por José do Vale Pinheiro Feitosa




Viva junto à alma mais próxima e compreenda que a proximidade é a medida da distância. Que a distância que os separa é este movimento maravilhoso da matéria e da energia. A maravilha é apenas esta surpresa porque esta proximidade é tão diminuta entre os dois e é a inesperada distância.

José do Vale P Feitosa



domingo, 24 de abril de 2011

CARLOS GALHARDO-MAIS UM 24 DE ABRIL- por Norma Hauer


“Você não gosta de mim...”

Foi assim que ele iniciou sua primeira gravação, no ano de 1933. Na época, talvez ninguém gostasse dele, mas a partir dessa e de outras gravações, ele passou a ser adorado por centenas, milhares, talvez milhões de pessoas.
Hoje, estando no mês de abril, vamos recordá-lo, dizendo que ele nasceu em 24 de abril de 1913.
E quem é ele? Onde ele nasceu?
Ele é CARLOS GALHARDO. Nasceu em Buenos Aires, na Argentina. Com 2 meses já estava residindo em São Paulo e com 1 ano no Rio de Janeiro, mais precisamente no Estácio.
Assim, foi curtíssima sua vida em Buenos Aires e mesmo em São Paulo.
Na realidade, ele poderia considerar-se carioca, porque aqui viveu , pode-se dizer, quase toda sua vida. Ele amava o Brasil, mais do que muitos brasileiros que vivem sonhando com outros países, lamentando ter nascido aqui.
Ele, porém, se dizia paulista. Nunca soube por que. Afinal viveu pouco em São Paulo. Nunca toquei nesse assunto com ele.
E não é isso que importa.
O que importa é que ele enriqueceu nosso cancioneiro trazendo-nos alegria com sua belíssima voz. Aquela voz que apareceu pela primeira vez , no mês de outubro de 1932, frente ao microfone na Rádio Educadora do Brasil (atual Rádio Tamoio) entoando uma bonita valsa de Romualdo Peixoto (o então conhecido pianista Nonô) e Luiz Iglesias, de nome “Destino”.
Essa valsa marcou seu destino como o maior intérprete de valsas brasileiras. Ele, porém, nunca a gravou. O único registro que existe é no Museu da Imagem e do Som, onde ele a cantou quando deu um depoimento sobre sua vida artística. Possuo uma cópia desse registro.
Apesar de seu “destino” ter sido cantar valsas, aquela sua primeira gravação (“Você não Gosta de Mim”) foi um frevo da autoria dos Irmãos Valença, de Pernambuco.
Falando em frevo, esse foi o primeiro, mas não o único gravado por Carlos Galhardo; no total, 41 frevos fizeram parte de seu repertório.

Nos anos 40, nas vésperas do carnaval, a Rádio Mayrink Veiga apresentava um programa de nome “Onda do Frevo” e ali Carlos Galhardo lançou dezenas deles. Foi o cantor que mais gravou frevos fora de Pernambuco.
Além desse frevo que marcou sua primeira gravação, as 14 gravações posteriores foram de marchas e sambas. Curioso ?
É que Mr.Evans, responsável pela Victor Brasileira (como então era conhecida a RCA Victor) cismava que Carlos Galhardo não era cantor romântico, para gravar valsas e canções. E assim continuaria, se ele não se transferisse pala a Colúmbia, ali levado por seu grande amigo, o compositor Roberto Martins.
E foi quando ele “estourou” com uma “Cortina de Veludo” que lhe abriu as portas para o “mundo das valsas e canções”. A partir daí, foi um não cessar de sucessos.
Depois da Colúmbia, ele foi para a Odeon onde gravou uma série de valsas: “...E o Destino Desfolhou”; “Assim Acaba um Grande Amor”; “Apenas Tu”; “Sonhos Azuis”; “Amar Até Morrer” e ainda lançou Ataulfo Alves como autor de valsas com “A Você” e “No Apartamento Discreto”.
Voltando à Victor (onde se manteve por 35 anos) gravou uma série de valsas, a maioria de Paulo Barbosa e Oswaldo Santiago, autores de “Cortina de Veludo”.
A primeira foi “Italiana”, depois vieram “Madame Pompadour”; “Lenda Árabe” e muitas outras de vários compositores até que, em 1943, “estourou” com “Fascinação”, música de Marchetti que recebeu letra de Armando Louzada. Letra original. Não é versão, mesmo porque a valsa “Fascinação” não tinha letra.
Se ficar falando sobre Carlos Galhardo, acabo escrevendo um compêndio e isso já fiz quando escrevi sua biografia de nome “Carlos Galhardo-Uma Voz que é Um Poema”, em 1988.

Neste domingo de Páscoa, em que Carlos Galhardo completaria 98 anos não posso deixar de lembrar que foi exatamente na Páscoa de 1943, que “caiu” no dia 25 de abril (o dia 24 foi Aleluia) que o conheci pessoalmente. Daí...
Os anos se passaram, outros meses de abril foram transcorrendo até que para o querido cantor Carlos Galhardo o último foi o de 1985, quando ele completou 72 anos. Foi a última vez que falei com ele.
No dia 25 de julho desse ano a maior tristeza : ele partiu para a viagem sem volta, passando a ser, como ele cantou em “Estrela Cadente” “uma estrela que correu no céu em busca de outros mundos”.

Lembrar hoje de Carlos Galhardo é sentir sua presença que, na data de 24 de abril de 1913, abriu os olhos para o mundo e ouviu uma "Cantiga de Ninar", que lançaria em discos 23 anos depois, quando abriu uma "Cortina de Veludo"
Essa Cortina abriu também as portas para as valsas e canções que o acompanharam por toda a vida.
Carlos Galhardo foi, talvez, o cantor que mais ritmos gravou em sua carreira; foi o primeiro artista, sem ser nordestino, que gravou frevos; foi o único que lançou uma valsa em pleno carnaval: "Nós Queremos Uma Valsa”; foi o primeiro a gravar composições para São Jorge (foram cinco); foi quem mais gravou para datas especiais:"Bodas de Prata";"Boas Festas";"Valsa dos Noivos"; "Valsa da Vovozinha";"Valsa da Formatura"; "Valsa dos Quinze Anos"...
Foi o primeiro a gravar para o dia das mães "Mãezinha Querida", sendo "Sublime Herança" uma das mais bonitas; foi um dos poucos a gravar para as festas da Penha: "Sinos da Penha"; foi o único a gravar para "São Brás".
Foi também o único a gravar um tango para o carnaval: "Morocha Linda", assim como uma quadrilha "Quadrilha no Carnaval"...

Gravou guarânias "Orgulho"; baiões "Quando eu Era Pequenino"; bolero "Te Quiero,Dijiste"; canção italiana; "Cara Piccina; rumba "Crioula"; sambas "Sei que é Covardia"; foxes "Rosa de Maio";
marchas “Carolina”; canções "Conversando com a Saudade"...

E ele era o "Rei da Valsa"! Imagine se não o fosse...

Em 24 de abril ele chegou e só trouxe beleza; em 25 de julho ele partiu e não deixou apenas sua voz em centenas de gravações, mas deixou uma grande SAUDADE. É tempo de relembrá-lo em toda sua pujança.

Nesta hora o estamos relembrando com a palavra SAUDADE no coração.
.
Obrigada, muito obrigada Carlos Galhardo por tudo que você nos deixou, ao lado, também de sua amizade que tive a alegria de compartilhar.
Um grande abraço de agradecimentos onde você se encontra.

Não quero terminar sem colocar aqui a letra da "cortina" que se abriu para que ele entrasse "no mundo das valsas e canções",

CORTINA DE VELUDO
Autores Paulo Barbosa e Oswaldo Santiago

No apartamento azul
Do nosso coração
Há rosas de Istambul
Em jarros do Japão.
É um sonho oriental
De mágico esplendor,
A aurora boreal
Na aurora de um amor.

E uma cortina de veludo
Esconde a porta oval
Por onde
Um dia hás de entrar.
E essa cortina há de se fechar
Sobre o teu vulto quando
Ele a vier transpor
E não mais se abrirá,
Meu amor.


Norma

Nenhum comentário: