por José do Vale Pinheiro Feitosa




Viva junto à alma mais próxima e compreenda que a proximidade é a medida da distância. Que a distância que os separa é este movimento maravilhoso da matéria e da energia. A maravilha é apenas esta surpresa porque esta proximidade é tão diminuta entre os dois e é a inesperada distância.

José do Vale P Feitosa



domingo, 8 de maio de 2011

Poemas de José Carlos Mendes Brandão:

link do Cronópios (onde saiu esse texto): http://www.cronopios.com.br/site/poesia.asp?id=5013


QUIETUDE

A casa quieta, à beira do lago, acorda com os pássaros.
Há domingos tão belos que ate os cachimbos florescem.
Os meus olhos e os figos maduros estouram ao sol.
A água fresca dos cântaros reluz à sombra sossegada.

O poeta escreve com estrelas, pedras e pássaros.
A montanha brilha no caminho do pinheiro além-horizonte.
O pássaro desenha o círculo perfeito no céu azul.
A pomba passeia na terra do canteiro de buganvílias.

Escrever é um testemunho da alegria.
A mulher ergue a mão para a macieira em chamas.
As árvores solícitas esperam a passagem do rio.

A figueira abre os braços e oferece a sombra acolhedora.
Nadam na água os peixes dourados e a imagem das árvores.
O melro canta, imóvel. O rio deflui, banha as folhagens do dia.



ENTARDECER

A borboleta conversa com a árvore.
O escorpião passeia entre as pedras.
Estou na varanda olhando o tempo.
O mormaço da tarde me envolve.

Uma taturana queima o meu olhar.
Os cavalos bebem o sol.
Um cabrito salta a porteira.
A água cai na calha de taquara.

O limo tem desperdício de sentido.
Passa uma garça sobre o telhado,
Ilumina a tarde nas asas.

Esta casa me maravilha.
A sombra azul do jacarandá
Se ajoelha para o sol.



SANGUE E SONHO

A infância é o ponteiro caindo no poço,
Subindo pejado de água limpa.
É uma rãzinha no ponteiro
Tocando violino com as estrelas.

É a meia-noite no ribeirão
Dançando com seu vestido de rendas.
É o luar quebrando uma pedra,
Espalhando sementes pelo mundo.

É a terra vermelha na boca
Com gosto de mato, sangue e sonho.
A areia à beira do córrego me acolhe.

Sou a novilha lambendo a minha cara,
Sou o cavalo alazão galopando
Com um galo cantando nas ancas.



O GRILO

O grilo aproveita a noite no monte de lenha,
Tomou vitamina e canta a plenos pulmões.
Pingam na noite lágrimas como estrelas,
A lua acorda, se levanta e boceja na janela.

A árvore abaixa a copa para a terra sonolenta.
As casas solitárias se apagam na distância.
Os cachorros latem encurtando as estrelas.
Late muito mais alto o meu grilo lenhador.

O cheiro do mato molhado me envolve todo.
O meu corpo exulta no calor do barranco.
Os coqueiros do pasto entram em casa.

A língua do meu bezerro Bito me lambe a cara.
Vaga-lumes passeiam beliscando os meus olhos.
O meu grilo martela a bigorna da memória.



A LÂMPADA DE ARGILA

Chego ao lago sereno com suas flores e pássaros.
Deito-me ao sol dourado, sob o verde das árvores.
A brisa ergue no ar a poeira fina dos estames
E a terra fertiliza-se como num encantamento.

Tomo da palavra como uma chave mágica.
As estrelas cantam nas folhas ainda escuras.
O sino toca na montanha acordando o dia.
O meu tronco de árvore floresce e frutifica.

A lagarta carrega uma flor nas costas, torta de dor.
A aranha tece a sua teia, caça e devora a mosca.
O limo escorre entre as pedras do barranco.

Uma cortina de água flui na entrada da gruta.
A casa da poesia é a única morada de Deus.
A lâmpada de argila brilha ainda.



A FLOR E O SOL

A flor se despe para o sol. Escorre leite de seus seios,
Seus lábios fremem. As abelhas preparam a dança
Do amor: ela geme de prazer, se contorce,
Se transforma numa estrela, numa virgem vestal.

O sol beija a nuca, as nádegas. Ela oferece o alforje
Com o néctar. O sol é uma aranha e a teia núbil.
O olho da aranha chove azul. A flor é fêmea
No cio. O sol é um escorpião esperneando.

Ela é uma árvore enferma, conhece a linguagem
Do corpo no verão. Ele agoniza salivando como um cão.
O cheiro dele é um caracol explodindo. Ela, a flor,

É uma jia calada. Mal respira para não morrer.
Ele, o sol, é um peixe com ela dentro.
E tudo é silêncio e escuro antes que o eterno gorjeie.



OS OLHOS DE MINHA MÃE

Nasce uma flor nos chifres da vaca,
Uma fonte de leite puro muge no pasto.
O orvalho da aurora me purifica.
Brotam da memória um bezerro e um touro

Voando sobre as árvores da infância.
Onde o cavalo do meu pai? Onde
O grito retumbando como um trovão?
Os centauros celestes fazem chover

Pétalas do delírio e borboletas azuis.
Um peixe curioso espia das locas na água verde
Do ribeirão correndo no fundo do pomar.

O eterno dorme ao meu lado como um cão.
Minha mãe chega à porta com pássaros nos ombros
E me mostra a face de Deus nos olhos.







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