por José do Vale Pinheiro Feitosa




Viva junto à alma mais próxima e compreenda que a proximidade é a medida da distância. Que a distância que os separa é este movimento maravilhoso da matéria e da energia. A maravilha é apenas esta surpresa porque esta proximidade é tão diminuta entre os dois e é a inesperada distância.

José do Vale P Feitosa



sexta-feira, 16 de setembro de 2011

insígnia

Os meus dedos são os meus melhores amigos.
Eram lisos e límpidos e nunca se orgulharam.
Agora ásperos, velhos e tristes e tudo bem.

Não largam das minhas mãos.
Acompanham minhas unhas
no outono e no inverno
sem questionarem
o tempo.

Seguram com altivez
e com a mesma loucura

a asinha da xícara
e o cadarço do tênis.

Os meus dedos são os meus únicos amigos.
Conhecem meu pensamento antes da unha roída.
Já viraram tantas chaves e doeram-lhes as juntas.

Nunca se gabaram
das suas falanges.

Da plasticidade dos ossinhos.
Dos seus ângulos e diretrizes.

Os meus dedos não me puseram contra a parede
à espera de um anel de aço cirúrgico ou de ouro.

Passaram muito tempo colados
uns aos outros sem ironia
e sem fracasso.

Os meus dedos não duelaram.
Não se sangraram à toa,

salvo sob momentos
de tensão em que
nem eu mesmo
compreendia
seus vãos
e a água
da chuva
escapando.

Também foram eles no outro dia
que me ensinaram a fazer concha
com as duas mãos e me levaram
à boca a mesma água da chuva.

Os meus dedos são os meus senhores.
Apontaram na cara de muitos canalhas a desonra.
Outras vezes apontaram para o céu o sol se pondo.

Os meus dedos são o pai que não tive.
Desde cedo é como se eles soubessem.

E cresceram comigo
e nunca me pediram luvas.

Os meus dedos nunca tremeram,
exceto aquele tempo de frenesi
em que meu coração derretido
veio até eles.

E eles supondo minha dor
tocaram em vez de blues
um samba.

Um samba de roda,
banquete e festejos.

Um comentário:

socorro moreira disse...

Uma ode.
O primeiro brinquedo da criança...
Cuidemos dos nossos- dos sonhos!

Um abraço, poeta querido!