por José do Vale Pinheiro Feitosa




Viva junto à alma mais próxima e compreenda que a proximidade é a medida da distância. Que a distância que os separa é este movimento maravilhoso da matéria e da energia. A maravilha é apenas esta surpresa porque esta proximidade é tão diminuta entre os dois e é a inesperada distância.

José do Vale P Feitosa



segunda-feira, 10 de outubro de 2011

A Insusentável Leveza do Ser - Por Zélia Moreira


Tempos atrás saindo de uma sessão de cinema em Curitiba, paramos numa livraria cujo dono, um senhor idoso, elegante e simpático, é amigo de Marlúcia, minha amiga .
Num frio de quase zero grau, fomos convidadas pra tomar um chocolate quente. Conversa vai , conversa vem falamos um pouco de tudo, gastrônomia, cinema, política, livros...
Na despedida fomos presenteadas pelo Sr. Ghnhone com dois livros. O meu, para minha alegria foi: A insustentável leveza do ser , de Milan Kundera.
Embora já conhecesse o filme, li esse livro com igual prazer, afinal ele, o filme, faz parte da lista dos meus favoritos.
Poderia falar tantas coisas, mas encontrei no livro de Rubem Alves : Canto do Pássaro Encantado, uma crônica que descreve tão bem o sentimento expresso no livro, no filme, que preferi transcrevê-la aqui pra vocês.
Saboreem a prosa de Rubem Alves, vejam o filme "A insustentável Leveza do Ser". Vale a pena!


A Bela Cena.

Tomas , personagem de A insustentável Leveza do Ser, de Milan Kundera, não conhecia a experiência da paixão. O que ele conhecia era os prazeres do sexo. esgotada a orgia, o seu desejo era se livrar da mulher. A ideia d acordar com uma mulher ao lado horrorizava. O seu horror ao amor era tal que nunca permitia que uma mulher dormissse na sua cama. Encontrava sempre uma desculpa para se livrar da companheira, levando-a de volta à casa dela. Ele se parecia com o sultão de Mil e Uma Noites, que depois de uma noite de prazeres carnais, quando o sol iluminava o horizonte, fazia com que a amnante fosse decapitada...Era assim que Tomas agia, como um animal caçador que abondona a caça tão logo sua fome é satisfeita.
Mas com Tereza foi diferente. Não que ela tivesse algum traço especial, que a distinguisse das outras. Não era mais bonita que as outras. Por que Tomas a amou e deixou que ela passasse a noite na cama dele? Por mais que a examinasse, nada encontrava nela que pudesse ser apontado como a razão do seu amor. Eles se conheciam por um tempo tão curto! Mas, sem razões e contra a sua vontade , o fato era que ele estava apaixonado por ela.
Sua aventura com Tereza havia começado exatamente onde terminava suas aventuras com as outras mulheres. Ela acontecera do outro lado do impulso que a levava as conquistas. Conhecera Tereza acidentalmente, num bar de uma cidadizinha do interior. Dissera-lhe, quase como brincadeira, que o procurasse quando fosse à capital. E lhe dera o seu endereço. Tereza chegou à capital doente ,sentindo-se perdida. Foi isso que a levou a procurar Tomas. E foi ai que a história de amor começou.
Ela ardia em febre. Ele não podia fazer com ela aquilo que fazia com as outras. Não podia levá-la para casa, porque ela não tinha casa. Ajoelhado à sua cabeceira, "ocorrera-lhe a ideia de que ela viera para le numa cesta sobre as águas".
Agora, a distância, pensava sobre as razões do seu amor e fazia, sem que disso se desse conta, a insólida pergunta de santo Agostinho: "O que é que eu amo quando amo tereza?" Tudo se tornou claro de repente. Ele ficou comovido pela fragilidade de tereza- criança amedontrada, chegando aos seus braços com um pedido de socorro.

"A mulher não resiste a voz do que chama sua alma amedontrada; o homem não resiste à mulher cuja sua alma se torna atenta à sua voz"....

Agora, na memória poética de Tomas, aquela cena permanecia imóvel, impertubável, fora do tempo. Era uma parte da sua alma. Não morreria jamais.
"O que eu amo quando te amo?" Tomas amava Tereza porque amava nela uma outra coisa: aquela cena que repentinamente brilhava em sua imaginação. Na cena, Tereza não era Tereza; era uma criança abondonada, levada pelas águas de um rio. E de repente ele deixou de ser Tomas caçador- tornou-se um homem forte, que tomava aquela criança nos braços. Tereza poderia deteriorar-se ou morrer. Mas a cena permaneceria inalterada, suspensa na memória poética, como objeto de amor.
Amamos a bela cena antes de amar a pessoa. Amamos a pessoa porque ela completa a bela cena. Por isso Santo Agostinho, antecedendo os versos de Fernando Pessoa, escreveu em suas Confissões:" Antes que te conhecesse eu já te amava." Somos amantes antes de nos encontrar com a mulher ou com o homem que será objeto do nosso amor. A alma é uma coleção de belos quadros adormecidos, seus rostos envoltos em sombras. sua beleza é triste e nostalgica porque sendo moradores da alma ao lado dos sonhos, eles não existem do lado de fora. Ves por outra, entretanto, defrontamos com um rosto- ou apenas uma voz, um olhar, um gesto com a mão...- que sem razões, ilumina um dos quadros que estava no escuro. Somos então possuidos pela certeza de que ese rosto que os olhos veem é o mesmo que está no quadro que mora nas sombras da lama. O corpo estremece. A paixão está nascendo.


Ficha técnica do filme:


ficha técnica:
título : A insustentável leveza do ser
gênero:Drama
duração:02 hs 40 min
ano de lançamento:1988


direção: Philip Kaufman

roteiro:Jean-Claude Carrière e Philip Kaufman, baseado em livro de Milan Kundera
produção:Saul Zaentz
música:Mark Adler e B.J. Sears
fotografia:
direção de arte:
figurino:Ann Roth
edição:Walter Murch e B.J. Sears


Um comentário:

Stela disse...

Adoro esse filme.
Primeiro conheci o livro.
Já vi e li mais de uma vez.
E choro. Sempre.