por José do Vale Pinheiro Feitosa




Viva junto à alma mais próxima e compreenda que a proximidade é a medida da distância. Que a distância que os separa é este movimento maravilhoso da matéria e da energia. A maravilha é apenas esta surpresa porque esta proximidade é tão diminuta entre os dois e é a inesperada distância.

José do Vale P Feitosa



terça-feira, 30 de junho de 2015

Tem um grande hotel em teu mundo ? - José do Vale Pinheiro Feitosa


Um ambiente muito diferente de tudo que é conhecimento do mundo. Escadas que se sucedem com outras escadas de um andar acima do outro. E apenas sabia que as escadas iam do chão ao sótão. Em cada andar tantas portas, entradas uma após as outras e dentro delas vidas que se multiplicavam em adereços, livros, discos, uma escova para dentes, um pente para cabelos. E ninguém era da família, parente ou aderente.

Um Grande Hotel, numa esquina para a Praça Siqueira Campos, na rua que vai para o Cine Moderno é um portal mágico entre séculos. No mundo do ambiente rural, sem luz elétrica, com água de cacimba, um paiol de milho, estrado levantado de queijos, o silêncio dos automotores, mas o grito do pavão. Um Grande Hotel é, de fato, uma abertura da Aida de Verdi para o interior fabuloso do mundo Egípcio, de um Etíope que cobiçava tal civilização.

Lá morava o professor de Português que corrigia estas falas, os sujeitos e seus predicados. Morou um sujeito dos Inhamuns, saíra do sertão, fora para o Rio de Janeiro, viveu mais de 30 anos naquela cidade e voltou, como os elefantes para morrer em volta de seu lago africano. Tal sujeito dormia e dormia, acordava pelas onze horas e logo comia seu almoço numa bacia carregada de misturas alimentares. O resto do tempo, entre o Grande Hotel e longas conversas com gentes que andam pelas ruas do Crato em busca de conversa como sopro de vida.

O circo chegou na cidade. Isso no tempo que um circo era tão grande que um shopping, destes que sucedem os mitos arquitetônicos da identidade urbana, não chegavam aos seus pés. Eram muito mais variados, animais selvagens, daqueles que só as fitas de cinema fotografaram, palhaços, dramas, trapézios, equilibristas, dançarinas e bandas. Mas o maior de tudo, a multidão que se acotovelava para adquirir uma entrada do espetáculo.

Pois foi na porta do Grande Hotel que a mulher do circo, uma bailarina de seus 16 anos, linda de doer, um sorriso de derreter, um corpo de acender, cabelos em coque que prometiam a enxurrada de todas as paixões. E do Grande Hotel saiu um filete de amor que, feito os versos de Marti, postos na Guatanamera, encantaram mais que o mar, tão imenso a prometer eternidade.

Mas do meu mundo do prédio do Grande Hotel, Edifício Figueira Teles escorre pela Rua Dr. João Pessoa uma permanência que não necessita de substrato para viver. Saindo do número 114, era lá que a cidade me dava um endereço, passava, com algum dinheiro no bolso, na porta da Livraria Católica que conhecia como a palma da mão. Em seguida, estava em frente às portas da loja elegante de Ernani Silva, que além de tudo honrava o centro da cidade, morando num sobrado sobre o próprio negócio. A casa de Dr. Elísio, corpulento homem entre a medicina e seu belíssimo sítio com engenho d´água. Mais alguns passos e encontrava o Deputado Filemon Teles, cabelos brancos de neve, bengala, uma vivacidade de velho político conservador, adonado da vida política da cidade.

Qual o quê? Era na esquina do Grande Hotel, bem no bico com vista plena para exuberância da praça que o menino caia nos braços da urbe luminosa. Um bar, mesa com pés de ferro fundido, tampo de uma pedra branca, cadeiras confortáveis, balcão com mostruário de vidros, o barulho de um refrigerador de picolé e sorvete, azulejos, quadros pendurados nas paredes e móveis de madeira que subiam cheios de vendas acima do balcão.

Nesse bar, sob a vida do Grande Hotel, uma bomboneira de vidro, arredondada e compartimentada, giratória, cheia de sonhos de crianças. A cada pequeno giro os papeis chamativos dos bombons faiscavam nos olhos e mourejavam a boca. Eram tantas as possibilidades que só a cidade pode. O exercício era girar para ver antes de apontar o dedo para o desejo sobre todos outros desejos já conhecidos.

Uma perfeita cor transparente do vermelho com mistura de azul, um solferino de sedução. Impresso um casal, ele vestido com um fraque preto e ela com vestido longo amarelo, dançando aberto como asas em evolução de vôo. Em seguida, um papel alumínio, hoje tão comum, mas, então, um brilho de prata no olhar. Finalmente a terra dos sonhos, com mais da metade em formato de globo e no outro lado um pólo achatado. Tinha este cosmo uma crosta de chocolate puro. Abaixo do chocolate um biscoito crocante, aerado como os waffles. No centro deste mundo de sabor, o núcleo era um mistério doce, com lembranças de castanhas.

E disseram que o Grande Hotel irá abaixo para dar vida a mais uma rua Miguel Lima Verde mutilada ou quem sabe arremedada. E dos escombros, surgirá, como um fênix banal, sem qualquer vida nova, sem simpatia, qualquer identidade, o palco do faz de conta de um Shopping, em inglês mesmo, pois é deste tipo de suicídio que a inapetência urbana vive.

No final quem lembrará do Crato?

Mas um bombom SONHO DE VALSA ninguém me rouba.

José do Vale

*José do Vale Pinheiro Feitosa – nascido na cidade de Crato, Ceará, em dezembro de 1948, morando no Rio de Janeiro há 34 anos. Médico do Ministério da Saúde. Publicou o Romance Paracuru em 2003, assina matérias em alguns blogs e jornais. Em literatura agita crônicas, contos, poesia e ensaios de temas variados. Gosta de pintar e tem alguns trabalhos de escultura.

"CAVALO PARAGUAIO" - José Nilton Mariano Saraiva

Teoricamente, os brasileiros se acostumaram a tratar pejorativamente os paraguaios, em razão, principalmente, da existência de uma zona franca de livre comércio numa cidadezinha paraguaia (Cidad Del Este) vizinha à nossa Foz do Iguaçu, onde os produtos comercializados são de procedência duvidosa (falsificados), daí o preço pra lá de convidativo.                                                                                     
Mais tarde e por via oblíqua, e já na base da gozação, nas competições de “turfe” realizadas no Rio de Janeiro, quando o animal teoricamente tido como favorito fracassava, de pronto recebia a alcunha de “cavalo paraguaio”, a fim de expressar o NÃO SER verdadeiro, ou o SER de qualidade duvidosa, falso.

Posteriormente, citada expressão difundiu-se por outros segmentos do cotidiano tupiniquim, dentre os quais o futebol. Assim, quando um determinado time inicia uma competição com todo o gás e, paulatinamente, começa a “descer a ladeira” rumo à rabeira, convencionou-se tratar-se de um “cavalo paraguaio”.
                                                               
A reflexão procura mostrar que a nossa seleção de futebol não mais que de repente resolveu incorporar o “espírito da coisa”. Tornamo-nos, sim senhores, um “cavalo paraguaio”, apesar de alguns experts relutarem em admitir. Tanto é verdade que, no decorrer da recente partida de futebol em que a seleção paraguaia “genérica” (a nossa) findou por ser merecidamente desclassificada pela seleção paraguaia “original” (a deles), o locutor global passou o tempo todo conjecturando sobre a próxima fase da competição (Copa América), quando nos defrontaríamos com a já classificada seleção argentina; ou seja, aquele jogo com o Paraguai já estava ganho com facilidade e, portanto, não deveríamos alimentar maiores preocupações, guardando-as para o confronto com os “hermanos” portenhos, aí, sim, um jogo de arrebentar, um jogo de alto nível e, enfim, onde existia a real chance ou possibilidade de chegarmos à final da tradicional competição.                                                                                      

Além do que, passando, como passaríamos, pelos paraguaios, os dois jogos seguintes (semifinal e final) serviriam para que a punição merecidamente imposta ao jogador Neimar cai-cai fosse “paga” e, assim, nas eliminatórias para a próxima Copa do Mundo o jogador pudesse atuar desde o princípio. Deu no que deu. 

Perdemos (sem jogar nada) e nem da Copa das Confederações, a ser realizada na Rússia, participaremos (coisa nunca antes acontecida, desde os seus primórdios). Além do que, dúvidas começam a surgir sobre se teremos condições de ultrapassar as eliminatórias a fim de participar da próxima Copa do Mundo de 2018, também na Rússia.                                                                                                     

É que os adversários já não se assustam com o futebol brasileiro, que se metamorfoseou num sofrível, banal e simplório “cavalo paraguaio”. É o preço que vamos ter que pagar em razão da mídia esportiva endeusar jogadores da estirpe de um Neimar cai-cai que, milionário em razão do futebol, não está nem aí para o que possa ocorrer com a seleção brasileira. 

Alguém tem dúvida ???


"DOAÇÕES"

DOAÇÕES DAS CINCO PRINCIPAIS EMPREITEIRAS DO PAÍS ( OAS, UTC, ODEBRECHT, QUEIROZ GALVÃO E ANDRADE GUTIERREZ ) AOS QUATRO PRINCIPAIS PARTIDOS POLÍTICOS DO PAÍS (PSDB, PMDB, PT E PSB), NO ANO DE 2014:

01) – PSDB – R$   65,7 milhões (ou 37,0%)
02) – PMDB – R$ 34,4 milhões (ou 19,4%)
03) – PT – R$ 58,1 milhões (ou 32,8%)
04) – PSB – R$ 19,4 milhões (ou 10,8%)


TOTAL – R$ 177,6 milhões (ou 100,0%)

E AGORA, AÉCIO ???

DELAÇÃO DE RICARDO PESSOA, DA UTC

A delação (de Ricardo Pessoa, presidente da UTC) divulgada afirma que a eleição de Dilma drenou R$ 7,5 milhões dos cofres da UTC. Pelo menos aqui Aécio Neves ganhou da adversária. Sua campanha agasalhou R$ 8,7 milhões do empreendedor preocupado com a marcha do capitalismo. Interessante: no total, suas doações declaradas aos tucanos foram maiores do que o dinheiro para o PT, inclusive em São Paulo.

E mais: pagou ministros do TCU, deu mesada para o filho do presidente do mesmo tribunal, comprou o PT, comprou o PSDB, comprou o PSB, comprou o PR, comprou o PMDB e ainda deu R$ 20 milhões para o ex-presidente Collor.


E agora, Aécio ???

segunda-feira, 29 de junho de 2015

A PEDRA A SOLIDIFICAR-SE COMO CROSTA DA REALIDADE FLUIDA - José do Vale Pinheiro Feitosa




Fogos alargando a noção de distância ressoam desde a praia. É o dia de São Pedro, uma procissão católica em face do pescador. Frágeis seres da terra a balançar nas ondas afogáveis onde as jangadas furam o espaço como uma flecha indígena.  

São Pedro o pescador. Tão simples na escala hierarquizada das tribos de Israel. Ali a tecer as malhas da rede de pesca. Na margem onde termina o sólido e começa o líquido.

Alguém como nós. Lutando pela vida. Trabalhando e criando margem onde os mercadores engordam. Engordam em moedas. Dinheiro que representa o poder de quem o detém sobre o trabalho de Pedro o Pescador.

Sobre José o carpinteiro. Sobre Madalena e seu corpo de hematomas a pedradas. E Pedro é isso. Um ser como os simples da terra. Temeroso da fúria armada dos que transformam trabalho em dinheiro e com esta unção de poder afoga a fé de Pedro.

E por três vezes negou o que vinha apostolando apenas por terror à espada. E mais uma vez demonstrou o quanto preservou sua integridade física abdicando da palavra. Das ideias. Da divulgação pelas terras dos senhores do sínodo hebreu e das hostes romanas.

E, no entanto, foi este desvio dos enormes obstáculos. Aquele que temeu. Que se acovardou afrontando-se com a ferida do ferro frio. Foi ele, que ao centro do Império migrou e, no coração dele, foi pedra para se erguer a vontade de muitos.

Todos frágeis como ele. Como nós diante destas instituições pervertidas, poderosas, insanas que carreiam ilusões e fazem da terra e sua natureza essencial objeto das pedradas a Madalena. Somos Pedro.

É só esperar. Somos alicerce a substituir a ruína imoral do capitalismo. A embriaguez desta segurança baseada em moedas. Moedas.

Todas elas enfileiradas numa corrente de faz de conta. Com elos se rompendo por todos os lugares e momentos. As podres moedas que não passam de uma falsidade ideológica sobre os resultados do trabalho de todos.


Pedro o Pescador. A pedra que se solidificou como crosta da terra.   

domingo, 28 de junho de 2015

TRAMA INSANA - Valdemar Menezes

Analistas políticos enxergam sinais de uma trama insana para retirar o ex-presidente Lula da vida política nacional, através do impedimento de sua candidatura em 2018. O que faltaria é encontrar a fórmula mais adequada para dar um mínimo de verniz legal à manobra, sem deixar expostas as motivações verdadeiras. Não seria por outra razão a campanha massiva de destruição da imagem de Lula, bem como a pressão do sistema para que ele seja enquadrado na Operação Lava Jato, levado à prisão e assim ter sua postulação inviabilizada pela Lei da Ficha Limpa. 

Quer se goste dele, ou não, Lula é o maior líder de massas do Brasil (isso apesar 30 anos de massacre midiático movido a preconceito e prejulgamentos). Só os cegos não veriam que ele tem sido o fator de moderação dos embates entre classes sociais antagônicas, numa sociedade cuja desigualdade escandalosa poderia fazê-la explodir a qualquer hora. Pode-se dizer que, sem Lula, possivelmente o Brasil estaria entregue a radicalizações piores ou similares a de países vizinhos, que não puderam contar com um líder de massas moderado como ele, nem com um partido de ampla inserção social, comprometido com a institucionalidade democrática, como o PT (apesar de ter cometidos erros indesculpáveis).

Os “aprendizes de feiticeiro” podem até ter êxito em suas articulações, mas não sem o risco de - cedo ou tarde – desencadearem a convulsão social, com grandes probabilidades de um confronto selvagem entre o andar de cima e o de baixo, quando não mais existiria o fator de moderação representado por uma liderança popular moderada. Para o escritor Fernando Veríssimo, a classe dominante brasileira odeia qualquer sigla que defenda a diminuição de seus privilégios. Brinca, irresponsavelmente, com a possibilidade de um Brasil convulsionado pelo ódio e a violência, visto que nenhuma força representativa do sistema dominante tem o que oferecer aos que querem ter um lugar ao sol e não mais aceitam voltar para a senzala.

sábado, 27 de junho de 2015

Uma noite feliz! 24.06.2015


Nada faltou
Música,comida,animação, e a companhia de antigos companheiros do BB.
Agradeço à Ângela Lobo , o simpático convite.
O tempo passou,mas o afeto permaneceu intacto.
Um feliz reencontro!

"FHC" - José Nilton Mariano Saraiva

“FHC” – José Nilton Mariano Saraiva

A notória “má fé” da mídia tupiniquim em relação ao ex-presidente Lula da Silva (extensiva ao PT, ou até por isso mesmo) é algo incontestável e digna de masturbações sociológicas. Talvez porque tenham receio que ele volte em 2018 para mais uma vitória acachapante sobre a “tucanalhada”, a determinação é, desde já, tentar “baldear o coreto”, criar “factoides” os mais diversos, mentir despudoradamente, chegar às raias da insensatez.

Como agora, quando um desconhecido advogado, useiro e vezeiro em impetrar o instrumento jurídico conhecido por habeas corpus, sem que os envolvidos sejam consultados, resolveu por conta própria que deveria “defender preventivamente” o ex-presidente contra uma possível prisão, por conta dessa onda do “Lava-Jato”. Sem tirar nem por, esta, resumidamente, a versão correta sobre o surgimento do FHC (fajuto habeas corpus) em favor de Lula da Silva (que o repudiou, ao tomar conhecimento).

Foi o bastante para que a desonesta oposição ao governo, irmanada com a mídia corrupta, repercutissem nos jornalões e nas redes sociais uma versão abjeta e irresponsável sobre, porquanto dando a entender que o ex-presidente houvera impetrado pessoalmente o tal habeas corpus, com receio de ser detido.

Como a Internet é uma via de multi-mãos, não tardou para que os apressadinhos de plantão fossem literalmente desmoralizados e tivessem que se penitenciar (embora tardiamente, já que houvera ganhado o mundo) pela deslavada mentira divulgada. Confira abaixo.       

Sem querer, querendo

“Nenhum desses cuidados primários foi tomado pela redação da Folha de S.Paulo, na quinta-feira (25/6), ao noticiar, em sua edição digital, que o ex-presidente Lula da Silva havia ingressado com pedido de habeas corpus preventivo, na Justiça do Paraná, para não ser preso como acusado na Operação Lava-Jato. A notícia original foi publicada às 11h25. Cinco minutos depois, uma nota colocada apressadamente dizia: “ERRAMOS – Não foi Lula que pediu habeas corpus preventivo; ação foi de consultor sem ligação com o ex-presidente”. A pequena nota corretiva foi substituída muito tempo depois, às 15h07, por um outro “ERRAMOS”, que informava: “Versão anterior da reportagem ‘Habeas corpus preventivo pede que Lula não seja preso na Lava Jato’ informou incorretamente que o pedido de habeas corpus havia sido feito pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva” (ver aqui). O título, o texto e a chamada na home page do portal foram corrigidos, mas a versão original já corria pelas redes sociais, impulsionada por uma equipe a serviço do senador Ronaldo Caiado (DEM-GO). Mesmo com os sucessivos atentados ao bom jornalismo que fazem a rotina da imprensa brasileira, difícil acreditar que a redação da Folha de S. Paulo tenha cometido um mero erro técnico, uma “barrigada”. Foi mais do que incompetência: foi resultado de um empenho do jornal em criminalizar o ex-presidente da República, no rastro de um processo que começa a incomodar alguns dos mais renomados juristas do país, por uma sucessão de decisões tidas como arbitrárias. O viés condenatório da Folha pode ser percebido na versão atualizada às 15h32 de quinta-feira, na qual se lê que “segundo o Instituto Lula, qualquer cidadão pode impetrar o habeas corpus”. O correto e honesto seria dizer, simplesmente, que “o pedido de habeas corpus pode ser feito em nome de terceiros por qualquer cidadão”, como saiu na edição de papel na sexta-feira (26/6) – porque essa é a norma legal, não a “opinião” do Instituto Lula.
As trapalhadas que se seguiram apenas aumentaram a repercussão da notícia – e para muitos cidadãos fica a impressão de que Lula da Silva está na iminência de ser colocado na cadeia – o que não é verdade, porque ele nem sequer é investigado. Os outros jornais alimentam essa versão ao publicar textos ambíguos – por exemplo, o Estado de S. Paulo diz que Lula “nega que seja o autor do pedido” – frase que não se justifica depois que o impetrante do habeas corpus admitiu ter agido por conta própria. O episódio dá razão aos impertinentes que chamam aquele jornal de “FALHA DE SÃO PAULO”.

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Alfim, e a fim de dissipar quaisquer dúvidas, em nota oficial o juiz da Lava Jato, Sérgio Moro (que está, sim, doido pra pegar o ex-presidente), houve por bem se pronunciar:A fim de afastar polêmicas desnecessárias, informa-se, por oportuno, que não existe, perante este Juízo, qualquer investigação em curso relativamente a conduta do Exmo. ex-Presidente da República Luiz Inácio Lula da Silva”.

Particularmente, entendemos que, como a porteira foi aberta, o risco é que a Justiça do Paraná de repente se veja sufocada de habeas corpus preventivos impetrados por milhares e milhares de pessoas que, a partir do governo Lula da Silva se descobriram vivas, se descobriram existir, se descobriram cidadãos do mundo.
Alguém duvida ???  

sexta-feira, 26 de junho de 2015

A Columbia explode na Rua do Amparo

Golvino Cetrônio acreditou, piamente, nos pés do padre, que aquela cláusula de Eternidade , escrita sorrateiramente no seu contrato nupcial, era perfeitamente factível.  O carrinho de rolimã do seu desejo havia derrapado nas curvas sinuosas de Abertiza, uma morena com trinta palmos de frente e uns noventa de fundo. Os amigos todos até lhe alertaram que aquilo era terra demais para seu caminhãozinho, mas Golvino fincou pé:
                                   --- Mulher e prejuízo só servem  grandes ! Se não der pra carregar a terra toda de uma vez, levo nem que seja em trinta viagens !
                                   O certo é que Cetrônio aceitou a empreita, até mesmo porque descobriu,  ali junto do altar, que tinha até à morte para transportar aquela montanha de terra que o destino acabava de lhe ofertar.  O caminhãozinho três quartos de Golvino aguentou firme o transporte por mais de trinta anos. Depois disso, começou a ficar ronceiro, a saltar de marcha, a encharcar , até bater o pino. Descobriu, então,  que seria impossível cumprir o trato. Abertiza que já era enorme , dobrou de volume e, a montanha que recebera um dia para carreto, se transformara num Everest. Resolveu dissolver o combinemos  feito um dia no pé do vigário, as cláusulas tinham se transformado em clausuras. Pensou que desfazer o acordo seria tão fácil como assinar aquele livro grande do Cartório . Qual nada!  Só então percebeu a necessidade de tantas testemunhas. Teve que vender os teréns e pagar a indenização a D. Abertiza.
                                   Golvino, apesar de depenado, imaginou que fizera um bom negócio. Saíra mais leve no bolso, mas também na alma.  Beirava os cinquenta, aquela idade em que já não existem mais tantos cartuchos na cartucheira  e muitas das balas restantes ainda  são de festim. Sem freio de mão, o caminhãozinho de Cedrônio saiu dispinguelado, ladeira abaixo. Atropelou boa parte das amigas de Abertiza, as colegas de trabalho da “Sapataria Pé Lustroso”  e as clientes mais atiradas. Construiu , pouco a pouco, um harém particular. Com o passar do tempo, no entanto, começou a enfastiar de tanta liberdade. Os relacionamentos, todos superficiais, de lingeries nas cadeiras e não no guarda-roupas,  já não preenchiam  o vazio da sua alma. Todo mundo precisa de alguém com quem possa contar além da cama redonda do Motel.
                                   Eis que Golvino percebeu que o caminhãozinho andava em círculos e tornara ao mesmo ponto onde um dia começara. Precisava de alguém para dividir as angústias e os prazeres, até porque, a balança, com a idade, tendia a pesar mais no primeiro prato.  A retomada da Bastilha não parecia tarefa fácil. Lembrou do velório do casamento anterior e sentiu calafrios. Ia começar tudo de novo ? Como suportar a putrefação do relacionamento e suas incontáveis exumações ? Além de tudo, como encontrar a noiva ideal ? As da sua geração estavam fora de prazo de validade e as mocinhas traziam seu frescor,  mas junto viriam as Bandas de Forró, os Cantores Sertanejos, as Baladas, as Paredões. Além de tudo,  tinha a quase impossibilidade de degustar sozinho o banquete e aquele risco  de  ficar a testa  como casca de jaca.
                                   Pensou, então, nas namoradas antigas, aqueles que vieram antes do casamento. Nunca, na vida, a paixão arde com aquele furor da adolescência. Talvez porque o tanque de combustível esteja cheio, pela tampa. Ademais, aqueles namoros , em geral, ficaram pelo caminho, longe das vias de fato, deixando um gostinho de quero-mais inalcançável. E foi aí que, um dia, posou-lhe na consciência, como um pássaro, a imagem de Sinharinha. Linda, meiga, delicada, tinha sido uma das suas paixões de Colégio. Tímido, se acercara, tentara , por diversas vezes, um namoro, um romance, sem qualquer sucesso. Depois, a vida os afastara. Soube que havia casado com um comerciante importante do Recife e para lá se mudara. Nunca mais seus caminhos se haviam cruzado. Comentou um dia com os amigos a doce lembrança e eles  falaram de um artifício modernoso : as Redes Sociais.  Precisou da ajuda dos universitários para adentrar na nova tecnologia. Analfabeto digital , diante de teclas e botões, parece mosca em Centro Cirúrgico.  Caqueando PC´s e Facebook, deu com o perfil de Sinharinha.   Lá estava diante de uma foto antiga, com aquele mesmo fascínio que um dia o tocara. Dizia-se novamente solteira e viu algumas fotos de dois filhos, já taludos e seguindo voo próprio. Golvino fez também uma página e encimou-a com uma foto dos tempos de colégio. Armada a arapuca, a partir daí,  fez contato e terminaram em conversas longas  in box.  Soube que se separara do comerciante há uns cinco anos e que, há pouco, se aposentara como professora do estado. As conversas foram se tornando quase que diárias e evoluíram para telefonemas. Por fim, Golvino combinou para se encontrarem em Recife, no Carnaval.
                                   Chegou na Veneza Brasileira,  no sábado de Zé Pereira, em meio ao frevo solto pelas ruas .  Acertara o encontro defronte à Bodega do Velho,  em Olinda, à tarde, na Rua do Amparo. Para facilitar a identificação Sinharinha prometeu ir de Colombina e  Golvino, já no clima,  disse, pedindo licença a Noel,  se fantasiaria de Pierrô  Apaixonado. Cetrônio nem conseguiu pregar os olhos pela ansiedade. Na hora de vestir a roupa, no entanto, apareceu um primeiro probleminha. Levara uma fantasia de muitos anos atrás e, simplesmente, não entrou naquele corpo antes de bengala e hoje tendendo  mais a barril. Chateou-se um pouco, mas , com ajuda de um primo, resolveu o impasse. Emprestaram-lhe uma longa e psicodélica  cabeleira  de Caboclo de Lança . Completou o adereço com a indefectível rosa nos lábios e os óculos escuros. Chegando lá , imaginou, daria alguma desculpa  esfarrapada e, certamente, a simples troca do figurino não atrapalharia o script.
                                   Partiu para Olinda com o coração saltando mais que o ônibus nos seus solavancos. Subiu a Ladeira da Boa Hora,  seguiu  a Rua do Amparo e, ao se aproximar da Bodega do Velho, já  percebeu, ao longe, a sua Colombina. À medida que a distância diminuía, no entanto, um sobressalto lhe foi invadindo o espírito. Aquela era Sinharinha ? Balofa, bochechuda, cabelos grisalhos, no rosto não pés-de-galinha, mas todo o galinheiro?  Que acontecera com a menina que um dia conhecera ? Caíra de um avião? Sobrevivera a Colombina à explosão da Columbia ? Por sua vez, Sinharinha, algo enfastiada, vendo a passagem do Caboclo de Lança, pensou consigo:
                                   --- Meu Deus ! Será que Golvino não chega ! Anda aparecendo cada assombração nessa Rua do Amparo ! Isso não é um Caboclo de Lança, mas um Caboclo de Pança ! Xô Satanás !
                                   Golvino ainda pensou em  se identificar. De repente , gelou ! O que ela vai pensar de mim ? Vai ter a mesma decepção ? Era melhor ficar a lembrança  dos tempos passados, pensou nosso Pierrô , agora  mais decepcionado que apaixonado. Que fiquem o Golvino e a Sinharinha do perfil da Rede Social !  Preferiu seguir em frente, como um filho que resolve não comparecer ao velório do pai, para manter na memória um retrato vívido e fulgente , ao invés da máscara mortuária.


J. Flávio Vieira 

segunda-feira, 22 de junho de 2015

SIM! - José do Vale Pinheiro Feitosa

Não!

Não é a arrogância da fé através da igreja. Esta pesada edificação plena de verdades últimas e anátemas àqueles que não se humilham aos pés dos seus longos mantos.

Não foram as agressões apenas porque referência de uma religião sincrética de forte veio africano. Sequer se trata da guerra religiosa.

Não foi a concorrência por adeptos que pagam dízimo. Como também não se trata desta fé cega que se resume aos gritos histéricos de salmos, apenas ruídos verbalizados.

Não lembre as fogueiras da inquisição. Assim como os malfeitos dos puritanos a atropelar todo aquele que não segue suas regras.

Sim.

Lembre-se o apedrejamento de uma criança de onze anos.

Uma criança de onze anos.

Onze anos.

Uma criança.

Assim como teu corpo.

Tua dignidade.

Tu.


domingo, 21 de junho de 2015


Soneto pra minha Cidade
Em seu fértil ventre eu não fui gerada
Mas logo cedo, você me adotou
Como sua filha,sinto-me amada,
Você há muito que me cativou.
Crato, querida tão hospitaleira
De brava gente que sabe lutar
Pedacinho de terra Brasileira
Que sabe conjugar o verbo amar;
Amo você, Crato, minha cidade
Sou-lhe grata pela felicidade
Que sempre preencheu os dias meus
Você pra mim é a Terra mais bonita
O tique taque que seu coração palpita
É o reflexo das bênçãos de DEUS!


sábado, 20 de junho de 2015

RECORDAR É VIVER ??? - José Nilton Mariano Saraiva

Prá você, aí do outro lado da telinha, que tá surpreso com MAIS UMA palhaçada patrocinada pelo jogador Neimar-cai-cai, no último jogo do Brasil na atual Copa América, permitimo-nos transcrever o artigo que postamos aqui mesmo, em 14.07.2014 (portanto quase um ano atrás) após a extravagante derrota do Brasil para a Alemanha, na Copa do Mundo de Futebol, e que trata sobre o dito cujo (Neimar-cai-cai):

...”No mais (e nisso ninguém fala), tivemos também a derrota da mídia brasileira. É que, antes de se preocupar com os adversários do Brasil propriamente, a atenção maior foi, antes e durante a Copa (e até agora, após) tentar incutir da mente dos torcedores que a seleção tinha um novo “LÍDER” capaz de guiá-la ao Olimpo, levá-la aos píncaros da glória, guindá-la ao panteão dos heróis imortais: o tal Neimar-cai-cai, que é apenas um bom jogador e não esse fenômeno que propagam.
Ora, amigos, “LIDERANÇA” não se encontra disponível nas prateleiras das bodegas da vida do interiorzão brabo, nas gôndolas dos grandes supermercados das capitais ou nas bancas das feiras-livres da periferia; “LIDERANÇA” não se compra, não se impõe, não se transfere e nem se atribui via decreto, bilhete, norma, portaria ou coisa que o valha. “LIDERENÇA” é algo natural, de berço, carismática, única, personalíssima. E disso o tal Neimar-cai-cai é desprovido, do dedão do pé à cabeleira moicana.
Assim, nada mais hipócrita que a recorrente imagem da TV mostrando no túnel de acesso ao gramado o tal Neimar-cai-cai abraçando um a um os colegas, antes de cada partida, ao tempo em que o narrador global destacava sua forte “LIDERANÇA” ante os demais; nada mais cafona do que a imagem dos jogadores entrando em campo para uma semifinal de Copa do Mundo usando “bonés” personalizados, saudando o tal Neimar-cai-cai (fora do jogo, por contusão); nada mais ridículo que exibir, durante o canto do Hino Nacional, a camisa do tal Neimar-cai-cai, como se fora ele um “herói” já falecido, a quem todos devêssemos reverência (passa longe, bem longe disso). Deu no que deu.”

Agora, e voltando à atualidade: quem quiser saber das imoralidades, mutretas e falcatruas do mundo futebolístico, não pode deixar de ler o livro “O Lado Sujo do Futebol-A trama de propinas, negociatas e traições que abalou o esporte mais popular do mundo” (editora Planeta do Brasil, 2014, 382 páginas) onde... “os autores desmontam uma intricada rede de corrupção, que envolve grandes multinacionais, emissoras de televisão, empresários, clubes, políticos e jogadores”.

Lá, por exemplo, tomamos conhecimento que “NIKE”, patrocinadora da seleção brasileira de futebol, indicava quais os integrantes que deveriam compor a comissão técnica da seleção e, posteriormente, quais os jogadores que deveriam ser convocados por essa mesma comissão, os adversários que enfrentaríamos e por aí vai; também, em conluio com a CBF-televisão, que os jogos se realizassem em horários “apropriados” (quase meia-noite); chegou, inclusive, a impor ao comando técnico da seleção a escalação do Ronaldo Gordo Nazário, na final da Copa do Mundo da França, mesmo e apesar de dopado por analgésicos e protegido por coletes ortopédicos que literalmente o mantinham de pé; lá temos, também, todos os detalhes (inclusive valores e cópias de documentos) da transação-fraudulenta entre o então presidente do Barcelona, Sandro Rosell (representante da “NIKE”) e o pai do Neimar-cai-cai, visando sua transferência para o clube catalão (hoje questionada pelas justiças espanhola e brasileira); lembremo-nos que à época a imprensa brasileira considerou o “papai-Neimar” um autentico “mago das finanças” devido à esperteza demonstrada na transação. Deu no que deu.


Enfim, lamentavelmente temos que aceitar que os desonestos dirigentes do futebol brasileiro e seus jogadores não estão nem aí para com a antiga paixão nacional, e que o transformaram num antro de corrupção e safadeza, onde uns poucos se beneficiam com muito.

sexta-feira, 19 de junho de 2015

O Profeta Apoquetílico

                                                     
                                                         
                                                                                                                    J. Flávio Vieira

Robledo Ipueira terminou eleito, em Matozinho, com uma votação recorde. O poder político até então se alternava entre dois grupos acirradamente inimigos : Os Cangatis e os Carrapatos. De início, ninguém imaginou que a regra pudesse ser um dia estilhaçada. Robledo nem matozense era. Chegara por ali há pouco mais de dez anos e se meteu no ramo de mandioca, produzindo farinha, goma e beiju. Os negócios prosperaram , impulsionados por seguidos anos de invernos fartos. De conversa fácil e traquejo no ofício, Ipueira construiu muitos amigos. Toda Matozinho, no entanto, olhou com ceticismo sua candidatura a prefeito da cidade. Parecia fadada congenitamente ao fracasso. Depois de tantos e tantos anos de alternância dos mesmo lobos guarás de sempre, no entanto, os desgastes se vão tornando insuportáveis. A candidatura de Robledo apareceu, assim, como uma novidade tanto que, rapidamente , os Cangatis e Carrapatos se uniram pela primeira vez na história e apresentaram uma chapa concorrente a Ipueira, tendo como candidato Ronivaldo Cangati e , como vice, Garibaldo Carrapato. Se vencedores, claro, rapidamente brigariam, mas o intuito era tirar a possibilidade de um terceiro vir a dividir o bolo político.
                                   Teria sido, uns cinco  antes do período eleitoral,  que por ali aportou um beato de  barbas longas e  níveas como leite mugido. Vestia-se com roupas de saco , sandálias currulepes. Trazia aquele ar de quem não tomou o gardenal todo :  Olhos aboticados e cabelos desgrenhados. Instalou-se, numa palhoça, numa área próxima à subida da Serra da Jurumenha. Chamava-se Apurinã , tinha voz pausada e cavernosa e vivia, em seus sermões, relembrando grandes catástrofes bíblicas e ameaçando os pecadores com as labaredas do inferno e as sete pragas do Egito. O povo, carinhosamente, o chamava de Pai Nanã. Aos poucos, o beato foi acumulando seguidores, principalmente, quando, um belo dia, anunciou o final dos tempos. O mundo acabaria no dia 28 de Outubro de 1999 de um grande terremoto,  seguido de explosões vulcânicas, fogo e, finalmente, os mares invadiriam as terras num novo dilúvio.  Pai Nanã tivera essa visão , num sonho, em que a Virgem lhe aparecera e alertara: O criador, cansado de tantos pecados da humanidade, resolvera deletar o mundo e, talvez, começar de novo tudo, após um upgrade.
                                   O povo de Matozinho, cansado do mesmismo , empurrou a única porta que  viu à frente para fugir daquela enrascada. Robledo terminou eleito com quase 70% dos votos. Assumiu o governo em 1995, para a alegria de todos, transportando um caminhão de esperanças. Votação tão expressiva carregava consigo uma enorme responsabilidade, eram inúmeras  as demandas da cidade, após tantos e tantos anos de “venha a nós e nada a vosso reino”.    Rapidamente, no entanto, o povo de Matozinho descobriu que tinha trocado égua por biroba. Robledo não possuía qualquer tino administrativo. Envolveu-se com secretários piores que ele. Varava o terceiro ano do mandato e não se contava uma obra só de relevância no município. Postos de Saúde fechados, Escolas sem merenda escolar, ruas esburacadas. Ipueira andava escondido, despachava cada dia em um local diferente, temendo as cobranças.  Daí terá vindo talvez  seu apelido : ” Robledo Manipueira”.
                                   O último ano do mandato do nosso edil coincidiu com a terrível profecia de Pai Nanã. Vendo a cidade devastada, os matozenses descobriram outras razões para acreditar no fim do mundo. Os dias que antecederam o fatídico 28 de outubro daquele 1999 foram de intensa agitação na cidade. Todos carregavam um ar de desespero, como se estivessem perpetrando seus últimos atos . Pai Nanã, uma semana antes, conclamou todos a subirem para Serra da Jurumenha. Acreditava que lá em cima, talvez, houvesse ainda alguma chance de escapar do fogo e da inundação.
                                   Matozinho praticamente esvaziou naqueles dias que antecederam à previsão terrível de Pai Nanã. Uma multidão de maltrapilhos se acotovelava em cima da Serra, esperando as horas finais. Choravam, rezavam, se abraçavam. Pai Nanã exortava a todos pedirem perdão dos seus pecados e exercerem entre si  milagre libertário do perdão. O Dia 28  amanheceu  trazendo, já nos seus primeiros raios, claros sinais do apocalipse vindouro. Uma chuva persistente, com trovões de estalo que simulavam os tremores de terra previstos para logo mais.  O clima entre os fiéis era de gado indo para o matadouro. À tarde, porém, a chuva cessou e o céu se abriu. As horas se passaram sem mais atropelos. Quando o dia 29 por fim chegou, sem que nada tivesse acontecido,  trouxe, junto, uma mescla de alívio e desapontamento. Pai Nanã , desconfiado, tentava entender onde teria errado na interpretação da profecia. Começaram todos a descer a serra. Pela trilha íngreme da descida iam se aproximando de uma Matozinho  arrasada, suja, triste e esburacada e, pior, sem vivalma. De repente, Jojó Fubuia que resolvera , pelo sim, pelo não, providenciar seu próprio dilúvio etílico, com a voz tropa como se sofrera um ramo, virou-se para Pai Nanã e disse, olhando para Matozinho que se aproximava :
                                    --- Pai Nanã, fique triste não, homem de Deus , sua profecia tava certa! Você só errou a forma do acabamento do mundo. Num era de fogo nem água não !
                                   -- Como assim ? -- Quis saber, um Nanã cabisbaixo.
                                   O mundo se acabou foi de veneno, Pai Nanã!  De veneno !
                                   --- Veneno ? Que veneno ? Você tá é bêbado, seu Jojó !
                                   Jojó, então, como um profeta apocalíptico ou apoquetílico , lascou :
                                   --- Manipueira, Pai Nanã ! Manipueira foi que acabou o mundo !


Crato, 19/06/15

terça-feira, 16 de junho de 2015



É A NATUREZA ESTÚPIDO! - José do Vale Pinheiro Feitosa

“Riqueza são aquelas coisas materiais produzidas pelo trabalho humano que satisfazem desejos humanos e podem ter valor de troca”. -  John Atcheson, citando Adam Smith que disse: “Riqueza é material, não podemos considera-la uma habilidade física ou mental humana. Ela é produzida pelo trabalho. A terra tem todas as características, só que não é produzida pelo trabalho. O dinheiro não é riqueza, mas um meio de troca. A riqueza, no entanto, deve ter valor de troca”.


Frase de Delfim Netto no período mais negro da Ditadura Militar, logo após o AI 5, quando ele disse: “é preciso fazer o bolo crescer para depois dividi-lo” se coloca na mais pura falácia do capitalismo segundo a análise de dois séculos feita por Thomas Pikkety. Na verdade, a esperança distributiva do capitalismo industrial avançado, nunca se concretizou e a ideia não é original de Delfim Netto. Dizia isso Simon Smith Kuznets, russo radicado nos EUA que desenvolveu uma curva que relacionava crescimento do produto à desigualdade de renda.

Pikkety destrói a falácia ideológica predominante na guerra fria de que o capitalismo estaria sujeito a um determinante econômico onde o desenvolvimento das suas forças produtivas levaria automaticamente à distribuição de renda. O seu trabalho demonstra que não há uma lei econômica inexorável que conduza à distribuição de renda. E nem à concentração.

O seu trabalho, no entanto, revela muito bem que a porção mais pobre continua tão pobre como há duzentos anos, que neste intervalo surgiu uma classe média que aumentou sua participação na distribuição das riquezas e que os ricos, inicialmente, perderam participação, mas agora concentram mais retirando meios da classe média.

Mas tem um lado importante do trabalho do autor francês: o crescimento médio da economia mundial desde a revolução industrial (1700 a 2015) foi de 1,6% e metade deste crescimento (0,8%) devido ao crescimento populacional. Crescimento mesmo do PIB per capita foi de 0,8%.  Crescimentos mais acelerados só ocorrem em países se recuperando em relação aos outros ou após guerras destrutivas. Quer dizer: se for subtraída a parcela desnivelada e as perdas de guerra, o crescimento é muito menor.
A questão do crescimento, que faz com que uma geração tenha melhores condições que seus país é bem abordada pelo pensador francês, considerando níveis ótimos em torno de 1 a 2% e perigosa a ideia do crescimento zero, quando cada geração ficaria pior que seus pais. Não se esqueçam que crescimento nos termos estudados consideram aumento de população e do PIB real (riqueza sobre o número de pessoas existentes) e por isso taxa de crescimento demográfico zero ou negativa leva a mero consumo das riquezas já acumuladas.

Mas aí vem a questão central quando diz Pikkety: “Melhorar a avaliação e valorização do capital natural é uma questão central. A degradação do capital natural é um risco maior do que qualquer outro. Esta é a verdadeira dívida(...) O problema real é que não estamos em dívida com Marte, mas com o planeta Terra (...). No entanto, um aumento de 2ºC na temperatura do planeta em 50 anos não é apenas um jogo de palavras. E não dispomos de nada para resolver o problema do custo imposto ao capital natural.

E ele continua apontando a questão do meio ambiente na evolução e futuro do capital e seu crescimento: “É preciso levar em conta o que foi destruído, contabilizar o capital natural. Contabilizar o que é criado sem reduzir o que foi destruído é estupidez. Então a reportagem levanta com Pikkety que vivemos num impasse com um capital muito poderoso e uma impressa muito forte.

Pikkety responde - “Tendência passadas sugerem que as coisas podem mudar mais rápido do que imaginamos. A história da desigualdade, da renda, da riqueza e dos impostos é cheia de surpresas. O que vai acontecer ainda é totalmente incerto, e temos vários futuros possíveis. Além disso, há diferentes maneiras de resolver estes problemas: de forma mais ou menos rápidas, mais ou menos justa e mais ou menos cara”.



domingo, 14 de junho de 2015

Sempre no meu coração - José do Vale Pinheiro Feitosa


Porque as fotos coloridas, quando cores não existiam, no filme e na revelação. E elas eram coloridas. Suavemente coloridas, dégradée, assim como as sombras do nosso corpo.

E a correnteza do tempo não é apenas um fluxo vazante. Com frequência a ausência e o intervalo calendário nos comovem em esquecimento. Mas é certo que no recôndito de camadas de anos aquele permanente fato é como um remanso na correnteza.

Assim como as caras, apenas elas, em várias poses, que contam a estética da época, traduzem uma permanência tão sólida como meus dedos digitando estas palavras. As caras nas paredes imorredouras do domicílio de um tempo de gentes e acontecimentos.

E o cinema. Que ideia força a criar imagens! Poses sugeridas das estrelas e estrelinhas de suas salas em plenitude de domingos. E lá estava Marisol na imagem de uma menina da terra.

E os leões da “casa dos leões” ao ladear a entrada para o estúdio. Uma sala de cores neutras, focos de luz, assentos, guardas-luzes, efeitos do clic mais saliente que os arranjos de laboratório (na fase digital o Fotoshop).

Isso é uma era. E não o passado do verbo ser. É uma linguagem viva com integral léxico ao mundo atual. Quem não compreende as palavras não pode se apresentar no escapismo do novo ou do presente. E quem não compreende e desdenha, mostra uma lagoa seca. Sem novas fontes de abastecimento.

Assim como as fotos coloridas de Telma Saraiva, em sua elegância apresentada, ela e as fotos, dizem de um tempo em remanso. Que gira, acumula, retém, sem perder-se rapidamente a jusante.

Como canções que enterneceram minha mãe em seu eterno romantismo. Uma das últimas conversas que tive com ela, um pouco mais do que dezesseis anos de idade, narrava-me todo o enredo de um filme de encontro e desencontro de um homem e uma mulher em plena 2ª Guerra Mundial. Na ponte londrina de Waterloo.

Assim como Ernesto Lecuona, mais um dos gênios latinos da canção do século XX, o cubano compositor de Siboney, Malaguena e Babalu. Qual sua canção que ganhou um Oscar na trilha sonora de um filme. A canção que minha mãe sempre cantava.


Sempre no meu coração. O remanso da permanência sobre o desgaste do esquecimento.  

sexta-feira, 12 de junho de 2015

E OS LADRÕES DA FIFA? - José do Vale Pinheiro Feitosa

“Já alguma vez se perguntaram como é que acontece que estes governos e o capitalismo continuem a existir apesar de toda miséria e problemas causados ao mundo?” – Alexandre Berkman.

E a crise da FIFA?

O FBI mandou prender pessoas de várias nacionalidades na Suíça. Não se sabe quando serão deportados para as cortes americanas, mas já estão sob a tutela delas. Há alguma contradição nesta notícia?

Muitas. Mas uma central: fazer negócio, receber bônus, privatizar bens públicos, fazer lobby e se tornar um vitorioso biliardário é a própria natureza do sistema cuja alma se encontra nos EUA.

Então tome siglas para nos confundir: FIFA, FBI e EUA. Pois é esta natureza sintética das instituições que reproduz a bomba de efeito moral. O mundo está revoltado com os corruptos.

Não com os ricos. Os biliardários não, mas com os corruptos. Mas onde fica o limite entre os dois? Alguém em consciência desperta consegue demarcar?

E tem uma questão clara. Nem um dos mais vitoriosos produtos do mundo consegue esconder um volume tão acelerado e corrupto. Falo da Microsoft. Quantas pernadas, esmagamento, oligopolização, sabotagem praticou e pratica, inclusive com sonegações fiscais imensas.

As corporações lutam pelo domínio do patrimônio geral da humanidade, incluindo os bens tangíveis como solo, água e ar e bens intangíveis como a cultura. Querem cobrar um pedágio universal permanente por tudo que exista, inclusive o ar que se respira. Assim como a telefonia celular que cobra caro para você se comunicar com outro.

E aquela junta de siglas? Corre célere a desconfiança que os EUA, que têm uma vida caríssima, (imensa armada espalhada pelo mundo, bases aéreas nos quatro cantos, milhões de militares, tudo em plena atividade), precisam das reservas feitas por entes privados no fundos bancários.

Por isso os paraísos fiscais começam a entrar na mira tendo que revelar seus depósitos para autoridades americanas. E já começaram a buscar os fundos dos “ladrões” da FIFA. Depois, o americano médio suspeita, vão investir sobre todo tido de fundo de pensão, de renúncias fiscais tradicionais, depósitos individuais e outros mais para compensar o aparelho de guerra montado para manter os “negócios” de siglas como a FIFA.

A pergunta que imediatamente nos afronta. É possível manter um status desta natureza, quando se esfaqueia exatamente aquele meio social que sustentou com trabalho e crença este sistema capitalista? Normalmente é este tipo de fogo que aumenta a pressão até o momento em que o acúmulo entra em ebulição e uma revolução acontece.

Berkman, aquele da frase acima explica: “as pressões vindas de cima (opressão política e econômica); as pressões vindas de baixo (emancipação, ativismo e pensamento crítico); a disseminação e debate de ideias críticas que facilitem a emergência de subjetividades rebeldes (esclarecimento). Este é o ponto de mutação da realidade.

Slavoj Zizek afirma: “Estou convencido que numerosos problemas como os ecológicos, biogenéticos e novas formas de apartheid não podem ser resolvidos pelo capitalismo global.” Uma frase interessante no mínimo.

Hoje se noticia que Israel joga os judeus negros e asiáticos no fundo da escala social. Há o predomínio do judeu branco. Que veio da Europa e nem semita geneticamente deve ser.

Aliás a ideia de raça branca é indissociável do território Europeu. É no território que as etnias se fundaram. Não pelo dedo de Deus.  


O último clique da velha Rolleyflex

J. Flávio Vieira 


“A beleza pode ser vista em todas as coisas,
ver e compor a beleza é o que separa
 a simples imagem,  da fotografia”
Matt Hardy

                                              A aquarela caririense esmaeceu esta semana, quando caíram por terra a câmara e o pincel da nossa querida D. Telma Saraiva. Fechou-se, naquele instante, uma gloriosa página da Cultura do Sul do Ceará, quando plainou , a caminho do infinito,  a última pioneira da fotografia na nossa região. D. Telma descendia de uma plêiade de fotógrafos que , por quase cento e cinquenta anos, vinha registrando, meticulosamente, o cotidiano caririense, as mudanças e os impactos nas nossas paisagens exteriores e interiores. Desde Manoel Biserra de Mello , o primeiro fotógrafo itinerante que por aqui aportou em 1886; passando por Luiz Gonzaga Martiniano da Costa que firmou o primeiro ateliê fotográfico da região em 1901; por Pedro Maia, o artista da câmara mais importante  nos anos 20-30, até Júlio Saraiva Leão que entregou  o bastão à filha; somaram-se, sucessivamente,  os nossos cronistas fotográficos em terras de Frei Carlos. Esta semana, por fim, quebrou-se, indelevelmente, o último cálice de cristal da nossa prateleira. Estilhaçou-se o Daguerreótipo e, por incrível que possa parecer, um daguerreotipo colorido.  

                                   D. Telma descendia de uma tradicional família ligada umbilicalmente às artes . Seu Tio, Cesário Leão, fora ator e músico;  Salviano Saraiva , irmão, um dos mais renomados atores caririenses e , depois, o mais importante fotógrafo de estúdio da capital pernambucana. Sem falar em Júlio Saraiva, seu pai, um dos pioneiros da fotografia no Ceará  e um urbanista dos mais inspirados. A Júlio devemos os mais bonitos cartões postais de Crato nas décadas de 40-60.  D. Telma  nasceu neste berço artístico e teve sua vida congenitamente traçada. Dedicou-se, desde cedo, embebida pelo cheiro do colódio e da prata, à fotografia e especializou-se em fotos de estúdio, talvez porque lhe fosse mais fácil conciliar a arte que abraçava quase como predestinação, às  atividades domésticas. E mais, artista plástica intuitiva, descobriu que era possível sim, associar a fotografia à  pintura, com vantagens vultosas. Conseguia dar cores às fotos ( numa época do preto-e-branco) , tirar possíveis incorreções ou defeitos ( uma espécie de photoshop pré-histórico) e  dispensava as longas seções de pose dos modelos imprescindíveis em caso de pinturas. Essa técnica apurada , nos últimos tempos, terminaram por lhe dar renome internacional.
                                   A Fotopintura  havia sido inventada por Disdéri em 1868 e foi introduzida no Brasil por um dos únicos fotógrafos portugueses da nossa história  : Insley Pacheco. Aqui, no Cariri, a técnica fora empregada pela primeira vez pelo fotógrafo itinerante José Ribeiro em 1904. Telma Saraiva aperfeiçoou a técnica original,  montando-se na intuição e  nos novos avanços tecnológicos da arte fotográfica.
                                   Outro pioneirismo da nossa artista foi de gênero. A Fotografia no mundo sempre foi extremamente masculina.  No Brasil, nos primórdios da arte, apenas uma mulher havia se destacado: Henriqueta Harms que montara um ateliê no Rio de Janeiro em 1851. D. Telma Saraiva  teria sido um caso único no nosso estado e deve ser considerada a grande Dama da Fotografia no Ceará.
                                   Pacientemente, entre os cliques e  pincéis, nossa artista bordou um gigantesco painel iconográfico da região. Sua Galeria  não se encontra fechada entre muros : expõe-se no mural da Chapada do Araripe. Suas fotos estão expostas em milhares de lares,  registrando o verdor dos anos e os sorrisos abertos de muitas e muitas gerações. Foi um prisma que, entre nós, obrou o milagre estonteante da refração.  Hoje, depois do último clique da antiga Rolleiflex, o Cariri todo se dá conta de que,  quando D. Telma pintava as fotos de estúdio, transformando sépias em aquarelas , ela não apenas coloria rostos  e faces sorridentes, ela enchia de cores e de brilho a própria história caririense.  


Crato, 12/06/15    

O UNIVERSO NÃO DÁ MARCHA A RÉ - por José Almino Pinheiro

Das extraordinárias qualidades que Deus dotou o mundo, uma das  principais foi a de que nada tem volta, o universo não tem freio nem marcha a ré, ele gira, explode, expande, encolhe, mas não para, segue sempre em frente. Com esta simples constatação a vida fica mais simples, a convivência melhor compreendida. Como a vida faz parte do mundo, também não para nem dá marcha a ré, o jeito é tocar para a frente. Assim as decisões e escolhas ficam limitadas, mais fáceis de serem tomadas. Recomeçar qualquer coisa que deu errado, provavelmente também não dará certo.  O que precisa é melhorar o que já foi feito. Se brigamos ou sofremos algum acidente não tem como apagar, tem que sarar e tocar pra frente.
A humanidade começou a vida de uma maneira simples, sem muitas complicações além daquelas necessárias para a sobrevivência. Pena que Adão e Eva tenham atrapalhado o idílio Divino. Alguns milhares de anos depois, chegamos aos dias de hoje com guerras, dilúvios, pestes, escravidão, sacanagens de toda ordem para justificar a conseqüente exploração de uns por outros.  
Uma  lição que tiramos disso é que no início, e ainda hoje, nos aglomerados humanos um pequeno grupo de privilegiados manda e explora a imensa maioria, usufruindo e acumulando praticamente sozinho o resultado do trabalho da maioria. Mas, como o mundo não para e a luta pela sobrevivência continua, sempre ao custo de desesperadas lutas por uma divisão mais justa do produto do trabalho e das riquezas, a classe dominante, a contragosto, tem que ceder privilégios. Países antes com monarquias absolutistas, para sobreviverem, tiveram que mudar para monarquias parlamentaristas. Lembrando que algumas delas perderam a parada e hoje são repúblicas.
Infelizmente o avanço não é uniforme, mas não para. Por exemplo, no caso do Brasil, a escravidão foi extinta oficialmente em 13 de maio de 1888; após 55 anos, em primeiro de maio de 1943, veio a CLT - Consolidação das Leis do Trabalho - que alguns especialistas consideram como as primeiras leis “complementares” à Lei Áurea. A CLT aos poucos se aprimora como com a Lei de 19 de dezembro de 2000 que proíbe o trabalho infantil, e mais recentemente, em 26 de março de 2013,  com a  aprovação da Emenda Constitucional nº 66, a chamada PEC das Domésticas. De forma que passaram 125 anos para que, finalmente pelo menos na lei, todos os trabalhadores tenham os mesmos direitos.

Como mostra a história, não é difícil imaginar que o esforço das classes dominantes para manterem sozinhas os privilégios é uma luta perdida. Nessa guerra, no máximo ganham tempo.