por José do Vale Pinheiro Feitosa




Viva junto à alma mais próxima e compreenda que a proximidade é a medida da distância. Que a distância que os separa é este movimento maravilhoso da matéria e da energia. A maravilha é apenas esta surpresa porque esta proximidade é tão diminuta entre os dois e é a inesperada distância.

José do Vale P Feitosa



domingo, 20 de fevereiro de 2011

Como encarar?

Como é difícil encarar a chamada "morte"... Como é duro e cruel. Sei que uma nova vida nos espera, mas...
Sei que nalgum momento da vida perderemos algo ou alguém. Seja no jogo (para os mais entusiastas), seja no amor, seja na perda de bens materiais, seja por conta de uma grande amizade desfeita, uma separação conjugal, a juventude do nosso corpo que pouco a pouco vai enfraquecendo e perdendo elasticidade e rigidez de uma forma sutil, mas aparente, e por aí vai. Sofremos pela distância, por não podermos estar próximas das pessoas que a gente ama, sofremos pelo conforto que deixamos de usufruir, e por diversos outros motivos. Mas essas perdas se tornam naturais e aceitáveis a partir do momento em que sabemos que essas coisas e pessoas continuam ali, são palpáveis; basta uma palavra ou um gesto. Um novo embate no jogo com aquele sentimento de vitória, a busca pelo novo emprego... Basta desafiarmos o nosso potencial de luta e corrermos em busca do que se perdeu no tempo e no espaço. Basta também aceitarmos de forma natural a decadência física do nosso corpo; antes jovem, e aos poucos, senil e frágil (o que é inevitável, quando a idade chega, apenas chega). Implacável!
A tentativa em resgatar o que foi perdido pode até se tornar em vão, mas, vale o risco; pois as pessoas continuam aqui, na mesma esfera. Sabemos onde encontrá-las. Basta querer, basta tentar alcançá-las, basta tentar recuperá-las. A esperança continua ainda dentro de nós. Aquela amizade desfeita podendo ser refeita, o amor abruptamente perdido podendo novamente ser recuperado. Continuamos cheios de perspectivas e esperanças.
Agora... Perder literalmente quem você ama e que vai embora sem marcar um novo encontro ou um meio qualquer de comunicação... Numa despedida amarga e dolorida; num choro solto e desesperado; num adeus que lhe esmaga o coração e sem final feliz. Deixar de sentir o cheiro por completo, de ver o sorriso repleto, o semblante tantas vezes calmo ou tão severo... Deixar de sentir o aconchego no momento do deitar, do acordar, as conversas sempre carinhosas ou afobadas... E tantas outras coisas. E para quem fica, a solidão. Sufocados ainda pela dor, e presos as recordações. É uma dolorida e triste saudade.
É caos e tristeza.
Ainda não estou pronta para despedidas, e sei que isso é muito ruim. Saber elaborar de forma tranquila uma perda, é deveras complicado. O meu espírito ainda se arrasta...
Às vezes não sei quem sou, e o que penso. Muitas vezes estou convicta, outras... Vejo que não tenho pensamentos coerentes a respeito de crenças, e da minha fé. Ainda não tenho opinião formada; e na altura da vida acho isso péssimo! Encontro-me perdida e cheia de interrogações por diversas vezes. Os sentimentos são inúmeros, as dúvidas e os questionamentos maiores. Encontro-me em meio à multidão, cada um com seus conceitos, convicções, buscas...
Tô aqui... Mais longe do que perto?
*
Mara Thiers
Escrito há um tempo atrás...

A DIALÉTICA ESCALAFOBÉTICA DE UMA VISÃO HERMÉTICA - Ulisses Germano



E na calada da noite
Quando a cidade dormia
A estratégia do açoite
Planejada no outro dia
Era feita no traçado
Deixando as bestas de lado
Dissolvidas na orgia

Uma porção bem cintilante
De alguma fresta passada
Escaneou a amante
Que da janela descuidada
Amostrou a silhueta
Ficando a visão na espreita
Da imagem apurada
A chanana e o fedegoso
Plantadas no mesmo chão
Compartilham o mesmo gozo
Do sim diante do não
De toda escalafobética
Cegueira da hermética
Clareira de uma visão

E juntada a gororoba
Na alquimia da cozinha
A linda manjerioba
Nasceu na vagem sozinha
Parenta do fedegoso
De um amarelado garboso
Exposto no fim da linha



CANTIGA AZUL


A solidão da praia deserta
o silêncio
do mar
da areia
do vento
luz tremulando na água
de ondas leves
curtas amenas breves
(como foram tantos amores)
murmurando cantiga
de ninar
de apaziguar
o mar azul da
terra azul
navegando no
céu também azul
meu coração tornou azul.

StelaSiebraBrito

Divagação - Aloísio

Divagação

Não sei se ouço
Instrumento ou voz
Nesse tempo veloz
Ouço o som do vento
Que me (e)leva às alturas
Aí me lembro de criaturas
Límpidas demais
Vivendo em outras planuras

Mas é hora de aterrissar
Pois toda divagação
Uma hora vai terminar


Aloísio

O Perdão - Por Magali de Figueiredo Esmeraldo

Quem pratica o perdão tem mais condições de alcançar a paz e a felicidade. As pessoas não são perfeitas e se não soubermos aceitá-las com seus defeitos, não praticaremos o perdão e não aliviaremos o nosso coração do peso da mágoa. O coração de quem perdoa se torna mais leve. No Evangelho de Jesus Cristo segundo Mateus, 18, 21-35, quando Pedro pergunta a Jesus se devemos perdoar nosso irmão, até sete vezes, Jesus responde: “não lhe digo até sete vezes, mas até setenta e sete vezes sete.” O número sete na Bíblia significa a plenitude. Portanto, devemos perdoar infinitas vezes.

Depois que respondeu a Pedro, Jesus narrou uma parábola comparando o Reino do Céu com um rei que resolveu acertar a conta com seus empregados. Jesus contou que um servo devia uma quantia de dez mil talentos ao seu rei e não tinha condição de pagar a dívida. Era uma quantia muito grande, pois cada talento equivalia a 34 kg de ouro. O empregado pediu um prazo e implorou compaixão. O rei perdoou sua enorme dívida. Mas esse servo saiu e encontrou um dos seus companheiros que lhe devia uma pequena quantia e exigiu o pagamento, agarrando-o pelo pescoço. Mesmo que o companheiro de servidão lhe implorasse por compaixão, ele o entregou à prisão. O rei sabendo dos atos desse servo zangou-se, pois ele não teve a mesma compaixão com o seu companheiro. Por isso mandou entregá-lo aos torturadores, até que ele pagasse a dívida.

Não podemos comparar as ofensas que cometemos contra Deus àquelas que os outros cometem contra nós. Jesus observou que como o servo que não tinha misericórdia, o Pai não perdoará nossas faltas se não perdoarmos nosso próximo.

Sabemos que o ódio somente prejudica a pessoa que não sabe perdoar. O perdão é também a outra face do amor e o mundo seria muito melhor se todos nós soubéssemos praticar o amor e perdoássemos nosso irmão infinitas vezes.

Por Magali de Figueiredo Esmeraldo

Sobre o Livro do Azul Sonhado ...

PARTICIPANTES DO LIVRO ( lista enviada p/Stela)

01. Aloísio Paulo

02. Bernardo Melgaço

03. F. Chagas

04. Carlos Esmeraldo

05. Wilton Dedê

06. Tiago Araripe

07. Assis Lima

08. Emerson Monteiro

09. Luis Eduardo

10. João Marni

11. Nilo Sérgio

12. Magali F. Esmeraldo

13. Edmar Cordeiro

14. Pedro Esmeraldo

15. Liduína Belchior

16. Marcos Barreto

17. José Nilton Mariano

18. José Carlos Brandão

19. Lupeu Lacerda

20. Pachelly Jamacaru

21. Manoel Severo

22. João Nicodemos

23. Rejane Gonçalves

24. Stela Siebra

25. Joaquim Pinheiro

26. Socorro Moreira

27. Everardo Norões

28. Marcos Leonel

29. Geraldo Urano

30. Teresa Peretti

31. Ulisses Germano

32. Isabela Pinheiro

33. Zé Flávio Vieira

34. José do vale Pinheiro

35. Rosa Guerrera

36. Vera Barbosa

37. Domingos Barroso

38.Corujinha Baiana

39.Mara Thiers

40.Geraldo Ananias

41. Roberto Jamacaru

42.José de Arimatéa
43. Cristina Diogo
(...)





Cada escritor concorrerá com 2 textos ( em prosa ou verso)
Tiragem : 500 exemplares.
Serão distribuídos com os autores : 250 livros
A outra metade será vendida  para complementar as  despesas de edição.
Prognóstico de lançamento : a partir de junho/2011 

Abraços !

Notícias do nosso livro !!!



O Livro do Azul Sonhado 
Coletânea em prosa e verso

Prefácio  por José Flávio Vieira
Orelha por  José do Vale Feitosa
Dedicatória  por Tiago Araripe - Homenageados: José de Figueiredo Filho e Patativa do Assaré.
Contra-Capa por Emerson Monteiro
Revisora: Stela Siebra de Brito
Capa: Foto de Pachelly Jamacaru

Autores : Os colaboradores do "Azul Sonhado", e alguns convidados especiais.
Em breve editaremos a lista definitiva  dos participantes.Os textos já estão em fase final de revisão.

Acataremos  sugestões !

Qualquer dúvida , comuniquem-se através dos e-mails:
sauska_8@hotmail.com ( Socorro Moreira)
stelasiebra@yahoo.com.br

Colaboração de Fátima Figueiredo



Queria falar com o Banco- Luís Fernando Veríssimo

ASSALTO

- Alô? Quem tá falando?
- Aqui é o ladrão.
- Desculpe, a telefonista deve ter se enganado, eu não queria falar com o dono do banco. Tem algum funcionário aí?
- Não, os funcionário tá tudo refém.
- Há, eu entendo. Afinal, eles trabalham quatorze horas por dia, ganham um salário ridículo, vivem levando esporro, mas não pedem demissão porque não encontram outro emprego, né? Vida difícil... Mas será que eu não poderia dar uma palavrinha com um deles?
- Impossível. Eles tá tudo amordaçado.
- Foi o que pensei. Gestão moderna, né? Se fizerem qualquer crítica, vão pro olho da rua. Não haverá, então, algum chefe por aí?
- Claro que não mermão. Quanta inguinorânça! O chefe tá na cadeia, que é o lugar mais seguro pra se comandar assalto!
- Bom... Sabe o que é? Eu tenho uma conta...
- Tamo levando tudo, ô bacana.. O saldo da tua conta é zero!
- Não, isso eu já sabia. Eu sou professor! O que eu queria mesmo era uma informação sobre juro.
- Companheiro, eu sou um ladrão pé-de-chinelo. Meu negócio é pequeno. Assalto a banco, vez ou outra um sequestro.. Pra saber de juro é melhor tu ligá pra Brasília.
- Sei, sei. O senhor tá na informalidade, né? Também, com o preço que tão cobrando por um voto hoje em dia... Mas , será que não podia fazer um favor pra mim? É que eu atrasei o pagamento do cartão e queria saber quanto vou pagar de taxa.
- Tu tá pensando que eu tô brincando? Isso é um assalto!
- Longe de mim pensar que o senhor está de brincadeira! Que é um assalto eu sei perfeitamente; ninguém no mundo cobra os juros que cobram no Brasil. Mas queria saber o número preciso: seis por cento, sete por cento?
- Eu acho que tu não tá entendendo, ô mané. Sou assaltante. Trabalho na base da intimidação e da chantagem, saca?
-Ah, já tava esperando. Você vai querer vender um seguro de vida ou um título de capitalização, né?
- Não... Já falei... Eu sou... Peraí bacana... Hoje eu tô bonzinho e vou quebrar o teu galho.
(...um minuto depois)
- Alô? O sujeito aqui tá dizendo que é oito por cento ao mês.
- Puxa, que incrível!
- Incrive por quê? Tu achava que era menos?
- Não, achava que era mais ou menos isso mesmo. Tô impressionado é que, pela primeira vez na vida, eu consegui obter uma informação de uma empresa prestadora de serviço pelo telefone em menos de meia hora e sem ouvir 'Pour Elise'.
- Quer saber? Fui com a tua cara. Acabei de dar umas bordoadas no
gerente e ele falou que vai te dar um desconto. Só vai te cobrar quatro por cento, tá ligado?
- Não acredito! E eu não vou ter que comprar nenhum produto do banco?
- Nadica de nada, já tá tudo acertado!
- Muito obrigado, meu senhor. Nunca fui tratado dessa...
(de repente, ouvem-se tiros e gritos)
- Ih, sujou! Puliça!
- Polícia? Que polícia? Alô? Alô?
(sinal de ocupado...)
- Droga! Maldito Estado: quando o negócio começa a funcionar, entra o Governo e estraga tudo!

Luís Fernando Veríssimo


O que é viver bem?!


Um repórter perguntou à Cora Coralina o que é viver bem?

Ela disse-lhe: “Eu não tenho medo dos anos e não penso em velhice. E digo prá você, não pense.

Nunca diga estou envelhecendo, estou ficando velha. Eu não digo. Eu não digo estou velha, e não digo que estou ouvindo pouco. É claro que quando preciso de ajuda, eu digo que preciso.

Procuro sempre ler e estar atualizada com os fatos e isso me ajuda a vencer as dificuldades da vida. O melhor roteiro é ler e praticar o que lê.

O bom é produzir sempre e não dormir de dia.

Também não diga prá você que está ficando esquecida, porque assim você fica mais.

Nunca digo que estou doente, digo sempre: estou ótima.

Eu não digo nunca que estou cansada. Nada de palavra negativa. Quanto mais você diz estar ficando cansada e esquecida, mais esquecida fica. Você vai se convencendo daquilo e convence os outros. Então silêncio!

Sei que tenho muitos anos. Sei que venho do século passado, e que trago comigo todas as idades, mas não sei se sou velha não. Você acha que eu sou?

Posso dizer que eu sou a terra e nada mais quero ser. Filha dessa abençoada terra de Goiás.

Convoco os velhos como eu, ou mais velhos que eu, para exercerem seus direitos. Sei que alguém vai ter que me enterrar, mas eu não vou fazer isso comigo.

Tenho consciência de ser autêntica e procuro superar todos os dias minha própria personalidade, despedaçando dentro de mim tudo que é velho e morto, pois lutar é a palavra vibrante que levanta os fracos e determina os fortes. O importante é semear, produzir milhões de sorrisos de solidariedade e amizade.

Procuro semear otimismo e plantar sementes de paz e justiça. Digo o que penso, com esperança. Penso no que faço, com fé. Faço o que devo fazer, com amor.
Eu me esforço para ser cada dia melhor, pois bondade também se aprende.”

"Mesmo quando tudo parece desabar, cabe a mim decidir entre rir ou chorar, ir ou ficar, desistir ou lutar; porque descobri, no caminho incerto da vida, que o mais importante é o decidir."

O olhar de meu pai

Antes dos 13 anos, declarei guerra a meu pai. Eu passara para o terceiro ano do ginásio, mudou o “irmão Marista” titular da classe, e tive a oportunidade de tirar o primeiro lugar, algo que não conseguira nos dois anos anteriores. Fui para casa de boletim na mala e peito estufado, e o velho nem ligou. À noite, no encontro de pais e alunos no Marista, um pai chegou perto de nós, saudou o meu feito e indagou se manteria a colocação. Seu Oscar respondeu irritado: “Problema dele”. Anos depois, Chafik, seu melhor amigo, me contou que ele não se conformara com minha decisão de, aos 12 anos, me tornar jornalista, e não seu sucessor na Farmácia Central.

Desde aquela noite de 1963 um muro ergueu-se entre nós. No mês seguinte caí para 7º da classe, no terceiro mês para 15º, do quarto mês em diante fui o último para o todo e sempre. Puni o seu Oscar a cada prova mal feita, a cada gazeta engendrada, a cada rebelião contra os irmãos. Mas nos momentos cruciais, consegui o seu apoio, especialmente no dia em que o reitor Lino Teódulo foi à minha casa com acusações falsas, em represália à minha militância estudantil. Disse-lhe na cara que ele estava mentindo, e meu pai me apoiou.

Nem isso quebrou as nossas barreiras. Eu chegava em casa antes de meu pai chegar, refugiava-me na tia Rosita na hora do jantar, depois, quando ele descia de novo para fechar a farmácia corria para casa, para dormir antes que ele voltasse de vez. Mas de manhã bebia cada som que ele emitia, cada gesto de ansiedade, andando para lá e para cá no corredor de casa, os gemidos de quem carrega os fardos do mundo. E me punia por não poder ajudá-lo.

Ao longo da vida, guardei em frascos de cristal os poucos momentos de emoção que consegui compartilhar com ele, como o garimpeiro que procura a pepita na bateia. Registrei seu choro na morte da tia Marta, as lágrimas na missa de sétimo dia do vô Issa, seu sogro, a última ida a Poços de Caldas, para ser comunicado da morte de seu melhor amigo, e seu olhar quando divisou a cidade ao longe. Mais tarde, acompanhei seu silêncio quando tia Rosita morreu. Não contamos nada para ele, e ele nunca mais perguntou dela, para não ouvir a resposta que temia.

E me lembrei para sempre do dia em que o critiquei na casa do vô Issa por ter comprado um bilhete de loteria enquanto estávamos acampados por lá, procurando casa para alugar em São Paulo. Ele saiu para a rua, fui atrás e pedi a Deus as palavras que me permitissem explicar o que sentia. Abracei-o, aquele homem alto, chorando, e falei, falei e falei, disse-lhe que ele continuava o centro da família e que minha preocupação era apenas para que não demonstrasse desespero indo atrás de miragens. E só serenei quando ele se acalmou e me olhou com olhar de pai agradecido.

O segundo derrame chegou doze anos depois do primeiro. Só depois de morto e enterrado comecei minha longa caminhada atrás de meu pai. Passei a buscá-lo em cada contemporâneo, em cada amigo. Com as velhas senhoras de Poços descobri o galanteador, com os fregueses mais humildes da farmácia, uma generosidade que nunca pressenti. Com os amigos, a pessoa aberta e alegre que submergiu com a crise da farmácia, mas que continuou sendo o mais gentil dos poçoscaldenses.

E quanto mais o buscava passava a descobrir o inverso, a busca que ele fazia de mim. Diariamente meu pai levava minhas irmãs ao Colégio São Domingos, e, na volta, pegava um amigo meu para almoçar e saber notícias minhas de São Paulo. Antonio Cândido me falou do orgulho com que ele relatava minhas primeiras reportagens. O padre Trajano me contava das notas que levava ao “Diário de Poços” relatando cada vitória em festival, em concurso literário. E minha mãe me contou que, no auge da minha crise de adolescência, ela perdeu a fé no meu futuro, e ele acreditou.

Às vezes sinto o travo da última conversa que não houve, dos beijos que não lhe dei. Mas em algumas noites o sinto ao meu lado, daquele modo silencioso com que ficava com a tia Rosita, sem nada falar, porque palavras eram desnecessárias. Apenas me olhando com aquele olhar de quem finalmente se fez entender.

Autor: Luis Nassif
Postagem: José Nilton Mariano Saraiva

Algumas noites da Bahia - Emerson Monteiro

Havia sempre o que agitar nas noites de Salvador, no tempo em que lá vivi e posso contar, anos da década de 70. Eram ocasiões plenas dos chamamentos de uma cidade maior e cheia das diversões e alternativas mais diversas. Visitei pessoas, lugares; assisti a espetáculos teatrais, musicais, folclóricos; percorri festas de largo, exposições artísticas, palestras, festivais de música, cursos, museus, filmes, gama de permanentes novidades inesgotáveis. Em movimentos contínuos, sobremodo aos finais de semana, jamais reclamaria de rotina ou monotonia, caso avaliasse o período, considerando, no entanto, a saudade que mexia comigo, por dentro, na ausência que sentia de minha família, dos amigos caririenses e das belezas que aqui deixara, o que marcava as lembranças, quisesse ou não. Agora isso acontece no sentido contrário, ao rever pela memória aqueles tempos de tantas presenças marcantes e alegres, súbito deixadas para trás no turbilhão das circunstâncias, ao regressar e aqui permanecer.
Enumerar os principais argumentos das histórias passadas chega como instrumento de analisar algumas delas. Uma noite, no Teatro Castro Alves, por exemplo, assisti ao Balé da China, mostra de música e dança que, de tão longe, veio ao Brasil com grupo formado por mais de 200 figurantes, festa de cores e movimentos que preservo nos arquivos das maiores emoções. Enormes figuras mitológicas chinesas e evoluções impressionantes envolveram a platéia entusiasmada, numa apresentação sem termos comparativos.
Por volta dessa mesma oportunidade, chegaria também o Balé do Senegal, que utilizou as dependências do ginásio de esportes Antônio Balbino, trazendo danças típicas africanas, executadas por centenas de homens e mulheres, em trajes, ritmos autênticos e quadros sucessivos, superlotando e sacudindo o público feliz, turnê que viajaria o mundo inteiro naquela ocasião.
Outras dessas gratas reminiscências ficam por conta de peças e shows musicais montados no Teatro Vila Velha, sempre palco de apreciados eventos, onde se encontravam os amigos e conhecidos da época, pessoas que se relacionavam através dos interesses artísticos e culturais, quando pude admirar grandes valores da nossa música popular, quais Milton Nascimento, Gal Costa, Gilberto Gil, Caetano Veloso, Maria Bethânia, Ivan Lins, Jorge Mautner, Gonzaguinha, dentre outros.
Visto gostar de cinema, usufrui ao máximo as chances de ver filmes raros, no Cine Clube da Bahia, no Instituto Brasil - Alemanha e no circuito comercial, comparecendo a exibições, festivais e seminários.
Então, nestas pinceladas rápidas, quis resumir a rica gama do que experimentei de um turno baiano e suas situações, o que preservo com afeto no íntimo depósito da memória, resultado de caminhadas vividas, e bem vividas, da existência.

Curtas. Liduina Vilar.

Eu sinto saudades de tu
e sei que sentes também
viajo neste sentimento
e os anjos dizem amém!


Saudade é falta de abraço,
de riso, de amor e de cheiro,
não sei se pensas assim
mas eu, com certeza,
sinto e sinto por inteiro.

Final do século XIX- Casamento no Crato - Por Joaquim Pinheiro


Recebi da minha irmã Maria Edith um exemplar da reedição do livro O Cariri, seu descobrimento, povoamento, costumes, escrito pelo Dr. Irineu Pinheiro, cuja primeira edição foi publicada em 1950. Obra belíssima, cheia de detalhes da vida dos cratenses de antigamente. Nas páginas 84/86 descreve uma cerimônia de núpcias, que transcrevo aqui:

“Cedo, às 2 horas da tarde, mais ou menos, batia-se o bombo a chamar-se os músicos, na calçada da casa do Mestre da banda de música local. Três as chamadas com intervalos de 5 minutos de uma para outra. Esse bater de bombo era como um toque de alerta a convocar o povo para partilhar da festa de casamento ou apreciá-la do lado de fora, na rua.
Algumas vezes varriam-se os passeios lageados da cidade até a porta da matriz, cobriam-nos de folhas verdes de mangueira.
Às quatro da tarde começavam a chegar os convidados ao domicílio dos pais da noiva.
Em dado momento, os homens iam buscar o noivo na residência deste e agrupados o traziam à frente de todos.
De volta, postavam-se na calçada, à porta da casa, e ali dando o braço às senhoras, formavam um longo préstito, às vezes de várias dezenas de pares.
Todos, uns atrás dos outros, acompanhavam os noivos a pé, até a matriz da cidade.
Registravam-se em certas ocasiões, na formação do cortejo, episódios engraçados. Algumas damas não queriam dar o braço a este ou àquele convidado, por julgá-lo de condição inferior à sua, por exemplo.
Faziam-se pequenas manobras hábeis, recuos disfarçados, mas, em fim, uma ou outra acabava por aceitar o braço indesejável e incorporar-se ao acompanhamento.
À frente deste, de braços dados, marchavam a noiva e o pai desta, logo após o noivo e a primeira madrinha, em seguida os outros pares indistintamente.
Uma menina segurava a cauda do vestido da noiva e uma outra levava em uma salva as alianças de ouro.
Na igreja, durante o cerimonial, os nubentes ajoelhavam-se em dois almofadões de seda para ali enviados adredemente.
As senhoras que compareciam a essas bodas, vestiam-se de fazendas caras, seda, merino, lã, alpaca.
Naquela época estava na moda o uso supliciante do espartilho. Tanto mais elegantes as mulheres quanto mais delgada a cintura. Algumas apertavam-na de tal arte que, as vezes, desmaiavam.
No patamar, na nave da igreja, em todo o trajeto de ida e volta, uma multidão curiosa a espiar os do séquito, a admirar os vestidos das senhoras, a cochichar bisbilhotices que despertavam risos.
À saída da comitiva nupcial da casa dos pais da noiva e à sua vinda, à chegada na matriz, tocava a banda de música, entusiasticamente, marchas e dobrados.
A noitinha começavam as danças: valsas, as polcas, o galope, as quadrilhas marcadas em francês por alguém, o par marcante.
Não havia entre os jovens de ambos os sexos essa excessiva familiaridade, que existe hoje, tão nociva ao prestígio da mulher.
Assistiam os noivos às danças na sala de visitas, sentados em um sofá, ela, a noiva, com o busto erecto e apertado pelas aspas de aço do espartilho. Um tormento a que nenhuma podia fugir.
Terminavam as festas com o ato de, pela madrugada do dia seguinte, todos os convidados acompanhados pela banda de música irem deixar os noivos na casa que lhes era destinada.
Assim se casavam os de há uns trinta anos atrás.

Joaquim Pinheiro

O agora - Por José de Arimatéa dos Santos

Hoje em dia parece que tudo tem que ser resolvido no exato momento e no afogadilho. Não se pode mais esperar. A paciência mandou lembranças já faz um bom tempo. Será que essa pressa nossa de todo dia é o sinal desse nosso tempo? A ligeireza de tudo atinge até as pequenas cidades atualmente. Não é coisa mais de grande centro. Tudo tem que ser corrido e as filas em bancos, lotéricas e órgãos públicos só aumentam e o que se nota cada vez mais é o stress presente em todos nós. Quando saímos de casa e estamos na rua vem a pressa de motoristas de carro e principalmente de motoqueiros. É difícil de ver um motoqueiro que pilote sua motocicleta numa velocidade razoável. A gente vê uma moto lá longe e quando menos espera já passou por nós. Atravessar uma rua é uma aventura perigosa devido a velocidade de carro e moto. Ah! Tem ainda o cidadão de bicicleta que teima em andar na contramão. Já aconteceu comigo e quase fui atropelado por uma bicicleta quando estava a atravessar uma rua e me preocupava somente com os carros e motos. De repente uma bicicleta freia em cima de mim. Foi por pouco!
Um fato curioso é que a pressa em resolver tudo nos atinge em cheio. Só que nem sempre podemos solucionar nossos problemas devido a muitas das vezes que na hora que estamos para ser atendidos o atendente fala que o sistema caiu ou saiu fora do ar. E haja paciência. E nessa pressa quando estamos enfrentando fila o pior que acho é quando a pessoa que está à frente resolve pagar seus compreomissos e mais ainda do amigo, do vizinho e de mais alguém. Tudo naquele dia e justamente naquele horário. A gente fica impregnado com a pressa que ela nos acompanha até no jogo de futebol no domingo na hora de comprar ingresso e vê o tamanho da fila. Desanima. Só fica na fila pelo amor ao clube do coração e ao charme e bem estar de ir para a arquibancada para gritar, xingar e torcer pelo bom futebol. Engraçado é que quando nosso time está perdendo o tempo é apressado e parece que passa mais rápido. Pois é, essa é a pressa de todos os dias.

Nuances de mim- socorro moreira




O sol despontou, um tanto zarolho. Parece um pirata, cheio de asas. As ruas escondem suas sombras, e clareiam os movimentos de quem passa.
Atravessei a praça, adiantando e retardando compromissos diários. Enfrentei filas. Comprei frutas nas calçadas. Olhei vitrines, experimentei vestido florido. Aspirei meu próprio cheiro, no vento dos meus cachos.
Ideias enroladas... Dispenso os babados. Amigos encontro ao acaso. Sorriem perguntas formais. Sem casos. Problemas escondidos, no banco de trás. Arrasto tempo e sandálias. Compro um brinco, na lojinha da esquina... Balançam meu juízo, mas emprestam-me charme. Café com bolo? Não posso, mas traço! E saio requebrando, na minha saia estampada. Pés descobertos evitam as águas paradas. Vestígios das chuvas, alocados nos buracos... Eu passo!
Pulo feito gata...Quando fui gata? Era uma tonta mulherzinha trepidando saltos no asfalto. Hoje as sandálias me carregam, me levam pra onde os olhos não podem, nem querem.
Tarde de malemolência. Sessão de cinema que adormece. Amores na tela me acordam... São quatro horas. Olho o espelho e vejo uma cara, traquinamente feliz...Mentira de Abril. 
É quase cínico ou triste, o olhar que pisca, nuances de mim.