por José do Vale Pinheiro Feitosa




Viva junto à alma mais próxima e compreenda que a proximidade é a medida da distância. Que a distância que os separa é este movimento maravilhoso da matéria e da energia. A maravilha é apenas esta surpresa porque esta proximidade é tão diminuta entre os dois e é a inesperada distância.

José do Vale P Feitosa



quarta-feira, 15 de fevereiro de 2012





Ainda não me livrei do bom cansaço.
Fui gulosa na intensidade de viver uma semana no Rio. Andei por todos os lugares, caí de boca, literalmente, na Gastronomia, e apreciei de um jeito ou de outro tudo que estava acontecendo na terrinha, misturada com os aposentados e trabalhadores do lugar.
Os cariocas ensinaram-me a ser mais gentil, e a ser feliz "por nada", como diria Martha Medeiros.
Sinto uma preguiça enorme de escrever, e uma disposição inusitada de viver.
A vida voltando ao ritmo normal trará de volta novos sonhos e suaves lembranças.
Tô ligada pra ver o desfile das Escolas de Samba, depois de uma passagem fantástica pelos seus Barracos.
É de arrepiar o trabalho árduo/artístico que acontece nos bastidores- a estrutura orgânica- garantindo o ensaio geral, e o desfile apoteótico.
Fiquei encantada com a Portela, Beija-Flor, Império Serrano,Mangueira... Sem deixar de torcer pelo Salgueiro!
Senti-me protegida no Rio. Gastei minhas havaianas, sem correr nenhum risco.

Tô feliz!


Pelé e Bidu - José do Vale Pinheiro Feitosa

Conheci a vida em pessoa. Alcoolista a ponto de ter o álcool como um veneno que lhe subtrai o mundo e a vida. Por isso milita no AAA de sua cidade. Alto, magro, um gingado da raça, tão bom de bola na adolescência que recebeu o apelido de Pelé e até hoje o é.

Na altivez da vida. Aos setenta e dois anos terminando a terceira série do segundo grau. A razão? O que mais gosta na vida é o conhecimento. Agora tomando aos goles de teoria a mesma eletricidade que soluciona nos automóveis. E eis que a física que é sua prática e hoje a teoria escolar, está na razão da sua síntese. O quê expressa Pelé? Este que vos falo!

A síntese dialética entre fim e eternidade. De todos os conceitos o “fim” é o terminativo de todos os demais conceitos. Os conceitos expressam o mundo em movimento, se não como dinâmica própria seja como parte a contrapor-se (ou complemento) a outro conceito. Já o fim é a cessação do movimento.

Como Pelé, somos mortais, portanto chegados a um fim. Tomamos conceito de fim como absoluto. A bíblia o radicaliza como o fim dos tempos. Afinal é contundente que a antiguidade já tenha reconhecido que o tempo expressasse o movimento do mundo (ou, seja contundente que ainda continuemos com a antiguidade em nós).

Mas o fim de Pelé se encontra numa dinâmica exterior a ele, que se prolonga muito além do último Pelé que o mundo criar. Então: Pelé é a finitude que se estica neste momento na eternidade. O conhecimento é prova da eternidade. E digo com toda certeza apesar dos grandes quilômetros a nos separar neste momento.

E foi no compasso dos dias que tomei conhecimento da história amorosa de Bidu. Um cão pincher, com aqueles olhos saltados mas um contraponto de personalidade que lhe é comum pela raça. Bidu era amoroso. Nada nervoso. Latia para estranhos, mas não com todos aqueles tremores da raça.

Um dia apareceu uma gatinha, ainda na fase de crescimento, e resolveu adotar o nicho ecológico de Bidu. Ao invés de Bidu fazer a explosão da espécie quais os humanos caricaturam como cão e gato, ele cai de amores pela gatinha. Sei, os mais velhinhos que diziam gatinha logo pensam no acerto, mas convenhamos que a lei humana é: cão persegue gato.

E Bidu faz a corte, lambidas, patas abraçando, tentativas de contato físico. A gatinha se esquivava dos carinhos como podia, mas adotara além do nicho. Adotara Bidu. E Bidu sendo aceito, se desmanchava em tentativas. Todas cruzadas pela divisão das espécies, mas a zoologia não era a classificação dos dois.

Bidu fazia outra classificação: a do amor. Tomado de amores não se afastava nem para alimentar-se. Onde ela fosse, iria atrás. Onde estivesse também estaria. Onde se encontra lá está. Foi aí que o dono de Bidu, tomado de pena com a cena contraditória dizia:

- Bidu! Rapaz! Isso não vai dar certo. Bidu! Não vai dar certo!

Bidu nem aí para os conselhos. Se não fosse um cão enorme e de dentes afiados a destroçar a cabeça da gatinha, a história teria um tempo de Romeu no jardim e Julieta na sacada a se prolongar. E Bidu não largou sua amada no transcurso do seu último respirar.

Os vórtices da paixão humana - Emerson Monteiro


E quando o tempo fecha, vinda de dentro do coração a força descomunal dos rios cheios de arrancar as pedras, arrebentar e destruir, apertar o tórax a ponto de prender a respiração, faz nascerem os surtos maravilhosos dos planos imaginários do que se chamar paixão. Sem lugar de repouso, ímpetos de querer fugir lá para longe como objeto do desejo, e esquecer, no passado, as belas construções e a família, jogar fora os valores alimentados anos a fio, essa fome do impossível trava a boca do estômago, pedido surdo de espaço no território inexplorado das ilusões, os vórtices de paixões jamais experimentadas, que já invadem com farra a paz dos inocentes. Nisso a vontade incontida do sonho ciranda acelerada, de revirar o mundo e reconstruir as intenções pela vida afora, junto de quem chegou o momento fantástico da mudança.


Saber que possui os direitos da razão, eis missão das mais ingratas. Ninguém anda nos campos do coração, nem o próprio dono, livre de machucar, vez ou outra, os frágeis pés. Ali, aqui, sopram os ventos da ansiada liberdade recém adquirida nos bancos da Natureza. Dominar, no entanto, significa talento de sabedoria, inteligência maior de personalidade, gosto do equilíbrio em andar maneiro longe das destruições arriscadas da fria irresponsabilidade.


Contudo, ainda saíram até aqui só poucos professores neste assunto, formados na escola da experiência. Alguns poetas e romancistas trabalharam o tema, porém chegaram pouco no transmitir da certeza de controlar as batidas dos corações apaixonados. O cancioneiro popular talvez olhasse mais próximo, com suas modinhas doridas, marcas rumorosas das primas e dos bordões, a vibrar as madrugadas insones das curvas idolatradas do ser amado.


Bom, em matéria de sentimentos incontidos nas quatro linhas da razão restam fora de propósito quaisquer cogitações asseguradas na luz da consciência pura. Vira de lado, corre agitado, abandona o lar, o desespero parece querer tomar conta dos protagonistas presos nas garras de aço da paixão. Eis matéria viva das contradições humanas, circunscritas ao calendário das idades. Vem silenciosa, rasga o teto da tranquilidade na história pessoal e despeja os tonéis de tempestade no peito dos solidários boêmios da esperança e parceiros iluminados.


Houvesse justificativas nas tantas circunstâncias do inesperado, poucos achariam as jóias de explicar a dor da paixão nos pobres corações humanos. Respeitar, no entanto, a febre da paixão de todos cabe descobrir qual jeito de poder mora no íntimo do amor de cada ser.

Dentro de um abraço- Martha Medeiros





Onde é que você gostaria de estar agora, nesse exato momento?

Fico pensando nos lugares paradisíacos onde já estive, e que não me custaria nada reprisar: num determinado restaurante de uma ilha grega, em diversas praias do Brasil e do mundo, na casa de bons amigos, em algum vilarejo europeu, numa estrada bela e vazia, no meio de um show espetacular, numa sala de cinema assistindo à estréia de um filme muito esperado e, principalmente, no meu quarto e na minha cama, que nenhum hotel cinco estrelas consegue superar – a intimidade da gente é irreproduzível.

Posso também listar os lugares onde não gostaria de estar: num leito de hospital, numa fila de banco, numa reunião de condomínio, presa num elevador, em meio a um trânsito congestionado, numa cadeira de dentista.

E então? Somando os prós e os contras, as boas e más opções, onde, afinal, é o melhor lugar do mundo?

Meu palpite: dentro de um abraço.

Que lugar melhor para uma criança, para um idoso, para uma mulher apaixonada, para um adolescente com medo, para um doente, para alguém solitário? Dentro de um abraço é sempre quente, é sempre seguro. Dentro de um abraço não se ouve o tic-tac dos relógios e, se faltar luz, tanto melhor. Tudo o que você pensa e sofre, dentro de um abraço se dissolve.

Que lugar melhor para um recém-nascido, para um recém-chegado, para um recém-demitido, para um recém-contratado? Dentro de um abraço nenhuma situação é incerta, o futuro não amedronta, estacionamos confortavelmente em meio ao paraíso.

O rosto contra o peito de quem te abraça, as batidas do coração dele e as suas, o silêncio que sempre se faz durante esse envolvimento físico: nada há para se reivindicar ou agradecer, dentro de um abraço voz humana nenhuma se faz necessária, está tudo dito.

Que lugar no mundo é melhor para se estar? Na frente de uma lareira com um livro estupendo, em meio a um estádio lotado vendo seu time golear, num almoço em família onde todos estão se divertindo, num final de tarde à beira-mar, deitado num parque olhando para o céu, na cama com a pessoa que você mais ama?

Difícil bater essa última alternativa, mas onde começa o amor senão dentro do primeiro abraço? Alguns o consideram como algo sufocante, querem logo se desvencilhar dele. Até entendo que há momentos em que é preciso estar fora de alcance, livre de qualquer tentáculo. Esse desejo de se manter solto é legítimo. Mas hoje me permita não endossar manifestações de alforria. ...recomendo fazer reserva num local aconchegante e naturalmente aquecido: dentro de um abraço que te baste.


Serviço: FELIZ POR NADA, Martha Medeiros. Porto Alegre, RS: L&PM, 2011.