por José do Vale Pinheiro Feitosa




Viva junto à alma mais próxima e compreenda que a proximidade é a medida da distância. Que a distância que os separa é este movimento maravilhoso da matéria e da energia. A maravilha é apenas esta surpresa porque esta proximidade é tão diminuta entre os dois e é a inesperada distância.

José do Vale P Feitosa



terça-feira, 26 de julho de 2011

O 12 DE OUTUBRO- Por João Marni de Figueiredo


A esperteza e o oportunismo do homem para ganhar e acumular dinheiro são impressionantes. Dentre as várias maneiras conhecidas, uma é estabelecer datas comemorativas, a exemplo de 12 de Outubro, “Dia da Criança”. Por algumas horas ficamos com a impressão de que tudo transcorre às mil maravilhas com os baixinhos: uma festa! Na manhã do dia seguinte, estarão fechadas as cortinas do grande teatro fictício, e a vida nos revelará a realidade cruel: o descaso com a criançada, seja em sua educação escolar, em sua moradia sem saneamento e água potável, ou na assistência de uma saúde pública sem qualidade e de difícil acesso. Poderão dizer os espertalhões que tudo se deve ao impacto da Revolução Industrial, que possibilitou a entrada da mulher no mercado de trabalho, alterando a forma da família de cuidar e educar seus filhos. Balela! O que falta mesmo é vontade e responsabilidade em políticas públicas, recursos com destinação correta, e não em malas, meias e cuecas!

Dada a ênfase da política macroeconômica atual, focalizada na realização de um elevado superávit primário para pagamento de juros, encargos e serviços da dívida externa brasileira, torna-se difícil acreditar que serão efetivados os investimentos e metas propostos.

De fachada, puro efeito cosmético, criou-se, dois anos após a aprovação da Constituição Federal de 1988, o “Estatuto da Criança e do Adolescente” (Lei 8.069/90), onde o artigo 227 inseriu as crianças no mundo dos direitos humanos. Pelo art. 3º., eles devem ter assegurado os direitos fundamentais inerentes à pessoa humana, para que seja possível, desse modo, elas terem acesso às oportunidades de desenvolvimento físico, mental, moral, espiritual e social, em condições de liberdade e dignidade. Presumem-se os direitos ao afeto, o de brincar, o de conhecer e o de se expressar. São atores do próprio desenvolvimento. Mas tem funcionado? É o que temos observado? Não nos esqueçamos do número escandaloso de crianças que morrem devido a sede e a fome, por causa de políticas públicas equivocadas.

Não deveria haver ninguém que sofresse por falta do necessário. O atual pontífice, Bento XVI, bem resumiu, numa declaração, esta situação: “De todas essas crianças, eleva-se um grito de dor que interpela e sacode nossas consciências.”

Crianças, as criaturas mais frágeis e indefesas e, dentre elas, as sofredoras, pedem a nossa atenção. Pequenos seres humanos que carregam já, em seus corpos e mentes, consequências de atrocidades da irresponsabilidade de quem os deveria proteger. Feridos no corpo e na alma em conflitos armados, vítimas inocentes dos insensatos. Meninos e meninas de rua, menores profanados por pessoas inescrupulosas que violam a sua inocência, provocando-lhes sequelas indeléveis. Diz-se que Deus não nos manda sofrimento sem enviar a força para suportá-lo. Mas não interferir, deixando uma criança à própria sorte, empenhada em tourear a fome, o frio, a dor e o medo, é de uma crueldade sem perdão.

Nada mais triste do que a visão de uma criança a perambular à toa, descalça, suja, com roupas puídas, faminta, chorando e sem norte. Damos-lhe as costas e seguimos em frente, afinal não batem os nossos DNAs. Ainda não percebemos que somos, cada um de nós, responsáveis diretos ou indiretos por suas mazelas. Esse ser exuberante de vida é a vergonha andante que experimentamos enquanto humanos, sombra de nós mesmos, consciência materializada das nossas omissões. O pior é que aquela criança poderá, no futuro, estar a nos esperar, num sinal de trânsito do cruzamento da Rua da Esperança com a Rua da Solidariedade, num ajuste de contas dantesco entre a inocência desprezada e seu verdugo de outrora. Ouvir-se-ão simultaneamente o som da batida do martelo de Deus e o do estampido de uma arma de fogo.


Do livro "No Azul Sonhado


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