por José do Vale Pinheiro Feitosa




Viva junto à alma mais próxima e compreenda que a proximidade é a medida da distância. Que a distância que os separa é este movimento maravilhoso da matéria e da energia. A maravilha é apenas esta surpresa porque esta proximidade é tão diminuta entre os dois e é a inesperada distância.

José do Vale P Feitosa



sexta-feira, 1 de março de 2013

A "estranha diligência" de um Magistrado - José Nilton Mariano Saraiva


Qualquer trabalhador que tenha algum vínculo empregatício, do humilde empregado da bodega da esquina ao mais alto executivo de uma grande corporação, sonha com o dia em que poderá oficialmente jogar tudo pro alto, livrar-se da ditadura do relógio, tomar umas e outras sem maiores preocupações, dormir até tarde, viajar por aí, esconder-se em algum recanto inóspito e de acesso se possível impossível, enfim, sonha em entrar de férias, evidentemente que levando a “mobília doméstica” (família) a tiracolo. Pelo menos esse é o entendimento das pessoas consideradas “normais”.

No entanto, como os integrantes do nosso Poder Judiciário não se consideram pessoas normais, mas, sim, o “supra-sumo de uma casta de iluminados”, a viverem num mundo particular, só deles, eis que, no Judiciário cearense surge uma situação curiosa: é que, embora em pleno gozo de férias, o desembargador Rômulo Moreira de Deus, integrante de um dos nossos Tribunais Superiores, deixou-se localizar facilmente e, procurado pelos empresários-dirigentes do Sindiônibus, sem maiores cerimônias houve por bem emitir, em caráter de urgência, liminar favorável aumentando o preço da passagem do transporte coletivo de Fortaleza de R$ 2,00 para R$ 2,20 prejudicando, assim, milhares de usuários do transporte coletivo (a troco mesmo de quê ???).

Questionado publicamente pelo jornalista Fábio Campos, do jornal O POVO, sobre se seria legal tal atitude, Sua Excelência publicou no mesmo jornal, dia seguinte, um extenso arrazoado sobre, onde enumera pareceres de eminentes juristas assegurando não haver nenhum impedimento em tal ação (trabalhar nas férias, concedendo liminar). Não convenceu, tanto que seus próprios colegas de Tribunal não concordaram com o seu posicionamento. Agora, que ficou esquisito, ninguém tem dúvida.

A pergunta é: e se ao invés do forte Sindiônibus, fosse o ilustre magistrado procurado pra conceder uma liminar em favor de algum pobre indigente necessitado, que estivesse dependendo da liberação de alguma grana prá salvar a própria vida, será que Sua Excelência teria sido tão diligente ???

Você, aí do outro lado da telinha, teria opinião formada a respeito ??? 

Papa dando sopa



O Grupo Escolar Capistrano Landuá, em Matozinho, ganhara fama ,na região ,por se tratar de uma escola bastante ortodoxa, destas de dar pesqueiro em Piaget e chulipa em  Paulo Freire. Os matozenses contavam orgulhosos  a grande quantidade de ex-alunos que ganhou importantes cargos em todo o estado, forjada nas rígidas regras do Capistrano. Comerciantes importantes, barnabés e até deputados ! D. Eufrazina, uma das pioneiras da educação na cidade, tinha sido a fundadora do Grupo e devia-se muito a ela a seriedade disciplinar da instituição,  nos muitos anos que a dirigiu. Com a partida da educadora para os campos celestiais, a escola foi, pouco a pouco , livrando-se dos velhos tempos e investiu-se de um certo ar de liberalidade, com os novos diretores que foram se sucedendo. Falamos em liberalidade, mas é importante dizer que era com os freios de disco matozenses, nada para além do que seria permitido num convento ou numa mesquita. Mesmo assim, a tradicional família de Matozinho malhava o pau nas mudanças  e vivia a recordar os bons tempos do quartel de Eufrazina:
                                    --- Aquilo sim é que era escola e não essa putaria: mistura de cabaré com Circo de Cavalinhos !
                                   Reclamava a cidade que o Capistrano já não tinha o mesmo desempenho dos anos gloriosos. Nem lembravam que o acesso à escola havia se ampliado nos últimos anos e não só a classe média estudava, mas adentraram as classes os mais desfavorecidos, com todos seus imensos problemas. Assim, caiu como uma notícia auspiciosa a nomeação do novo diretor do Grupo : Prof.  Bento de Assis. O mestre tinha fama de durão, fora coroinha de igreja, membro da TFP e um dos mais famosos anticomunistas e dedos-duros na época da ditadura  militar. Os bons tempos do Capistrano tinham tudo para retornar. 
                                   Bento fez valer a sua fama de duro como beira de sino. Fez uma reviravolta na Pedagogia. Implantou a velha Gramática de Carneiro Ribeiro, o ensino do latim e do Grego na grade curricular, a matemática tradicional com sua tabuada ( nada de maquininhas) e a velha palmatória como professor adjunto. Geografia e História,   só antigas e com o seu decoreba incluso. Nada de figurinhas, cartazes e muito menos diabo de computador. Mudou ainda a farda,  com a necessidade dos homens usarem calças compridas, sapatos fechados e ceroulas e as mulheres saias longas, com toda a proteção interna :califon, anágua e combinação. Proibiu ainda os homens usarem cabelos longos e as mulheres , curtos. Brinquinho em macho, piercing em moça era motivo imediato de expulsão. Não bastasse isso, Bento modificou totalmente a merenda escolar, trocando o velho mingau de aveia,  por uma sopa de coentro que ele tentava convencer os alunos ser mais saudável, mas confidenciava aos professores que aquilo diminuía o tesão dos meninos, em plena fase perigosa de explosão hormonal.  As solenidades na escola eram uma sucessão de rezas e mais rezas todas, necessariamente, em latim.
                                   Bento tinha ainda uma profunda preocupação com os possíveis desvios dos alunos em fase de formação. Encheu a escola de beatas tentando ensinar os meninos que sexo só depois do casamento; que camisinha era uma passagem pro inferno. Amedrontavam ainda os guris lembrando que o pecado solitário era um assassinato em massa, pior do que no nazismo, pois milhões e milhões de espermatozóides eram sacrificados.
                                   Semana passada, depois de uns oito meses de mandato, estranhamente, Bento renunciou ao cargo. Reuniu os alunos no grande pátio, na hora da merenda,  e explicou que estava velho e cansado e que precisava passar a diretoria para alguém mais novo e disponível.  Os matozenses, depois, comentaram que a desilusão dele teve outros motivos. Mais de dez alunas tinham engravidado no último ano, para seu desespero. Os meninos viviam no Cyber da cidadezinha , criticando-o no Facebook. O estado abriu ainda sindicância por conta de um enorme   desvio na verba da merenda escolar por uma quadrilha montada dentro da escola por pessoas do Núcleo Gestor, da sua mais inteira confiança. Não bastasse isso vários alunos colocaram no You Tube vídeos de transas entre eles ,em festinhas promovidas por eles mesmos,  em fins de semana, sob o nome : “As Taradas do Capistrano”. A gota d´água, no entanto, parece ter sido a divulgação de pretensas cartinhas de amor do nosso sério diretor ,  dirigidas a um servente da escola chamado Valdemarzão.
                                   Enquanto o Diretor avisava, solenemente, os motivos da sua renúncia, os alunos , ouvidos de mercador,  engolindo a contragosto a insulsa sopa de coentro, começaram a gritar em uníssono:
                                   --- Queremos papa! Queremos papa  !

J. Flávio Vieira

Zodíaco – Março – poema de Daniel Lima

                               Março vem
                Quando menos se espera.
 Março é pássaro avoante
                é ave de arribação.

Há de repende uma escuridão no céu
                               Como de chuva urgente.
                Levantam-se cabeças.
          Não há nuvem de chuva,
               Não é escuro do ar.

São pássaros que passam em revoada,
                               é março que flutua,
                é março no seu tempo e no teu céu.

Março é fluido e fluente
                    como o rio de Heráclito.
Mas ao cair da tarde,
                à chegada da noite
março firma-se no chão
como o ser de Parmênides,
é terra em que se pisa, solo firme,
vontade de ficar.

                Fluir, ficar.
Às vezes, penso:
                março fundou a dialética
(a verdadeira, não a nossa,
                a triste pobre nossa
                dialética da consumição).

Março é essa perpétua interrogação    
                               suspensa no ar.
É a resposta não percebida
                senão quando passou.

Março é a véspera
                (não aconteceu ainda).

 Março é o dia seguinte
                (acontecerá sempre amanhã).

Março é o intervalo,
                               a pausa,
                a ansiosa espera,
o olhar perdido na distância,
                               quase desesperado,
                mas o teimoso coração
                              a se dizer: “Ele vem!”

Quem que vem? Quem março espera?
Ele, ela, o amor, a paz,
                a boa serenidade,
                               o calmo desencanto,
                o alegre imprevisto,
                               a vida afinal
                (que nem sempre acontece).

Março é o travo
 que dá sabor à vida
                e elimina
a nauseante doçura original.
A amargura de março.
               Sem ela
ninguém suportaria a vida
medíocre feliz e doce vida demais.

A felicidade é fruta
     que tem sabor e cica.
   Março é fruta e é feliz.

Aprende a saborear com volúpia
a vida e seu travor.

É março que te diz.
                Ama a fruta e seu travo.

Março semeia,
                Março não colhe.

O milharal de março
                Será o milho que assarás
Nas fogueiras de junho.

    Março tem a humildade, a grandeza
da fonte cujas águas te abastecem
    e que te matam a sede
    e de que nem te lembras
                e que até desconheces.

Março é a paixão que olha para si mesma
    e se queima no próprio fogo
                como uma vela.

É preciso traduzir março
                para entendê-lo.

Ele é o gesto
                o código
                     o enigma.

Traduze-o vivendo.
                Simplesmente vivendo.
(Não compliques).

Março é a oculta mão,
                               No entanto estendida
                e que não apertas
porque não a vês, a oculta mão
                               a ti sempre estendida.

               Março é a altura da tua alma.
Cresce para colheres sempre mais
                               no alto,
                a amarga, a saborosa fruta
                    que é março em tua vida.

                           (Daniel Lima in POEMAS. Recife 2010)

 

 

               

Uma mente "arejada" - José Nilton Mariano Saraiva


Está mais que provado que uma das causas determinantes do “festival pedófilo” que permeia na Igreja Católica tem tudo a ver com a insistência da manutenção do ultrapassado dogma do celibato (dentre outros). Em sã consciência, é difícil imaginar que um homem “normal”, mas que instruído a “evitar olhar nos olhos da mulher”, não sinta o sexo manifestar-se vez por outra (mesmo que involuntariamente). Se até os animais irracionais possuem o instinto do sexo, o que dizer do racional ser humano, ante a profusão de beldades que desfilam por aí, inclusive nas Igrejas ??? E aí não dá pra segurar (literalmente) ou refrear o desejo, daí a monstruosa e bestial busca por satisfazer suas necessidades sexuais com crianças inocentes (e aí o pecado passa a ser hediondo, com direito a passaporte vip para o Inferno).
Configura-se, pois, ato grotesco e incompreensível, por parte da Igreja Católica, a absurda exigência que aqueles que com ela “contraem matrimônio”, assumam o compromisso de lhes ser fiel, inclusive via celibato, até mesmo porque, em outras seitas, religiões ou ajuntamentos religiosos, os pastores, padres, ou seja lá o que for, têm permissão pra paquerar, namorar, casar, ter filhos e por aí vai. Então, por qual razão não na Igreja Católica ??? Por que castrar aos seus integrantes a benção de ser pai ??? Não foi o próprio Senhor que ordenou o “crescei e multiplicai-vos” ???
Eis que de repente, em pleno Ceará, como se fora “um estranho no ninho”, um dos mais fervorosos e ortodoxos defensores da Igreja Católica, num átimo de sinceridade e certamente depois de muita reflexão, resolve expor publicamente seu sonho de adoção de uma espécie de “abertura lenta, gradual e segura” dessa mesma Igreja, ao colocar na mesa as seguintes ponderações (ipsis litteris): “Por que não colocar para os papas uma regra já existente para os bispos? A aposentadoria automática aos 80 anos. Afinal, dirigir uma organização com mais de um bilhão de seguidores é uma tarefa que, além das qualidades espirituais e intelectuais exige também muita aptidão física. E esta última condição torna-se difícil de ser encontrada numa ancião”... “A renúncia do Papa Bento XVI me encheu de esperanças para o futuro. Não custa sonhar em grandes mudanças para a Igreja. Em primeiro lugar, sonho com a extinção do celibato. Isto permitiria a ordenação de maior número de sacerdotes, que estariam mais presentes no meio das comunidades carentes”... e “Desejo também a ordenação de mulheres. Quantas Teresa de Calcutá poderiam surgir?”. 
De parabéns, pois, o conterrâneo e católico praticante Carlos Eduardo Esmeraldo por, sem abrir mão das suas convicções religiosas, ter a coragem de expor sem temores o que muitos outros católicos pensam, mas se recusam a extravasar.
No mais, é esperar e torcer para que o substituto do Benedito XVI consiga INSERIR a Igreja Católica no mundo real, contemporâneo, cibernético, atual, através da paulatina revisão dos seus dogmas milenares. Para tanto, a “demolição” do celibato já seria um bom começo.