por José do Vale Pinheiro Feitosa




Viva junto à alma mais próxima e compreenda que a proximidade é a medida da distância. Que a distância que os separa é este movimento maravilhoso da matéria e da energia. A maravilha é apenas esta surpresa porque esta proximidade é tão diminuta entre os dois e é a inesperada distância.

José do Vale P Feitosa



domingo, 6 de janeiro de 2013

Encanto do Conto- pesquisador: João Nicodemos


Encanto do Conto


CONCEITOS DE ESCRITORES SOBRE O CONTO
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Estudos Literários
Edgar Allan Poe (1809 – 1849), o primeiro teórico do gênero:
“Temos necessidade de uma literatura curta, concentrada, penetrante, concisa, ao invés de extensa, verbosa, pormenorizada... É um sinal dos tempos... A indicação de uma época na qual o homem é forçado a escolher o curto, o condensado, o resumido, em lugar do volumoso”.
Mário de Andrade (1893-1945), em Contos e Contistas (1938):
 “[...] em verdade, sempre será conto aquilo que seu autor batizou com o nome de conto...".
Alfredo Bosi, História Concisa da Literatura Brasileira:
"O conto cumpre a seu modo o destino da ficção contemporânea. Posto entre as exigências da narração realista, os apelos da fantasia e as seduções do jogo verbal, ele tem assumido formas de surpreendente variedade. Ora é quase-documento folclórico, ora quase-crônica da vida urbana, ora quase-drama do cotidiano burguês, ora quase-poema do imaginário às voltas, ora, enfim, grafia brilhante e preciosa voltada às festas da linguagem."
Em seu livro O Conto Brasileiro Contemporâneo sobre o caráter múltiplo do conto:
"[...] já desnorteou mais de um teórico da literatura ansioso por encaixar a forma- no interior de um quadro fixo de gênero. Na verdade, se comparada à novela e ao romance, a narrativa curta condensa e potencia no seu espaço todas as possibilidades da ficção."
Afrânio Coutinho:
"O contista oferece uma amostra através de um episódio, um flagrante, ou um instantâneo, um momento singular e representativo."
Massaud Moisés, O Conto; em A Criação Literária:
"[...] o conto vem sendo praticado por uma legião cada vez maior de ficcionistas, que nele encontram a forma adequada para exprimir a rapidez com que tudo se altera no mundo moderno."
"[...] o conto é, do prisma de sua história e de sua essência, a matriz da novela e do romance, mais isso não significa que deva poder, necessariamente, transformar-se neles. Como a novela e o romance, é irreversível: jamais deixa de ser conto a narrativa como tal se engendra, e a ele não pode ser reduzido nenhum romance ou novela."
Moacyr Scliar (1937), um dos escritores mais representativos da literatura brasileira contemporânea, numa entrevista concedida ao jornal Folha de São Paulo, em quatro de fevereiro de 1996:
“Eu valorizo mais o conto como forma literária. Em termos de criação, o conto exige muito mais do que o romance... Eu me lembro de vários romances em que pulei pedaços, trechos muito chatos. Já o conto não tem meio termo, ou é bom ou é ruim. É um desafio fantástico. As limitações do conto estão associadas ao fato de ser um gênero curto, que as pessoas ligam a uma idéia de facilidade; é por isso que todo escritor começa contista”.

Tempos paralelos- por Socorro Moreira





Sarita adormeceu com quatro anos de idade. Leite na patinha, cortinado na cama Gerdau, lençol de algodão azulado, cheirando às águas das levadas.
Acordou com a caixa de diazepan faltando uma drágea. Estava zonza, desorientada. Foi até o espelho e viu um rosto de mulher envelhecido, marcado por expressões de dor e conformismo. Seus cachos ficaram lisos, e a pele sem viço. Deveria ter quase um século, pelo visto.
Procurou sinais de uma vida: um álbum de fotografia, um diário, uma agenda de aniversários. E foi retirando das cotoneiras rostos desconhecidos: mulher nova, gata pintada, bonitinha adolescente, tímida menininha. Cadê a foto do baile das debutantes? Do casamento cristão, formatura, batizado do último varão?
Não tinha! Era sozinha.
Onde foram parar os registros dos seus anos?
Olhou a cama de casal vazia. Nenhuma peça masculina cobrando a presença do dono. Onde ele se escondeu, onde estaria?
Na gaveta do armário, brincos descasados, maquiagem vencida, perfume adocicado, nauseante.
Descobriu na  varanda do quarto uma estrela cadente, uma lua sorridente tirando sarro da sua cara.

- Teu sol só chegará na eternidade, sabia?

Amanhã vai colocar cheiro de tinta fresca na casa. Casa com odores de tempos passados.
 Enquanto pensava, vestiu saia, calçou sandália rasteira, com destino ao beco de Pe.Lauro.
 O beco dos doces sapotis, e suspiros de namorados. O beco com nódoas de amoníaco, e fezes de gatos.
As luzes piscavam de todas as praças. Procurou um banco, uma música, um rosto conhecido... Quem sabe o dono do chapéu pendurado no armador da sala, ou do relógio de algibeira, esquecido na penteadeira do quarto?
Fez o pelo sinal na porta da Sé, e deixou esmola pras almas. Voltou pro seu canto, sem contos de reis.
Vai acordar todos os dias lembrando ou esquecida das vidas passadas, entrelaçadas com aquelas do porvir.
Voltou,entrou, fechou a porta de casa, e abriu a porta do sonho.
 Estava lá o engraçado, que lhe assusta com poesias. Nunca lhe promete anel de noivado, nem bodas na eternidade...Que ironia!
Quem é esse moço que Orfeu escolheu para sua companhia?
-Ele é presente de papel passado. Futuro amante. Amigo de verdade ou da verdade?
Nas paralelas tudo acaba unificado, e sem carne.