por José do Vale Pinheiro Feitosa




Viva junto à alma mais próxima e compreenda que a proximidade é a medida da distância. Que a distância que os separa é este movimento maravilhoso da matéria e da energia. A maravilha é apenas esta surpresa porque esta proximidade é tão diminuta entre os dois e é a inesperada distância.

José do Vale P Feitosa



segunda-feira, 30 de abril de 2012

Os criminosos das Minas Terrestres - José do Vale Pinheiro Feitosa


Na metade dos anos 90 estive numa Missão do Itamaraty (Agência Brasileira de Cooperação – ABC) em Angola e Moçambique para organizar uma cooperação com aqueles países no esforço de consolidar a paz na região. Em Angola a lembrança mais forte que tenho é do estrago que as minas terrestres faziam sobre a população rural.

Nas ruas de Luanda, especialmente na região central, víamos centenas de pessoas mutiladas em decorrência destas minas. Tais minas terrestres são tão criminosas do ponto de vista dos direitos humanos que se de fato funcionasse um tribunal democrático da humanidade já deveria ter condenado Chefes Políticos, Militares de Alta Patente e a Indústria Produtora desta máquina de morte.

Os EUA e seu governo seriam o primeiro da lista apenas com o que fizeram no Laos: lá eles lançaram mais de 78 milhões de munições do tipo durante os conflitos no sudeste asiático. O pobre Laos ganha a medalha de ouro do país mais minado do mundo. E reforcemos a idéia: as minas estão nos campos, onde vive, trabalha e se sustenta a população rural. Mas as minas poderão estar nos campos que formam os atuais pontos de visitação do turismo ecológico, do turismo desbravador de paisagem. No caso a paisagem da morte.

Mas a América Latina também teve o seu solo com alvo de tais munições mutiladoras e mortais: Chile, Peru, Colômbia, Equador, Argentina, Bolívia, El Salvador e Honduras. A Nicarágua apenas recentemente terminou o seu trabalho de desminagem em seu território e, diga-se de passagem, é um trabalho altamente perigoso e de custo altíssimo. Na maioria destes países o ambiente a justificar estes atos criminosos de implantar minas terrestres foi de algum modo decorrente da guerra fria e da ação internacional dos EUA.

No Chile as minas foram postas nas fronteiras do extremo norte, especialmente junto ao Peru, no extremo sul e até mesmo na região central do país. Augusto Pinochet com sua ditadura para dar ventura aos Chicago Boys implantou estas desgraças e até hoje estão lá a lembrar da barbárie ideológica e imperial.

As minas não perdem validade e permanecem ativas quase que pela eternidade. Mas tem um fator mais chocante ainda. Movimentações do solo, por chuvas, tufões, ciclones, desmoronamentos, terremotos, carregam a minas para outras localidades, gerando mais insegurança num raio geográfico amplo.


Instantâneo


Dois homens hesitam em deixar no chão
restos do olhar que no encontro se quebrou.
Na dúvida, desce neles a calçada
a caminho de tão mísero salário.

Ontem, era a tarde nos olhos
de um deles: água salobra.
Sua presença tinha curva,
vara para as costelas e espinhaço,
ferrugem amaciando os dentes,
carimbos que o tempo tem de aço.

O outro trouxe a chuva.
E os dois homens se espremem,
se enroscam nos fios d'água,
a hora se enrijece nos ossos,
a chuva se amarra em balaustradas,
um deles lamenta: sua pressa
encharca a cidade
nervosa.

sábado, 28 de abril de 2012


O CARIRI TEM SAMBA

O nosso querido e amado Cariri tem artista por tudo que é canto. Como disse certa vez minha querida amiga Izaira Silvino, por onde você anda nessa região esbarra com um artista. Eu diria que, graças a Deus que é mesmo assim. Para todas as tendências de arte, o maior destaque sem dúvida que é a música. Nela estão inseridos diversos ritmos, indo do coco, embolada, forró autêntico, baião, samba, xote, mpb, passando pelo rock, pop-rock, blues, jazz e todas as variações desses ritmos. É um cenário deslumbrante, riquíssimo e de primeira qualidade. Dentre os já citados ritmos, quero aqui dar uma ênfase ao samba, um dos ritmos mais brasileiros e que, durante algum tempo andou meio esquecido pelos nossos músicos. Aqui e acolá, algum artista coloca um samba em seu repertório, mas sem dar maior destaque e importância devida. Agora esse delicioso ritmo está tendo um merecido reconhecimento através de um grupo recém formado aqui no Crato. É o "SAMBA DE MINUTO", formado por jovens artistas e músicos do Cariri, e que vem fazendo a diferença em suas apresentações. O grupo, formado com a maravilhosa voz de Janinha Brito, o delicioso violão de Cidinho, o fino pandeiro de Walesvick Pinho, a batida perfeita da percussão de Rodrigo Moura e o ritimado cavaquinho de Savio Souza, tem animado e muito as noitadas caririenses e nos brinda com deliciosos sambas dos mais respeitados compositores brasileiros. É ouvir e sentir o pulsar do coração chamando para a dança, a festa e a alegria. Samba é o nosso ritmo mais festejado, cultuado e admirado e agora aqui no Cariri o grupo "SAMBA DE MINUTO" está o levando para o nosso prazer.

Se você quer ouvir o "SAMBA DE MINUTO", nesta próxima segunda-feira, dia 30, véspera de feriado, o grupo vai se apresentar no "TERRAÇUS - Bar e Petiscaria", um maravilhoso espaço que fica no triângulo do Grangeiro em Crato. Lá vai rolar o SAMBA DE PÉ (de serra), com o grupo. Começa por volta das 20h, mais cedo para não perturbar tanto a vizinhança, e vai ser cobrado cinco reais por pessoa de couvert artístico. Vai ser uma noitada regada a muito samba, cerveja e feijoada, além da alegria do encontro com pessoas bacanas. Vamos nessa?

sexta-feira, 27 de abril de 2012

A Magia dos Lençóis. Liduina Vilar.


Quando de manhã acordo cedinho, arrumo a cama e dobro os lençóis, eu medito em cima desse comportamento: Esses lençóis com cheiro de noite, recebem meus pensamentos, depois meu estado de vigília, em seguida meu estágio REM, ficam pertinho de mim, sonhando comigo. No frio me aquecem, no calor me descobrem e... Inevitávelmente me fazem companhia todas as noites, todas as madrugadas e todos os "amanheceres". Existe uma ligação tão grande entre mim, entre os lençóis, entre os travesseiros e entre a própria cama, que ás vezes penso, serem eles, uma espécie de extensão minha. Até nas minhas orações antes de dormir, nos planos para o dia seguinte, eles estão ali, numa fidelidade indiscutível. Estabelecendo uma intimidade tal, que ás vezes nas minhas divagações, digo o chavão: cá com meus lençóis, eu penso, sorrio, choro, amo, saltito e brinco. Ao amanhecer, no espreguiçar do novo dia, eis que estão com a mesma temperatura do meu corpo, ora animado, para a nova manhã, para o novo sol e para iniciar a maravilhosa jornada de trabalho.



Boa noite e fiquem todos em bons lençóis.

Enigmático - Por José de Arimatéa dos Santos

Caminhos me levam
A um lugar de uma especialidade só
Quero é ver o diferente
Realçar em minhas retinas
Paisagens cristalinas
Belezas intransponíveis,
Mas vou tentar decifrar,
Igual filme de aventura,
Descobrir e encontrar calmamente
Esse lugar que teimo conhecer
Florestas a desvendar e caminhar
Numa lógica pé ante pé diferentemente
De tudo que já presenciei
E certo de maravilhas que só lá encontrarei
Ah! Isso é espetacular num momento
Que só com essa aventura decifrarei
Lei de Reforma do Congresso para 2012
(emenda da Constituição)

Lei de Reforma do Congresso (emenda da Constituição do Brasil)


1. O congressista será assalariado somente durante o mandato. E não terá  aposentadoria proveniente do mandato.
2. O Congresso contribui para o INSS. Todo a contribuição (passada, presente e futura) para o fundo atual de aposentadoria do Congresso passará para o regime  do INSS imediatamente. O Congresso participa dos benefícios dentro do regime do INSS exatamente como todos outros brasileiros. O fundo de aposentadoria  não pode ser usado para qualquer outra finalidade.

3. Congresso deve pagar seu plano de aposentadoria, assim como todos os brasileiros.

4. Congresso deixa de votar seu próprio aumento de salário.
5. Congresso perde seu seguro atual de saúde e participa do mesmo sistema de saúde do povo brasileiro.

6. 
Congresso deve igualmente cumprir todas as leis que impõem ao povo brasileiro.
7. Servir no Congresso é uma honra, não uma carreira.  Parlamentares devem servir os seus termos (não mais de 2), depois ir para casa e procurar emprego. Ex-congressista não pode ser um lobista.

Se cada pessoa repassar esta mensagem para um mínimo de vinte pessoas, em três dias a maioria das pessoas no Brasil receberá esta mensagem.
A hora para esta emenda na Constituição é AGORA.

É ASSIM QUE PODEMOS CONSERTAR O CONGRESSO
Se você concorda com o exposto, REPASSE,  
Se não,  basta apagar.

 
"Existem duas opções na vida:
Se resignar ou se indignar, e eu, não vou me resignar, nunca"
 Darcy Ribeiro


quinta-feira, 26 de abril de 2012

Eu queria muito ouvir e falar com Marcus Cunha - José do Vale Pinheiro Feitosa


Eu gostaria de falar com Marcus Cunha. De passar horas falando da desigualdades que perdura na minha cidade, no bairro em que nasci, entre os transeuntes dos quais fui um deles. Gostaria de sentir a coragem de romper com um passado que se sustenta de um lado nas tetas de uma tradição tão antiga quanto os anos cinquenta do século XX ou tão arrivista quanto certos aventureiros que nadam de braçada no sucesso individualista do alpinismo social.

Eu gostaria de, neste momento, ouvir as palavras de Marcus Cunha sobre a quebra desta desigualdade com a oportunidade da escola de qualidade, por acesso à universidades para os jovens dos bairros pobres, por transporte coletivo que dê impulso à energia criativa deste povo querido da minha terra.

Gostaria de ouvir de Marcus Cunha sobre os planos de um governo reorientador do meu município, que tem a vigilância sã dos nossos recursos naturais, que promova o maior programa de saneamento com água limpa, lixo tratado e esgotamento sanitário. Que nossos rios não se tornem cloacas dos despejos de quem não tem outra alternativa a não ser drenar os dejetos para as levadas que se tornam seus afluentes. Que os canais dos nossos rios sejam duradouros, seguros e ao mesmo tempo uma área de encontro e lazer da cidade, que, enfim, não se tornem apenas a morada dos automóveis velozes. 

Eu gostaria ouvir de Marcus Cunha que a saúde pública fosse inteligente, que se antecipasse aos fatores determinantes das doenças, que tivesse o amor pelas pessoas que são mais vulneráveis e que não se tome a saúde apenas como um objeto de consumo, mas como um direito que lhe é devido pelo município que é a expressão objetiva do Sistema Único de Saúde.  

Eu queria ouvir de Marcus Cunha sobre a nossa cultura tradicional e sobretudo sobre os nossos produtores culturais e nossos artistas. Eu queria sonhar com esta força da cultura nas escolas, no currículo, nas horas de recreio, no preenchimento da ociosidades dos prédios escolares quando eles cessam suas atividades letivas. Eu gostaria que Marcus Cunha desse visibilidade a este potencial da nossa cidade.

Eu tanto desejaria falar com Marcus Cunha sobre a região metropolitana de nossa cidade, ouvindo dele novas palavras, distintas daquela lenga lenga de filhinhos de papai com a eternidade do resmungo frente a realidade que torna conquistadora a nossa vizinhança. Ora aconteça em Juazeiro, Barbalha ou em Exu, no outro lado da terra, isso nos dá mais riqueza de entorno e exemplo de interiorização. Que viva a unidade da nossa região.

Enfim, eu gostaria tanto de ter uma conversa diferente destes tempos medíocres na política da minha terra. Espero que outros tantos cratenses, habitantes ou não do município, eleitores ou não nele, tenham  igual desejo por conversas desta natureza. 




Valei-me, Meu São Luiz !


Matozinho sempre foi antenada com as novidades mundo afora. Nos primórdios da sua história, elas chegavam através dos tropeiros e caixeiros-viajantes. Eles eram esperados na cidade ansiosamente e traziam consigo não só suas quinquilharias, mas também  a moda e  costumes da capital. Nesta época a Vila ligava-se ao mundo por trilhas varadas apenas por animais de carga. Com o tempo, foram melhorando os meios de transporte e os caminhoneiros receberam a missão que um dia  tinha pertencido aos tropeiros. Os Caixeiros  investiram-se de ares de nobreza e passaram a ser chamados de viajantes e depois Representantes Comerciais. Com a melhoria do transporte e, mais tarde, a chegada da TV, as novidades do consumo aportaram em Matorzinho quase que de forma imediata, sem nenhum delay. Um outro fator importantíssimo na modernização dos costumes da Vila : o retorno de matozenses que fugindo da seca haviam emigrado para o Sudeste. Passada a fase de euforia, quando o concreto armado caía por fim nas suas cabeças, voltavam para sua cidade natal, geralmente contando vantagem, cagando goma, com a língua trôpega: cravejada de chiados, de  “uais” e de “carambas”.
                                   Nesses dias,  aportou em Matorzinho, vindo de “Sum Paulo”, um desses filhos pródigos :  Sonisvaldo Coité. Trabalhara no  Sudeste numa infinidade de empregos, até ter se especializado , finalmente, como garçon. Migrou daí para uma Pizzaria, onde terminou por se firmar como Pizzarollo, um dos mais consagrados da capital paulista, segundo sua própria avaliação.  Fizera um acordo com a firma e recebeu uma graninha boa, proporcional aos mais de dez anos que trabalhou por lá na beira do forno. Vaval , este era o apelido carinhoso que nosso pizzarollo já não reconhecia, trazia consigo já a determinação de se estabelecer no comércio da sua cidade natal : vou botar a primeira Pizzaria de toda Grande Matorzinho , vaticinou ainda no ônibus, nosso Coité. Mal  desembarcou ,com sua indumentária esdrúxula : botas, gorro do Corinthians, casacão de frio e um tênis paraguaio espalhafatoso; Vaval encetou os preparativos para sua empreitada. Sobe rua, desce rua, terminou escolhendo o ponto que lhe parecia perfeito.  
                                   João do Bozó havia sido proprietário de uma Bodega próximo à praça da Vila que findou evoluindo naturalmente para um mercadinho e, agora, ostentava o vistoso nome de : “Supermercado Santa Genoveva”. Há alguns meses, Bozó providenciara um “puxado” lateral no prédio, pensando numa ampliação futura das instalações. A idéia empacara e  o espaço estava até então inutilizado. Vaval negociou então o aluguel e encetou os preparativos para a instalação daquela que seria a pioneira em massas  em toda região. Antes da reforma, já abriu o letreiro no frontispício, em letras gigantes : “Sonny´s Trattoria” e, para que o povo não ficasse pensando que ali se vendiam  tratores,  logo abaixo explicava : “Pizzas”.  Como era de se esperar,  o povo acorreu célere em busca da novidade de Coité e o empreendimento  se mostrou um sucesso.  Até porque nosso empresário entendeu rapidamente que precisava adaptar a novidade aos costumes locais. Os sabores tiveram que ser acrescentados dos quitutes matozenses e aí surgiram as pizzas de macunzá, de panelada,de manzape,  de sarapatel e de sarrabulho. Às tubaínas , também, foi preciso acrescer algumas bebidas tradicionais como Gingibirra , Aluá e garapa de cana. Tirante estas necessárias adaptações, nada foi mais preciso corrigir para que a “Trattoria” se transformasse num dos empreendimentos de maior sucesso naquele cafundó do Judas. Vaval , inclusive, estava sonhando em levar filiais para Bertioga e Serrinha do Nicodemos. E quem sabe, no futuro, vender franquias da “Sonny´s” para todo país. Tudo ia tão bem!  Mas, como diz o velho Giba: “ pobre só tem as coisas até Deus descobrir, aí toma tudo de volta”.
                                   Algumas questões certamente contribuíram para a tragédia que um dia desabou sobre a “Trattoria”. Primeiro,  a proximidade com o Supermercado de Bozó. Era lá que Vaval se abastecia e por ali não existia prazo de validade de produtos: enquanto o tapuru não comesse toda a carne e o gorgulho esfarelasse todo feijão, negociava-se. Mas o ponto crítico de tudo, certamente, foi a introdução no cardápio, da famosa Pizza de Buchada de Bode. O lançamento do novo produto foi feito com alarde e , no domingo, a “Trattoria”, de repente, viu-se apinhada de gente, pronta a degustar a novidade, apresentada naquele dia com preço promocional. A metade da vila obedeceu aos chamados de Vaval e degustou a nova iguaria ,de difícil conservação, sofregamente, acrescida de maionese caseira ( uma outra novidade perigosa trazida pelo pizzarollo). O certo é que a maionese serviu de estopim e fez explodir a bomba de bactérias da buchada de Vaval.
                                   Em poucas minutos, viram-se todos acometidos de uma caganeira universal e fenomenal. Faltou moita ao redor de duas léguas da pizzaria. Folhas e sabugos eram disputados à tapa. O velho Antonio Sitó que usava calças presas em suspensórios, só nesse dia, gastou mais de cinco : baixando e levantando os elásticos. Negrinho ,mal saía da moita,  já pegava novamente a fila. D. Filismina, uma velhinha esguia, fina que só assovio de sagüi , simplesmente desapareceu. De tanto ir ao mato encontraram apenas o molhado no chão e o filho dela, ajoelhado ante a poça , chorava inconsolado : Mãe dissolveu! Mãe dissolveu !   A família de Juca Caçote estava com o velho de vela na mão, empanzinado há mais de quinze dias. Quando souberam da catástrofe, correram na pizzaria e trouxeram um pedacinho da pizza de buchada e fizeram Caçote , in extremis, engolir. De repente, ouviu-se um murmurejo na barriga do velho e ele começou a se contorcer como se estivesse com  dores de parto. O  barulho tomou forças de trovão e , subitamente, ele gritou :
                                   ---“Valei-me, meu São Luiz !” 
                                   Ouviu-se um tiro seco,  como de um canhão no  quartel. Foi um destroço: esgotou-se a fossa, o homem desentupiu e sarou.

                                   Passados os dias, as coisas foram voltando ao normal, em Matozinho. Tirante D. Filismina, não houve baixas. Apenas o  velho Sinfrônio Arnaud preocupava. Há mais de quinze dias permanecia em casa, cabisbaixo e capiongo. Fora acometido da fininha em grandes proporções, mas aparentemente já recobrara as forças. A família preocupou-se com o velho. Vaval e Bozó, então, resolveram fazer-lhe uma visita. Encontraram-no recluso e tristonho , num canto do quarto escuro. Só com muito esforço conseguiram arrancar dele uma explicação. O velho foi enfático, estava bem, não mais sentira nada, mas estava com uma pulga detrás da orelha.
                                   --- O que está acontecendo, Coronel, o Senhor tá doente ainda?
                                   --- Não, seu Vaval, estive quase com  passagem na mão, mas já sarei.
                                   --- Mas por que anda tão triste, tão jururu ? –pergunta Bozó.
                                   --- Meu filho,  é que passei mais de três dias cagando sem o cu saber. Aí peguei aqui a matutar:  com um fiofó ignorante desses, que nem dá notícia do que tá saindo, se pode lá confiar num diabos desses, rapaz !
                                   --- Confiar como, coronel ? Quis saber Vaval.
                                   --- Se inventar de entrar alguma coisa, um fiofó analfabeto desses, será que o miserável vai  dar-se conta ?


J. Flávio Vieira

quarta-feira, 25 de abril de 2012

Pingo de Fortaleza - Uma chuva de musicalidade comprometida




Compositor, músico, brincante, pesquisador  e produtor cultural Pingo de Fortaleza é um artista  que nasceu um ano antes do Golpe Militar e que se envolveu com a música  e com outras linguagens artísticas na adolescência. Recebe esse pseudônimo por ter nascido prematuro. Com uma grandeza de olhar ele destaca que definir o que é  popular e  contemporâneo  está cada fez mais é difícil e perigoso usar estas compartimentações no campo da cultura e da arte. 


Alexandre Lucas – Quem é Pingo de Fortaleza?

Pingo de Fortaleza - João Wanderley Roberto Militão, nascido prematuro em Fortaleza no dia 08 de fevereiro de 1963, músico desde a adolescência e um eterno apaixonado pela arte da vida e pelas artes.

Alexandre Lucas – Fale da sua trajetória?

Pingo de Fortaleza - Comecei ainda menino tocando violão no bairro José Walter e em seguida junto aos amigos da ETFCE onde cursei meu segundo grau, depois fui cursar música na UECE e neste tempo já havia me envolvido com parceiros do teatro e da poesia. Ali no universo do movimento estudantil do inicio da década de 1980 fiz minhas primeiras apresentações e meus primeiros espetáculos individuais. Depois gravei meu primeiro LP em 1986 e nunca mais parei de produzir e seguir nesta viagem musical.

Alexandre Lucas – Como se deu sua relação com a música?

Pingo de Fortaleza - De forma natural, recebendo informações de todas as formas e linguagens e se fortaleceu na adolescência com a audição das músicas do Pessoal do Ceará.




Alexandre Lucas – você é autor do livro Maracatu Az de Ouro – 70 anos de memórias, loas e batuques. O que representa a publicação deste livro para o Maracatu Cearense?

Pingo de Fortaleza - Tenho mantido um envolvimento com o universo da cultura do maracatu do Ceará desde 1990 quando criei a canção Maculelê, acho que o livro traduz um pouco todo o meu aprendizado neste segmento e revela através da história do Maracatu Az de Ouro que ainda precisamos de muitos registros para reconhecer profundamente à rica e significativa presença do maracatu na cidade de Fortaleza.

Alexandre Lucas – Além de pesquisador, você é brincante de Maracatu. Isso possibilitou um olhar diferenciado para produção do seu livro?

Pingo de Fortaleza - Ser brincante me deu mais felicidade em conseguir produzir este trabalho, pois vivo este universo e procuro recriá-lo sempre.

Alexandre Lucas – você é um dos fundadores do Maracatu Solar. Como vem sendo desenvolvido esse trabalho?

Pingo de Fortaleza - O Maracatu SOLAR é um Programa de Formação Cultural Continuada da ONG SOLAR (ONG criada por mim e alguns parceiros em 2005) e de certa forma essa atividade deu mais visibilidade e articulação a SOLAR e também nos possibilitou uma prática mais livre desta manifestação.

Alexandre Lucas – Você agrega na sua musicalidade o popular e o contemporâneo?

Pingo de Fortaleza - Em minha arte agrego sempre aquilo que me vem de inspiração e atualmente tenho usado pouco essas nomeclaturas, por compreender que todas os gêneros estão de certa forma conjugados e que está cada fez mais é difícil e perigoso usar estas compartimentações no campo da cultura e da arte.

Alexandre Lucas – Como você ver a relação em entre arte e política?

Pingo de Fortaleza - Acho que no campo filosófico a arte é parte integrante das relações humanas na sociedade, portanto qualquer fazer artístico é uma ação política, contudo não me refiro à política de estado ou governo.

Alexandre Lucas – Quais os seus próximos trabalhos.

Pingo de Fortaleza - Depois dos cds Prata 950 (2009), Ressonância Instrumental (2010) e Axé de Luz(2011), pretendo lançar um novo livro sobre os universo rítmico do maracatu do Ceará e estou trabalhando num projeto intitulado "Pérolas do Centauro - 40 Anos da Música Cearense e 30 Anos da Musicalidade de Pingo de Fortaleza (1972-2012, Compositores e Intérpretes)

"Consignados" - José Nilton Mariano Saraiva

De acordo com o divulgado pelo Deputado Heitor Férrer, o arrecadado ( SÓ EM “COMISSÕES” ) pela empresa Promus, de propriedade do senhor Luis Antonio Valadares, genro do Chefe da Casa Civil do Governo do Estado, senhor Arialdo Pinho, no período de novembro/2009 a começo de 2012 (cerca de 27 meses), bateu em estratosféricos R$ 101.500.000,00 (cento e hum milhões e quinhentos mil reais). É uma montanha de dinheiro, aqui, na China ou no Haiti.
Assim, uma simplória e prosaica operação aritmética – R$ 101.500.000,00 / 27 - (meses) nos dá como resultado final o valor de R$ 3.759.260,00 (“comissão” mensal ao longo dos 27 meses) ou R$ 125.308,64 (faturamento diário no mesmo período) ou ainda R$ 5.221,20 (faturamento por hora). Não, você não leu errado: em CADA UMA MÍSERA HORA, no decorrer de 27 meses (incluindo sábados, domingos e feriados), a empresa do senhor Valadares arrecadou – SÓ DE “COMISSÃO” - o corresponde a 8,39 salários mínimos (hoje em R$ 622,00).
Apesar dos números impressionantes, o Governador do Estado, Cid Gomes (certamente que orientado pelo irmão Ciro Gomes, ex-empregado do senhor Arialdo Pinho) já “decretou” que não houve qualquer “tráfico de influência” do sogro (atual poderoso Chefe da Casa Civil) em benefício do genro querido.
Como a tendência, lamentavelmente, é o assunto esfriar ou arrefecer (ou passar por um providencial “esquecimento”) por parte dos meios de comunicação, espera-se que pelo menos o Ministério Público Federal não deixe pedra sobre pedra e vá fundo na investigação, visando debelar a fedentina que exala dos corredores e salas   que abrigam a cúpula do Governo Estadual.
De outra parte, matreiramente, a empresa Promus, querendo desviar o foco da questão principal, (se houve ou não tráfico de influência e o porquê dos juros exorbitantes cobrados) saiu com uma extensa e risível matéria paga nos principais jornais de Fortaleza, desafiando o Deputado Estadual Heitor Ferrer a abrir mão da sua imunidade parlamentar, sem, contudo, apresentar quaisquer provas que sirvam para descredenciar as denúncias levantadas pelo parlamentar ou, sequer, dispondo-se a abrir mão do seu sigilo bancário.

As plantas da varanda
Amanheceram dançantes
Ordenam que eu relaxe
E traga-lhes flores do campo
Horas que se arrastam...
Meu coração em sobressalto
Solfeja uma canção...

Parece tão perto do ontem
Parece tão longe das construções
Que entremearam vidas...

socorro moreira

Na Rádio Azul



terça-feira, 24 de abril de 2012

Carybé - Emerson Monteiro


Hector Julio Páride Bernabó, conhecido por Carybé, foi um artista plástico argentino que viveu na Bahia, marcando presença com trabalhos de desenhista, ilustrador de livros, pintor, escultor, gravador, nome expressivo da arte baiana do seéulo XX, ligado à elite que assinalou fase marcante e trouxe fama internacional ao ricopanorama cultural da Boa Terra.
Conheci  Carybé nos inícios dos anos 70, ao desenvolver um programa do Banco do Brasil para divulgação do Cheque Ouro junto  aos artistas e intelectuais. Abri sua conta no banco e cuidei do acompanhamento desse novo cliente. Sempre que precisava de resolver algum assunto na agência, ele subia ao terceiro andar, indo me encontrar na Secretaria da Gerência.
Tipo alto, magro, de tez clara, olhos acesos, roupas folgadas de características irreverentes, por vezes manchadas de tinta ou cimento, isto quando produzia o célebre painel que existe na confluência da Avenida Sete com a Rua Chile, em frente à Praca Castro Alves. Usava sandálias japonesas ou andava de pés descalços, alegre, simpático; merecia dos baianos afetivo carinho e continuado respeito; amigo de Jorge Amado, de quem ilustrou o livro Gabriela, Cravo e Canela; de Floriano Teixeira, Mário Cravo Júnior , Dorival Caymmi, doseleto clã no qual fulgurava nos encontros da boemia consagrada de seu tempo.
Já no Cariri, época do Navegarte, em Crato, na década de 90, eu visitei exposição do artista, promovida pelo País atrravés da Fundação Banco do Brasil, com desenhos retratanto os costumes e pessoas representativos do povo da Bahia, com destaque para as dancas, a música, a religiosidade, a capoeira, a pesca e as mulatas, fixação constante da obra de Carybé, nas imagens pitorescas com que perenizou a vida comunitária rica em cores e movimentos, tema bem próprioao talento dos gênios de seu porte.
Assim, paro e revejo de memória a produção eclética de Hector Barnabó, Carybé, argentino de nascimento e baiano de coração, um marco indelével das belas artes no Brasil da segunda metade do séculoque passou.

Por socorro moreira


Existia um teclado imaginário
Uma voz aveludada
Cantarolando canções de amor
Que eu já sonhara

Existia um viver intenso
Num pequeno espaço
Onde uma vitrola de brinquedo
Era um convite ao enlace...

Paulinho da Viola implicava
Em lindos versos
Numa música que obrigava
entregar aos céus
Sorrisos de felicidade
Entre cerejas e luar
Bebíamos a madrugada.

Faltava algo?
Algo parecia incompleto?
Quem entende os desígnios da alma?
- Faltava um tempo paralelo
Para um fechamento no final dos tempos

Final?
Hoje é recomeço...
Os olhos saem da opacidade,
E se rendem...
Fazendo a teia da mulher rendeira
Quando o amor volta e se achega pro seu lado.




Nota!

Amigos queridos,

Vou ficar afastada por uns  dias. Volto em breve e com  saudades. Aqui faço a alegria do meu dia a dia.
Solicito aos colaboradores que não descuidem da manutenção deste nosso cantinho.

UM GRANDE ABRAÇO, E ATÉ  A VOLTA!

Por Socorro Moreira - Faz de conta...



Que hoje é um dia qualquer da minha vida
foi recortado do passado
ou chegou do futuro, ainda novinho

Faz de conta que o meu presente é esse dia
E nele eu reponho a poesia, o verde, a minha alegria.

Faz de conta que você contracena comigo
Que sorri, e me fala num carinho.

Faz de conta que contigo sou fada sem varinha
Que tu és mago com cajado, e lanterninha
Que a água está gelada, que a fonte de mim
É você quem mina e mima!

Pára um só minuto...
Abraça-me com todos os beijos que eu perdi
Como certo dia,
em que eu vi teus olhos,
e nem versos , fiz!

Hoje malhei em ferro frio
viajei na maionese
conversei fiado
passeei no futuro
reencontrei o passado

O presente foi longo
mas não vi resultados
vou dormir sem
escrever nas estrelas,
colhendo na lua
um verso extraviado.

Hoje pairou uma dúvida ...
Mas, que importa ,
se às vezes sonho errado?

Amanhã eu acerto o passo
reforço a cura
de uma inquietação
que virou paz !

Daqui a pouco
quando o dia amanhecer
eu te acho
em meus guardados !


socorro moreira

Meu coração é um deserto, mapeado por oásis insondáveis.
Um dia você chegou...
Chegou num verso, e assentou a rima do meu lado.
Ainda vivo esse encanto, aos pedaços.
Nem foi preciso beijar um sapo...
 Ele se transmuta em todos os personagens
idealizados pela incompletude da minha alma.
Fique quietinho...
Não escape pela porta dos fundos...
A porta da entrada está selada !

socorro moreira

Amar Verbo Incondicional- José do Vale Pinheiro Feitosa





eu amo teu olhos baços,

não como lembrança do brilho de outrora,

amo as luzes finas,

penumbras que traduzem detalhes,

pupilas que escondem universos,

pálpebras pregueadas de resguardos,

amo teu olhar lento,

penetrando o irrevelado,

e assim me deixa leve,

leve de palavras não ditas.

como amo tuas rugas universais,

cada trajeto de tuas veias tortas,

as vigas musculares de tuas mãos,

as manchas solares de teu corpo,

amo a trajetória no tempo,

a longa espera dos espaços,

amo a delicadeza de tua pele frágil,

cada detalhe da superfície de teu mundo,

este mundo ao qual gravito.


amo teus cabelos opacos,

a rebeldia dos fios esquecidos da cor,

cada mecha que diz até aqui vivi,

o modo displicente que parece pouco,

quando na verdade foram muitos anos,

e tantos que parecem evocativo sésamo,

sobre os ombros como se nunca houvesse fim.

amo tua coragem de viver,

pois a beleza não é estética plástica,

é um pouco de forma, um tanto conteúdo,

como uma fera que teima sobreviver,

uma criança que se deita no colo para sonhar,





amo tua virtude de envelhecer,

sendo outra a cada passo e a mesma no horizonte,


amo teu ardor de viver,

pois a beleza não é grade de juventude,

ela é o que meus olhos amam,

como amo teu olhos baços,

tuas rugas universais,

teus cabelos opacos,


subterfúgio para amar tua coragem.


brilham na mesma direção

olhos que se cruzam ?
Uma é bela
a outra é lua !
Energia amorosa
que se espalha
envolve caras
invade corações
Até os mais distantes !
Acho que vou morrer me apaixonando
Embora a minha paixão tenha mudado de cor...
É prata , querendo ser ouro !

socorro moreira

Na Rádio Azul


Pássaro na Vidraça - por Everardo Norões




súbita pulsação
na vidraça
luz
na lágrima parada
entre espaços
onde tudo se dissolve
(ínfima poeira
nas Galaxias)
uma
vertiginosa lor
explodida
dntro
de si
mesma

Saudade
Saudade - O que será... não sei... procurei sabê-lo

em dicionários antigos e poeirentos

e noutros livros onde não achei o sentido

desta doce palavra de perfis ambíguos.



Dizem que azuis são as montanhas como ela,

que nela se obscurecem os amores longínquos,

e um bom e nobre amigo meu (e das estrelas)

a nomeia num tremor de cabelos e mãos.



Hoje em Eça de Queiroz sem cuidar a descubro,

seu segredo se evade, sua doçura me obceca

como uma mariposa de estranho e fino corpo

sempre longe - tão longe! - de minhas redes tranquilas.



Saudade... Oiça, vizinho, sabe o significado

desta palavra branca que se evade como um peixe?

Não... e me treme na boca seu tremor delicado...

Saudade...




Pablo Neruda, in "Crepusculário"


Tradução de Rui Lage

Por Socorro Moreira






E o espinho disse pra flor:
De ti aspiro o perfume,
a sombra da tua cor
Existo porque te protejo
Sou teu ponto fálico
Sou teu amor!
Se te amar
Marca-me de solidão
Aquieto minha alma
No vazio da tua mão !


Olhos atentos te descobrem
E não adiantam todas as voltas
As meias, as teias...
Nem o decote, que decora
Lá fora a lua some,
engolida por um dia.
Adormeço dos meus olhos,
E sinto que estou sozinha!

Poema de Adélia Prado


Eu te amo, homem, hoje como
toda vida quis e não sabia,
eu que já amava de extremoso amor
o peixe, a mala velha, o papel de seda e os riscos
de bordado, onde tem
o desenho cômico de um peixe — os
lábios carnudos como os de uma negra.
Divago, quando o que quero é só dizer
te amo. Teço as curvas, as mistas
e as quebradas, industriosa como abelha,
alegrinha como florinha amarela, desejando
as finuras, violoncelo, violino, menestrel
e fazendo o que sei, o ouvido no teu peito
pra escutar o que bate. Eu te amo, homem, amo
o teu coração, o que é, a carne de que é feito,
amo sua matéria, fauna e flora,
seu poder de perecer, as aparas de tuas unhas
perdidas nas casas que habitamos, os fios
de tua barba. Esmero. Pego tua mão, me afasto, viajo
pra ter saudade, me calo, falo em latim pra requintar meu gosto:
“Dize-me, ó amado da minha alma, onde apascentas
o teu gado, onde repousas ao meio-dia, para que eu não
ande vagueando atrás dos rebanhos de teus companheiros”.
Aprendo. Te aprendo, homem. O que a memória ama
fica eterno. Te amo com a memória, imperecível.
Te alinho junto das coisas que falam
uma coisa só: Deus é amor. Você me espicaça como
o desenho do peixe da guarnição de cozinha, você me guarnece,
tira de mim o ar desnudo, me faz bonita
de olhar-me, me dá uma tarefa, me emprega,
me dá um filho, comida, enche minhas mãos.
Eu te amo, homem, exatamente como amo o que
acontece quando escuto oboé. Meu coração vai desdobrando
os panos, se alargando aquecido, dando
a volta ao mundo, estalando os dedos pra pessoa e bicho.
Amo até a barata, quando descubro que assim te amo,
o que não queria dizer amo também, o piolho. Assim,
te amo do modo mais natural, vero-romântico,
homem meu, particular homem universal.
Tudo que não é mulher está em ti, maravilha.
Como grande senhora vou te amar, os alvos linhos,
a luz na cabeceira, o abajur de prata;
como criada ama, vou te amar, o delicioso amor:
com água tépida, toalha seca e sabonete cheiroso,
me abaixo e lavo teus pés, o dorso e a planta deles
eu beijo.


O texto acima foi extraído do livro “Poesia Reunida”, Editora Siciliano – São Paulo, 1991, pág.99.