei a anos luz
A contemplar-te
Como um dia "traduziu-te"
A tua avó."
(Zé Nilton)

FOMOS ONTEM

Fomos ontem!
Caminhos diversos,
Paisagens coloridas ,fotos em preto e branco.
Paramos num tempo
Onde o próprio tempo traçou atalhos
E nos levou para novos rumos.
Fizemos longas viagens,
Percorremos vales e montanhas,
Mergulhamos em mares diferentes.
Apenas um elo restou em forma de poesia.
Hoje quem sabe
Juntando os nossos restos
Não possamos no outono do tempo
analisarmos que se fomos ontem,
Bem poderíamos hoje sermos nós .

SABER VIVER

Não sei... Se a vida é curta
Ou longa demais pra nós,
Mas sei que nada do que vivemos
Tem sentido, se não tocamos o coração das pessoas.
Muitas vezes basta ser:
Colo que acolhe,
Braço que envolve,
Palavra que conforta,
Silêncio que respeita,
Alegria que contagia,
Lágrima que corre,
Olhar que acaricia,
Desejo que sacia,
Amor que promove.
E isso não é coisa de outro mundo,
É o que dá sentido à vida.
É o que faz com que ela
Não seja nem curta,
Nem longa demais,
Mas que seja intensa,
Verdadeira, pura... Enquanto durar !

(Cora Coralina )

Não Importa ... - Por Rosa Guerrera



Não importa a dor da saudade , se um dia existiu o verdadeiro amor.
Não importa o passar do tempo se soubemos colher todos os frutos na árvore da nossa juventude.
Não importa os anos que ainda teremos amanhã , se no nosso ontem saboreamos um a um todos os presentes.
Não importa o coração cansado pelo desgaste natural das coisas , se ele já pulsou imensamente todas as paixões vividas.
Não importa a lembrança de um beijo que partiu , se conservamos no nosso corpo o orvalho acontecido em muitas madrugadas.
O que importa mesmo , é termos a convicção de que não vivemos em vão , quando chegar o momento da partida .
Por certo noutras vestes e com novos rostos continuaremos os mesmos percursos de hoje , e quem sabe até não continuaremos a escrever uma história de amor que deixamos por acaso ou por ironia um dia inacabada !!!

rosa guerrera

O Jogo - Rejane Gonçalves


Procura-nos a Morte quando já somos tão pouco.
Quando o que nos dá a condição, senão a possibilidade de seguir ao lado dessa gente, é apenas um corpo semelhante aos que do nosso lado passeiam. Todavia mover os pés nesse ritmo próprio do caminhar, trotar com essas criaturas de uma calçada à outra, não nos confere a imponência de um puro sangue, nem tampouco oferece à Morte a garantia de que apertará nos braços um indivíduo, ainda, senhor absoluto dos seus restos de sonhos, ânsias e quereres
A Vida matreira e ladina com suas mortes cotidianas, sutis, mas atrozes, a nos infligir, dificilmente entrega um corpo cujo espírito ainda esteja envolto na integridade de suas emoções. Ela que dispõe e impõe, olha da janela envidraçada a ridícula figura da Morte que ao se abaixar para pegar o fardo o faz sempre com a convicção de que o peso a ser suportado vai ser imenso, e ao levantar-se com um urro como que para se ajudar, acaba desequilibrando-se com a leveza da carga. Nesse momento, Vida e Morte, como duas velhas comadres que estivessem em abstinência da companhia mútua, cruzam os olhares ávidos de uma para outra calçada; e gesticulam e gritam e gemem e movem-se como se existisse uma fluidez ao abraço ou à trincheira. As duas comadres enfrentam-se.
E nós somos um leve embrulho arremessado no ar num jogo frenético, destituído do calor das torcidas e da sonoridade das multidões. Bola disforme jogada cada vez com menos precisão de Uma para a Outra, até que a Morte, a mais sensata dentre elas, lembre-se de sua tarefa milenar, bote-nos debaixo do braço e saia praguejando.

Rejane Gonçalves

Dia da Consciência Negra



O Dia Nacional da Consciência Negra é celebrado em 20 de novembro no Brasil e é dedicado à reflexão sobre a inserção do negro na sociedade brasileira. A semana dentro da qual está esse dia recebe o nome de Semana da Consciência Negra.

A data foi escolhida por coincidir com o dia da morte de Zumbi dos Palmares, em 1695. O Dia da Consciência Negra procura ser uma data para se lembrar a resistência do negro à escravidão de forma geral, desde o primeiro transporte de africanos para o solo brasileiro (1594).

Algumas entidades como o Movimento Negro (o maior do gênero no país) organizam palestras e eventos educativos, visando principalmente crianças negras. Procura-se evitar o desenvolvimento do auto-preconceito, ou seja, da inferiorização perante a sociedade.

Outros temas debatidos pela comunidade negra e que ganham evidência neste dia são: inserção do negro no mercado de trabalho, cotas universitárias, se há discriminação por parte da polícia, identificação de etnias, moda e beleza negra, etc.

O dia é celebrado desde a década de 1960, embora só tenha ampliado seus eventos nos últimos anos.

* IBGE Teen - Dia Nacional da Consciência Negra

Não é contradição, são os meus dois lados

Minhas palavras são mais afiadas do que navalha, entretanto, trago dentro da alma, palavras tão delicadas que a mais doce melodia não se pode comparar...
Rosemary Borges Xavier

As finalidades do canto orfeônico - By Ângela

Outro dia vi, num telejornal, uma reportagem que mostrava professores em treinamento preparando-se para o ensino de música, matéria recentemente incluída no currículo escolar. Apesar da obrigatoriedade da disciplina, não existem professores capacitados para o exercício da função. E, como tudo que acontece no Brasil, correm atrás do prejuízo e são formados a toque de caixa. Mas o inusitado da situação fez o meu pensamento viajar no tempo, levando-me aos anos 60, no Ginásio São Pio X, mais precisamente a uma aula de canto orfeônico, cuja professora era dona Chiquinha Piancó.
Era uma figura contraditória, muito querida por todos. Porém não existia professora mais enérgica do que ela, sendo, assim, bastante temida. Ela sabia ser doce em algumas ocasiões, mas na sala de aula virava guardiã dos bons costumes e, como aquele senhor de que fala o evangelho, cobrava o que não dava.
Mesmo sendo uma boa aluna, nunca aceitei de bom grado a ideia de estudar canto orfeônico. Espírito contestador, achava aquilo uma baboseira. Afinal, para quê me serviria? Considerava perda de tempo. E, por não encontrar motivação, descuidava dessa matéria, chegando muitas vezes a passar o maior sufoco na hora de dar o ponto, pois raramente sabia a lição de cor.
A arguição era oral. Tínhamos que solfejar, no compasso correto, trechos de músicas a partir da partitura. Para mim, não existia suplício maior. Os símbolos que representavam as notas musicais não me eram nada amistosos. Ainda conhecia a clave de Sol, por achá-la bonitinha. Mas quando partia para identificar as breves, semibreves, mínimas, semimínimas, colcheias, semicolcheias, fusas e semifusas, aí engrigolava tudo. Era uma horror!
Um belo dia, dona Chiquinha decidiu, sem prévio aviso, tomar a lição de toda a classe. O assunto era “as finalidades do canto orfeônico”. Quando ela chamou o número 1, Adecy, eu fiquei apavorada, pois seria a próxima e não sabia nada. Tentei ainda decorar às pressas, porém Adecy não conseguiu lembrar de todas as finalidades, gaguejou e teve que voltar para a sua carteira com a recomendação de estudar mais, pois, naquele dia, só poderíamos sair da sala após provarmos que tínhamos aprendido.
Fui chamada em seguida. Titubiei logo na primeira finalidade, levei um carão, voltei para o meu lugar e, da mesma forma, todas as demais colegas. Naquele dia, não sei bem o porquê, não houve uma aluna que salvasse a pátria. E dona Chiquinha, pacientemente, aguardava a manifestação de alguém que já pudesse se desvencilhar daquela tarefa.
Após algum tempo, Adecy, sempre a primeira, levantou a mão, foi até o birô da professora, deu a lição completa e foi liberada. Saiu da sala de cabeça erguida. Aos poucos, uma a uma, as colegas foram se livrando daquela situação vexatória e partindo para suas casas. E lá restou apenas eu. Por mais que tentasse, não decorava as benditas finalidades. E a noite já estava chegando, o cansaço e o desânimo tomavam conta de mim.
Finalmente, dona Chiquinha resolveu usar o bom senso. Percebeu que seria melhor deixar para o dia seguinte, mas antes me obrigou a fazer um trato com ela: ninguém jamais poderia ficar sabendo que eu havia saído sem ter dado o ponto completo. Jurei que assim seria e fui correndo para casa.
No dia seguinte, ao chegar à escola, fui procurá-la para me livrar de uma vez daquele incômodo. Quase de um fôlego só, despejei tudo. Ao final, dona Chiquinha falou: “nunca mais você irá esquecer as finalidades do canto orfeônico”.
Ledo engano! Por mais esforço que eu tenha feito, não consegui lembrar uma só palavra. Também, é bom que fique registrado, nunca precisei usar aquelas informações para nada. De repente, bateu a curiosidade. Resolvi fazer uma pesquisa na Internet. Foi quase tão difícil quanto decorar o texto naquela ocasião. Finalmente, quando já estava quase desistindo, encontrei um artigo de Wilson Lemos Júnior/UFPR, onde consta a citação:
  • Na Portaria Ministerial nº 300, de 7 de maio de 1946, referente ao ensino de canto orfeônico nas escolas secundárias do país, lê-se o seguinte:I – O ensino do Canto Orfeônico tem as seguintes finalidades:a) Estimular o hábito de perfeito convívio coletivo, aperfeiçoando o senso de apuração do bom gosto.b) Desenvolver os fatores essenciais da sensibilidade musical, baseados no ritmo, no som e na palavra.c) Proporcionar a educação do caráter em relação à vida social por intermédio da música viva.d) Incutir o sentimento cívico, de disciplina, o senso de solidariedade e de responsabilidade no ambiente escolar.e) Despertar o amor pela música e o interesse pelas realizações artísticas.f) Promover a confraternização entre os escolares. (ARRUDA, 1960, P. 153)

E agora, a pergunta que não quer calar: será se existe alguém, que tenha estudado no Pio X e passado por situação idêntica, que possa ratificar o pensamento de dona Chiquinha, ao afirmar que eu jamais esqueceria?

Voa...

Imagem/Internet

VOA...

Abre também a tua porta, abre...
Abre e deixa o vento entrar.
Deixa a brisa se instalar;
Deixa o corpo abençoar;
E as lágrimas poder secar.
Deixa...

Abre de vez a tua porta, abre...
Sem chaves e nem fronteiras.
Sem grades e nem cadeados;
Abre e deixa o sol entrar.
Deixa os raios te tocar;
Deixa o corpo enternecer,
E não te fazer adormecer.
Deixa...

Aceita a porção mágica do tempo...
O desenrolar dos dias e das horas.
O rumo de todos os mundos.
O vôo das grandes gaivotas.
Os pássaros voltam sim pros seus ninhos;
Mas só pra alimentar, e fazer voar.
E depois, um ciclo poder fechar.

Deixa então os ninhos dos passarinhos;
Não faz dele o teu ninho.
Faz do teu peito apenas abrigo e
a liberdade de todos os ventos;
Então voa... Desperta!

Abre um novo caminho.
É sempre um novo dia e um novo momento.
E aí, na mesma direção dos ventos,
Você vai poder se encontrar, sem mais nenhum tormento.

Lana Mara
10/10/2011

Na Rádio Azul




O Milagre da Volta
Composição: A.cavalcantI - Fernando César


Volta meu amor
E deixa novamente que eu te afague
Não vás deixar que o nosso amor se acabe
Como um domingo que chegou ao fim
Volta meu amor
A tarde está cinzenta de saudade
E toda essa tristeza é na verdade
Saudade a mais que já não cabe em mim

Volta meu amor
A minha vida nasce em teu carinho
Para morrer a soluçar baixinho
Onde começa o meu viver sem ti
Volta meu amor
E faz do meu carinho o teu caminho
Transforma como um Deus a água em vinho
Devolve a fé  que eu tive que perdi


Aprendi ouvindo-a no rádio. Menina, já achava a letra linda.
Engraçado...Não mudei tanto!

Quem conhece esta canção tem a minha idade...Me diga!

Amor imponderável - Por Socorro Moreira



Acho sincero o silêncio do amor não declarado. Por mais sutil que seja a sentença, ela considera o imponderável.
O amor decantado vive da própria essência e prolifera num habitat especial, paralelo à realidade.
Ele é incerto, sendo unilateral.
Ele é completo, no percurso das heras. Ele não vive na espreita, sabe a falta do encalço. Não posso condená-lo, se o campo é imaginário. Meu juízo perdoa a falta de reciprocidade. Levianamente extrapolo em palavras, e deito no rio dos sentimentos as pedras que nos separam. Permeiam águas correntes, que deslizam, nos mares dos prazeres. Unificar o amor é objetivo perene. Objetivá-lo é deixá-lo livre, na corrente que circunda fios interiores.
Quando um dia passar, vou entender que foi vivido, no fórum da eternidade.
Macacos me mordam, corujas guardem os meus segredos... Meu amor é crédito, sem cartão de saque.
É previdência, na providência do vazio, quando se instala.
Nada trágico. Tudo dentro do previsto mensal. E assim os anos e ânimos se sucedem. Começou em Janeiro de um ano infindo.

socorro moreira


Náufragos - Por Rosa Guerrera



Mergulhaste o rosto em meus cabelos
E eu cingi numa carícia o teu corpo ...
.
Senti tuas mãos úmidas de suor
Quando entrelaçaste as minhas .
.
E no silêncio compreendemos
A imensidão do leito ao nosso redor.
O mesmo leito que antes parecera
pequeno demais para a nossa paixão .
.
E ternamente enxergamos nos nossos lugares
Duas crianças exaustas de carinhos.
.
E as brancas mãos da madrugada
Fecharam as cortinas
De mais um maravilhoso naufrágio de amor !


rosa guerrera

Dia da Bandeira - por Norma Hauer



19 DE NOVEMBRO
HINO À BANDEIRA
Letra de Olavo Bilac

Salve, lindo pendão da esperança,
Salve, símbolo augusto da paz!
Tua nobre presença à lembrança
A grandeza da Pátria nos traz.

Recebe o afeto que se encerra
Em nosso peito juvenil,
Querido símbolo da terra,
Da amada terra do Brasil!

Em teu seio formoso retratas
Este céu de puríssimo azul,
A verdura sem par destas matas,
E o esplendor do Cruzeiro do Sul.

Recebe o afeto que se encerra,
Em nosso peito juvenil,
Querido símbolo da terra,
Da amada terra do Brasil!

Contemplando o teu vulto sagrado,
Compreendemos o nosso dever;
E o Brasil, por seus filhos amado,
Poderoso e feliz há de ser.

Recebe o afeto que se encerra,
Em nosso peito juvenil,
Querido símbolo da terra,
Da amada terra do Brasil!

Sobre a imensa Nação Brasileira,
Nos momentos de festa ou de dor,
Paira sempre, sagrada bandeira,
Pavilhão da Justiça e do Amor!

Recebe o afeto que se encerra,
Em nosso peito juvenil,
Querido símbolo da terra,
Da amada terra do Brasil!

Mais um hino que nos leva ao Aurélio para que compreendamos sua letra.
Também, escrita por Olavo Bilac!..
Este também aprendíamos no Colégio e o sabíamos quase de cor.

Na segunda estrofe, o verso certo é:

"em nosso peito VARONIL, mas como éramos estudantes, cantávamos "em nosso peito JUVENIL"
Assim, sem o conhecimento de Bilac, a palavra VARONIL foi transformada em JUVENIL.

A data era commorada no pátio do Ministério da Educação.

Já funcionária, assistia às crianças cantando o hino e hasteando a Bandeira.
E recebendo sorvete Kibon no encerramento da festa.

Nós, funcionários, descíamos ao pátio para saborear um autêntico sorvete Kibon.
(que não era para nós). Mas era tão bom voltar à juventude e saborear um Chica-Bom autêntico.
Quando a Kibon era representada por um grande K e não por esse símbolo internacional.
Será a Globalização?

norma hauer

Guimarães Rosa


João Guimarães Rosa (Cordisburgo, 27 de junho de 1908 — Rio de Janeiro, 19 de novembro de 1967), foi um dos mais importantes escritores brasileiros de todos os tempos. Foi também médico e diplomata.

Os contos e romances escritos por Guimarães Rosa ambientam-se quase todos no chamado sertão brasileiro. A sua obra destaca-se, sobretudo, pelas inovações de linguagem, sendo marcada pela influência de falares populares e regionais que, somados à erudição do autor, permitiu a criação de inúmeros vocábulos a partir de arcaísmos e palavras populares, invenções e intervenções semânticas e sintáticas.

Tudo, aliás, é a ponta de um mistério, inclusive os fatos. Ou a ausência deles. Duvida? Quando nada acontece há um milagre que não estamos vendo.
Guimarães Rosa

Ficando no prejuízo


Chegou em casa e a mulher estava tiririca. Sabe-se lá como diabos ela descobriu a tramóia ! Devem ter sido as outras, pensou em meio à ressaca fenomenal, a classinha é extremamente solidária, quando são amigas contam tudo que viram ( sempre com algum acréscimo), em nome da dignidade feminina, quando são inimigas o fazem para ver o circo pegar fogo e deliciar-se de longe com as labaredas. Tinha tramado tudo, nos mínimos detalhes, durante uns dois meses. A mulher era uma fera: para cascavel só faltava o guizo. Pediu, com antecedência, para que a Grendene o escalasse naquela horário nobre que vai de uma hora da manhã até às oito horas do dia seguinte. Sapecou uma estória que estava a perigo e necessitava do adicional noturno. Os colegas desconfiaram daquela predileção de tetéu, justamente no mês de julho mas engoliram com alguma careta a justificativa . No finalzinho de junho já avisou à mulher da novidade. A patroa estrebuchou, logo no mês de férias dos meninos, no mês da EXPÔ/Crato, aquela notícia pouco auspiciosa! Mas empresa é assim mesmo mulher, quem quiser que se enquadre, senão a porca torce o rabo ! Guilhermina( assim chamava-se a crotálica esposa) destilou algum veneno, mas terminou por entender ,a contragosto, as razões apresentadas e abrandou o coração ao imaginar as possibilidades comerciais do adicional noturno. A partir daí o fojo estava armado e precisava só um ou outro ajuste, a sintonia fina do piau. Pois bem, chegada a EXPÔ/CRATO , foi uns dois dias com a serpente, digo esposa, e os filhos dar uma olhadinha nos bichos de dois e quatro pés e os meninos rodaram no parque. Tudo com muito comedimento que assalariado não pode se dar ao prazer de beber cerveja de três reais e refrigerante de um e cinqüenta, não ! Estribuchou mas não houve jeito, teve que cair na ratoeira da carestia que lhe disseram foi armada por causa de uma tal de terceirização e que por isso mesmo todos os preços , no Parque, foram multiplicados por três.Fez tudo isto com desvelo , o cuidado e a atenção para com a família fazia parte do plano que projetara. Na segunda de Exposição, chegou com cara amuada em casa , fingindo-se aborrecido e avisou à sua serpenteante mulher que a folga programada para a Sexta-Feira tinha sido cancelada por conta da doença de um colega que entrou com atestado.Ela resmungou, reclamou e ele, estrategicamente, somou suas lamúrias às de Guilhermina. A partir daquele momento puxara o cão para posição de tiro, o projeto encontrava-se na sua fase final de implantação. Na sexta, por fim, saiu de casa por volta das 11 da noite, pronto para o trabalho. Fingiu cansaço e partiu. Dobrada a primeira esquina, escapuliu ladinamente para uma bodega da caixa d´água, onde a turma já o esperava e encheu a cara de cana e não de “loura gelada”, conforme mandava o momento. Dali , enfiou um chapéu de palha grande na cabeça e partiu para o show do RPM. Foi uma noite e tanto. Arranjou uma moreninha torada no grosso, de pernas curtas mais roliças e dois air-bags de segurança e resolveu exercitar a última invenção dos novos tempos, coisa que sua geração jamais experimentara: o “Fica”. Ao amanhecer nem lembrava bem o nome da sua “ficante”, em homenagem ao RPM , lembrou-se dela sob o epíteto significativo de “Stefanie de Mônaco”.

Mal entrou em casa, no entanto, mal disfarçando o fim da embriaguez misturado com o começo da ressaca, aquela surpresa. Nem o FBI, nem o SNI, nem mesmo o MOSSAD conseguiriam tamanha agilidade na espionagem. Guilhermina saltou de lá, com a língua bífida e armou bote. Ele ainda tentou criar algum álibi, alguma estória paralela mas desistiu aí por volta da quinta lapada do cepo de carne no pé do toitiço.Recobrou os sentidos três dias depois na UTI do São Francisco, todo enfaixado: só os olhos de fora. Pensou ainda em dar parte da mulher, mas não existe delegacia especializada para homem agredido por esposa e, além do mais, estaria exposto definitivamente à execração pública. Quando o médico veio para visita perguntou o paciente sobre o atropelamento, imaginou que esta tinha sido a versão apresentada por Guilhermina, quando do internamento e manteve a versão. Disse que tinha sido uma moto que ziguezagueva na pista, próximo da sua casa ou uma cobra venenosa que o tinha mordido. O médico informou então que ele sofrera um traumatismo encefálico, mas encoontrava-se bem, estava pensando inclusive em dar alta, mas dependia tudo dele :

---- O senhor ainda deseja Ficar ??

O paciente levou as duas mãos enfaixadas até à cabeça inchada e, com aqueles olhos roxos, de guaxinim, suplicou :

---- Pelo amor de Deus, doutor, nunca mais eu quero Ficar nesta vida, viu ?

J. Flávio Vieira