por José do Vale Pinheiro Feitosa




Viva junto à alma mais próxima e compreenda que a proximidade é a medida da distância. Que a distância que os separa é este movimento maravilhoso da matéria e da energia. A maravilha é apenas esta surpresa porque esta proximidade é tão diminuta entre os dois e é a inesperada distância.

José do Vale P Feitosa



terça-feira, 11 de junho de 2013

Olhem só esta declaração do prefeito do Rio, Eduardo Paes sobre uma hipotética vitória da Argentina sobre o Brasil numa final do mundial: “Se eles vencerem o Brasil na final, eu me mato!”, disse. E complementou: “Eles já têm o Messi e o Papa, não podem querer tudo”, brincou Paes.  

Isso num jornal ou numa revista não teria efeito desconhecido para a pronta brincadeira do leitor: agora temos um motivo para torcer pela Argentina. Só que a brincadeira ficaria restrita ao leitor e eventualmente num encontro entre pessoas se reproduziria a brincadeira.

Mas nesses tempos de internet a história muda de figura: logo um grupo de pessoas reproduz o desejo de se livrar do prefeito simultaneamente através das redes sociais. E é o que está acontecendo.


Até estas gracinhas terão que ser retocadas para uso público. 

A Cerâmica Quinchamalí e o comportamento pequeno burguês - José do Vale Pinheiro Feitosa

O pensador francês Claude Levi-Straus na primeira metade dos anos 80 do século passado publicou um pequeno livro chamado A Oleira Ciumenta. Neste que foi um dos seus últimos livros, analisando o trabalho de ceramistas dos povos americanos identifica uma série de mitos que depois, segundo ele, foram tratados como achados originais da psicanálise. Na verdade Levi-Strauss defende que a maioria dos mitos tratados na psicanálise já pertenciam ao universo dos povos primitivos que viviam em sociedades culturalmente de caça, coleta e de uma agricultura puramente de sobrevivência.

Aquela arte que foi objeto das análises do pensador francês é questão principal em mais este texto sobre o chile: a cerâmica. Ou a “alfarería” como a fala hispânica costuma adjetivar, embora nesta língua cerâmica se refira a técnicas mais refinadas com várias cocções, com esmaltamento da peça e de acabamento mais sofisticado. De qualquer modo a nossa arte popular com cerâmica seria qualificada como uma “alfarería”.

E aí reside uma das questões mais agudas do nosso tempo: a aproximação e o desprezo em relação às artes oriundas dos povos desde os tempos mais primitivos em relação ao mercantilismo e ao capitalismo. Na verdade a civilização europeia se fez em base ao comércio mundial e à produção industrial. Por isso os valores econômicos das mercadorias são determinados pela produção, pelo trânsito e ponto de venda comercial.

Por isso vasos de cerâmica chegados aos portos brasileiros ou chilenos oriundos do comércio inglês, francês ou americano sempre tiveram maior valor do que aqueles modelados pelas mãos em argila dos próprios países. A cerâmica popular normalmente nesta escala é visto como de menor valor e não enfeitam as prateleiras das casas de classe média ou dos ricos.

E desse modo fomos encontrar uma grande exposição da cerâmica Quinchamalí no Centro Cultural Gabriela Mistral. Os jovens e o pessoal de classe média que visitava a exposição olhava as inúmeras peças com um sentimento entre o estranhamento aos padrões do design de consumo dos shoppings e uma vaga memória ancestral porém centrifugada pela atual padronização.

Quinchamalí é um povoado localizado no sul do Chile e que fica a 31 Km da cidade de Chillán. Estes oleiros produzem um cerâmica tracionalmente de cor negra, de aspecto brilhoso e que adquire o tom negro pois é cozida com bosta de cavalo. As peças são típicas com uma base que lembra um vaso ou a base de ums quartinha de água e em cima as cenas humanas, animais e plantas.

Além do tom preto da peça ela é decorada com motivos vegetais desenhados com incisões no barro e pintados em cor branca ou com outra cor que se destaque no fundo. Os oleiros de Quinchamalí se originaram nos povos Mapuche e como em toda as américas as peças tinham originalmente sentido utilitário como recipientes de água e panelas. No princípio do século XIX é que surgiram as garrafas com formas humanas e animais e por volta de 1850 uma figura típica desta arte é a guitarrera, um símbolo da mulher camponesa chilena. Depois aparece a louça artística como brinquedos e novas figuras zoomorfas que se inovam em relação às formas tradicionais.

No GAM vimos a exposição de 261 peças da coleção do Museu de Arte Popular Americano da Faculdade de Artes da Universidade do Chile (aliás onde se encontra o Museu de Arte Popular do Cariri e arredores nas nossas universidades estadual ou federal?). O título da amostra se identificava como “Quinchamalí no Imaginário Nacional” e tem duas marcas fundamentais.

A primeira é o quanto a arte popular se tornou um objeto do desejo das classes médias mais afetas a um chamamento intelectual. Na parede de entrada da exposição havia um texto primoroso de Pablo Neruda tratando do valor cultural e artístico da arte Quinchamalí usando de todos os artifícios de encantamento do consumo: dizendo ter tomado conhecimento de algumas peças através de um grande museu de Nova York. Certamente isso ilumina os desejos dos urbanos afastados dos seu povo.

A segunda é como uma arte popular se projeta no trabalho artístico e faz nascer uma força estética tomando por base sua estrutura. Assim como em Caruaru até hoje se cultua o Mestre Vitalino e no Cariri as duas Ciças como fundadores autorais de uma estética da nossa cerâmica, entre os Quinchamalí se destacou uma artesão chamada Práxedes Caro. Não tenho espaço para reproduzir seu impressionante testemunho de liberdade e decisão sobre seu corpo e destino como mulher.


Nesta linha da estética veio o grande gravador Nemesio Antúnez, artista chileno de expressão formal na arte mundial, que mergulhou na forma e na expressão da cerâmica Quinchamalí. Quem ainda for ao Chile até 23 de junho bem poderia dar fugidinha daquele circuito turístico tradicional e ir ao Centro Cultural Gabriela Mistral (GAM) e aproveitar para abrir o coração ao povo. Quem ficar neste friozinho das nossas madrugadas caririenses estimule-se a ir ao Centro de Artesanato Mestre Noza ou outros que desconheça e ali observar a originalidade popular. Sempre será um “descarrego” deste pesado mundo pequeno burguês em suas gôndolas de consumo fugaz.   


E Se  (Francis Hime)
E se o oceano incendiar
E se cair neve no sertão
E se o urubu cocorocar
E se o Botafogo for campeão
E se o meu dinheiro não faltar
E se o delegado for gentil
E se tiver bife no jantar
E se o carnaval cair em abril
E se o telefone funcionar
E se o pantanal virar pirão
E se o Pão-de-Açúcar desmanchar
E se tiver sopa pro peão
E se o oceano incendiar
E se o Arapiraca for campeão
E se a meia-noite o sol raiar
E se o meu país for um jardim
E se eu convidá-la para dançar
E se ela ficar assim, assim
E se eu lhe entregar meu coração
E meu coração for um quindim
E se o meu amor gostar então de mim