por José do Vale Pinheiro Feitosa




Viva junto à alma mais próxima e compreenda que a proximidade é a medida da distância. Que a distância que os separa é este movimento maravilhoso da matéria e da energia. A maravilha é apenas esta surpresa porque esta proximidade é tão diminuta entre os dois e é a inesperada distância.

José do Vale P Feitosa



domingo, 30 de janeiro de 2011

Un cuerpo se cae! Quién? - José do Vale Pinheiro Feitosa

Com um abraço aos que postam e leêm este blog publico este texto. Inédito. Apenas publicado aqui. Sempre no desejo que o coletivo aconteça no amplo espaço e que não se insule no factual dos oceanos bravios.

José do Vale Pinheiro Feitosa


Menos alguns metros da esquina da Calle Corrientes, alguns metros a norte, na margem da Avenida Pelegrini. Próximo ao Obelisco e sua majestosa glória, a América Latina despenca no vazio.

Vazio de futuro e excesso de presente sem linhas de horizontes. Levas de migrantes rurais vendendo a produção dos chineses na Calle Florida, na Feria de Santelmo. Sangrando a indústria argentina, mas permitindo os trocados da sobrevivência no rés do solo das “calles calientes”, corrosivas mesmo, debajo de milhões de estrelas cadentes.

No alto da construção de um coletivo imaginário de três continentes face ao imperialismo. No alto do Hotel Panamericano, no andar que se nivela aos montes, o vigésimo terceiro andar. Neste espaço e nesta altura, o corpo de uma jovem argentina de número igual de anos àqueles de tais patamares. Um corpo indeciso, entre respirar ou deixar esta etapa no vazio.

Diante de tanto horizonte da cidade portenha, dos seus edifícios parisienses, da mais ancha calle del mundo, o que via era apenas os escombros de sua vida rota. O córrego vazio, no horizonte de um pampa que ao invés de dobrar a curvatura do mundo, apenas se recurva sobre si mesmo.

Um pouco menos, quem sabe igual em conteúdo, mas diferente em recipiente, do motorista de táxi que estacionado à frente do hotel espera o passageiro que ainda não chegou. Espera tanto, quanto a sua vontade não suporta o ritmo do relógio do taxímetro e abre a porta.

Põe uma perna para fora, entre permanecer e dar alguns passos na calçada. Um limite em que tal decisão não faz, no cotidiano, qualquer diferença. Mas a outra perna vem para fora e os passos se antecipam na vontade de fuga do olhar aprisionado ao teto do veículo e lhe vem o desejo imediato de encontrar o azul do céu.

E ele olha para o topo do mundo, ali definido pelos 25 andares do Panamericano. E o quê ele vê?
Um corpo acelerando-se à velocidade da atração da gravidade. Corre por um triz. Sobre o estimulo do rito esmagador. Do impacto que destroça carne, abre as torneiras das artérias e despedaça os ossos. Ele corre do seu instrumento de trabalho a um só tempo.

O tempo em que a jovem de 23 anos, do vigésimo terceiro andar, a alguns metros a menos da calle corrientes afunda de teto adentro do veículo. Muito machucada, como matéria apropriada às ambulâncias de emergência.

Quando soube do assunto, foi como aquele tango à media luz: Corrientes 3-4-8, segundo piso ascensor. Non hay porteros, ni vecinos....Ela ainda estava viva como matéria dos cuidados intensivos.

Um comentário:

socorro moreira disse...

Cinematográfico!
Poesia, falas, cenário, personagens...Mas entendo que é vida real!
Choro nas cenas de filme, me arrepio, fico repassando as imagens, quando me impressionam...

Vi a cidade portenha com os teus olhos, e dancei o tango com a tua sensibilidade de escritor.
Obrigada pela presença!
Você é essencial nos coletivos regionais e universais.
Um abraço amoroso de boas vindas !