por José do Vale Pinheiro Feitosa




Viva junto à alma mais próxima e compreenda que a proximidade é a medida da distância. Que a distância que os separa é este movimento maravilhoso da matéria e da energia. A maravilha é apenas esta surpresa porque esta proximidade é tão diminuta entre os dois e é a inesperada distância.

José do Vale P Feitosa



quinta-feira, 26 de julho de 2012

Vestibular em Matozinho


Matozinho teve sua primeira escola regular sob a batuta, ou a palmatória,  de D. Filomena Garrido. Sistemática, rigorosa, D. Filó alfabetizou muitas gerações de matozenses,  com a indispensável ajuda de bolos e chulipas. Cabra aprendia o ABC ou largava  o couro das mãos. Até em Piaget ela daria pesqueiro. Só muitos anos depois,  surgiu o primeiro Grupo Escolar que  estendia os estudos  até o Exame de Admissão , o que já era de causar admiração. Já nos anos 70, fundou-se o Colégio Filomena Garrido, em homenagem à primeira educadora da cidade, naquelas alturas já ministrando aulas na corte celeste. O Colégio fez com que os primeiros matozenses conseguissem completar todo o Ensino Médio. Causou certa estranheza, pois, que a partir dos anos 90 começasse uma avalanche de Faculdades a se instalar na ainda pobre e provinciana vila de Matozinho. Primeiro foi uma Faculdade Pública estadual com um nome meio estrambótico : FAVAJU – Faculdades do Vale da Jurumenha. Oferecia alguns poucos cursos como Contabilidade, Pedagogia, Letras, Geografia.  Instalada por Sindé Bandeira, o prefeito, a FAVAJU era pública, mas cobrava uma ajuda de custo aos alunos, para manutenção. Logo depois, começaram a aparecer extensões de outras Faculdades do Estado, todas elas públicas, mas também pagas . E, por fim, instalaram-se mais três Faculdades particulares em Matozinho. Contavam-se, em poucos anos, mais de sete Faculdades oferecendo cursos superiores, numa região pobre e, mais, com altos índices de analfabetismo.
                                               Como era previsível, rápido se estabeleceu uma grande concorrência por alunos. Sindé Bandeira , preocupado com a sobrevivência dos cursos, encaminhou um Decreto-Lei para a Câmara de Vereadores, aprovado por unanimidade, em que tirava a exigência de qualquer histórico escolar para acesso ao Nível Superior. Basta passar no Vestibular, dizia Sindé! Justificava-se dizendo  não podia haver preconceito: a ordem é inclusão, meus amigos ! Mouco, Surdo, Cego, Doido não podem entrar na Faculdade? Por que analfabeto tem que ser discriminado? Que faça o vestibular! E mais, tem que ter uma pessoa para acompanhar e ler as questões e, também, dar uma ajudazinha. A Secretaria de Educação, também, reuniu-se com as diversas Faculdades no sentido de facilitarem um pouco as questões do exame seletivo. Aí apareceram quesitos mais fáceis como : “O Prefeito de Matozinho é Sinderval: a) Fâmula; b) Hino; c) Bandeira; d) Mastro. Abriram-se ainda cursos superiores em áreas mais apetitosas ao povão : “Chapéu, Arupemba, Balaio e Caçuá”; “Landuá Soca-Soca , Bodoque e Baladeira”; “Macramê, Fuxico, Bordado,  e Frivolitê”; “Rosário de Coco, Passa-Raiva, Filhós e Quebra-Queixo”; “Tabaqueiro, Tamanco, Palito e Chapéu de Couro”.
                                               Tomadas as devidas providências,  a vida universitária em Matozinho tem ido de vento em popa. Daqui a mais dois ou três anos vamos ter doutor de sobra na cidade, já vaticinou Zé Fubuia. O Matadouro Municipal está atrás de contratar um auxiliar de limpador de tripa , mas já veio com exigência : só aceita com nível superior e de anelão no dedo!
                                               Mês passado  aconteceu mais um Vestibular Integrado das Faculdades de Matozinho-- INFAME , nos últimos anos trazendo um grande afluxo de pessoas das cidades próximos que perfazem a Grande Matozinho. Em Serrinha dos Nicodemos, Gilberto da Topic fazia contratos com alguns alunos para levar e trazê-los após as provas . Naquele semestre transportou doze estudantes de Serrinha e mais cinco de Aparecida do Norte, um outro arruado, distrito de Matozinho. Conduzia-os pela manhã e trazia-os após as provas. Marcado o dia da publicação do resultado final  do INFAME, os alunos o contrataram novamente para ir até a  FAVAJU , verificar se tinham sido aprovados. O topiqueiro se dirigiu à Secretaria da Faculdade e lá explicou que se chamava Gilberto e tinha vindo de Serrinha dos Nicodemos e Aparecida do Norte a mando de alguns estudantes para saber se tinham passado no Vestibular. Entregou a relação dos alunos   a uma mocinha fardada, com crachá da Faculdade que a identificava como Secretária. A burocrata folheou uma extensa relação de nomes e foi pouco a pouco procedendo à checklist dos vestibulandos. Parou por um momento o caqueado  e voltou a perguntar o nome do motorista.
                               --  Gilberto de Serrinha do Nicodemos e Aparecida, minha senhora !
                               Passados alguns instantes, a mocinha voltou toda sorrisos e avisou:
                               -- Meus parabéns, por coincidência todos foram aprovados ! Aproveite e dê nossas mais profundas congratulações aos novos universitários, em especial ao Sr. Gilberto ,ao Sr. Nicodemos que obtiveram  médias ótimas  e, principalmente à Sra. Aparecida do Norte, ela é cobra : tirou o segundo lugar !

J . Flávio Vieira