por José do Vale Pinheiro Feitosa




Viva junto à alma mais próxima e compreenda que a proximidade é a medida da distância. Que a distância que os separa é este movimento maravilhoso da matéria e da energia. A maravilha é apenas esta surpresa porque esta proximidade é tão diminuta entre os dois e é a inesperada distância.

José do Vale P Feitosa



quarta-feira, 27 de abril de 2011


Quando renunciamos aos nossos sonhos e encontramos a paz - disse ele depois de um tempo - temos um pequeno período de tranquilidade. Mas os sonhos mortos começam a apodrecer dentro de nós, e infestar todo o ambiente em que vivemos. Começamos a nos tornar cruéis com aqueles que nos cercam, e finalmente passamos a dirigir esta crueldade contra nós mesmos. Surgem as doenças e psicoses. O que queríamos evitar no combate - a decepçao e a derrota - passa a ser o único legado de nossa covardia. E, um belo dia, os sonhos mortos e apodrecidos tornam o ar difícil de respirar e passamos a desejar a morte, a morte que nos livrasse de nossas certezas, de nossas ocupaçoes, e daquela terrível paz das tardes de domingo.

(em O diário de um Mago)
Paulo Coelho

Marisa Gata Mansa




Marisa Vertullo Brandão, mais conhecida como Marisa Gata Mansa (Rio de Janeiro, em 27 de abril de 1933 — 10 de janeiro de 2003), foi uma cantora brasileira. Começou cantando jazz, como crooner de orquestra. Nos anos 50, graças à sua ligação com Dolores Duran e um namoro com João Gilberto, aproximou-se do movimento da bossa nova, gravando em seu primeiro 78 rotações, de 1953, uma música de João Gilberto e Russo do Pandeiro ("Você Esteve com Meu Bem"). Fez teatro em São Paulo nos anos 60 e, de volta ao Rio de Janeiro, trabalhou em boates e casas noturnas. Depois de um intervalo de quase 20 anos sem lançar um disco, gravou em 1997 o CD "Encontro com Antônio Maria", com músicas do compositor. Também homenageou a amiga Dolores em show. Entre seus maiores sucessos estão "Viagem" (João de Aquino/ P.C. Pinheiro), "Leva-me Contigo" (Dolores Duran), "Tudo Acabado" (J. Piedade/ Oswaldo Martins), "Leopardo" (Vital Lima) e "Caçador de Mim" (Luiz Carlos Sá/ Sérgio Magrão).
O apelido Gata Mansa ela recebeu do jornalista Djalma Sampaio por causa de seu jeito calmo de falar. Nascida numa família entusiasta da boa música, cresceu nesse ambiente que a incentivou a cantar. Foi casada com o compositor e pianista César Camargo Mariano, que compôs em sua homenagem a música Marisa, tema da cerimônia religiosa de seu casamento com o compositor. Uma trajetória marcada por um viés jazzístico, foi crooner do Golden Room do Copacabana Palace e substituindo Dolores Duran no bacará. Típica voz de bares noturnos, cantava no Beco das garrafas, ao lado de outros nomes da bossa nova.

viagem/musical

Quando Tu Passas Por Mim




Quando Tu Passas Por Mim

Composição : Vinicius de Moraes/Antonio Maria

Quando tu passas por mim
Por mim passam saudades cruéis
Passam saudades de um tempo
Em que a vida eu vivia à teus pés
Quando tu passas por mim
Passa o tempo e me leva para trás
Leva-me a um tempo sem fim
A um amor onde o amor foi demais
E eu que só fiz te adorar
E de tanto te amar penei mágoas sem fim
Hoje nem olho para trás
Quando tu passas por mim

Por socorro moreira
*O tempo cura a dor do amor. Mas, "quando tu passas por mim", mesmo na imaginação, eu lembro que te amei ( ou amei?)  demais!

o presente supôe...
o passado afirma
e o futuro duvida...

não falo  quando sinto
não penso quando falo
mas falo  o que penso


a palavra  quebra a magia
façamos silêncio
na leitura do olhar

palavra  e humor
nos intervalos do amor
encanta!

viver um amor
é um conto...
pra depois se contar!

socorro moreira

Ela é maravilhosa !



Maurício Einhorn gravando a vida - Por: José do Vale Pinheiro Feitosa



O som de uma harmônica de boca ecoou entre as palmeiras da praça, desde os espigões do topo delas, passando pela folhagem dos pés de benjamim, carregados de sementes e Lacerdinhas. Como um cosmo, respirava em cada poro da existência até mesmo naquelas bolinhas pretas e duras que são as sementes das palmeiras. Foi quando uma voz, acompanhada pela harmônica, encantou o ambiente:

Alguém como tu, Assim como tu, eu preciso encontro Alguém sempre meu De olhar como o teu Que me faça sonhar...

E, na madrugada solitário, num banco da Praça Siqueira Campos, tive saudades de mim mesmo. Saudades de todas aquelas meninas, com seus olhares dissimulados, que me deixavam queimando de dúvidas. Saudades da minha intensidade, mesmo que sob incertezas, com que as amavas e ainda as amo. Sob efeito da abertura do “show” de gravação do disco “Maurício Einhorn e Convidados”, na noite de ontem, 30 de abril de 2010, na Sala Cecília Meireles. A platéia de amigos e músicos da carreira deste extraordinário instrumentista. À exceção de Billy Blanco, apoiando seu passo trôpego numa bengala, a maioria não faz parte do écran da televisão. São músicos verdadeiros, do cerne da música, do fundo do palco, mas que constroem a maravilha de arranjos que parecem naturais quando são pura criação, aqui e, eternamente, humanas. Naquele estágio em que, efetivamente, se revela o quanto Deus é criatura deles.

Não poderia estar mais bem acompanhado. Uma turma de engenheiros, físicos e matemáticos, todos, músicos instrumentistas. Vivem de suas profissões, mas tocam em seus apartamentos, nos bares da cidade, sem o peso terrível com que os músicos têm que matar o leão da sobrevivência todos os dias. E foi, neste clima, que falávamos das agruras do músico instrumentista: Maurício Einhorn, um símbolo da cultura musical internacional, entre os melhores junto a Jean “Toots” Thielemans, por vezes não tem grana para fechar o pagamento do condomínio do prédio em que mora e o atrasa. Quando aquele homem alto veio ao palco, com sua roupa do cotidiano das ruas do Leme, alto, dominando a cena, era de uma gentileza pura como os carbonos brilhantes de um diamante. Um carinho com os amigos e a platéia em geral só comparado ao seu gesto, quando, no meio da gravação, abre uma garrafa de litro e meio de água mineral, levanta em oferta para o seu público e bebe um gole. Um gesto de educação, tão distante, destes jovens nervosos no palco que parecem o centro do mundo.

É preciso ver. Maurício Einhorn quebrando a vulgaridade dos “shows” de absoluta coreografia, destas bandas caídas, destes artistas de palco, destas embalagens de consumo fugaz, como uma barra de chocolate. Ele tocava, como um ferreiro na oficina, olhava para um músico e outro, se afastava, simples assim, como se caminha na rua, apenas para melhor ouvir e visualizar os sons que aqueles gênios da música extraiam. Da mais pura e intensa fonte humana: Alberto Chimelli, Luiz Alves, João Cortez, Roberto Sion,Dario Galante, Augusto Mattoso e Rafael Barata. Isso acrescido de um dos melhore regionais de chorinho da atualidade aqui no Rio de Janeiro. O disco é uma comemoração especial na vida de Maurício Einhorn. No próximo dia 20 de maio ele completa 78 anos, sendo 73 anos dedicados ao instrumento – ganhou sua primeira gaita em 1937, quando tinha 5 anos. A Sala Cecília Meireles cheia, ainda pediu um bis e ele assim se confraternizou, com todos cantando parabéns. Ele abraçado a todos os artistas. Incluindo seu diretor e produtor Danilo Bossa Nova. E aqui uma variante aos músicos de todo o nosso país, na periferia do mercado de sucessos.

Maurício Einhorn foi a Ubá, terra de Ary Barroso em Minas Gerais para um evento musical e lá encontrou, vendendo livros, o seu produtor atual. Danilo Bossa Nova tivera sucesso como cantor no inicio da Bossa Nova, recebeu o apelido de Altamiro Carrilho. Depois de ter viajado pela América do Sul, acompanhando Dilu Mello, Danilo se apresentou na TV Excelsior, TV Tupi, TV Rio, Boite Plaza, onde começou a bossa nova, na Boite Cangaceiro, cantando com Elizete Cardoso e Rildo Hora. Foi ajudado por Roberto Carlos na divulgação do seu disco nas rádios. No final da gravação do CD, fomos para o Bar do Ernesto com a turma de músicos. Entre ouvir um conjunto que tocava na casa, dançar um pouco, beber e comer, um bom papo sobre música. Ora, vocês não precisam mais arrancar o feijão da terra. O que fazer do tempo? A resposta: o que Maurício Einhorn faz. Uma intensa procura de regiões inalcançáveis de cada um, através do instrumento musical que mais gosta, como se escala o estreito do cume do Everest. Aliás, na altura rarefeita do Everest, se encontra metros abaixo, os pulmões de Maurício Einhorn, sobre o fechamento de um enfisema, adquirido como fumante passivo nas casas de shows em que os músicos instrumentistas, especialmente os jazzísticos, exerciam sua profissão. Aquela mistura entre o espaço fechado, o esfumaçado dos cigarros e o sopro em suas gaitas.

Na volta para deitar-me e dormir, tinha a certeza que assistira a algo muito singular. Em todos os sentidos, especialmente o programa musical, a expressão de arte, mas, também, a possibilidade de que aquilo não se repita tão facilmente. Um evento como aquele, uma gravação, um público e uma divulgação, é algo extremamente difícil e, economicamente, caro. Como o caro em economia só envolve moeda, não diz sobre arte, está aí a dificuldade, não na escassez de oportunidades.

Por: José do Vale Feitosa

A poesia de Artur Gomes



Quintana sempre me dizia

o amor é um rio vermelho de sangue

os caranguejos desovam nos mangues

os rios deságuam no mar

o mário é um poeta solitário

um dia vai pousar em teu aquário

e no outro vai nadar em pleno ar

o amor se esgota pelos mangues

caranguejos não têm veias nem sangue

os rios se evaporam pelo ar

o mário é um poeta centenário

um dia se esfinge solitário

e no outro se transborda pelo mar



jura secreta 14

eu te desejo flores

lírios brancos margaridas

girassóis

rosas vermelhas

e tudo quanto pétala

asas estrelas borboletas

alecrim bem-me-quer e alfazema

eu te desejo emblema

deste poema desvairado

com teu cheiro

teu perfume

teu sabor

tua doçura

e na mais santa loucura

declarar-te amor até os ossos

eu te desejo e posso

palavrarte até a morte

enquanto a vida nos procura






OS DADOS DO DÍA



Deduzem-se

os dados do dia

entre as garras do gamão.

Raro sopro de alegria

sôbolos rios que se vão.

 (Everardo Norões)



A necessária reprodução do esquecimento: conversa com Everardo Norões


Uma das  vozes de maior destaque na poesia brasileira contemporânea, o poeta cearense, radicado em Pernambuco, Everardo Norões, acaba de lançar um livro novo: Poeiras na réstia, publicado pela editora 7letras.

Em conversa exclusiva para a Crispim, por e-mail, Everardo fala um pouco das relações entre poesia, política e contemporaneidade.

***


1) Everardo, algumas vezes conversamos sobre sua experiência como exilado político, durante a ditadura militar. Sem dar nomes, claro, como você via a atuação dos poetas, tanto em Pernambuco, quanto em outros estados, em relação ao regime?

O poeta deve enxergar o núcleo escuro do mundo, o lugar de onde vem a lava incandescente que nos queima e, contraditoriamente, nos alimenta. Outro dia, lendo um texto do filósofo italiano Giorgio Agamben, fui tocado pela maneira como ele observa o conceito de contemporaneidade. Ser contemporâneo, segundo ele, é aderir ao seu próprio tempo, enquanto, simultaneamente, nos distanciamos dele. É como se estivéssemos na claridade e olhássemos também o lado escuro das coisas. Como se tivéssemos sempre à mão um caco de vidro esfumaçado para observar o eclipse. A partir daí, é possível concluir que ser contemporâneo é diferente de ser ‘atual’. Ser atual remete a uma concepção linear do tempo. Mas nossa relação com o tempo é dialética: aderimos a ele; ao mesmo tempo dele fugimos, pois somente nessa fuga podemos senti-lo na sua plenitude.

Temos de ter uma noção dessa totalidade para não observarmos apenas um pedaço do caminho. É por isso que toda grande poesia é política, pois acaba por exprimir uma visão necessariamente crítica.

O exílio é uma espécie de troca de mundos. Você não precisa sair do Brasil para se sentir exilado. Quando você troca de mundo, você guarda um referencial que lhe permite fazer comparações, olhar com mais objetividade os retalhos de sua vida que ficaram para trás, comparar acontecimentos. Ou seja, você tem mais possibilidade de afiar sua visão crítica. Isso não significa, no entanto, que basta você ser exilado ou ter morado em outro lugar para adquirir essa percepção das coisas. Fábio Andrade escreveu uma matéria sobre meu penúltimo livro na qual faz uma observação interessante. Escreveu, salvo engano, que os caminhos da memória são reinventados continuamente, assim como a tradição também deve ser reinventada. No livro do escritor estadunidense Philip Roth (vamos adotar essa apelação, já que americanos somos todos nós...) ele entrevista outro escritor, que eu nunca li, chamado Aharon Appelfeld. E o entrevistado diz alguma coisa parecida: a memória é apenas um elemento menor no processo criativo, a criação é uma criatura independente. O exílio também pode ser social e talvez essa seja uma explicação pelo fato de Pernambuco ter tantos poetas...

Outra vantagem da circunstância de ser exilado é alcançar forças para colocar em questão os cânones ou para romper as peias da tradição. O último livro de Ronaldo Correia de Brito, Galiléia, a meu ver, deve ser lido sob esse prisma. O ‘sertão’ de Galiléia (coloco de propósito entre aspas) não é mais sertão. É como no Azulão, de Manuel Bandeira. Nosso sertão acabou. As relações mercantis (falo aqui das relações mercantis do capitalismo selvagem, não daquelas das gerações passadas) destruíram boa parte do que muita gente ainda continua a cultuar, como se a sociedade fosse imutável. Ora, a própria Igreja católica está em vias de desaparecimento, pelo menos naquela forma institucional em que a víamos, com padre, coroinha, sacristão...

Walter Benjamin escreveu uma espécie de parábola, que consegue resumir tudo isso. Está incluída no texto sobre seu conceito de história. Fala do angelus novus, um anjo que ele observou num quadro de Paul Klee. O anjo olha fixamente alguma coisa que ficou para trás, para um passado. Enquanto acompanhamos os acontecimentos, o anjo vê apenas a catástrofe e, conforme escreve Benjamin, quer acordar os mortos, juntar os pedaços dos escombros. Ao mesmo tempo, uma tempestade sopra do paraíso, abre as asas dele com força e o lança em direção ao futuro, amontoando ruínas que atingem o céu. Essa tempestade, segundo Benjamin, chama-se progresso. Ora, quem venera a tradição, teme a tempestade. Ficará imobilizado, a contemplar as ruínas...

2) Me parece, inclusive, que uma parte da nossa arte e literatura atuais parece estar imobilizada nestas ruínas. Muitos poetas e artistas criam tentando resgatar uma função “salvadora”, “revolucionária”, da arte. Por outro lado, vejo também, principalmente na poesia brasileira hoje, um certo fetiche pelo vanguardismo! Há uma cobrança de experimentalismo, a ponto de poetas de forma mais “contida” serem chamados de “caretas”. É reacionário escrever um soneto? Você acha que os beletristas do século XXI são aqueles que não conseguem sair das ruínas das histórias das vanguardas?

Hoje há muitos poetas ‘sociais’, ‘engajados’. Na conhecida época de chumbo, poucos poetas se manifestaram de forma clara. Um deles foi Alberto Cunha Melo. Para mim, Noticiário foi seu livro de grande impacto. Logo que voltei da África, recebi um exemplar desse livro, um presente do poeta Orley Mesquita. Há algum tempo atrás, Alberto e eu nos encontramos na Biblioteca Pública e eu lhe disse de minha preferência por Noticiário. Ele concordou. Seu poema sobre a seção de obras raras estava na sala onde trabalhava naquela Biblioteca. Deveria ser distribuído e afixado em todas as salas de leitura. Mas Alberto é um poeta importante não apenas porque sua poesia teve força de denúncia, mas pela maneira original como essa denúncia é posta.

Não procuro fazer poemas ‘políticos’. Quando escrevo que as ruas com nomes de coisas são mais humanas, como o poema “Estátuas”, de meu penúltimo livro, Retábulo de Jerônimo Bosch, penso que há uma ‘leitura’ a ser feita em torno dos significados. Um poema pode ter uma conotação política mais forte sem adotar um discurso marcadamente contestatório. Hoje em dia a poesia deve denunciar de forma original a ‘racionalidade’ que transformou o ser humano em mero homo oeconomicus, uma ‘mutação antropológica considerável’, para usar a expressão de Cornelius Castoriadis. A crise que está sendo apregoada [a entrevista foi realizada em janeiro de 2009] - será que não vivemos constantemente em crise? - vai colocar novamente em questão certos paradigmas. Antes de qualquer coisa, deveríamos nos perguntar: isso também não ocorreu em 29? E por que depois houve uma Segunda Grande Guerra? E por que logo tudo foi de novo ‘esquecido’? É que a lógica da racionalidade capitalista tanto funcionou em Auschwitz como funciona em Israel; tanto funciona para o kit eletrônico previsto para ser consumido em determinado tempo - um computador, por exemplo - como para os armamentos sofisticados usados na Guerra do Iraque. O esquecimento, o esquecimento histórico, é uma necessidade para a reprodução desse paradigma. Para quem escreve ficção ou poesia, o que nos cabe é inventar formas que desmascarem essa ‘racionalidade’ e inscrevam o ser humano em outra dimensão, na qual o sensível de sua natureza essencialmente criadora possa se manifestar.

Observo que muitos escritores da nova geração têm uma atitude de respeito profundo para com a literatura. O que significa isso? Que não se contentam com o brilho da novidade e estudam atentamente as transformações do mundo das letras com a rapidez e a leveza que o novo século passou a exigir. Acho que ao fazer assim, permanecem atentos ao símbolo com o qual Italo Calvino saudou o novo milênio: “o salto ágil e imprevisto do poeta-filósofo que sobreleva o peso do mundo, demonstrando que sua gravidade detém o segredo da leveza, enquanto aquela que muitos julgam ser a vitalidade dos tempos, estrepitante e agressiva, espezinhadora e estrondosa, pertence ao reino da morte, como um cemitério de automóveis enferrujados”.

3) Como o poeta deve se posicionar em relação às pautas do seu tempo?

Há poetas entre nós que sempre se posicionaram em relação ao seu tempo, sem nunca descuidarem da forma, da síntese forma/conteúdo. João Cabral de Melo Neto, embora nem fosse militante político, foi o mais contemporâneo. Ele e Joaquim Cardozo foram, a meu ver, os dois grandes poetas brasileiros do século que passou. Um grande problema para os poetas de nossa geração foi tentar se desvencilhar das influências deles, sobretudo a de João Cabral - porque Joaquim Cardozo foi muito pouco divulgado. A grande poesia de João Cabral não é a que tem conotação mais abertamente política, como Morte e Vida Severina, mas os poemas sobre alguns toureiros, os da educação pela pedra, aqueles que rompem, de certa forma, com os cânones da poesia tradicional. Ele assume o lado ‘feio’ do poema, sem a chatice do violão de rua ou do poema sujo.

João Cabral e Joaquim Cardozo não são poetas ‘brasileiros’ ou ‘pernambucanos’. São poetas universais. Costumamos insistir na ‘pernambucanidade’ de João Cabral. Deveríamos, isto sim, dar como exemplo sua ‘universalidade’. Atribuir essa ‘pernambucanidade’ a um poeta como ele é apenas uma tentativa conservadora de recuperar e, ao mesmo tempo, amesquinhar, sua grandeza. Lembro que ele viveu muito tempo na Espanha, onde ainda hoje é reverenciado. Em plena ditadura franquista, sua casa em Barcelona foi uma espécie de guarida para intelectuais do porte de Joan Miró, Joan Brossa ou Angel Crespo.


(Cristhiano Aguiar)
29.09.2010


por lupeu lacerda



na faixa de gaza o borba gato é um delírio de um só. um poeta encalacrado em suas veias envelhecidas pela nicotina bela e maldita. vontade de beber vinho. vontade de ser baudelaire e chamar por satanás. vontade de ser ginsberg e vomitar ácido nas paredes da américa. vontade de ser lupeu e ter um microfone psicografando morrison. vontade de explodir o borba gato. e construí-lo em um desenho menos es-tru-tu-ra-do. vontade: essa coisa que é ao mesmo tempo o umbigo, e o fio do impossível. entre o nada e a coisa nenhuma... preccisaria beber uma ayhuasca, ou fumar um do bom pra entender um cara desses. lobo bom em ser mau, come chapeuzinho, nega o filho, exige dna.

"Medalhões" e "Idiotas" - José Nilton Mariano Saraiva

Conta bancária recheada de dólares e euros (daí a incessante “caçada” que lhes empreendem as sempre atentas e expeditas “marias-chuteiras” da vida), já dobrando o “cabo da boa esperança” (em termos de idade avançada), barrigão protuberante (pelos excessos cometidos), indisposição pra queimar calorias (via extenuantes exercícios físicos), farras homéricas que varam a madrugada (predominantemente regadas ao “sexo muito bem pago” e drogas em profusão), “eles” não mais encontram espaço no exigente mercado europeu e só então (e ainda assim), cansados e esbaforidos, lembram da terra-mãe, onde tudo começou, e aonde, a partir de agora, poderão “enganar” ad eternum.
Para tanto, à espreita e de prontidão, já se acham mercenários empresários e corruptos diretores de clubes, sempre acessíveis e dispostos a usufruírem robustos dividendos (financeiros e preferencialmente políticos), que se encarregam de “forrar a mão” de mafiosos jornalistas (e como proliferam, na imprensa esportiva tupiniquim), a fim que notícias sejam paulatinamente plantadas, anunciando-os como o “herói saudoso” que retorna ao “time do coração” (ou até mesmo – por que, não ??? - para atuar no arquirival, numa prova inconteste de “profissionalismo”).
Movida e estimulada pela paixão e irracionalidade latentes, insuflada a torcida do tradicional clube de pronto adere à causa, tratando de relembrar lances e gols de placa de um passado distante, que (intimamente sabem) jamais se repetirão (mas que o fanatismo se encarrega de obscurecer).
Após a assinatura do contrato milionário, a revelação-surpresa e desprovida de qualquer ética ou escrúpulo: como estão “sem ritmo de jogo”, necessitarão de dois a três meses pra “entrar em forma e ficar na ponta dos cascos”; e aí é que se constata que na realidade se acham mesmo é “bichados”, irremediavelmente “baleados”, sem a mínima condição de agüentar o tranco e, pior, indispostos para tal desiderato (porquanto visceralmente “dependentes” potenciais de “substâncias não recomendáveis”, herança maldita do “velho continente”). Ainda assim, durante o “sacrifício” a que se submetem (meros exercícios físicos), exigem o recebimento dos estratosféricos salários religiosamente em dia (como se tivessem a exercer a profissão) enquanto que - como ninguém é de ferro - as “baladas noturnas” se sucedem numa freqüência impressionante, com muito luxo e desperdício (para a infelicidade e protestos dos novos vizinhos (de um lado), e felicidade completa de determinadas “atrizes globais” (de outro); tanto é que uma delas, das mais famosas e requisitadas – e não caiam pra trás – chegou a receber “um apartamento”, pelos relevantes serviços prestados em uma única noitada).
O resto do script todo mundo já sabe: em campo, enquanto os companheiros literalmente “se matam” de correr atrás da “gorducha” (bola), eles “passeiam” ou “caminham” sem maiores preocupações; se alguém tem a “infeliz idéia” de endereçar-lhe o instrumento de trabalho (bola), há que fazê-lo “a domicílio”, sem que haja a necessidade de maiores esforços de sua parte, porquanto, se empreenderem algum excesso poderão romper algum vaso ou tendão; depois do “desfile” pelo tapete verde (por uma ou duas míseras partidas), alegam “cansaço” e exigem repouso absoluto de um ou dois meses para se “recondicionarem” fisicamente (sem que, no entanto, deixem de freqüentar assiduamente a noite). Viajar com os companheiros para atender a algum compromisso do clube, numa praça razoavelmente distante ??? Nem pensar (quando convenientemente não estão na “fisioterapia”, sempre têm que cumprir algum compromisso particular, sob a proteção da imprensa e Diretoria do clube).
E assim esses (podres de rico) “medalhões-heróis” forjados pela mídia esportiva tupiniquim levam a vida na maciota, certamente que gozando da cara dos (lisos)
“idiotas” - todos nós).
Agora, aqui pra nós: você já parou pra imaginar quanto custou cada um dos raros gols de autoria do tal Ronaldo “Pensão” Nazário, Adriano “Pó Puro” ou Ronaldo “Moleque” Gaúcho, depois que retornaram à pátria amada ???
Quanto ???

O GRÃO DE BICO GERA FELICIDADE


O grão-de-bico é um alimento mais rico do que o feijão em muitos aspectos. Entre 20% e 30% de sua constituição é pura proteína. Além disso, possui fibras, zinco, potássio, ferro, cálcio e magnésio. Se for consumido todos os dias, ajuda no ganho de massa muscular, reduz o nível de colesterol ruim e regula o intestino.


Mas sua qualidade mais famosa é a de gerar felicidade: o grão-de-bico possui mais triptofano do que o feijão, o mesmo aminoácido essencial que faz do chocolate uma ótima fonte de bem-estar e redução do estresse.
“Em seres humanos com o metabolismo normal, o aumento do consumo do grão-de-bico tem como consequência uma maior produção da serotonina”, destacam Leonardo Boiteux e Maria Esther de Noronha Fonseca, pesquisadores do Laboratório de Melhoramento Genético & Análise Genômica do Centro Nacional de Pesquisa de Hortaliças (CNPH) da Embrapa Hortaliças, em Brasília.
Por ter ômegas 3 e 6, é indicado para prevenir doenças cardiovasculares. E quem tem diabetes ou está lutando contra a obesidade também pode se beneficiar da leguminosa. “O alimento possui carboidratos complexos, ou seja, que possuem uma metabolização lenta no organismo. Por também ser rico em fibras, proporciona sensação de saciedade e a pessoa só vai sentir fome, após consumi-lo, bem mais tarde”, explica a nutricionista baiana Solange Carvalho.
As sementes do grão-de-bico também acumulam mais fitoestrogênios do que as do feijão – substâncias que têm ação preventiva na osteoporose e de problemas cardiovasculares. “Os fitoestrogênios também são usados na reposição hormonal após a menopausa”, concluem os pesquisadores, destacando uma importante característica do alimento.

Homus tahine




* Ingredientes
* 1 kg de grão de bico
* 4 colheres (sopa) de molho de tahine
* 2 dentes de alho amassados
* Suco de limão a gosto
* Azeite o quanto baste
* Sal a gosto


* Modo de Preparo

1. Deixar o grão de bico de molho de um dia para outro
2. No dia seguinte trocar a água e colocar para cozinhar em pressão, ou não, até ficar macio
3. Passar no liquidificador com um pouco da água do cozimento, não deve ficar um creme mole
4. Reserve
5. Desmanche o molho tahine com o limão, misture o sal e o alho amassado
6. Bata com um garfo até ficar um mingau, se precisar acrescente um pouco de água
7. Misture o azeite
8. Junte com o creme de grão de bico misturando bem
9. Prove o sal e o limão
10. Regue com mais um pouco de azeite e enfeite com folhas de hortelã ou salsinha picada
11. Sirva com pão sírio, italiano ou torradas

CHOVE- por Rosa Pimentel Guerrera



Chove !
Deitada olhos os pingos
que tamborilam na vidraça da janela

parecendo mensagens que soam aos meus ouvidos
como o ruído das teclas de um computador.
Uma palavra aqui,
Uma frase acolá,
Uma saudade mais adiante,
E muitos poemas inacabados.

Chove!
E a impressão que tenho
É que o teu suor banha de novo o meu corpo.

Chove !
E nos meus lábios ainda
o sabor de teus beijos molhados.

Chove!
E nas poças d’ água que se espelham nas ruas...
Nossos pedaços rolam anônimos .
Fragmentos de um amor que nunca morreu!
 por rosa guerrera

Dê-me um cheiro meu bem! - por José do Vale Pinheiro Feitosa




Um dia, nos sertões do Fidelis, em Potengi, fazia um inverno exuberante. Um amigo sobre a parede de pedra e cimento de uma barragem examinava, sentado com olhar atento, a placidez enganosa das águas naquela manhã fria. Aquelas águas transparentes eram, também, densas, quase escuras, embora se vissem as piabas nadando. Talvez a profundidade adensasse aquela transparência. Por isso mesmo as águas convidavam meu amigo a se agasalhar no seu frio leito. O sol do sertão já se apresentara com todo o vigor.

Ele inteiramente dividido, um olho na água e outro para os que já estavam em pleno mergulho, nadando, dando cambalhotas no ar e tibungo no líquido da vida. Quase mais ninguém deixara de pular na água, apenas ele numa postura curiosa. Entre o recolhimento e lançar-se ao espaço. Era coreografia complicada, merecedora da dança moderna, a clássica não se dividiria assim, pois apenas é. Uma única coisa e meu amigo eram duas. Uma vontade de pular e outra de se resguardar do frio.

Eis que de sua mais profunda reflexão veio, pelas vias tortas da psicologia de primeiro ano de faculdade, toda a explicação para aquela contradição. Disse ele: o ego quer, mas o superego não deixa. Pois é disso que falo: o ego quer a transformação, mas o superego quer a conservação. Um dia me agarrei a um neologismo que inventara para a ocasião cineperservação. É com isso que me divido.

Quando foi a última vez que você já viu alguém pedindo um cheiro? Pois era habitual, especialmente no nordeste, se pedir um cheiro. Cheirar o outro. Sentir o prazer dos odores naturais que se exalava nele. Quando quem cheirava era colibri e quem se deixava cheirar era flor da humanidade.

Um cheiro profundo, querendo capturar todo o espectro do aroma que ia da derme, atravessava todo o corpo e chegava aos sentimentos mais afetivos que existiam. Os mais velhos, olhando aquelas crianças em reboliço a dizer: dá cá um cheiro, meu bem! E da agitação mesmo em que se encontrava, ela expunha a sua cabecinha e o adulto, ao cheirá-la, quase que novamente a batizava com as palavras do amor. E lá ia ela, sabendo-se protegida, mas não interrompida em seu correr.

Mas veio o cinema americano com aqueles beijos de final de cena. Confesso que sempre os interpretei como a conciliação de tantas tentativas frustradas na narração. Os beijos eram a senha para o desfecho. Quando mais nada resta para contar. E as cortinas se fechavam, as luzes se acendiam com toda a exuberância da mesmice cotidiana.

Quando a linguagem erótica penetrou a cena, o beijo se tornou a volúpia do desejo sexual. O começo de longas e repetidas cenas de prazer e desejo. A estética se resolveu na linguagem do ato sexual e o beijo foi além. Passou a ser troca de saliva, confusão de lábios e línguas, não um saboreio, mas a digestão dos sentimentos de ambos. No final apenas o restolho digestivo.

E com isso ninguém mais pede um cheiro, cheira e captura a essência dos perfumes do outro. Agora, como bem diz o cinema americano, é o beijo. E o que mais choca que enquanto o cheiro era a expressão de um sentimento através dos sentidos do olfato, igualmente não se pode afirmar que seja o beijo relacionado a qualquer sentido. Existem as apelações dos cremes e óleos, mas aí nem mais beijo é.

Uma nesga de céu azul - por José do Vale Pinheiro Feitosa



Chover vários dias isso conhecemos. Andaremos com os pés molhados, os braços respingados. Isso não tem importância: chover vários dias em seguida.

Chover como torneira aberta afoga a vigília do presente e apreende a esperança do próximo minuto. Como choveu no Rio de Janeiro! Tanto que agora estou com a alma a comemorar uns pequenos rasgos de azul no céu. Nem meia hora se passara quando tudo estava fechado com as águas escorrendo, se infiltrando, inundando.

Informam que apenas em quatro horas caiu mais de 100 milímetros na região metropolitana do Rio. Em alguns bairros isso ultrapassou os 150 milímetros. E até compreendo a praticidade dos meteorologistas medindo as chuvas em milímetros, mas nada mais irreal nestes metros que nos afogam.

Eu deveria me encontrar de férias em algum lugar e nem li a revista O Cruzeiro, pois não me lembro de ter ouvido falar nas enxurradas de 1966. Mas todas as demais, a de 1988 e 1996, eu estava com água na cintura. Se me perguntarem o momento mais impressionante que vivi, foi em 88.

Era um domingo molhado. Pingara a noite toda. Sentamos na cozinha para tomar café por volta das 08h30min. A janela da área de serviço que se abre também para a cozinha mostra a Pedra da Gávea e dos Dois Irmãos. Qual foi o nosso susto simultâneamente no primeiro gole de café. O céu estava literalmente enegrecido. Mas não era apenas a cor, era uma massa sufocante que lentamente se deslocava em nossa direção. O inevitável tomaria nossas vidas.

E a chuva caiu com torneiras abertas. Não eram pingos, eram milhares de jatos disputando cada milímetro do terreno. A rua da janela da frente se tornou uma cachoeira. Nosso prédio sustenta-se sobre pilotis. Descemos até ele para verificar se algo de anormal ocorria. A Clínica Santa Genoveva já fora soterrada matando dezenas de idosos.

Hoje duas imagens vindas do noticiário se fixaram. Eram duas mulheres jovens. Uma negra, com um casaco branco com desenhos pretos, toda molhada, ainda rindo e dizendo que tentara chegar até ao trabalho, não dera e, agora, patinava nas poças no rumo de casa. A outra sob um guarda-chuva, os pingos em volta, era de classe média, na beira da Lagoa inundada, inteiramente desorientada. Olhou para o repórter e perguntou se na direção que viera daria passagem. Não tinha como chegar ao trabalho e não sabia o que fazer.

A palavra subentendida em certos discursos da mídia, especialmente a Míriam Leitão no Bom Dia Brasil de hoje: é o aquecimento global. Não é. É o de sempre: populações migrantes para as grandes cidades, com o espírito selvagem do capitalismo a dar um jeito, qualquer jeito em suas vidas. Nas encostas volúveis, seja por necessidade ou pela vista e prestígio com as mansões dos ricos.

O Aquecimento Global pode ser uma verdade, mas nas circunstâncias não passa de empreiteiro de obras. E como gostam de uma obra superfaturada!

por José do Vale Feitosa