por José do Vale Pinheiro Feitosa




Viva junto à alma mais próxima e compreenda que a proximidade é a medida da distância. Que a distância que os separa é este movimento maravilhoso da matéria e da energia. A maravilha é apenas esta surpresa porque esta proximidade é tão diminuta entre os dois e é a inesperada distância.

José do Vale P Feitosa



quinta-feira, 14 de julho de 2011


algumas coisas

deveriam sumir antes que as víssemos

algumas coisas

deveriam nunca acontecer

algumas coisas

doem como se nunca mais fossem parar

algumas coisas

não deveriam ser sonhadas

algumas pessoas

deveriam

prestar

atenção

nas placas

 por lupeu lacerda
Chego em casa querendo rua
Paredes que se estreitam, como estreitas são
As petúnias na mão da defunta sem nome do jornal nacional
Entro então, como uma samambaia entra
Vaso adentro, sabendo sim, que o vaso é finito e raso
A única luz, uma luz, a porta da geladeira aberta
Frio, frio demais, frio pra caralho,
Quero um frio desses

Stéreos, ok! Graves e médios, ok!
O menestrel fala de rudeza, diz que tudo é solidão
Pessoas indo e vindo, mastigando ausências
Na trilha um ônibus um carro de mão uma guitarra
O sol de dezembro escondido atrás da água
Água de ausência, abrindo buracos assim, assados

Olho o olho da ave que não sei o nome, andina,
Bebo ayahuasca sem liturgia, só em minha viagem
Vejo o que não determino
Vampiros juntos no presépio de um deus menino abandonado
Miração urbana soft
A fogueira acesa, a fogueira,
Solitária na mágica de transformar toras em cinzas

 por lupeu lacerda

TUDO É IMPORTANTE- Rosa Guerrera



Tudo na vida possui a sua importância e sua exata dimensão!.
Não importa o tempo que dure.
Não importa se nele estejam contidas lágrimas, sorrisos, angústias, paixões ou medos .
Tudo que vivemos , tudo que sentimos , tudo que fizemos possui sua peculiar importância dentro de nossos corações.
O riso que acontece hoje pode perfeitamente dar lugar a um choro de saudade, e vice versa.
Em cada sentimento vivido existe sempre histórias ! Histórias que a vida nos fez protagonistas de um círculo vicioso onde vamos repetindo falas e gestos num palco gigante , sujeitos a vaias e aplausos .
Impossível se apagar momentos passados .
Impossível também a tentativa de fugir da saudade.
Impossível ainda esquecermos pessoas que por longo ou curto período de tempo , existiram em nossas vidas .
Tudo realmente possui a sua importância e a sua exata dimensão.
E não importa quando aconteceu , desde que a eternidade possa ter sido vivida e conhecida... nem que tenha sido por um minuto apenas.

Múltiplo solitário José do Vale Pinheiro Feitosa



Há um caroço de milho na calçada. É visto e amarelo. Perdido na malha das pedras portuguesas, brancas e pretas, e Carlos o viu. Quem na Rua da Glória segue, uma multidão de gente, comércio, ambulantes, sebos nas calçadas, papéis e chicletes agarrados ao piso. E percebe um caroço de milho, tem em mente aquilo que está por trás da semente. Tem a perspectiva do milharal, da fantástica explosão de eventos que aquele simples caroço contém. Entre gente, desviando-se, interrompendo-se na caminhada, uma banca de camelô, coisas espalhadas pelo chão, uma esquina suja, prédios decadentes, mendigos, a maré humana das cidades. Carlos subiu a escadaria do Metrô da Glória contrariado. Havia se enganado de estação, ao invés da Cinelândia, por descuido do mergulho na leitura da Play Boy, descera na Glória. Para não gastar mais uma passagem, subiu a escadaria e marchou no rumo do Passeio Público.

Quem de um caroço de milho enxerga a árvore inteira, logo se apercebeu. Há uns duzentos metros, o sol dourava os cabelos de uma jovem alta, magra, calças jeans salientando a bunda de tulipa. Na mesma direção que ele, cruzava a esquina e começava a entrar na rua da Lapa pela calçada da direita. A estreiteza da calçada funcionava como uma passarela de modelos, a barriga esguia, o talhe elegante, os cabelos ondulando ao andar, havia tantos eventos prestes a acontecer no corpo daquela mulher e Carlos, da distância em que vinha, estava com as batidas do coração a mil. Não adivinhava, o doce balançar da cintura multiplicava realizações no rapaz, ele e sua timidez, a pouca beleza, espinhas, barba rala, cabelos longos e desgrenhados. Nem as tradicionais medidas de defesa funcionaram no ar que o Carlos respirava como se quisesse toda a atmosfera de um só ato. A timidez, uma das suas defesas, media-lhe os passos apressados em destino do corpo que azougava todos os olhares, mesmo que de outras mulheres, na velha e puta rua da Lapa. Um sonhador por resguardo, não queria sofrer as decepções que o estado permanente da beleza parca lhe ofertava. Mas Carlos era outro, como um carro de polícia em perseguição de algo, assoviava um samba de Zeca Pagodinho, entrecortado pela pressa de ter cada vez mais perto de si os cabelos de ouro, longos, finos, brilhosos, tramas de uma malha de pescá-lo.

As falhas das pedras da calçada, dobrando os pés, pisando alguma poça de água, dejetos de cachorro, mas Carlos deslizava sobre um tapete de rosas. Deslizava pela trilha dos desejos, dos lábios úmidos, das partes que se juntam para sugar e nos extrair o sêmen das florestas, a multidão do potencial guarda um ao encontro de outro. Nem as tabelas dos botequins, os pratos do dia, as promoções, o vai e vem dos comensais, formavam quadro interrupto para os passos de Carlos na rua da Lapa em trajeto da mais linda traseira que jamais vira, em coreografia andante a menos de cinqüenta metros, cinqüenta metros menos um de cada dois passos de poucos segundos. Menos um e mais uma fantasia nas alças da blusa de tecido fino, branco como nuvens, modulante como elas, espáduas que prometem asas de andorinhas, da qual emerge reto, absolutamente simétrico, largo na base, cinturado ao meio e abrindo-se ao final, depois de carregar de baixo a cima, um canal colunar estreito pelo qual sobem os melados hormonais de Carlos, pescoço de paixão. Os olhos não poderiam se desviar da nuca, os cabelos eventualmente levantados pelo vento que vinha da Glória, uma ou no máximo duas vezes, deram o senso de eternidade para Carlos que vira a depressão do occipício. Sabia que era neste ponto que os odores das mulheres prometem multiplicidade e desideratum. Nada mais havia, esquecera-se de toda a riqueza que transita pela rua da Lapa, era ele um todo concentrado em si para daí se projetar na moça. Na verdade nem era mais ele, era apenas uma seta em sentido do corpo balançante que enfeitiçava o ar à sua frente em menos de vinte metros.

A igreja da Lapa, de uma só torre, não existia, a moça por ali passava, mas os monumentos históricos nada são que passado, passeio, ido, foi-se. Carlos era aqui e agora, feito um foco de luz, como o cogumelo de uma bomba atômica. Por duas vezes vira uma fugaz silhueta de um rosto lindo que não precisava ver, o traduzia pelo corpo que se manifestava e pela face sorridente e fixamente prolongada dos passantes que vinham em direção dele e assim ficavam tão logo cruzaram aquela Diana que nascia bem ali no meio da Lapa. Por muito que a negativa lhe roubasse coragem antes do fato, Carlos era pura resolução. Jamais se sentira assim, como se o desejo dele já tivesse antenado no dela, como se cada movimento de corpo fosse um linguajar de uma língua que só ele entendia e para ele falava. O mais impressionante da visão dela era que à proporção da redução das distâncias entre os dois, mais a acuidade valorizava suas curvas, seus brilhos, seus movimentos. O sinal de trânsito ficou verde e como um chamariz a moça atravessou e chegou na calçada do Passeio Público. Para felicidade de Carlos que já vinha tão perto, ela parou rapidamente próximo a uma banca de jornal, de relance prestou atenção em alguma manchete mas logo continuou o passo. Na ocasião a sua bolsa caíra, Carlos já estava bem ao lado dela.

Nunca Deus lhe dera tamanha oportunidade. Ela parou para abaixar-se em busca da bolsa. Para Carlos foi como se dissesse, agora começamos a nos entender. Ele se adiantou e se abaixou lentamente para eternizar o momento. Com precaução, tanto para não precipitar equívocos, como para não desvelar sua própria escassez de beleza. Lá com as mãos já envolvendo a alça da bolsa dela, pelo canto dos olhos viu o mais lindo rosto que nem aquele corpo de promessas havia prometido igual. Quase se desfalecendo foi subindo de andar como que por estágios. Primeiro os olhos verdes, depois os lábios carnudos e lacustre, em seguida um queixo de carinhos, acima uma testa de luz em arco perfeito a razão dos cabelos que se repartem de cada lado. Ela lhe sorriu, desmanchando a distância que os separava. Carlos afinal chegou-lhe à altura, ao todo do momento realizado, era simpática, não se furtava de flertar com ele mesmo depois que a bolsa lhe havia sido devolvido. Mas em Carlos há o interrupto.

Um cheiro de merda. Penetrante, dominante, envolvente. Carlos estava num fog de fossa, um asco que lhe derretia o ímpeto por aquela beleza única. Mas agora no centro excremental dos acontecimentos, que aquela mulher degenerava-se. De súbito uma palidez tomou conta de Carlos, os ombros se abaixaram, os braços se arriaram, a vontade e o desejo se foram. Aquilo que fora uma explosão sexual, afinal se reduzira, apagara-se sem a placidez da pós-ejaculação. Carlos definitivamente se desinteressava pela mulher, que percebendo sua decepção, logo tratou de seguir adiante pela calçada perdida.

O impacto fora tamanho que Carlos ficou parado olhando-a mudar de calçada em frente à Loja Americana, a antiga Mesbla e desaparecer entre as barracas de Camelô. Desaparecera para sempre. Mas o fedor de merda, não. Carlos tomou um susto, pois era natural que tivesse desaparecido com ela. Mas no entanto, algum tempo depois continuava tão vivo e presente quanto parecera em razão dela. Numa dúvida de perda fatal, Carlos se dirigiu para um fiscal do ponto de ônibus que ficava à frente e perguntou:

- Que cheiro de merda é esse?

- O quê? Cheiro?

- Sim esta coisa que cheira mal e que não se acaba.

- Cheira mal?

- Sim! Este fedor de merda.

- Ah! É esta planta. A flor de macaco. Fede prá dedeu.

- É!?

Carlos terminou a pronúncia do "é" com a voz quase se apagando. Olhou de volta o destino da mulher e teve vontade de sair correndo feito maluco ao encontro de coisa alguma.


22.09.2005

Aniversário de 6 meses do Azul Sonhado !




Com 65 colaboradores, completamos nesta data, seis meses de interatividade.
E como primeiro produto material, no próximo dia 20, lançaremos uma coletânea, em prosa e verso, com a participação de 42 autores.
Parabéns a todos que contribuíram pela vivificação deste espaço que de forma sinérgica vem cumprindo seu destino: agregar afins, numa troca harmonizada de informações e prosa poética, estreitando laços de amizade.
Estamos felizes!


REVOLUÇÃO FRANCESA - POR NORMAHAUER


A data de 14 de julho está para sempre marcada na história de todos os povos.

Foi com a queda da Bastilha que os povos começaram a compreender que eram uma potência e que reis, rainhas e cia. poderiam ser destituídos enquanto o povão, com seus líderes, seria capaz de tomar o poder.
É verdade que muito sangue correu antes e depois do 14 de julho, mas ele foi a porta aberta para a democracia (embora "capenga") nos países ocidentais.
Hoje, até em nações que ainda mantêm a monarquia, esta não tem mais força e não se pode matar a torto e a direito por motivos fúteis.
Vê-se a Inglaterra onde sua Rainha não manda nada; serve apenas para dar títulos e fingir que "governa".
Quem manda mesmo é o Primeiro Ministro, que também tem seus limites.
Aquela época dos Reis Luizes de "L'Etat se moi" acabou com a Revolução Francesa, apesar de Napoleão Bonaparte ter vindo depois.
Mas este era um grande estadista, que ía à frente de suas tropas. Não ficava fechado em suas fortalezas, enquanto seus soldados morriam.
Mas essa é outra história.

E “lembrando os reis Luízes”, aqui vai a letra de uma valsa que também trás à tona, o nome de uma das mais famosas amantes de um Rei Luiz :

MADAME POMPADOUR

Autores Paulo Babosa e Oswaldo Santiago
Gravação de Carlos Galhardo

Conta a história que um Rei Luiz,
Um rei Luiz.
Por amor se fez grande e feliz,
Se fez feliz
E a seus pés assim,
Eu ouvi, oh flor,
Te dizer um dia um dia um trovador:

“Madame Pompadour,
Mon amour, por toujour
Será teu meu coração
Que é um reinado de ilusão.
Um trono de estrelas
Terás que eu te darei,,,
“Madame Pompadour”
Rainha de um rei. 

NORMA

Entre o Céu e a Terra



Encontraram-se um dia, uma lágrima, uma estrela, uma
pérola e uma gota de orvalho. Falou primeiro a
estrela:
"- Quem diria que eu tivesse o trabalho de descer das
alturas luminosas, para vir conversar com vocês três?
Não sabem que sou mais alta que as nuvens? E que a
minha altivez fulgura entre mil chamas radiosas, na
infinita amplidão?"

Mas, respondeu a pérola vaidosa:
"- Quem te dará valor, entre milhões de lâmpadas no
espaço? Tu não passas de um grão de esplendor, metido
na poeira do infinito. Ninguém se lembra de te por
nos braços! Enquanto eu, lá no fundo dos oceanos, sou
buscada e vendida aos soberanos, para enfeitar, com
minha limpidez, as coroas dos reis! Vivo no colo
esplêndido dos nobres, e nos ricos seios das rainhas...
Não como ti, que sob o olhar dos pobres poetas
vagabundos te encaminhas...

"- Valho mais que tu! E ainda mais valho que um
orvalho e uma lágrima, pois ambos são gotas d'água,
sem o mínimo valor."

Disse o orvalho, com mágoa:
"- Qual de vocês três, tem esse encanto de se
transformar em gozo, na boca imaculada de uma flor?
Eu venho lá de cima, radiante, nos braços da alvorada,
cobrir de beijos uma rosa, que se sente tão doce
nesse instante, que vale a pena vê-la tão ditosa! E
trago o riso ao coração da Terra, engolfada em pranto.
Eis como sou feliz! Na campina, ou no cimo da serra,
sou sempre uma esperança cristalina, nos lábios
sorridentes de uma flor!"
Calou-se o orvalho.

E a lágrima? Coitada, esta nada dizia... "E que
respondes tu?" Perguntaram os demais. E ela, rolada
na terra úmida e fria, nada ousava falar...
Porém, sublime e calma, respondeu :
"- Eu sou o perdão no crime e a vibração no amor!
Bailo no olhar risonho da alegria, moro no olhar
tristíssimo da dor! Eu sou a alma da saudade e da
harmonia! Sou o estrilo na lira soluçante dos poetas,
sou oração no peito dos ascetas, sou relíquia de mãe
em coração de filho, lembrança de filho em coração de
mãe! Não vivo nos seios perfumosos, nos colos
orgulhosos, na ostentação efêmera do luxo... Porém,
penetro no espírito do mundo, seja do rei, do sábio
mais profundo, do rústico mais vil... do pecador, do
santo, até na face do Senhor um dia já rolei...
Eu, lágrima pequena, penetrei no coração de Deus, e
fiz estremecer, abrir-se extasiado o pórtico dos céus!
Não sei quantos pecados já lavei!"
A lágrima calou-se humildemente, deslumbrando...
Em silêncio, a tudo contemplou serenamente, na
vastidão vazia...

A estrela se ocultou atrás de uma nuvem e chorava...
A pérola desceu à profundeza dos mares e chorava...
O orvalho tremulando sobre a relva também chorava...
E a lágrima, só a lágrima sorria!...


Fonte : Texto recebido em pps. Desconheço o autor


Imagem - Google Imagem






O centenário de Juazeiro do Norte - Emerson Monteiro


Neste ano de 2011, o dia 22 de julho assinala 100 anos desde que Juazeiro mereceu sua autonomia municipal através da Lei n.º 1.028, quando recebeu a toponímia de Joaseiro, em homenagem à árvore típica da vegetação do semi-árido, sempre verde inclusive nas épocas mais tórridas.

Suas origens remontam ao vilarejo de Tabuleiro Grande, formado nas terras que pertenceram à sesmaria concedida no ano de 1703 ao capitão-mor Manuel Rodrigues Ariosa, de origem norterriograndense, depois havidas por famílias iniciais advindas de Sergipe, até chegar no brigadeiro Leandro Bezerra Monteiro e no neto, o sacerdote católico Pedro Ribeiro da Silva Monteiro. As terras se estendiam do município do Crato às cercanias da Serra de São Pedro. Nessa área da grande propriedade, no decorrer da década de 1820, o Padre Pedro Ribeiro edificaria casa grande, de taipa e telha, engenho, aviamento, senzala e capela.

Para a construção da capela dedicada à Nossa Senhora das Dores, o sacerdote e seu futuro capelão reuniria também esforços dos familiares, nela sendo celebrada missa no dia 15 de setembro de 1827 alusiva ao lançamento da pedra fundamental do templo.

Em 09 de setembro de 1833, quando Padre Pedro Ribeiro deixaria este mundo, a futura povoação juazeirense começava a despontar no crescimento. Somava duas ruas, a Rua Grande, hoje Padre Cícero, e a Rua dos Brejos, em traçado perpendicular; a capela, uma escola e 32 prédios com tetos apenas de palha.

Ordenado em 1870, no dia 11 de abril de 1872, o Padre Cícero Romão Batista fixaria residência no pequeno arruado. Afeito aos anseios das populações simples, desempenharia funções apostólicas voltadas ao conforto das almas sertanejas, cumprindo nisso a missão religiosa católica. Tempos depois, em 06 de março de 1889, dar-se-ia o fenômeno da hóstia transformada em sangue, na ocasião de ministrar a comunhão à Beata Maria de Araújo. A propagação do acontecimento pelos interiores nordestinos intensificaria o deslocamento de milhares de pessoas ao lugarejo, que ganharia impulso surpreendente e definitivo no desenvolvimento.

Já em dias do século XX, a 16 de agosto de 1907, circulara um boletim conclamando os cidadãos juazeirenses para reunião a ocorrer no dia 18 do mesmo mês, na residência do major Joaquim Bezerra de Menezes, descendente dos primeiros proprietários do lugar, visando organizar a emancipação política do território, livrando-o da administração do município do Crato, a quem obedecia. Isso, no entanto, deixaria de gerar efeitos práticos imediatos. Só adiante, devido ações encetadas por novas lideranças, de Padre Alencar Peixoto, Floro Bartolomeu da Costa, José Marrocos e outros, nas páginas do jornal O Rebate, essas ideias ganhariam corpo, galgando efetiva concretização em 22 de julho de 1911, quando da lei estadual que estabeleceu: “Art. 1.º - A povoação de Juazeiro, da comarca do Crato, é elevada à categoria de vila e sede de município, com a mesma denominação”.

Expocrato? Estou fora! – Por Carlos Eduardo Esmeraldo


Não gosto do Crato no período da exposição. Barulho ensurdecedor até o raiar do dia, ruas estreitas entupidas de automóveis, motoqueiros transitando pelas calçadas, gente em demasia que nos faz sentir-se num outro lugar que não a nossa bucólica e pacata terra. E o que é pior, nos tornamos forasteiros em nossa própria casa. Nas estradas o movimento é intenso. Constantes blitz’s fazem parar nosso carro duas ou três vezes. Nada mal, pois ela surpreende os irresponsáveis motoristas alcoolizados, evitando deste modo que o número de acidentes cresça mais ainda. O pior mesmo são as bandas de forrós que fazem um barulho tão grande que ecoa por toda área urbana do Crato e roubam o sono de muitas pessoas, que não estando de férias, trabalham no dia seguinte.

Soube que a URCA suspende suas aulas no período da Expocrato? Pode um negócio desses? E o Hospital São Francisco que fica tão próximo? Que é feito dos doentes? Onde estão o silêncio e a paz tão necessários para a cura das enfermidades?

Sou favorável que a Exposição volte às suas origens. Imaginem que eu alcancei nos distantes anos de 1954/1955 duas exposições tendo como local a atual Praça Alexandre Arraes, naquela época denominada "Bosque Municipal", depois Parque Municipal, bem defronte da Maternidade e muito próximo do Hospital São Francisco. Ao redor do local já existiam as residências que por lá permanecem até hoje. E não houve incômodo algum para os moradores, a não ser o grande “mosqueiro” que vem após. Afinal, a Expocrato é uma exposição de gado, de produtos agrícolas, agro-industriais, cultura regional e não de swhos musicais com estridentes bandas de forrós e de extremado mau gosto. Para que esse som tão ensurdecedor? Por ventura são surdos? Esquecem também que os animais que ali estão expostos sofrem dez dias de estresse que lhes são prejudiciais à saúde. Então que se volte a fazer a Exposição como ela era até meados de 1960. Sem música estridente, sem bandas de forró. Até então tínhamos festas em todas as noites da exposição que eram realizadas no Crato Tênis Clube. Época em que íamos às festas e além de dançar, podíamos bater um agradável papo. Todos ouviam a música num tom normal, ninguém era surdo. Por que então, em vez de transferir o parque para outro local, não levar esses shows para cima da Serra do Araripe, no antigo Aeroporto, por exemplo? Será que o IBAMA deixaria? Tenho certeza que não, pois seria prejudicial à fauna e também à flora. E nós, o bicho homem, podemos suportar tudo isso?

Por Carlos Eduardo Esmeraldo

Sofia e o Ursinho Pimpão - José do Vale Pinheiro Feitosa


Meu caro Edgar Poças, já o teu tempo andou mais dois anos que o avô de Sofia, ela aponta o dedinho e pede que toque Ursinho Pimpão. Põe a mão no queixo como aquelas fotos da década de trinta e sonha na música.

Logo que as notas iniciais começam e a voz infantil de Simony as canta, os olhos vagalumeiam como nas noites ancestrais dos sertões. E algo espetacular ocorre: Sofia, diziam-me, é de agora e quem o é não se conecta com a música do passado. E agora, Edgar Poças? Como explicar Sofia querendo ouvir tantas vezes esta mesma canção?

Ela abre um sorriso como se encontrasse a seiva que sai do centro do mundo. A seiva que bebida explica tudo. Inclusive ela. Ela e sua abertura de tempo. Seu tempo que inventa relevos e histórias sobre ele.

A nascente brota abaixo da construção imensa da montanha e Sofia coleta todo este movimento. Enche-se de meiguice com a vida. Os olhos mexem para cima e para baixo confirmando o alvo daquele momento.

O avô ao lado transfere o calor do seu corpo vivo. Sofia compreende o calor e deita a cabeça ao peito grande dele se ao corpo pequenino se comparar, mas irrelevante para a imensidão daquele momento dela.

Ela não deita a cabeça por descanso, ao contrário, é por concentração e enlevo sobre a superfície tosca a que o avô se acostumou pisar. A superfície das coisas úteis, das regras pragmáticas, dos objetivos mensurados.

Todo o peso do corpo dela se encontra como gravidade ao tronco do avô. Mas certo que alguma fração da força G se subtraiu e foi para o rosto feliz de Sofia. Aquela felicidade que permeia os modos de infinitamente: o grande e o pequeno.

Tudo, meu Caro Edgar Poças e sua composição Ursinho Pimpão, flui bem agora, junto com estes sinais gráficos. A recordar aquele momento de grande descoberta, da criança com menos de três anos de idade achando o mesmo ponto que Arquimedes desejou para mover o mundo.

O mesmo ponto em que seu rostinho de novidade sonhava um sonho muito além da linha do horizonte do seu avô. Muito depois do que dizia as manchas solares, as rugas e as evidências das veias tortas sobre o dorso da mão e braço do avô que abraçava Sofia.
 por José do Vale Pinheiro Feitosa

Everardo Norões e Você - José do Vale Pinheiro Feitosa


Guerrilheiro, andarilho do terceiro mundo, político de seiva, erudito, universal como a cratera de um vulcão, vivente de muitas vidas numa apenas, cratense inconcluso, Everardo Norões é um dos poetas mais maduros da geração do pós guerra. E muito sério.

Isto é, quem olha Everardo na ambiência social, encontra uma sisudez herdada. Aproxime-se e descobrirá um verbo que tem aquilo que Eça de Queiroz dizia do português falado no Brasil: tem a doçura da cana. Mas não procure que se cristalize definitivamente, logo ele se liquefaz e toma outras formas. Por isso tão múltiplo como dito no início.

Ia me esquecendo dizer de quem herdou. De Plínio Norões, o seu pai, quem o mundo movia-se por quereres, mas também por aleatoriedade. Nem acaso apenas como necessidade somente. A sisudez como atenção pelo momento em curso.

Portanto, neste evento que o Cariricaturas promove de lançamento de mais uma edição de Everardo Norões, o livro “Poeira nas Réstias” o pessoal do Crato tem de se desapegar desta preguiça malsã.

A preguiça que não é nossa e nem nos convém como acontecia nas canções de Dorival Caymmi. Peço aos meus que mande para os quintos dos infernos esta preguiça de televisão, da mesmice pequeno-burguesa do Jornal Nacional e que por falta não perderá a alma. Ganhe sua alma e vá ao Teatro Rachel de Queiroz.

Encontre Everardo em companhia de Sonia e Dihelson Mendonça. Verás quão significados existem neste verbo encontrar: frente a frente; descobrir a consciência; recuperar a própria alma escondida atrás dos cristais luminosos das televisivas. Tudo bem que procure a simplicidade própria, não este sonambulismo hipnotizado por tantos lugares comuns e tanta notícia sangrenta.

No Teatro Rachel de Queiroz, neste dia 22, na próxima quinta feira, não deixe sua alma no éter, dê-lhe a chance de ser ela por ela mesma. Abrace esta intenção, supere o umbral desta casa que lhe prende por exaustão. Vá para a rua e encontre-se. Lembre de um poema de Everardo Norões em seu “Retábulo de Jerônimo Bosch”:

Orley

Ele cruzava
as pontes do recife
em direção à Abissínia.

Nós o seguíamos:
havia sempre um cais,
um segredo,
o elixir das noites mortas.
Aprendíamos
a verdade incompleta,
o sortilégio dos desenganos,
as formas de penetrar,
(de leste a oeste)
a pálpebra das coisas.

Sempre um átomo a pulsar
no vidro,
no sexo,
nos móveis da casa:
a substância mais viva
do esquecimento.

Digo:
o silêncio é uma rua
de janelas fechadas.

Coquetel de frutas


* Ingredientes
* 1 garrafa de suco de caju
* 1 garrafa de suco de abacaxi
* 1/2 garrafa de suco de maracujá
* 1/2 garrafa de suco de goiaba
* 1 garrafa de guaraná (refrigerante 600ml)
* 1 copo de groselha ou mais
* 1 lata de leite condensado
* 700 ml de água


* Modo de Preparo

1. Bata tudo e coloque para gelar
Duas namoradas
Itamar Assumpção / Alice Ruiz

Tenho duas namoradas
A música e a poesia
Que ocupam minhas noites
Que acabam com meus dias

Uma fala sem parar
A outra nunca desliga
Não consigo separar
Duvido d o dó que alguém consiga

Cantar é saber juntar
Melodia, ritmo e harmonia
Se eu tivesse que optar
Não sei qual eu escolheria

Tem vez que o caso é comigo
Tem vez que sou só sentinela
Xifópagas, caso antigo,
Tem vez que é só entre elas

Nenhum instante se deixam
Grudadas pelas costelas
Nenhum segundo me largam
Também eu não largo delas

Indizível- por corujinha Baiana

O que dizer
dos sonhos não realizados
dos versos não declamados
do silêncio que era meu ?

O que dizer
das ofensas recebidas
das lágrimas não percebidas
da alegria que morreu ?

O que dizer
das lições não aprendidas
das emoções tão contidas
do riso que não se deu ?

O que dizer
da música nunca entoada
da beleza não contemplada
de tudo que se perdeu ?

Como perdoar o imperdoável ?
Como esquecer o inesquecível ?
Como evitar o inevitável ?
Como dizer o indizível ?

Paroles... Paroles...Paroles..

Por Stela Siebra Brito

DISTRAÇÃO POÉTICA


Ônibus cheio,
calor, suor,
trânsito lento.
Alenta-me admirar
a sombra das árvores - colo acolhedor em terra
nuances variadas das copas verdes
desenhos das nuvens
plantas rompendo cimento concretizado em muro
jarros de flores bizarras enfeitando janelas toscas
o andar dos transeuntes
uns lerdos, dispersos, alheios
outros afobados, perplexos,
sorridentes... felizes?
fiteiros, catedrais
pichações
pixotes
meninos pingentes
de cola na boca
meninos famintos
de arroz e feijão
meninos desnutridos
de saúde e ternura.
meninos na cidade
sem cidadania.

A cidade é de todos?
a cidade é suja
a cidade é linda
a cidade é a nossa cara deslavada
ensebada e
perfumada de lama.

Augusto de Campos



Augusto Luís Browne de Campos (São Paulo, 14 de fevereiro de 1931) é um poeta, tradutor e ensaísta brasileiro

Augusto de Campos




Diálogo a Dois

“A Angústia, Augusto, esse leão de areia”
Décio Pignatari


A Angústia, Augusto, esse leão de areia
Que se abebera em tuas mãos de tuas mãos
E que desdenha a fronte que lhe ofertas
(Em tuas mãos de tuas mãos por tuas mãos)
E há de chegar paciente ao nervo dos teus olhos,
É o Morto que se fecha em tua pele?
O Expulso do teu corpo no teu corpo?
A Pedra que se rompe dos teus pulsos?
A Areia areia apenas mais o vento?

A Angústia, Pignatari, Oleiro de Ouro,
Esse leão de areia digo este leão
(Ah! O longo olhar sereno em que nos empenhamos,
Que é como se eu me estrangulasse com os olhos)
De sangue:
Eu mesmo, além do espelho.

Orquídeas de Liduína