por José do Vale Pinheiro Feitosa




Viva junto à alma mais próxima e compreenda que a proximidade é a medida da distância. Que a distância que os separa é este movimento maravilhoso da matéria e da energia. A maravilha é apenas esta surpresa porque esta proximidade é tão diminuta entre os dois e é a inesperada distância.

José do Vale P Feitosa



quarta-feira, 5 de setembro de 2012



O Falatório do Homem Massa


Pouco se pode esperar de alguém que só se esforça quando tem a certeza de vir a ser recompensado.José Ortega y Gasset

    Como todos sabem, estamos no período eleitoral onde as mais diversas propostas (nem tão diversas assim) propagadas por uma infinidades de candidatos tem colocado a população em um estado de nervos deveras excitante. Tratando-se o Crato como cidade da cultura, não era de se espantar que sua população participe ativamente dos debates políticos que tem se dado em praças, rua e principalmente na internet, e mais especificamente do facebook.
    O que cabe ao eleitor que pretende se informar a partir das inúmeras informações emitidas nos debates em questão é: 1º - A veracidade das mesmas; 2º -A confiabilidade do seu emissor e; 3º - A capacidade de você mesmo percebê-la, comparando a informação obtida com os dados que a realidade lhe apresentam.  O que estamos falando aqui é algo essencialmente filosófico, onde conceitos de ciência polícia, história, oratória e até a mais abjeta erística se misturam. Isso complica bastante ao leigo no debate pois os com conceitos não nos chegam prontos e explicados, cabendo a nós mesmos a habilidade de entender cada um deles em sua singularidade, separá-los e conexioná-los segundo a necessidade do momento.
    Há a partir de então, para um debate saudável, uma primeira necessidade que é a percepção do real em suas diversas singularidades e expressá-lo de modo mais fidedigno possível. Quem atende essa primeira premissa é um grupo de artistas e escritores maduros, que, embora adicionem um elemento estético, este elemento está submetido a realidade. É importante entender que ao falar em realidade, não me refiro ao realismo como escola artística. É possível que várias correntes artísticas emitam um signo realístico segundo sua própria estética, sem que seja necessário relativizar a verdade (como vem acontecendo costumeiramente). Como exemplo, podemos coletar ao longo da história da literatura uma série de exemplos, que podem ser entendidos como “signos artísticos” que dão lastro a quem os estuda para perceber melhor a realidade que os rodeia. Após ler um Homero, Sófocles, Cervantes ou Dostoiévski, temos uma variedade de personagens decodificados que podem ser reconhecidos em nosso convívio diário. Uma das características de uma obra clássica é o número de eventos extraordinários que acontecem em um espaço temporal relativamente pequeno. O leitor tem então uma enorme fonte de experiências que ele pode ter acesso sem sofrer as consequências de nenhuma delas, aprendendo se possível com cada uma. Isso é a transposição da experiência em memória e linguagem e expressão culturalmente reconhecível.
    Sem esse número de experiências decodificadas primeiramente pela literatura (que já deixa marcado no imaginário da população, por assim dizer, os “mocinhos e os bandidos”) é impossível o desenvolvimento político saudável que é nada mais do que uma extensão das atividades da filosofia. Como nosso caso não é este é reduzido o número de experiências necessárias para a entrada de qualquer pessoa no debate político. Fica fácil então qualquer um começar a dar palpite sem que sua própria consciência seja verificada antes do mesmo ser ouvido. Ora, este debatedor que não foi verificado sua procedência pode ser um Raskólnikov, uma Madame Bovary em potencial. Como alguém deste nível, que não reconhece os próprios pecados poderá ser ouvido em questões públicas? Alguém deste nível poderá elabora algo em um significado filosófico mais profundo? Ora, é claro que a necessidade de elaborar um discurso de mudança é algo comum a qualquer ser humano, mas, o que é preciso pensar é se a personalidade e o empenho de tais pessoas são condizentes com seus desejos de mudança.
    É fácil elaborar uma questão maliciosa para um político, mas vez que você próprio não seria capaz de superá-la. O problema de uma população que não tem esse imaginário literário que decodifica muitas coisas da vida por experiências dadas de presente a quem se dedica a sua leitura é que, uma vez sem essa experiência em potencial já pronta, a sociedade terá que vivê-las por sua própria conta, podendo repetir os mesmos erros totalmente desnecessários. Esse é o preço que uma sociedade sem literatura e sem história paga. Portanto, como diria o grande Chesterton: “Tradição significa conceder votos à mais obscura de todas as classes: nossos ancestrais. É a democracia dos mortos. A tradição recusa submeter-se a essa arrogante oligarquia que meramente ocorre estar andando por aí." Portanto, quanto mais experiências nós absorvemos, mais fácil fica para entender a realidade, seja ela qual for.
    O que tem me deixado um tanto perplexo é como pessoas de inteligência tem trabalhado questões políticas por meio de um molde feito pelas experiências de massas, que, de um modo geral, não tem uma experiência bem elaborada de questões necessárias para um debate saudável. Quando falo que não tem, não é pelo fato de que as mesmas simplesmente não queiram, mas que o fracasso da educação brasileira os usurpou dessa possibilidade. O número de palpiteiros nos grupos do facebook atesta o que estou falando: Afirmação graves são proferidas sem provas, invertem conceitos, tomam-se constantemente a mera hipótese por prova incontestável, entre tantos outros pecados intoleráveis para uma argumentação lógica, saudável e que possa contribuir para alguma coisa. É preciso urgentemente que a chamada Cidade da Cultura se afine de fato com os grandes nomes da cultura ocidental. Não estamos acima deles, portanto, não podemos desprezá-los. O que nos resta é baixar a cabeça e aprender humildemente, ou, continuar no falatório travestido de erudito, que, na maioria dos casos não resiste a menor réplica.

Antonio Sávio Nunes de Queiroz

CRIA O TEU RITMO


“Cria o teu ritmo e criarás o mundo.”
Eu era adolescente quando li esse verso de Ronald de Carvalho. Pareceu-me de imediato uma chave para a poesia. Simples. Básico. Bastava-me criar o meu ritmo e eu seria poeta. Fácil, não? Ainda hoje estou tentando criar o meu ritmo, falar com a minha voz.
Há sempre um outro por trás. Talvez meu outro eu. A minha máscara – essa que todo poeta usa. Essa que, afinal, fala com a sua voz.
Dizem: o seu estilo é inconfundível. E me confundem, se confundem, não me reconhecem no que escrevo.
Como quando, certa vez, eu era jovem ainda, mostrei um pequeno poema de Drummond a umas amigas. Elas ficaram assim, assim. Como quem não sabia o que dizer. Então eu disse: “É de Drummond.” “Ah, bom”, disseram.
Não era apenas bom, o poema. Bom como eu não seria capaz de fazer. Tinha mais, tinha uma voz, que não era a minha – mas se confundia com a minha em sua impessoalidade.
Impessoalidade. Contento-me lembrando Gide: Estilo é não ter estilo. O estilo ideal é não se denunciar por artifícios de linguagem, por enfeites, floreios, etc. A linguagem ideal é a que parece de todo mundo. Nem se percebe que por trás há o homem.
Por trás há o outro.
Um poeta só é poeta quando descobre a própria voz, quando cria o seu ritmo.
O ideal é que não se perceba o outro por trás.
Pouco importa se não é reconhecido, se a sua voz parece a voz de todo mundo. Melhor ainda. Eu é um outro, diria Rimbaud.