por José do Vale Pinheiro Feitosa




Viva junto à alma mais próxima e compreenda que a proximidade é a medida da distância. Que a distância que os separa é este movimento maravilhoso da matéria e da energia. A maravilha é apenas esta surpresa porque esta proximidade é tão diminuta entre os dois e é a inesperada distância.

José do Vale P Feitosa



sábado, 28 de dezembro de 2013

O nosso (anti) herói do sertão - José Nilton Mariano Saraiva

Todo mundo sabe que o Ceará enfrenta uma das maiores secas da história. Que tal drama comoveu milhares, ao se constatar que tem gente no interior bebendo água misturada com lama, porquanto os açudes e reservatórios de há muito chegaram aos fundos lodosos dos poços.

Pois, ainda assim, o Governador do Estado resolveu inaugurar uma “adutora” no município de Pentecoste, a poucos quilômetros de Fortaleza. Adutora cuja tubulação é composta daqueles “canões” grossos de PVC, com diâmetro de 20/30 centímetros em toda a sua extensão.

Só que, durante a inauguração da dita-cuja, “espocaram” vazamentos de tudo que é lado na tubulação, em razão da... “pressão da água” (é vero, senhores, acreditem). Assim, em pleno cenário de fome e desolação, onde literalmente as pessoas morrem de sede, a pressão da água (durante a inauguração da adutora) foi tão grande que os canos de PVC não suportaram e... tome água jorrando aos borbotões (mais um daqueles milagres fajutos de Cícero Romão Batista ???).

Fato é que logo desconfiaram da “qualidade” dos “canões” de PVC utilizados na obra, e que possivelmente alguém pagou por um produto de marca e recebeu um genérico, presumivelmente fabricado no Paraguai, daí o espetáculo inesperado.  A oposição, claro, botou a boca no mundo.

E aí, de pronto, surge a intrépida figura do salvador da pátria, nosso (anti) herói do sertão. Fingindo-se incomodado, sua excelência o Governador do Estado, Cid Gomes, resolveu “fiscalizar” a obra, evidentemente que acompanhado de um exército de áulicos de plantão e de uma autentica caravana de  jornalistas, cinegrafistas e por aí vai.

E aí aconteceu o inimaginável, o intraduzível, o surrealismo em toda a sua pujança: deixando a formalidade de lado, sua excelência se desvencilhou da roupa tradicional, pôs um “bermudão” de cor berrante e, alegando querer ajudar de forma mais efetiva e presencial, mergulhou e submergiu diversas vezes em um tanque, ferramenta à mão, com o intuito de “fechar um registro” (aqueles “torneirões” enormes usados em adutora) a fim de obstacular a derrama do precioso líquido, possibilitando aos seus “colegas-bombeiro” complementar o serviço.

Naturalmente que tudo isso foi “filmado para a posteridade”, de sorte que as gerações futuras possam tomar conhecimento que (em plena seca), graças à atuação do “governador-bombeiro” foi sanado um sério problema de falta d’agua no município de Itapipoca (por que não cunhar uma placa comemorativa, a ser afixada no local, sob o título de “governador-bombeiro” ???).

O espetáculo, desnecessário, deprimente e repulsivo sob todos os aspectos, apenas reforça o conceito pra lá de negativo que os políticos brasileiros ostentam ante a população.


Quanto ao nosso (anti) herói do sertão, governador Cid Gomes, pontuou seu currículo com mais uma atitude reprovável, dentre as muitas que já afloraram na vigência do seu mandato. Afinal, isso é falta de respeito para com seus conterrâneos, ou o atestado eloqüente do pouco caso que faz da inteligência do eleitor cearense.    

FEIRA LIVRE - José do Vale Pinheiro Feitosa

O Rio de Janeiro é uma narrativa esticada. Convivem atos e fatos coloniais, imperiais e republicanos. Da velha, nova e atual República. E não falo de molduras como o casario e ruas antigas. Falo do metabolismo cotidiano da cidade.

Por exemplo, as Feiras Livres. Nos bairros, na véspera, os carros estacionados em certas ruas devem procurar novo repouso. Na madrugada começa a algazarra da montagem de barracas, caminhões estacionando, caixas de hortifrútis com baques se empilhando nas calçadas.

Carros não passam nas ruas, não chegam e nem saem das garagens. A rua é da feira. Os moradores delas são parte da dinâmica. Suas calçadas, seu trânsito a pé, seu silêncio e sua portaria fazem parte da apropriação coletiva da feira. De um coletivo a serviço da atividade mercantil privada e vice-versa.

O esticado Carioca não é um painel de tempos. É a maneira como o hoje acontece. Uma fusão de contraditórios, misturando aparências com interioridades distintas. Ao mesmo tempo um tipo estranho numa mentalidade conservadora. No mesmo corpo a vanguarda e o atraso. E usar o que deseja sem buscar a coerência. Viver o nicho zoando pelos habitats estranhos.

Com o carrinho de feira pela calçada, na rua Jardim Botânico, dou de cara com uma jovem gorda estampando uma camisa com a logomarca da revista Vogue. A revista fashion. Mas quem traduz de fato aqueles dizeres em inglês das t-shirt? E um pintor de paredes com uma camisa de uma campanha eleitoral de dez anos passados.

Nos botequins da redondeza, aqueles que ainda restam, os bebedores contumazes ausentam-se da monotonia dos quitinetes com uma garrafa de cerveja de volume incerto, mas um copo espumando já pela metade. E nunca ficam cheios.

E na barraca de pastel, uma juntada de fregueses pedem, esperam, conversam enquanto o motor de 4 HP espreme o bagaço que esvaziou-se num córrego de caldo de cana. Quem é mais importante? O Caldo de Cana? O pastel? A espera? Ou a conversa?

Os caminhões do peixe, do frango, do porco e até do carneiro. Linguiças. Ovos. Sangue para o molho pardo. Miúdos para o banho de vida insalubre e a retirada da pele das peças que dizem saudável. Dizem, é assim que a regra se interpõe.  

E uma rua plena com as duas margens de verduras, legumes e frutas desde a típicas dos finais de ano como a Lichia e as Cerejas até a velha banana do cotidiano. Barracas de temperos. Dos queijos, coalho, minas canastra, manteiga, parmesão e outros mais que somam-se à natureza de cada comerciante.

Para os sem tempo e preguiçosos, sacos de macaxeira descascada e em pedaços, sacos com mixes de legumes cortados ou de apenas um, além de outros ralados de modo a superar a lavagem daquele processador de legumes que foi uma maravilha na compra, mas hoje é estorvo no armário da cozinha.
E os comerciantes precisam alertar para o seu produto. Eles gritam, fazem piadas, têm seus refrãos. O marketing mais avançado contempla deste a rasgada satisfação com a venda ao repetir inúmeras vezes a palavra maravilha, maravilha, maravilha ou mentir sobre a qualidade do seu produto sem esquecer da piada que o denigre. Por exemplo, o senhor quer um mamão maduro, de vez ou um mamão podre.

E é fatal. Você se torna freguês de algumas barracas. A do Grandão por exemplo. Uma lábia de fazer inveja ao um padre ou a um pastor da liturgia da prosperidade. O melão é ótimo, só ele o tem, vem de Itaiçaba no Ceará. A manga dele não vem de São Paulo mas de um lugar outro onde é mais doce. Na verdade o bom sabor nos coloca no conhecimento da excelência daqueles lugares sem que nunca se tenha qualquer base que a sustente. A não ser a boa capacidade de escolha do Grandão na Ceasa.

E como um cidadão do século XIX, vou de volta para o meu canto, puxando um carrinho de compras cheio dos produtos da era da biotecnologia. A feira do Rio de Janeiro.