por José do Vale Pinheiro Feitosa




Viva junto à alma mais próxima e compreenda que a proximidade é a medida da distância. Que a distância que os separa é este movimento maravilhoso da matéria e da energia. A maravilha é apenas esta surpresa porque esta proximidade é tão diminuta entre os dois e é a inesperada distância.

José do Vale P Feitosa



quarta-feira, 30 de abril de 2014

Pelé e o Brasil - José do Vale Pinheiro Feitosa

A consciência crítica sobre a ditadura e o massacre social no nosso país sempre viu Pelé como um mito que não se preocupou com as origens de classe e etnia de sua família. Nunca fez um gesto para denunciar o status quo que sufocava os pobres e nem levantou lebres contra o racismo que se expressa contra a população que se originou na África.

Pelé, um negro e ídolo popular, chegou até falar em amor quando vivíamos uma das situações mais críticas de repressão política. Gostava de aparecer ao lado dos poderosos e andou bem distantes de mitos negros de repercussão mundial como Miriam Makeba que abriu uma luta mundial contra o Apartheid em sua África do Sul.

O que se diz sobre ele no mundo sujo do marketing, associações com empresas, patrocínios e contratos de jogadores é uma corrente que toma energia na mesma fonte dos velhos cartolas do futebol. A face corrupta e mercenária por vezes é assacada contra ele nos meios de comunicação especializado.

Por tudo isso Pelé é posto do outro lado da rua em relação àqueles que lutam por uma vida melhor, por justiça social e por maior igualdade pública. Mas aí é que começa a minha narrativa.

Pelé foi por muitos anos o maior símbolo da capacidade dos negros em todas as sociedades que os discriminam. Pelé, pode ser que não Edson Arantes do Nascimento, mas Pelé é a força da raça, o vitorioso, o gênio aquele ser superior que toda cultura deseja. Especialmente a cultura dos povos explorados e oprimidos.

Pelé, até por ser brasileiro, por vir de um país pobre e sujeito às tempestades dos impérios arrogantes, terminou por representar no imaginário de povos em igual situação a rota da superação histórica. Por isso todo brasileiro que estivesse no mais remoto lugar da Ásia, da África, da América do Sul e até da Europa era automaticamente identificado por Pelé. Pelé era sinônimo de brasileiro.

Esta coisa que o Brasil ainda carrega. De ser este gigante territorial que pode contribuir com outro modo de fazer política. De ser alegre, tolerante, aberto à diversidade, lutar pelo progresso material nacional mas sem comandar a estratégia imperial do domínio e do controle dos povos.

Este Brasil mulato, branco, negro, indígena e japonês que é cor de todas as cores.   


Em conclusão: os setores mais progressistas não conseguem ver em Pelé a essência da sua genialidade popular e o mais arraigado pensamento de direita, que deseja ser o Brasil o mero reflexo de um espelho do majestoso imperial do hemisfério norte, vê no nosso povo apenas a sua marcha serviçal. 

"É FOGO" - José Nilton Mariano Saraiva

Numa dessas nossas andanças pelo Brasil, certa vez desembarcamos em Curitiba, a belíssima e agradável capital do Paraná, já à noitinha e com o tempo bastante frio. Em chegando ao hotel, a surpresa: no hall, dentro dos elevadores, nos corredores, nas portas dos apartamentos e, enfim, por todo o prédio, cartazes em letras garrafais anunciavam: “A falta d’agua é fogo”.

De princípio, não demos maior importância, porquanto a prioridade era se acomodar o mais rápido possível e logo partir para conhecer a noite curitibana.
E aí a surpresa: ainda no elevador, o “office-boy” encarregado de transportar as malas, notando o sotaque diferente dos integrantes do grupo, indagou de onde éramos. Ao saber sermos cearenses, do Crato, Fortaleza e tal, identificou-se como também cearense, só que se São Benedito, na Serra da Ibiapaba. Não se conteve e, apontando para o cartaz afixado numa das laterais do elevador, disparou: “Tão vendo isso aí ? É que aqui tá faltando água há vários dias e “eles” tão passando por grande dificuldade” E emendou: ”Eu acho é pouco. Só assim “eles” vão ter consciência do sofrimento que nós, nordestinos, passamos com a seca”. Já instalados, telefonema da portaria reverberava o dito pelo office-boy: “Senhor, queríamos comunicar-lhe que toda a cidade está com problemas de falta d’agua e, assim,  pedimos sua compreensão a fim de consumir o menos possível, só o absolutamente necessário”.

A reflexão nos remete ao drama pelo qual passa o todo poderoso Estado de São Paulo, atualmente no enfrentamento de uma estiagem braba e demorada, com água faltando até para as necessidades básicas e com perspectiva de racionamento iminente. E como o tal São Pedro não tá nem aí para o drama dos paulistanos, a tendência é a coisa piorar.

Mas, como não há mal que dure para sempre, naturalmente a “coisa” passará algum dia; e aí, pode ser que eles deixem de “frescura” e não fiquem a reclamar da transposição das águas do Rio São Francisco, sob o argumento que a Região Nordeste não é prioritária e que se está jogando dinheiro fora com um projeto de tamanho alcance social.


Por enquanto, vão ter que reprisar o lengalenga que ouvimos dos  curitibanos, àquela época:  “A FALTA D’AGUA É FOGO”.