por José do Vale Pinheiro Feitosa




Viva junto à alma mais próxima e compreenda que a proximidade é a medida da distância. Que a distância que os separa é este movimento maravilhoso da matéria e da energia. A maravilha é apenas esta surpresa porque esta proximidade é tão diminuta entre os dois e é a inesperada distância.

José do Vale P Feitosa



sexta-feira, 31 de maio de 2013

DEPUTADA ERUDINA FALA SOBRE VIOLETA ARRAES

Muito me honra e comove ser a primeira mulher a receber a Medalha Violeta Arraes de Direitos Humanos, criada pela Secretaria Estadual de Mulheres do PSB do Rio de Janeiro, ao mesmo tempo em que o Prêmio Zuzu Angel – II Edição é conferido, pela mesma Secretaria, às bravas mulheres do grupo Tortura Nunca Mais. A elas nossos cumprimentos e gratidão pela dedicação na defesa dos Direitos Humanos.
Ao ser informada pela companheira Regina Flores, Secretária da Mulher, sobre a escolha do meu nome para receber a Medalha Violeta Arraes, pensei sobre o significado da homenagem e conclui que não é era a mim que devia ser prestada, mas, sim, à própria Violeta , inspiradora da criação deste Prêmio. É a ela, pois, a quem devemos e queremos homenagear nesta noite de festa, com toda solenidade que se possa imprimir a este ato.
Com certeza, tudo o que de mais relevante eu possa destacar da trajetória de vida dessa mulher extraordinária, já deve ser de pleno conhecimento dos que estão presentes aqui e de tantos mais que a conheceram pessoalmente ou através dos rastos luminosos que ela foi deixando atrás de si ao longo de sua rica e fascinante existência.
No entanto, o reconhecimento e a celebração pública da grandeza e dignidade de uma pessoa, cuja vida privada se confunde com a vida pública, nunca é demais, visto que confirmam o que já se sabe sobre ela; ao mesmo tempo conferem realidade aos feitos extraordinários de sua vida, iluminando-os. É o que queremos fazer neste momento, reconhecer e celebrar a vida e a obra de Violeta Arraes que marcaram indelevelmente seu tempo e sua geração.
Violeta dedicou inteiramente sua vida às lutas pelos direitos humanos e na defesa da democracia; lutas essas que ela travou sem fronteiras, com muita coragem e determinação e no limite máximo de sua generosidade.
Cearense do Araripe, veio ao mundo em 5 de maio de 1926 e foi uma das figuras mais atuantes e influentes nos meios acadêmicos da sua época, projetando-se publicamente dentro e fora do Brasil por sua presença ativa no mundo da cultura e das artes e pelo seu engajamento político.
Em Recife, Violeta foi ativista do movimento de educação de base; atuou no Movimento de Cultura Popular, junto com o educador Paulo Freire, e colaborou com D. Hélder Câmara, enquanto membro do Secretariado Nacional da Ação Católica e integrante da Juventude Universitária Católica (JUC), de onde se originaram grupos de ação política que combateram o golpe de 64 e resistiram à ditadura civil-militar; por isso foram duramente perseguidos e dizimados.
Ligada ao Cinema Novo e ao meio artístico e cultural pernambucano, no período em que junto com o marido Pierre Maurice Gervaiseau, economista e militante socialista, Violeta colaborou com a ação política do seu irmão, o então governador de Pernambuco, Miguel Arraes, deposto e preso em 1º de abril de 1964, no golpe militar. Ambos foram presos quando chegavam à sede do Arcebispado para visitar D. Hélder Câmara no dia em que ele assumia como bispo de Recife e Olinda. Quatro meses depois, ela e sua família foram expulsos do Brasil e se exilaram na França onde, a partir de então, passaram a viver.
O castigo do exílio que os algozes da ditadura lhe aplicaram, não conseguiu fazer com que Violeta arrefecesse o ânimo, nem abdicasse de seus sonhos e da utopia socialista que iluminaram e deram sentido à sua vida. Esta é uma marca da sua origem nordestina, região onde se forjam homens e mulheres fortes que não se dobram diante das agruras da seca e do sol inclemente do semiárido, nem menos se vergam sob a opressão covarde de um regime de força que dominou pelas armas durante longos e tenebrosos vinte e um anos de ditadura e de graves violações aos direitos humanos em nosso país.
Na França, já graduada em sociologia, cursou pós-graduação em psicologia para poder ajudar, como psicoterapeuta, a muitos exilados brasileiros traumatizados com a tortura a que foram submetidos. Por sua generosidade e dedicação no acolhimento aos exilados políticos na França, ficou conhecida como a “Rosa de Paris”.
Como integrante da Frente Brasileira de Informações, naquele país europeu, Violeta, segundo testemunho de ex-exilados, foi fundamental para a denúncia dos crimes contra os direitos humanos cometidos pela ditadura militar e, como estava acima das divisões entre partidos e grupos políticos, conseguia aglutinar todos e a todos ajudava a suportar as terríveis agruras do exílio. Sua casa em Paris se transformou em uma referência para artistas e intelectuais perseguidos pelo regime militar. Também estendeu sua ajuda aos exilados chilenos, após o golpe de Pinochet, e ao movimento anticolonialista em Angola, Moçambique e Guiné Bissau.
Com a aprovação da Lei da Anistia em agosto de 1979, Violeta retornou ao Brasil, mas foi convidada a trabalhar como adida ao projeto França-Brasil, na embaixada brasileira em Paris. De 1984 a 1986, ela se dedicou a elaborar e desenvolver o projeto, realizando vários eventos relevantes, destacando-se, entre outros, a Exposição de Arte Popular Brasileira, no Museu de Arte Moderna. Em 1988, a convite do então governador Tasso Jereissati, assumiu a Secretaria de Cultura do Estado do Ceará e, em 1996, foi nomeada reitora da Universidade Regional do Cariri, na cidade do Crato, cargo que exerceu até 2003. Viveu os últimos anos de sua rica existência na cidade do Rio de Janeiro, onde veio a falecer em 2008. No entanto, Violeta continua viva, não só nas nossas mentes e nos nossos corações, mas sobretudo no exemplo que deixou, exemplo de coragem e de fidelidade absoluta ao seu compromisso com os direitos humanos e com a democracia.
Para que a história de uma pessoa se revele em toda sua inteireza, é preciso que seja projetada no espaço público, sobretudo se for mulher, e, como tal, historicamente condenada a viver submersa na invisibilidade da vida privada, por determinação de uma cultura machista e patriarcal ainda hoje dominante na nossa sociedade. Violeta Arraes é uma mulher que rompeu com esse padrão e protagonizou os acontecimentos mais importantes e cruciais da vida nacional, com desdobramentos para além de nossas fronteiras.
Vale destacar, ainda, o simbolismo e o significado da Medalha Violeta Arraes de Direitos Humanos que projeta, no espaço público, a figura gigantesca dessa mulher excepcional. Esta homenagem é prestada num momento decisivo para a história e a democracia brasileira. Ocorre exatamente no momento em que, após longos e aflitivos anos de espera, o Estado e a sociedade civil brasileira buscam resgatar a memória e desvelar a verdade histórica sobre os crimes de lesa humanidade cometidos durante a ditadura militar, e apontar os responsáveis por eles, para que não fiquem impunes. Trata-se, portanto, de fazer justiça, mas para isso é preciso dar nova interpretação à Lei da Anistia que, absurdamente, anistiou vítimas e algozes.
Se viva ainda estivesse, não tenhamos dúvidas de que Violeta estaria na linha de frente deste embate entre o passado, que quer ser esquecido, e o presente que grita, em dores de parto, para que a Verdade se revele por inteiro e se faça justiça aos que, como Violeta Arraes, pagaram com prisão, tortura, assassinato, desaparecimento forçado e exílio a incipiente democracia que temos hoje. Precisamos, de uma vez por todas, passar a limpo essa vergonhosa página da nossa história, e como diz a ex-presidente do Chile, Michele Bachelet, “a ferida só sara se for lavada”. É este o momento. A hora chegou, não a deixemos escapar.
Por fim, agradeço de coração a honra de me conferirem esta Medalha que me servirá de escudo e de estímulo para continuar a luta de Violeta Arraes, e de tantos outros, na defesa intransigente dos Direitos Humanos e na luta sem trégua por Verdade, Justiça e plena Democracia.
Obrigada a todos e todas.
Rio de Janeiro, 27 de maio de 2013

Dep. Luiza Erundina de Sousa

quarta-feira, 29 de maio de 2013

Colaboração de Vera Barbosa




"Todas as manhãs ela deixa os sonhos na cama, acorda e põe sua roupa de viver. Todas as manhãs ela caminha vagarosamente para pegar o ônibus que a levará para lugar nenhum, para ver ninguém. E todas as manhãs ela imagina como serão as tardes, já sabendo a resposta, finge ser feliz assim todas as manhãs. E todas as manhãs ela espera pela noite, ela espera assim para voltar para seu quarto, e ser triste. É quando ela sente que está assim completa. Completamente triste, mas completa. E quando vai pra baixo das cobertas quentes e sente que começa a sonhar, é quando ela sorri . Assim pra ninguém. Mas pra ela mesma. E viver vale a pena."

terça-feira, 28 de maio de 2013

"Santa"... pode ??? - José Nilton Mariano Saraiva

Tendo o próprio homem como ator principal, de uns tempos até aqui a questão relativa ao meio ambiente tem assumido proporções outrora inimagináveis, por conta do acelerado processo de degradação que atravessa o planeta Terra. Houve, poderíamos assim considerar, como que um despertar para a gravidade do problema, porquanto influenciaria na própria sobrevivência da raça humana. 
Partindo-se de tal pressuposto, eis que, não mais que de repente, a tal “camada de ozônio” se tornou tema obrigatório em reuniões de cúpula, em ambientes festivos, no boteco da esquina, em salões de beleza, nos estádios de futebol e, enfim, onde se façam presentes duas ou mais pessoas. Tanto é que, quem se arrisca a subtrair uma simples folha de uma árvore já passa a ser olhado com desconfiança, quando não repreendido pelo grave “crime” cometido. 
A coisa chegou a tal ponto que, embora todos reconheçam ser a energia elétrica vital ao desenvolvimento de qualquer grande nação, construir uma usina hidroelétrica em uma área de floresta (que precise ter uma ínfima área inundada, para a formação do respectivo lago que moverá suas turbinas), tornou-se tarefa das mais problemáticas (vide as dificuldades postas por ambientalistas brasileiros, em razão da decisão do Governo Federal de aproveitar os caudalosos e perenes rios da região amazônica a fim de erguer duas ou mais usinas que irão aumentar a nossa produção de energia e, conseqüentemente, alavancar de vez o nosso desenvolvimento). Sob a alegativa de que tal construção irá provocar o “desequilíbrio” do meio ambiente, pugnam os reclamantes pela suspensão da obra, mesmo que isso implique na condenação do país a, literalmente, não enxergar o próprio futuro.
O arrazoado acima é só pra lembrar que, aqui em Fortaleza, numa área bastante valorizada, em plena Av. 13 de Maio, no ainda aprazível Bairro de Fátima, se localiza uma igreja (das mais concorridas) que homenageia Nossa Senhora de Fátima: a Igreja de Fátima. Em frente à mesma, do outro lado da avenida, uma pracinha agradável é “point” obrigatório de coopistas, fiéis da santa, transeuntes à espera do transporte e, enfim, trata-se de logradouro dos mais movimentados da cidade.

Pois bem, não é que de repente, sem que ninguém esperasse, no centro da praça e de frente para a Igreja, resolveram construir uma imensa estátua da “santa” (deve ter uns 15/20 metros) muito bem trabalhada e que se tornou espécie de atração turística. Só que, por pressa ou excesso de entusiasmo, não atentaram que duas imensas, antigas e frondosas árvores se punham exatamente em frente à estátua, obstando sua visão, por quem, por exemplo, saía da Igreja ou simplesmente trafegava pela Av. 13 de Maio. E então, sem choro nem vela ou ranger de dentes, puseram-nas a pique, sem maiores delongas. Se houve ou não autorização para tal, ninguém sabe, mas a pergunta que se impõe, é: se o mortal comum, governos, instituições e por aí vai, não podem mexer uma folha de uma árvore qualquer, sob pena de está cometendo um crime grave, por qual razão só a “santa” pode ???  Por quê ???     

segunda-feira, 27 de maio de 2013

  PARA PINTAR O RETRATO DE UM PÁSSARO

Primeiro pintar uma gaiola
com a porta aberta
pintar depois
algo de lindo
algo de simples
algo de belo
algo de útil
para o pássaro
depois dependurar a tela numa árvore
num jardim
num bosque
ou numa floresta
esconder-se atrás da árvore
sem nada dizer
sem se mexer…
Às vezes o pássaro chega logo
mas pode ser também que leve muitos anos
para se decidir
Não perder a esperança
esperar
esperar se preciso durante anos
a pressa ou a lentidão da chegada do pássaro
nada tendo a ver
com o sucesso do quadro
Quando o pássaro chegar
se chegar
guardar o mais profundo silêncio
esperar que o pássaro entre na gaiola
e quando já estiver lá dentro
fechar lentamente a porta com o pincel
depois
apagar uma a uma todas as grades
tendo o cuidado de não tocar numa única pena do pássaro
Fazer depois o desenho da árvore
escolhendo o mais belo galho
para o pássaro
pintar também a folhagem verde e a frescura do vento
a poeira do sol
e o barulho dos insetos pelo capim no calor do verão
e depois esperar que o pássaro queira cantar
Se o pássaro não cantar
mau sinal
sinal de que o quadro é ruim
mas se cantar bom sinal
sinal de que pode assiná-lo
Então você arranca delicadamente
uma das penas do pássaro
e escreve seu nome num canto do quadro.


de “Paroles” (1945)

 JACQUES PRÉVERT (Neuilly-sur-Seine, 1900 - Omonville-la-Petite, 1977) foi, entre outros ofícios, poeta, argumentista de filmes, letrista de canções populares, tendo-se popularizado nestas duas artes ainda antes de ser conhecido como poeta. O seu primeiro livro de versos foi um sucesso de vendas e um fracasso de crítica, em 1945 "Paroles", foi criticado por ter uma linguagem direta e simples. Continuou como poeta sendo sucesso de público e fracasso para os  críticos, acusado de não ter sofisticação.

Poemas do livro "Poemas de Jacques Prévert", 2000, tradução de Silviano Santiago.

domingo, 26 de maio de 2013

Paredes da memória





 Encontrei, mexendo em velhos papéis, folhetos e cartazes de algumas das minhas primeiras participações em shows em São Paulo, nos anos 70. Trabalhar com Tom Zé e com o Papa Poluição: uma escola.

Sivuca

Severino Dias de Oliveira, mais conhecido como Sivuca, (Itabaiana, 26 de maio de 1930João Pessoa, 14 de dezembro de 2006) foi um dos maiores artistas do Nordeste do Brasil do século XX, responsável por revelar a amplitude e a diversidade da sanfona nordestina no cenário mundial da música. Exímio executante da sanfona, multi-instrumentista, maestro, arranjador, compositor, orquestrador e cantor.

sexta-feira, 24 de maio de 2013

FHC - LOBO QUERENDO SE PASSAR POR OVELHA


Com a aproximação das eleições presidenciais de 2014, os partidos começam a promover seus arranjos e buscar argumentos na tentativa de chamar a atenção do eleitorado, o que é normal em qualquer democracia.  O eleitor, no entanto, deve ficar atento com possíveis armadilhas para não cair em “contos de vigário”. Vimos recentemente pela imprensa, preparativos de um partido político se organizando para lançar seu candidato ao palácio do Planalto no próximo ano.  Certamente confiando na pouca memória dos brasileiros e na falta de um discurso mais consistente, seus líderes tentam “ressuscitar” Fernando Henrique Cardoso depois de tê-lo escondido em todas as campanhas posteriores ao término do seu governo.  Na verdade, a administração de FHC, fora a condução do Plano Real e a Lei de responsabilidade fiscal, não deixou marcas, foi um verdadeiro desastre para o Brasil. Um índice representa bem o que foi a era FHC. Quando assumiu, em 1998, o Brasil era a 8ª  economia do mundo. Ao passar a faixa presidencial para Lula, em 2002, o país havia caído para o 13º lugar. Além deste indicador, outras comparações dão a medida do desastre:
Indicador                                            FHC – 2002                                         Lula – 2010
  1. PIB                                                        R$ 2.598 bilhões                              R$ 4.248 bi – preços de 2012% PIB
  2. em cada governo               19,2%                                                   37,1%
  3. Taxa de juros                   24,90%                                                10,90%
  4. Inflação (IPCA)                12,53%                                                5,90%
  5. Salário Mínimo                     R$ 200,00                                            R$ 510,00
  6. Empregos criados      5.016.672                                            14.725.039
  7. Reservas Internacionais         US$ 35 bilhões                                 US$ 289 bilhões
  8. Taxa de desemprego    12,9%                                                   4,7%
A tônica do discurso tucano é o fortalecimento da economia brasileira durante sua gestão. Os números acima mostram exatamente o contrário. Eles querem dar a impressão que estabilidade de preço significa fortalecimento. A economia se fortalece com crescimento que na era deles foi pífio. Basta lembrar que o Brasil quebrou três vezes, não teve força para resistir a crises no México, na Malásia e na Rússia, países periféricos.  Em 2008, o país sofreu impactos de crises na Europa e EUA com reflexos bem menores.
Caso reste alguma dúvida aos leitores quanto à dimensão de FHC, basta ver o filme no site abaixo para perceber como foi inexpressivo:

 Louco não é o homem que perdeu a razão. Louco é o homem que perdeu tudo menos a razão.

Gilbert Chesterton

Alegria!

Recebi de um amigo querido um presente precioso: 
Os filhos dos dias, de Eduardo Galeano.

"O livro tem o formato de um calendário.
A cada dia nasce uma história.
Porque somos feitos de átomos, mas também de histórias."

Estou no mês de janeiro/2013.Pretendo atualizar meu diário de leituras e postagens,estimulada por este livro.
Obrigada, amigo!
Simplesmente, adorei!

quinta-feira, 23 de maio de 2013

O Condicionado



“E, aquele
Que n
ão morou nunca em seus próprios abismos
Nem andou em promiscuidade com os seus fantasmas
N
ão foi marcado. Não será exposto
Às fraquezas, ao desalento, ao amor, ao poema.”
Manoel de Barros

                                   Raimundo Arruda Sobrinho, um velhinho simpático de 74 anos, viveu os últimos vinte anos, como morador de rua, no canteiro central da avenida Pedroso Morais,  na Zona Oeste de São Paulo. Nascera no Tocantins , filho de um vaqueiro, viera tentar a sorte na capital paulista, ainda rapazinho , após   ser reprovado na segunda série ginasial. Como todo migrante, meteu-se nas mais variadas profissões,  desde  jardineiro a  vendedor de livros velhos,inclusive com passagens em hospitais psiquiátricos Tentou a vida ainda como migrante ilegal no Paraguai, na Argentina e no Uruguai . Até 1978 já computava mais de quatorze endereços, quando , definitivamente, fez da rua seu bangalô. Em 1993, por fim, adotou o canteiro central da avenida Pedroso Morais, como seu lar. Barba longa e desgrenhada, higiene precária, roupas em frangalhos.   Ali, na dura selva urbana,  conviveu com a fauna típica do submundo brasileiro : esmoleres, bêbados, prostitutas, bandidos, traficantes, descuidistas, menores abandonados e adolescentes delinquentes  de classe média jogando o  seu  esporte preferido : churrasco de mendigo.
                                  
A história de Raimundo não é tão diferente da de outros tantos desafortunados da sorte que, órfãos de família , de emprego, de amigos e de amparo social, terminam por sujar, incomodamente,  a paisagem das grandes metrópoles. Moram numa outra dimensão , como se prematuramente tivessem morrido e , agora, invisíveis, vagassem como zumbis pelas praças e pelas ruas. Alguns fatos específicos, no entanto, diferenciam a vida de Arruda e que terminaram por fazer com que a história, estranhamente,  findasse com final feliz. Raimundo, sem mais nem porque, começou a escrever, quase que continuamente, aquilo que ele denominou de minipáginas. Redigia e ia oferecendo aos transeuntes que por ali passavam, em retribuição a alguma esmola por eles oferecida. Algumas, no entanto, colecionou cuidadosamente em  caderninhos, preparados com papel de embrulho. Escrevia a qualquer hora,  nada o atrapalhava, nem mesmo o barulho dos carros que freneticamente cruzavam ao derredor. Se chovia, enfurnava-se num plástico e continuava seu mister , sentado numa lata de dezoito litros. Utilizava um pseudônimo : “O Condicionado”. Condicionado a viver ao relento, a lutar diuturnamente contra as feras da floresta urbana, a sobreviver entre trapos e migalhas.
                                    Recentemente,  Shalla Monteiro, com o aguçado fato dos publicitários,  interessou-se pela história de Raimundo e por seus escritos, e terminou conseguindo localizar um irmão dele em Goiânia. O irmão, com muito esforço, conseguiu tirá-lo da rua e lhe proporcionar uma moradia digna, com o precioso calor da família. Arruda já se acostumara àquela jaula e temia sair da selva onde já aprendera a viver ou  sobreviver aos lobos e aos abutres.
                                   A poesia de Raimundo é caótica e  fragmentária. Uma extensão da sua vida : um mosaico de cacos e estilhaços de momentos .  Literariamente não parece carregar grande valor . Rescende, no entanto, um imenso peso humanístico e artístico. A Arte para ele foi redentora. Sobrinho, como uma Sherezade moderna, foi escrevendo, por mais de vinte anos,  suas histórias para não ser trucidado pelo Sultão que se chamava , agora,  Miséria. Linha após linha, página após página foi desfiando  suas mais de 7300 noites.  Ele é uma espécie de Arthur Bispo do Rosário da Literatura. Diante de um mundo cruel e hostil, criou um universo poético paralelo e para lá se mudou. Viveu e sobreviveu literalmente da sua Arte por muitos e muitos anos. Residiu nos seus abismos mais abissais  e conviveu promiscuamente com todos os seus fantasmas, talvez tenha sido por isso mesmo que a Poesia  se lhe tenha oferecido voluptuosamente como uma fêmea no cio.

J. Flávio Vieira

quarta-feira, 22 de maio de 2013

Por Eurípedes Reis

O DIA DAS MÃES

Não sei quem disse, mas falou com muita razão: “Aquela imagem que se tinha da mãe como mulher inteiramente voltada para os afazeres domésticos, que colocava o contentamento dos filhos acima dos seus interesses particulares e sua satisfação pessoal tem se transformado muito”. Realmente mudou.

A Martha Medeiros uma vez escreveu:
"Mãe foi mãe, mas há muito tempo. Agora mãe é jogadora de basquete, é top-model, é atriz, é superstar. Mãe, além disso, é pediatra, cozinheira, lavadeira, psicóloga, motorista. Também é política, tirana, ditadora, às vezes não tem outro jeito. Mãe é pai. Sustenta a casa, fuma charuto e esta jogando um bolão. Mãe é irmã: empresta as roupas, vai ao show de rock e disputa namorado com a filha. Mãe é avó: pode ter um neto da mesma idade que o filho do segundo casamento. Mãe é deputada, é sem-terra, é destaque em escola de samba, é guarda de trânsito, é campeã de paddle. Mãe FOI mãe. Agora é mãe TAMBÉM."
Gosto muito do que escreve a Martha. A verdade é que, nos dias de hoje, a mulher, além de todas as suas atividades, é mãe também. A mulher conquistou a sua liberdade e vem defendendo uma posição de destaque e igualdade em todos os setores da vida.
Tenho observado, a partir das minhas filhas ,que a mulher vem se realizando profissionalmente e ampliando seus horizontes. Entretanto, apesar de todas as responsabilidades que assumiu e se encarrega com muito brilhantismo, ela também é mãe.
E ser mãe, é estabelecer essa relação mágica quando a mulher se responsabiliza por outra vida, não importa em que condições, repetindo sempre novamente o milagre que originou toda a história da humanidade. Se tantas coisas fundamentais mudaram, o amor de que a criança necessita, não mudou. Apenas agora pode e deve ser mais consciente porque apoiado nos novos conhecimentos trazidos pelo desenvolvimento humano. Hoje a mãe sabe a importância do seu amor para a saúde do filho. Se antes tudo era quase intuitivo e automático, agora a ciência lhe desvendou a grandeza do seu papel, como geradora de seres saudáveis e felizes.
Ser mãe é muito mais do que falaram os poetas, e tudo o que eles disseram, também. A mulher - mãe moderna - tem de lutar, trabalhar em casa e fora, e aprendeu não só usar a coragem da resignação e sim, o que é muito mais difícil, a coragem da ação. Ela toma, sem medo, o futuro em suas mãos e o molda dia-a-dia.

O "poder pelo poder" - José Nilton Mariano Saraiva


Depois de “bater de frente” com integrantes do próprio Poder Judiciário, ao colocar em dúvida a honestidade de propósito de alguns deles (estariam criando novos tribunais sem que houvesse necessidade, mas tão somente objetivando auferir dividendos), agora o “Joaquimzão” Barbosa (Presidente do Supremo) direcionou sua metralhadora giratória para o Poder Legislativo, ao peremptoriamente verbalizar uma verdade cristalina, mas que, embora  todos tivéssemos conhecimento, nunca nos foi dada a oportunidade de expô-la: que os nossos partidos políticos são de “mentirinha”, que no meio político (Congresso Nacional) vige a filosofia do “poder pelo poder”, que inexiste qualquer consistência programático-ideológica por parte dos seus integrantes e, enfim, que legislam em causa própria, sem preocupar-se com os destinos do país.  
Por conta de tais declarações, o “bafafá” tá feio lá em Brasília, com os políticos se fazendo de ofendidos, posando de vítimas, reclamando da deselegância do Ministro e de uma presumível interferência do Judiciário no Legislativo e por aí vai.
Agora, aqui prá nós, cearenses, o retrato emblemático do que disse “Joaquimzão” Barbosa está contido no currículo do falastrão senhor Ciro Gomes, que já foi filiado à  Arena (1979-1980); PDS (1980-1983); PMDB (1983-1988); PSDB (1988-1996): PPS (1996-2003); e PSB (a partir de 2003).
A pergunta é: o que tais agremiações têm a ver entre si ??? Onde a consistência programático-ideológica de tamanha salada de siglas ??? Cadê a coerência do senhor Ciro Gomes ???
Portanto, ponto pro “Joaquimzão”.

"Responsabilidade" - José Nilton Mariano Saraiva


Definitivamente, quem se dispõe a expor de forma cristalina e didática suas idéias em algum instrumento de domínio público (blogs, jornais, revistas, etc) há de ter em mente a tremenda “responsabilidade” contida no bojo de tal atitude, porquanto aceitando compulsoriamente tanto o bônus como o ônus do “conjunto da obra”.
Tanto é que, até como forma de se prevenir ou resguardar, no “caput” de cada um desses instrumentos os responsáveis colocam a observação pertinente: os conceitos e opiniões emitidos são de responsabilidade única e exclusiva do autor da cada postagem.
Claro que, como cada cabeça é um mundo, bem como em razão da miscelânea de estilos redacionais, haverá sempre e sempre espaço para discordâncias, mumunhas, embates, contradições, e por aí vai. 
Afinal, difícil acreditar que a preferência de um se constitua unanimidade num universo tão vasto (lembremo-nos que, segundo Nelson Rodrigues, toda unanimidade é burra), tendo em vista que, enquanto “fulano” é contundente e afirmativo em sua explanação, “sicrano” usa e abusa de “sabonete” o tempo inteiro, tornando-se escorregadio por excelência; enquanto uns não têm qualquer receio ou temor em se expor, outros primam pela precaução excessiva (que poderia ser catalogado por medo ou conveniência).  Temos, então, a tal “liberdade de expressão”, garantida pela nossa Constituição Federal.
A reflexão acima é só para reafirmar que assumimos conscientemente o desiderato, sem jamais ter em mente agradar ou desagradar a A ou B. Apenas colocamos nossa visão particular, individual e intransferível do mundo e, conseqüentemente, nos responsabilizamos por cada palavra posta. 

segunda-feira, 20 de maio de 2013

Encontro reunirá pipeiros no Crato



O mês de maio é sempre propicio para a brincadeira de pipas na cidade do Crato (CE).  Esse ano, a comunidade do Gesso realizará evento denominado de  “Pipada no Gesso” que visa reunir crianças e adultos na brincadeira que teve origem com os chineses há cerca de 3000 anos.  

A pipa também conhecida como papagaio,  pandorga ou raia fez parte da infância de várias gerações. No Crato, o Campinho dos Meninos do Gesso é um dos locais tradicionais para a prática da brincadeira.

Segundo os organizadores,  a Pipada não tem caráter competitivo e visa fortalecer a ocupação criativa da comunidade no campinho dos Meninos do Gesso que já vem sendo ocupada com outras atividades como jogos de futebol, brincadeiras de bila, pião, malhação dos Judas e Dia das Crianças.  

A Pipada será um evento aberto e colaborativo, aonde as pessoas não precisarão fazer inscrições, basta levar sua pipa e brincar. No local haverá oficina de produção de pipas e registros fotográficos.

O evento conta com a parceria do Coletivo Camaradas, Blog do Alexandre Lucas, Projeto Nova Vida, Programa Nacional de Interferência Ambiental – PIA  e a Comunidade do Gesso.

Serviço:
Pipada no Gesso
Dia: 26/05/2013
Horário: 8h00 (manhã)
Local: Campinho dos Meninos do Gesso    
Colabore com doação de materiais: Linhas, Papel Seda, Sacos Plásticos e cola. Informações: 96616516.       

sexta-feira, 17 de maio de 2013

A tortuosa estrada do sonho



                                                                                    
                      Ali estava bem na sua frente e era um deslumbramento. Parara ofegante e atônito, como um menino que balbucia as primeiras palavras de amor para a namorada. Saíra com a inglória missão de comprar um presente para o aniversário do filho, esta difícil e impalpável arte de calçar  a matéria no sonho alheio. De repente, diante dos seus olhos, como se pronunciasse o abracadabra ou o abre-te-sésamo, aparece o objeto de todos os desejos da sua já distante  infância.                                                                                                                             
                                    Fora pirralho pobre e desde cedo precisara aprender a inventar os seus próprios brinquedos. A duras penas , aprendera a fazer o pião com um tronco de goiabeira e um prego; o “triângulo”, mais simples , o precedera, quando entortou a extremidade de um arame e afiou a outra ponta numa pedra de amolar facas. Depois viera o caminhão, doce enlevo da sua meninice, que fabricara desfazendo uma velha caixa de madeira e dela construiria todos os módulos: a boléia, a carroceria, as rodas ( a mais difícil tarefa) e até os amortecedores --  feitos das aspas metálicas que recobriam a caixa e que davam ao carrinho um discreto molejo, tão importante para as manobras mais radicais. As bolas de gude   (  de aço ,as preferidas) eram conseguidas dos mecânicos da redondeza, que as tiravam de rolamentos “gripados”. Depois vieram os carrinhos de rolimã , os patinetes construídos com tábuas e rolamentos, que eram o terror do sono de todos os vizinhos Fez-se clone  de Ícaro ,também , montando   “pipas” com papel celofane, pedaços de madeira e “grude de goma”. Os “papagaios”, ao serem empinados, como que alçavam aos céus o dourado enleio da sua  infância ( enleio que um dia se perdeu no espaço,  ao ser cortado pelo brusco cerol da adolescência).                                                                                                                   .                                                                                                    
                                          Uma vez , pisando na sombra do pai, tinha tido um encantamento igual ao de hoje : diante de si um ônibus feito artesanalmente, de quase meio metro, com inúmeras cadeiras no seu interior , as laterais fabricadas de lata e pintadas, onde se lia, em letras transversais: “Viação Cometa”. Lembra, como se fora ontem,  atanazara tanto o pai para comprar aquela maravilha,  que terminou por ganhar o mais comum presente do seu tempo: uma surra monumental.
                                  Hoje, no entanto,  se sentia o mais feliz homem do mundo: podia dar ao filho o mais almejado presente da sua vida de guri. Comprou-o, trêmulo, como se tivesse voltado  trinta anos .  Cerrou os olhos um pouco, enquanto o vendedor lhe trazia o troco, e se viu apenas de calção listrado, com barbante na mão,  à guisa de volante,  e dirigindo cuidadosamente aquele ônibus que por tantos e tantos anos foi o cometa de todos os seus desejos. O tilintar do troco no balcão o fez viajar , num átimo, três décadas de volta. Tomou do embrulho valioso e partiu célere para casa, na expectativa de ver ,nos olhos do filho,  a felicidade que poderia ter brilhado nas suas próprias retinas tantos anos atrás...
                              Mal abre a porta, berra, ofegante :
                   ---Filho, olha o presente de aniversário que eu trouxe pra você!
                              O menino corre e rasga o invólucro, vorazmente, sem nenhum critério artístico. De repente emerge do papel picotado , o ônibus reluzente. O filho , porém, não reluz como o ônibus,  o olha sem entusiasmo e pergunta, sem graça:
                   ---- Pai, o que é que ele faz, hein? Tem controle remoto, anda sozinho?
                             O pai, triste,surpreso,  ainda pensou em explicar que aquele carrinho fazia tudo: andava sozinho, corria, subia ladeiras e rampas, até voava e tinha controle remoto sim: A imaginação. Mas já não adiantava, o guri, hipnotizado,   agora fixava seu pensamento  apenas no videogame e o sonho de infância do pai estava ali jogado no chão em total desamparo --- um ônibus que capotara , perdera em algum lugar a sua força lúdica,  e era agora um  veículo  enferrujado,  obsoleto , sem rumo claro e sem destino previsível.

J. Flávio Vieira