por José do Vale Pinheiro Feitosa




Viva junto à alma mais próxima e compreenda que a proximidade é a medida da distância. Que a distância que os separa é este movimento maravilhoso da matéria e da energia. A maravilha é apenas esta surpresa porque esta proximidade é tão diminuta entre os dois e é a inesperada distância.

José do Vale P Feitosa



segunda-feira, 15 de outubro de 2012


As fontes de música antes da época da internet eram o disco, rádio, o cinema e depois a televisão. O disco permitia o acesso em casa e no momento que se desejasse, as demais mídias nem pensar em ouvir uma determinada música. O cinema, quando não tinha como gravar e o único meio era o próprio rolo de filme, aí nem pensar em repetir.

Agora uma coisa interessante é a importância que o disco teve para trazer o sucesso europeu e americano através da chamada versão em português. Todos os cantores de rock antigos e a jovem guarda aqui no Brasil viveram de versão. Desde o Carlos Gonzaga trazendo Paul Anka até o caso aqui enquadrado.

Escutem esta versão em Português da "If i were a Carpenter" de Bobby Darin.  Na voz do meloso Ronnie Von.

Ronnie Von - O Carpinteiro

Pois aí no Crato a maioria tomou conhecimento de Bobby Darin através do filme "Quando Setembro Vier." Uma comédia americana, com locações italianas, contando um romance bobinho, mas com as presenças em plena beleza de Gina Lollobrigida  e Rock Hudson. A música tema do filme fez grande sucesso nas “tertúlias” da cidade.

Neste filme um grupo de jovens disputava a juventude com o controlador Rock Hudson um milionário que tinha uma mansão na Itália onde se encontrava com Gina e por um azar dos empregados, estes são pegos fazendo o que sempre faziam: alugando a mansão como um hotel enquanto o patrão não se encontrava. Neste caso um grupo de “jovens castas” que o milionário tenta preservar a virgindade por conta de uma rapaziada entre a qual Bobby Darin. No filme ele canta esta Multiplication.

Bobby Darin - Multiplication

Durante as filmagens Bobby dar tudo para encantar Sandra Dee no papel de uma das jovens castas, agora na vida real e se casam. Isso em 1960, logo após as filmagens. O casamento durou 7 anos, tiveram um filho, o Bobby terminou fazendo sombra na carreira de Sandra e os dois se desentenderam. A grande música deste romance é a que segue.

Bobby Darin - Dream  Love

Bobby Darin teve uma vida trágica de nascença a ponto de Hollywood fazer um filme sobre ele estrelando Kevin Spacey com o título em português de: "Uma Vida Sem Limites." Bobby sofreu febre reumática quando pequeno e tinha uma severa lesão de válvula no coração. Foi criado preso e por isso a mãe lhe deu de presente instrumentos musicais que o talento dele elevou ao cenário do sucesso.

Bobby era politizado e participou das campanhas eleitorais dos Kennedys, John e Bob e pretendeu se candidatar. Mas foi aí que a suposta irmã mais velha disse que ele iriam revirar a vida dele pelo avesso e aí confessou que na verdade ele era filho dela e de pai desconhecido e ela para não cria-lo como bastardo dera à mãe (a avó) que o criasse.

Bobby  passou um tempo fora dos palcos e quando retornou enfrentando dificuldades e trazendo uma música de protesto contra a guerra do Vietnã. Ele morreu ao 37 anos de idade durante uma complicada cirurgia cardíaca. Sandra Dee só foi casada com ele e sempre o amou. Morreu em 2005, aos 63 anos de idade com várias complicações inclusive por decorrência de alcoolismo e consumo de drogas.
A canção a seguir fala é da fase política dele e fala em liberdade.  

Bobby Darin - Simple Song of the Freedon





Planos Terminais - José do Vale Pinheiro Feitosa


- O Plano de Saúde dele tem cobertura?

- Tem! Vamos fazer a cirurgia na próxima semana e depois envio para você começar a quimio!

- A sobrevida é quase a mesma sem tratamento! Você sabe? A família pode participar?

- Pode! Tem grana. São comerciantes pesados. Eu pinto o quadro e você dar os retoques por aí.

- Pode deixar.

Quando há uma família no circuito um diagnóstico de uma neoplasia maligna com metástase é um limite intransponível. O acolchoado que protege a vítima da notícia é formado por desencontro entre os membros da família. O desespero pela má notícia e o comportamento pessoal a apontar atitudes divergentes. Ficar mais tempo fora de casa do que costuma. Evitar encontrar os olhares dos parentes para não sentir o peso da sentença. Os crentes a orar. Os jovens a inventarem embalos para se distraírem.

O doente, a vítima, o detentor da mais verdadeira e indesejada notícia sente os sintomas que eram vagos, mas intensos, embora ainda se engane ao aceitar a mentira que os resultados ainda estão por vir. Aquele excesso de otimismo. Os planos exagerados de viagens de sua mulher. A reforma da casa que nunca puderam. A compra daquele sítio que ela sempre boicotou. Por certo que algo há além da espera por um diagnóstico que na sua expectativa deveria ter saído. Mas ainda não saíra. Mas saíram tantos planos antes negados.

Finalmente orientada pelo cirurgião oncológico, a mulher e mais um dos filhos levam aquele que tanto espera para que o próprio médico lhe dê a notícia com suas técnicas de apontar a morte para em seguida vender-lhes esperança. Nem precisamos saber os detalhes do elaborado “diálogo” do especialista. Inclusive os efeitos colaterais daquela conversa.

Mesmo ciente que todos aqueles que ainda não morreram um dia morrerão, o depositário de vãs esperanças não admitia a morte. Aliás, não é bem isso: tem fobia descomunal com o segundo em que a vida lhe for fugindo. Aquele momento exato em que não haverá mais retorno, aquilo que até a bíblia aponta: a agonia da morte. Essa é a questão central dele: se curará definitivamente daquela doença e jamais aceitará ficar na fila daquele momento sob o sofrimento do corte cirúrgico e todo o cortejo hospitalar e depois a destruição física da quimioterapia. Neste caso prefere resolver o problema fugindo dele através da janela da breve morte induzida que o exima da espera com hora marcada.

Foi por aí que a consulta médica se contradisse. O médico cada vez mais incisivo na solução e o paciente cada vez mais resistente a ela. Sem contar intervalos para os médicos se comunicarem e o clínico informar que as drogas já estavam todas disponíveis para a família comprar por fora. A argumentação era superior até às questões clínicas e cirúrgicas ou à inexistente sobrevivida com aquele estágio fora de possibilidades terapêuticas. Interpunha-se entre a solução médica e o seu paciente, uma viagem dos colegas e suas respectivas famílias para esquiarem em Aspen. Aquele paciente medroso era quase um assalto às pretensões financeiras da sacra ciência e de todo o arcabouço meritocrático.

E foi neste clima que o clima definitivamente azedou e não se sabe como lá estava o médico aos berros apontando um bisturi em direção ao paciente em franca garra de combate. A coisa degenerou a ponto do paciente tomar o bisturi da mão do médico e em seguida, num acesso extremo de autodefesa, tentar cortar a garganta do doutor. Para sorte daquele promitente da morte a lâmina estava cega.

A família estava arrasada. O escândalo serenou com a família saindo às pressas do consultório. Mas a mulher como sempre tinha a noção da sobrevida e conseguiu que o marido fosse até um hospital público especializado. A médica, muito atenciosa, fez as entrevistas necessárias, uma Assistente Social completou o atendimento, o clima estava por aí e quando ela apresentou uma solução quimioterápica apenas, deixou claro que a sobrevida não ultrapassaria de dois anos.

O paciente repetiu os mesmo argumentos: não iria esperar uma morte lenta por dois anos, com um intervalo terrível de quimioterapia. Preferia tudo resolvido nos próximos dias. A esposa entrou em parafuso e a médica até vacilou. Mas o chefe da farmácia foi até a médica e pressionou pelo protocolo. Ela teria que seguir o protocolo. E o protocolo mandava realizar a quimioterapia.

O paciente ficou furioso: não quero. Quero ir-me agora. O protocolo não é meu, é de vocês ou do fabricante deste remédio. Não é meu. Se os impostos servem para isso, usem noutro, não em mim. A esposa se aproximou e começou a pedir ponderação ao marido, quem sabe Deus não ajuda e o remédio faz um milagre. Milagres existem!

- Para a indústria farmacêutica. Este é o milagre. – Gritava o impaciente.    

Finalmente a médica pediu licença para sair da sala e que a esposa a acompanhasse para uma conversa com a “supervisão médica”.

Com bata absolutamente branca, gravata italiana vistosa, camisa de grife o supervisor sentenciou: está na hora da senhora se afastar do seu marido e deixar que os nossos profissionais resolvam o assunto.
Suado. A respiração ofegante, o coração disparado e a boca seca, acordei-me de um pesadelo sem, no entanto, esquecer o mundo no qual respiro mansamente.     

A mão que afaga


Parece uma quarta-feira de cinzas essa ressaca pós-eleitoral. Os confetes estão espalhados na avenida, a música silencia, os foliões arriam as bandeiras, os blocos batem em retirada. Daqui a um pouquinho , também, todos tirarão as máscaras : políticos e eleitores. Defenestradas as fantasias, invariavelmente, nos bate o impacto da dura realidade cotidiana. As expectativas , sempre, sobrepujam em muito as possibilidades  reais. Luiz XV dizia que quando escolhia alguém para um cargo vacante, imediatamente , criava um ingrato e cinquenta inimigos. Há sempre cargos de menos para candidatos de mais. E promessa em período eleitoral é como coceira em macaco: não tem tratamento conhecido. Candidato promete até convencer mulher a não pintar os cabelos depois dos sessenta. Os desapontamentos são inevitáveis e, em geral, ele é proporcional ao tamanho da vitória nas urnas. Quanto mais expectativa alimentada, maior o falatório depois da lua de mel que aqui em Crato costuma durar uns noventa dias.
                               Há tempos não tínhamos uma vitória tão contundente na nossa cidade. Levantou-se, no meio da população,  o anseio de mudança e o candidato do PMDB foi aquele que mais  demonstrou reais possibilidades de virar o jogo. Jovem, empresário bem sucedido,  sem quaisquer desgastes  prévios na sua imagem de administrador,  conseguiu travestir-se, fácil, de candidato ideal.  Sua missão é hercúlea . Em tempos bicudos como o que vivemos, quando o Crato de líder regional , tornou-se, nos últimos trinta anos,  um mero fantoche daquilo que um dia foi; seu povo não  escolhe um prefeito, mas um salvador da pátria, um Messias que venha trazer a boa nova ou a boa velha.  Os cabelos brancos me foram tornando mais cético, perdi a crença em profetas e em milagres, mas torço de coração para que esteja errado e que a voz do povo, na realidade represente a voz de Deus, apesar de antecedentes em contrário como na eleição de Barrabás e no III Reich.   Afinal estamos todos no mesmo navio fazendo água, torço para que o Almirante escolhido encontre o caminho das Índias. Que administre para o bem estar da cidade não para seus grupos de apoio!
                               Vivemos em uma ilha banhada de hipocrisia por todos os lados.  Em pleno julgamento do mensalão pelo STF, vemos o Poder Econômico direcionar descaradamente as eleições em todos recantos do país. Julgamento que, diga-se de passagem, por estranhíssima coincidência,  foi ajustado justamente para um mês antes da eleição e o da cúpula do PT calculado milimetricamente para acontecer na semana anterior ao pleito.  A Casa Grande não tem mesmo vergonha na cara.   Qualquer menino em beira de rua sabe o absurdo que se gasta para eleger um prefeito ou um vereador. As pessoas se indignam na TV, mas se esbaldam na compra e venda de votos, sem nenhum escrúpulo. O candidato que comprou sua eleição, que compromisso tem com o povo que vendeu o voto? Negócio fechado! Estamos quites!
                               Os ventos da mudança bafejaram ainda na Câmara Municipal. Tivemos uma grande renovação de nomes  no quadro de vereadores. Esta reviravolta certamente oxigena o nosso Poder Legislativo, historicamente tão débil e cooptável.  Quantos farão oposição real à nova administração? Acredito que mudaram nomes,  mas não vão se modificar facilmente as antigas práticas , os velhos conchavos. Mesmo com minoria na Câmara,  os prefeitos, rapidamente, num passe de mágica, arrebanham, sabe-se lá como, uma trupe imensa de fiéis escudeiros.
                               Passada a festa, é hora de guardar a fantasia e voltar à realidade. Os que deixam a administração têm que imaginar as imensas janelas que se abrem à  frente, agora que a porta fechou. A tutela do estado teima em tornar todos um pouco inebriados e anestesiados. Passado o efeito do curare,  abrem-se imensas veredas para o crescimento pessoal e profissional de cada um, sem a gangorra inevitável dos empregos políticos. Os que chegam,  disfarcem ao menos a sofreguidão e percebam a ciclicidade inevitável dos cargos que estão assumindo. Pensem na cidade e na população que os elegeu. Coloquem os projetos coletivos acima dos interesses pessoais. Afinal, tudo é transitório, tudo é fugaz. E ,como dizia o nosso Augusto dos Anjos, lembrem  que “a mão que afaga é a mesma que apedreja”.

J. Flávio Vieira