por José do Vale Pinheiro Feitosa




Viva junto à alma mais próxima e compreenda que a proximidade é a medida da distância. Que a distância que os separa é este movimento maravilhoso da matéria e da energia. A maravilha é apenas esta surpresa porque esta proximidade é tão diminuta entre os dois e é a inesperada distância.

José do Vale P Feitosa



quarta-feira, 7 de outubro de 2015

TEMOS PAPA, VIVA O PAPA ! - Demóstenes Gonçalves Lima Ribeiro (*)

Aos prantos, ela se jogou ao pés do Frei Abelardo e implorou para que a criança ficasse. Era mais um menino consagrado a São Francisco, vestindo marrom desde o nascimento e que a mãe não tinha como criar. Percebendo minha comoção, o superior aceitou, mas que eu me responsabilizasse.

Aparentava sete anos e se chamava Raimundim. Logo, os moleques o apelidaram Perna-Santa – apesar do defeito, corria, driblava e chutava de maneira surpreendente. Quem sabe, dali não brotasse um novo Chagas, aquele que começou no Salesiano, brilhou no Treze, voou pra Roma e envelheceu nos braços de uma condessa italiana. Mas, se ele ia bem no futebol, na alfabetização era um desastre. Sempre o pior aluno, jamais a pendeu a ler e a escrever, independente do esforço e de diversas tentativas pedagógicas.

Com o tempo, me convenci de que era impossível alfabetizá-lo e ordená-lo frade. Além disso, como se agravaram o defeito na perna e um problema na coluna, o sonho do futebol foi embora. No entanto, sempre de batina marrom, adorava limpar o altar, tocar a chamada da missa, responder ladainha, sacudir o turíbulo e estar à frente nas procissões. Tornou-se um agregado da Igreja e virou irmão Raimundim.

Memória prodigiosa, ele sabia de cor os evangelhos e nenhuma liturgia lhe faltava. Na Semana Santa, apoderava-se da matraca na procissão do Senhor Morto e ficava a noite inteira ajoelhado na Sexta Feira da Paixão. Ninguém na Ordem Franciscana conseguia acompanhá-lo, E assim continuou até quando Frei Abelardo faleceu e eu fui promovido a pároco.

Curvado sobre a bengala, barba e cabelos brancos, Raimundim envelheceu precocemente, tão longe aquele menino que eu vislumbrava um craque. Ao saber que Bento XVI renunciou, ele se recolheu em orações, aumentou as penitências, não comia nem dormia, cada vez mais introspectivo e solitário.

Certo dia, o Bispo convocou o clero pra orientações no período da vacância papal. À tarde, quando voltei, percebi algo estranho, um povaréu imenso ia da estação ferroviária à Igreja dos Franciscanos. Mil fogos espocando, banda de pífanos, bacamarteiros e maneiro-pau. O badalar dos sinos e um mar de braços erguidos num ondular de chapéus e gritos ritmados de “temos Papa, viva o Papa, temos Papa...”.

A muito custo, atravessei beatas ajoelhadas e, penitentes em flagelação. Cheguei à sacada da Igreja e constatei perplexo: era ele mesmo, agora sem marrom, mas de batina, estola e solidéu brancos. O crucifixo pendia do pescoço e Raimundim abençoava a multidão que ecoava “temos Papa, viva o Papa, temos Papa...”.

Retomei o fôlego, olhei no azul dos seus olhos e fulminei colérico: o que é isso Raimundim, pode me explicar que loucura é essa ??? Sereno, ele fitou-me com extrema gravidade e falou para que só eu escutasse: Oxente, Frei Serafim, eu ia deixar os romeiros sem Papa ???



(*) Demóstenes Gonçalves Lima Ribeiro (médico cardiologista, nascido em Missão Velha, residente e exercendo a profissão em Fortaleza)

segunda-feira, 5 de outubro de 2015

As reflexões, imaginações, especulações, adivinhações, ocupam parte do nosso viver. Por isso mesmo tanto representam na vida. Porém as grandes questões são ações e reações frente ao surgir, ao momento, ao acontecendo.
A fusão entre o longo da imaginação e o imediato do acontecer é uma das maiores evidências pelas quais o amor existe. Ele é o manifesto do relâmpago e o reboar dos trovões.
Aqui um pouco desta experiência:


domingo, 4 de outubro de 2015

DIREITOS HUMANOS

Na selva viva das redes sociais apareceram tipos que apenas refletem as palavras odientas de desesperados, ou que têm tanta insatisfação com a própria história que vivem à caça de culpados como os nazistas aos judeus, ciganos, comunistas, gays e tantos que poderiam, indefesos, serem a expiação de tanta culpa. Mas essa é a origem imediata de um discurso mas existem outros mediatos.

Há na selva desarmônica heranças históricas que teimam em permanecer apesar de outros tempos.  A herança das polícias (que se assemelhavam a pistoleiros, bandidos, justiceiros, vingadores etc.) que existiam para proteger os privilégios de elite em explorar e perseguir a população de trabalhadores e camponeses.

Vejamos uma questão. Quem mais semeia o ódio contra os Direitos Humanos, inscritos na Constituição Federal, nas Leis Nacionais e na Carta da Declaração dos Direitos Humanos da ONU são grupos militares (especialmente policiais).

 Os grupos militares do Estado o tempo todo tentam privatizar em benefício de suas operações o que é um monopólio do Estado: a violência em defesa das pessoas e seus direitos. A violência do Estado é pela justiça que é um modo de pesos e contrapesos para garantir a plena liberdade à acusação e à defesa.

Quando um grupo, seja de mídias, religiosos, políticos, de interesses ou corporativo tenta estigmatizar todo o curso da justiça quer apenas se apropriar da violência que é monopólio do Estado. Quando policiais vêm com aquele discurso genérico de que prendemos e o juiz solta, logo imagine que eles querem apenas para eles o monopólio que é do Estado.

Por isso os discursos de má qualidade contra os direitos humanos normalmente nascem de picaretas políticos, de exploradores da raiva pública nos grupos de mídia e de grupos militares que querem o privilégio da violência para si.

Ao criminoso o caminho corretivo é o da justiça. À violência se contrapõe a educação, a democracia, a justiça e os direitos humanos. E por isso toda a dinâmica tem que ser pelos direitos humanos, que passo a escrever segundo os termos de um vídeo divulgado pelo Youtube chamado: “A História dos Direitos Humanos (legendado em português). Tomo algumas frases essenciais:

Onde fica o lugar dos Direitos Humanos?

“Indivíduos de pensamento livre que se recusam a ficar calados;
Que compreendem que “Direitos Humanos” não é uma lição de história em sala de aula;
Palavras escritas nas páginas de livros;
Não são discursos, propagandas, ou campanhas de relações públicas;
São as escolhas que fazemos diariamente como seres humanos;
São as responsabilidades que todos nós compartilhamos que são:
Respeitar uns aos outros;
Ajudar uns aos outros;

E proteger aqueles que precisam”.
A estética da arma de fogo

Ao assunto das mortes por arma de fogo. A primeira coisa pensemos nas armas como uma posse. Um objeto pessoal. Uma categoria de fetiche. De design. Misturada ao consumo como estas tecnologias digitais cada vez mais atraentes. Isso tudo se encontra nas séries de armas de fogo, especialmente as chamadas armas leves.
Em segundo lembremos o caso do cigarro. Desde que na abertura do Canal de Suez, para ganhar tempo dos trabalhadores, inventaram a máquina de fazer cigarro, que ele se tornou um objeto de consumo de massa especialmente na indústria americana. Afinal as grandes tabageiras se fundaram no Império Inglês e o americano, convenhamos, é apenas o mesmo transferindo ativos para a América do Norte.
Os americanos usaram a maior máquina de gerar consumo com o cinema. E foi no cinema, na estética do cinema, cenas preparadas para dar profundidade e estética ao ato de fumar. Aquele momento da reflexão, o charme da sedução, a virilidade masculina, o desafio da juventude, tudo isso foi usado para aderir o público ao consumo do cigarro.
E tem um fato mais criminoso ainda. As estratégias foram se adequando à faixa etária que aderia ao consumo. Quando esta baixou para menos de 18 a indústria não teve escrúpulo algum, avançou no estímulo específico. Humphrey Bogart e outros meninos transviados formavam a imagem. A tragédia é que Bogart morreu de câncer provocado pelo cigarro assim como o cowboy que era o homem de Marlboro.
Pois agora a indústria armamentista faz o mesmo no cinema. A estética da arma de fogo, fazer clics viris para encaixar a bala, as munições que destroem tudo à frente, o ódio, a vingança desenfreada, as acrobacias para atirar deitado, no ar, caindo, pulando com as balas saindo em câmara lenta e explodindo no "inimigo".
Enquanto no cigarro a estética se associava ao drama e às seduções de amor, agora é no ódio desmedido que a estética da arma se justifica. Por isso Hollywood tem feito tanto filme destruindo tudo. Com a queda das torres gêmeas a vontade de destruir tudo que se move e tudo que se encontra em pé se aprofundou na cultura americana.
Agora imaginem, o que esta estética faz com uma sociedade acumulativa, com uma meritocracia de faz-de-conta, onde o sucesso é sempre o revés, as insatisfações aumentam e o ódio cresce ao tentar explicar as permanentes derrotas da imensa maioria. Um estado permanente de culpa de terceiros pelo próprio fracasso.

Imaginem o que isso gera com a estética da arma de fogo. Especialmente na mão de quem já não consegue sair do estado de alienação do feitiço da mercadoria e da estética cultural da destruição ampla, geral e irrestrita.

sábado, 3 de outubro de 2015

A PRIMEIRA EXPOSIÇÃO DE BRUNO PEDROSA

Onde o Vêneto começa seu abraço aos alpes dolomitas, vive um artista plástico corre-mundo, que hoje navega o abstrato pictórico, mas foi nas sinuosidades, ângulos e ilusões da tridimensionalidade que se descobriu. Após formar-se na Escola de Belas Artes no Rio de Janeiro, é aquele joio que fica das levas de formandos que desistem ou escondem suas obras em guardados. Ele viveu, vive e viverá até o fim dos tempos levando o pão para casa do valor de mercado de sua arte.

E para compreender os séculos gestados a partir do Renascimento, o Bruno Pedrosa é um espécime em amostra. Não por ser quase italiano, ou por artista plástico, mas pelo que aquele movimento fez ao buscar no passado uma bússola para abrir novas, inimagináveis e interditadas trilhas da alma.

Séculos que carregam simultaneamente a ousadia iconoclástica, a inovação, o questionamento do posto ou a revisão da realidade ao mesmo tempo em que se veste de corpo e alma com o arcaico que sua passadas derruba. Nascido e alimentado numa longa mesa patriarcal, com 32 assentos, no sertão do Riacho do Machado no Ceará, com as barbas e cabelos de profeta, Bruno Pedrosa é o tipo humano dos nossos séculos renascentista-iluminista-técnico-científico.

E este caleidoscópio de eras, das dimensões imperiais, dos fragmentos civilizatórios e localidades culturais resultou neste associativismo abstrato. Em que o obscuro é parte essencial da luz. Da realidade multiforme e por isso mesmo sensível.  

Nos últimos quarenta anos do século XX, numa cidade típica do mais profundo interior nordestino, localizada no centro geodésico do Nordeste, ali se desenvolveu o coletivo daqueles séculos. Uma cidade ajoelhada aos séculos coloniais com os olhos brilhando para as luzes inovadoras que piscavam nas publicações jornalísticas, nas ondas da Rádio Araripe e nos fótons projetados na tela dos cinemas.   
E foi numa peça automotiva do pós-guerra, um jipe com tração nas quatro rodas, que Bruno Pedrosa, poderia ser Raimundo, Pinheiro ou Campos, assistiu à explosão da sedução. Uma jovem cratense ganhara o título de Miss Ceará e iria para a disputa nacional. E a cidade comemorou igualmente com já fazia com Antonio Corninho um transeunte das ruas.

Não é para esticar. Mas Antonio Corninho era no Crato a representação da modernidade com adereços do arcaísmo. Pela rua central de comércio as senhoras das honradas famílias faziam compras nas lojas chiques. Era o ambiente de exposição da sociedade, da elite da cidade. E por ela também passava Antonio Corninho e os gaiatos gritavam: Antonio Cornin! Comunista! E Antonio Corninho fazia descer do mais intenso arcaico uma profusão de palavrões suficientes para abalar até os cabarés do Gesso.

Então puseram a Miss em pé, ao lado do motorista, no jipe sem capota, se movendo pelas ruas principais da cidade. Apinhadas de gente, fogos espocando, sorrisos largos e a miss desfilando a glória da beleza. Especialmente para Bruno Pedrosa, então uma criança beirando a adolescência.

As famosas misses das capas da revista O Cruzeiro, desfilavam em vários trajes. O escolhido para o desfile no Crato foi aquele de banho na piscina. Um maiô colante que expunha todos os centímetros da perfeição, dos cabelos até as unhas pintadas dos pés, passando por toda vibração erétil do corpo da juventude desbragada. E ali Bruno Pedrosa.

Que já manifestava seus pendores para o desenho. E com pedaços de gesso de um conserto da vizinhança, desenhou aquele corpo sensual, de maiô, desfilando num jipe no cimento da passarela que atravessava o jardim da casa. A casa de uma tia carola e violenta que, segundo o sobrinho, quando apresentou as credenciais ao chefe do fogo eterno, recebeu deste uma pequena gleba para ali implantar seu inferno particular e fora dos domínios do decaído.

O cimentado, da miss desenhada, foi esfregado, raspado, tomou banho de ácido, até que nem lembrança restasse daquele pecado mortal do lembrado adolescente. Foi um prazer interrompido. Assim como ser pego no auto prazer solitário e por escândalo surgirem vituperações de todas as injúrias possíveis.

Acontece que segurar a era de Bruno Pedrosa, é igual segurar a água líquida pela mão. É uma era amoldável aos continentes, mas capaz de drenar, pelas falhas estruturais existentes em todos os contidos. Logo estava Bruno na fazenda do pai. Na redondeza pessoas moldando telhas para depois queimar no forno como uma cerâmica.

E com a telha moldável, a argila ainda mole, Bruno Pedrosa desenhou a miss sedutora sendo conduzida naquele jipe na representação do alazão do prazer. Um tio viu aquilo e encantou-se qual o sobrinho. Mandou queimar a telha. Pôs a dita com a face desenhada para baixo, do alpendre, bem na mira do seu olhar quando deitado na rede usada para sonhar.


E ali ficou anos sem fim exposta aos olhares admirados por aquela primeira exposição de uma obra de Bruno Pedrosa. 

sábado, 26 de setembro de 2015

PEDRO CARDOSO E ONDE SE ENCONTRAM O ARTISTA E A TELEVISÃO BRASILEIRA.

Podemos apontar alguma característica específica nas famílias? Com a urbanização, a globalização parece uma pergunta sem referência. Mas a verdade é que certas lideranças familiares projetam, numa sequência de descendentes, valores que se transmitem entre as gerações. Lembro da família Cardoso (de FHC) que tem papel na história desde o fim da Monarquia.

O pai do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, militar, era uma das lideranças destacadas do nacionalismo e foi deputado federal pelo PTB do Distrito Federal na legislatura de 1955. Aliás, FHC, embebedado pela USP, ufanou-se em superar a era Vargas.

Mas eu queria falar era do Pedro Cardoso, ator, figura de destaque no teatro e televisão, até bem pouco tempo fez o Agostinho na série da Globo chamada de Grande Família. Olhem só alguns trechos do que diz Pedro Cardoso numa entrevista para o UOL:

“O mundo ainda é moldado para atender ao interesse sexual masculino. Principalmente no mundo artístico. Acho que não há nada mais subserviente aos interesses econômicos, hoje em dia, que o mundo artístico. Acho que nós artistas esquecemos de muito tempo que nós somos do contra. Que nós temos que estar um pouco na contramão do interesse econômico”.

“Hollywood colocou os artistas perto dos ricos e essa atração por uma vida mais rica, com mais dinheiro, ela é muito complicada, no meu entender, para o artista. A pessoa que te paga nunca de paga para você dizer o que você quer. Paga para você dizer o que ela quer que você diga”.

“Mas chega um momento, às vezes, que é poderosa a divergência, nessa hora o artista é demitido. Ou ele vende a alma ao diabo e diz o que não está no coração dele... Eu acredito que a arte é simbólica. Que o gesto artístico não é uma reprodução da realidade. Até porque eu acho que a realidade não é reproduzida. Ela só é possível viver. Quando eu te conto algo que me aconteceu, já é uma narrativa. Já é uma coisa que tem uma linguagem ali. É inevitavelmente simbólica”.

“A atual administração da TV Globo, tanto a parte burocrática quanto a artística, está empenhada em projetos de autores e não de atores. O petróleo da comunicação social, em teledramaturgia, é o ator. É o ator que dá cara ao trabalho de todos. Isso confere ao ator um poder incomensurável. Eu penso que a empresa, e não só a Globo, inconscientemente nega o poder ao ator. Na organização de poder da empresa quem tem poder não são os atores. Os atores ficam esperando serem convidados. A Globo não é sensível a nenhum movimento feito pelo ator”.

“Eles não querem atores autores. E ele não precisa necessariamente escrever. O Antonio Fagundes e o Lima Duarte quando representam, a autoria da representação deles é tão poderosa que aquilo é uma autoria que o público reconhece. No momento atores assim não são bem vistos. Porque atores assim cobram caros. O mercado, no momento, não quer pagar autores. Ele prefere atores que já entraram no mercado tendo abdicado de antemão de sua autoria. Já entraram subservientes ao autor”.

“Os atores fazem qualquer coisa que lhes mandam. Têm pouca voz. Eu sou tido e havido como um sujeito que briga. Eu brigo pela minha autoria. Quando eu encontro um diretor que compreende que o que há entre mim e ele é apenas uma relação de função e não de hierarquia”.

“Eu acho que o saldo da Grande Família se deve em grande parte ao relaxamento das relações hierárquicas entre o Guel, o Claudio Paiva e o elenco. Porque a autoridade é inimiga da criação. O ambiente da criação é a liberdade”.

“Televisão no Brasil se dedicou a construir uma espécie de pais que não é verdadeiro. Eu acho que isso atrasa o amadurecimento político, emocional, do Brasil. Então eles negam o Brasil verdadeiro. Eu vou dar um exemplo: houve um tema sobre liberdade. A nossa máquina inconsciente rapidamente colocou uma questão de escravidão. Porque o problema da liberdade no Brasil está indissociavelmente ligado à escravidão. Este tema tratado com verdade é difícil para o Fantástico. Porque o Fantástico trata dos assuntos com uma falsa verdade. Até quando diz que uma coisa é verdade parece um entretimento, parece uma coisa bobinha, uma coisa engraçadinha. E eu faço uma coisa que é engraçada mesmo. Não uma coisa engraçadinha. ”

“Eu defendo a regionalização da programação. Eu acho um crime que o nordeste brasileiro não tenha uma teledramaturgia própria. Se for ruim para o negócio mudamos então o negócio. É ruim para esse negócio como está organizado hoje. Mas os artistas do Rio de Janeiro não vão poder ganhar tanto. Não vão ganhar tanto aqui, mas eu vou poder trabalhar lá. Vou ter mais liberdade. O mercado ficaria infinitamente maior, câmeras, contrarregra, todo mundo ia ter mais emprego. O dinheiro ia circular mais nas regiões. O Brasil ia perder este centralismo São Paulo e Rio de Janeiro”.


“O Brasil mudou muito mais do que a televisão brasileira mudou. A televisão brasileira ainda está igual à televisão do FH. Nós estamos já aqui no Brasil pós-Dilma, embora ela ainda esteja. E a gente tem que retratar este Brasil que mudou. Se a gente ficar fazendo a televisão que era da época do Fernando Henrique o público vai fazer outra coisa. ”

quinta-feira, 24 de setembro de 2015

Confraternização dos ex-alunos do São João Bosco do Crato-Década de 60

Encontro dos ex-alunos do Colégio São João Bosco-Década de 60
Dia 31.10.2015
Horário: 21 h
Local: Sérgio's Recepções
Av Horácio pequeno, 968- Lameiro- Crato-Ce
Preço do convite por pessoa: 90,00
Depósitos identificados ,nas contas:
BB - Ag.094-9 cc 45.119-3 tit: Sergio's DB Ltda
ou
CEF Ag- 0684 013 102228-0 

Prazo limite: até o dia 21,10.2015 
O recibo de depósito é a sua senha!

sexta-feira, 18 de setembro de 2015

UM JUIZ "DESAJUIZADO" - José Nílton Mariano Saraiva

Lamentavelmente, no Brasil ainda vige o retrógrado processo de “indicação política” para os almejados e vitalícios cargos de ministros dos tribunais superiores, tanto em nível federal como estadual (STF e TCE, são exemplos), sem que se vislumbre indício de que a coisa mude algum dia. Afinal, o corporativismo far-se-á sempre presente (legislar contra ou acabar com os privilégios e mordomias, jamais).


Assim, embora na teoria a condição sine quo non para que alguém faça parte de uma dessas cortesde notáveis (mesmo que indicado) associe o douto conhecimento da natureza da função sobre a qual legislará, a um perfil de clarividência, sensatez, educação e equilíbrio, na prática a coisa não funciona bem assim. Muitos dos nossos juízes (não todos, evidentemente) escudados por um linguajar rebuscado e prolixo e por uma certa aura de superioridade, pecam pelo ativismo politico desbragado, pela extemporânea manifestação fora dos autos, pela flagrante parcialidade em determinadas decisões e, enfim e por extensão, pelo exercício de uma inidoneidade moral a toda prova.


E como isso ocorre originalmente em nível de judicatura federal, como o exemplo vem da “turma do andar de cima”, a consequência direta é que se espraie às instâncias de menor porte, em estados e municípios. Basta atentarmos para as recorrentes vendas de liminares a preços escorchantes, pelobeneficiamento de detentores do vil metal e por aí vai, sem que haja uma providência efetiva e moralizadora para obstar tal prática, para constatarmos a imoralidade presente em nosso judiciário


O exemplo mais que emblemático disso tudo tem agora o Estado do Ceará como protagonista: é que, embora comprovadamente cobrasse algo em torno de R$ 150 mil “per capita” pela liberação da bandidagem (traficantes, de alta periculosidade), eis que o “magnânimo” Juiz responsável pordiversas solturas foi... “condenado à PENA DE CENSURA por desvios funcionais durante plantões judiciários, como a concessão irregular de liminares e direcionamento de açõese assim não poderá figurar em lista de promoção por merecimento pelo prazo de um ano; nada terá que devolveraos cofres públicos e continuará recebendo integralmente seus polpudos vencimentos”. Além do mais – é vero, senhores, acreditem - se efetivamente fosse condenado à pena máxima, “Sua Excelência” receberia como severo e exemplar castigo” a aposentadoria compulsória). Aqui pra nós, existe excrescência maior ???


Pois bem, e retomando o fio da meada: indicado por FHC para compor a egrégia corte do Superior Tribunal Federal (STF), o mato-grossense Gilmar Mendes queimou etapas e foi efetivado na função,mesmo tendo um perfil ao avesso do avesso das encimadas qualificações exigidas. E desde o princípio mostrou pouco apreço pela magistratura, porquanto tendencioso e claramente hostil à razoabilidade e ao bom senso (lembremo-nos que, em um mesmo dia, mandou soltar duas vezes,sem maiores justificativas, o bandido mór do Brasil, Daniel Dantas, que houvera sido preso pelo Juiz Federal Fausto de Sanctis; a troco mesmo de quê ???).


Intolerante, sectário, prepotente e mal educado, Gilmar Mendes demonstra frequentes laivos de autoritarismo e de pouca paciência para o contraditório, como se fosse o detentor da verdadeprimeira e única. Assim e sem nenhuma cerimônia, desde que empossado tenta transformar o recinto daquela seleta corte numa espécie de arena política chinfrim, ao investir de forma desrespeitosa e ultrajante contra seus pares, ao tempo em que defenestra agremiações e pessoas que não professam o seu medieval credo (atualmente, está sendo processado pelo jornalista Luis Nassif).



Eis que agora, após um ano e meio de posse do processo que trata sobre financiamento empresarial nas eleições (que houvera solicitado para "vistas ou melhor examinar" e de passar nada menos que cinco horas proferindo seu voto favorável - já vencido e inútil - desandou a acusar um partido político (PT) de tentar se beneficiar, assim como investiu furiosamente contra uma instituição de classe (OAB), ao não aceitar que o seu lídimo representante manifestasse a opinião da categoria sobre, conforme lhe permitia o rito processual. Repreendido pelo presidente do STF, Ricardo Lewandowski, Gilmar Mendes rebateu desrespeitosa e arrogantemente: "Eu sou ministro da Corte, o advogado é advogado" (como se nota, até parece julgar-se um "ser superior" em relação aos mortais comuns). Ao ser informado por Lewandowski de que "aqui quem manda sou eu e o advogado da OAB tem o direito, sim, de se pronunciar", abruptamente retirou-se do recinto.  


Foi o bastante e suficiente para que (até que enfim) dia seguinte a OAB o “peitasse” publicamente, ao emitir a seguinte nota de repúdio: “Ressalta o Colégio de Presidentes da OAB que comportamentos como o adotado pelo Ministro Gilmar Mendes são incompatíveis com o que se exige de um Magistrado, ferindo a lei orgânica da magistratura, e estão na contramão dos tempos de liberdade e transparência. Não mais o tempo do poder absoluto dos juízes. Não mais a postura intolerante, símbolo de um Judiciário arcaico, que os ventos da democracia varreram. Os tempos são outros e a voz altiva da advocacia brasileira, que nunca se calou, não será sequer tisnada pela ação de um Magistrado que não se fez digno de seu ofício”.

A expectativa é, pois, que com o zangão e "desajuizado" juiz ainda bufando de raiva e expelindo fogo pelas narinas, o colegiado do Supremo Tribunal Federal se pronuncie a respeito, recriminando-o e punindo-o severamente, sob pena de, não o fazendo, assinar um inaceitável atestado decompactuação com todas as asneiras e desmandos por ele provocadas, até aqui. Se assim proceder, a OAB se credenciará ao respeito da sociedade.




segunda-feira, 14 de setembro de 2015

A CONJUNTURA

Chegou em casa despejando ira. Paga seus impostos em dia e direitinho. O governo ameaça mais algum para cobrir suas faltas.

A empregada chega logo depois com ar desanimado: não conseguira fazer o curativo da úlcera na perna. No posto de saúde estava faltando muita coisa.

Ele já estava no embale mesmo e tocou diagnóstico na situação: não tem nada mesmo. É uma bagunça de cabo a rabo. Quem já viu faltar esparadrapo e gaze? É o roubo da Petrobrás.

O senhor pode adiantar um vale para eu ir na farmácia?

Pelo amor de Deus. Sou funcionário do governo, não vou ter mais aumento. O que ganho não cobre a despesa. Amanhã não vou mais comprar carne todo dia.

Carne! Não vai ter mais carne? Como pode?

É o governo que não dá aumento. A conta não fecha.

Igual ao posto de saúde. Não tem dinheiro para o mínimo. A empregada lembra.

É este governo incompetente. Põe logo outro no lugar que tudo melhora.

E assim termina o assunto caseiro e vai para o bar tomar umas e outras.

Lá se encontra seu Laércio num papo animado com Aloísio Nuvens e seu Fernando Airoso. A conversa deles: deixa os babacas pagarem a conta do ajuste. Depois a gente denuncia o estelionato.

O bom pagador de impostos se aproxima a tempo de ouvir o encerramento da questão: já pensaram se fôssemos nós a fazer esta lambança? A raiva que o povo ia ter da gente?


E um pouco tonto de tanto ruído mental, encostou-se no balcão e, na sorrateira, roubou o esparadrapo do comerciante. Já era uma economia, só precisava agora comprar a gaze para a empregada. 
Como atuam os setores que articulam a queda da Presidenta Dilma?

Nas ruas uma postura de classe. Um “paulistanismo” arrivista, vinculado à globalização subalterna e a uma espécie de neocolonialismo com outras regiões brasileiras (especialmente o Nordeste). A rua não teria o peso, mesmo com o descontentamento, se não houvesse estímulo da mídia e algum financiamento.

Os dados da crise e o desgaste político do governo é um fenômeno pós-eleitoral. Tem a força motriz na derrota eleitoral seguida. Mesmo com o avanço do PSDB nas eleições presidenciais passadas, que já representava o desgaste do governo Dilma, a verdade é que toda a articulação e a grita é pós-eleitoral e de janeiro para cá.

Tenho consciência que antes eram as eleições e hoje é o governo. A luta antes era a disputa e agora é a oposição. O que é novo em relação aos anos recentes é a ação política para negar a disputa anterior. Se ela não fosse válida, porque não mobilizar o povo na ocasião. Claro, naquele momento não havia clima e a oposição confiava na vitória. Assim se nomeia de golpe aos seus passos de janeiro para cá.
Por isso setores “mais progressistas”, simpatizantes do PSDB, estão tentando se descolar desta primeira versão da cassação da Presidenta (e do PT) evidentemente golpista e passaram a pegar carona na figura emblemática de Hélio Bicudo. Que não se perca nas semelhanças com o sobrenome e o símbolo do PSDB.

Como os quadros metabolizam o momento? (É semanal. A cada semana uma nova dose, especialmente na mídia):

a)     O PMDB sente a fraqueza e tenta buscar a sua grande fatia do bolo, aquela de quem se senta à mesa há décadas. Lembra a solução pós-impedimento de Collor com uma espécie de Itamar Franco (Michel Temer?).

b)    Segmentos mais racionais sabem que não será igual ao impedimento de Collor, agora há um partido ainda forte (pelo menos no imaginário brasileiro) para ser derrubado além da Presidenta. Para tal setor o tempo atual é juntar forças para selecionar os que ficarão num suposto “Governo de União Nacional”, mas excluindo o PT e, claro, os Movimentos Sociais e os partidos mais à esquerda (PSOL, PCO etc.). Um adendo: o ideal para eles é não brigar com os Movimentos Sociais, sabem da instabilidade do neoliberalismo pós-crise 2008 e, portanto, não é possível uma mão pesada ao estilo Margareth Thatcher.

c)     Setores ainda marcados pelo ideário socialdemocrata, simpatizantes do velho PSDB de Covas e do FHC dos seus livros quando ainda não negados, querem que o Partido ocupe o vácuo que pensam será deixado pela queda do PT (mais à esquerda) e assim se legitime uma coluna dorsal que não desconsidere de modo desbragado o avanço social recente. É o pessoal que exulta com Hélio Bicudo.

d)    Os segmentos à direita usam de artifícios radicais, com base num ódio extremista que vinga em todo mundo, para manter aceso o processo e ampliar o desgaste, atirando continuamente no governo cambaleante. O pagamento pela queda da Dilma e do PT será uma fatia de políticas e poder, mas não serão a espinhal dorsal da tal União Pós-PT.

e)     O Empresariado, especialmente o paulista, usa a mídia corporativa para exaurir politicamente a Presidenta, com uma mão consegue concessões para seus negócios e com a outra desgraçam Dilma com quem a elegeu.

f)      O PT nesta altura apenas sufoca. O governo é dele. A queda do governo é um forte golpe político contra o PT. Mas ele parece não entender a dimensão da ação adversária e de vez em quando alguém, que sabemos vinculado a ele, vem a público para dizer que o tempo da Presidenta se esgota rapidamente. Ora a sede e matriz do PT é o “paulistanismo” e nesta altura não é improvável que as mentes se confundam entre o que é política e o que o vício torto pelo cachimbo da raiz cultural.

Em desfecho. A ideia do PT de apresentar Lula como um espantalho ao golpe não é de todo desprovida de razão, pois a direita, pelas reações de Delegados da PF e Promotores Públicos, em conluio com a mídia corporativa, demonstra que a tese funciona. Mas, por outro lado é um tiro apenas conjuntural, não apresenta um plano para o futuro ao demonstrar preguiça de lutar e se organizar, pois aí é que algo pode se contrapor.

Mais do que um mero golpe. Mais do que mero direito político democrático da oposição, o que estamos vivendo é uma luta entre capital e trabalho sob a forma ideológica do neoliberalismo e dos direitos e proteção social. Pode-se pensar em táticas, mas estas se sujeitam a estratégia maior para as consequências da luta.

O PT ao expor o ex-Presidente se apresenta como uma espécie de covardia em relação a seus próximos passos histórico, pois apresentar a “solução Lula” é, também, uma espécie de plano futuro de concessões ao capital que sabe da moderação do líder.


O plano Lula, sem uma forte mobilização política, mais carrega a canibalização de um líder do que a marcha e um povo soberano. 

sábado, 12 de setembro de 2015

Onde fica o texto?

Ao ouvir Mauro Senise junto a Gilzon Peranzzetta, ao som da música “Choro, porque não”, expresso-me no verbo correto. Mesmo que a comunicação entre nós e os músicos ocorra além e aquém da cóclea ou do nervo auditivo.

No vídeo em que tocam juntos os músicos se corrigem e fica nítido que a centralidade da linguagem na audição.

Mas o texto fica em quais sentidos?

Algo indefinido. Ele é como uma fala interior. Uma história relembrada ou inventada, um discurso, uma narrativa, uma expressão.

Especialmente interior.

O texto não é apenas visão, oralidade, audição ou tato.


Por analogia ele é sabor. Pode ter um odor. Mas sobretudo é o nosso encontro silencioso. Quase uma telepatia.  

"RATINGS" INFLADOS E... SUSPEITOS - José Nilton Mariano Saraiva

Sem que haja ainda um necessário e desejado modelo alternativo, que de forma honesta e imparcial privilegie o “contraditório” e faça uso de equações mais adequadas e consistentes (a China começa a esboçar um), o mundo hoje se fia cegamente, para o bem ou para o mal, no que é produzido e incessantemente divulgado pelos norte-americanos, mesmo que às vezes falte a devida comprovação (só para ilustrar, lembremo-nos da presumida “morte” do saudita Osama Bin Laden, sem que absolutamente ninguém haja visto o corpo ???).

Por isso mesmo, o escarcéu provocado por pusilânimes e desonestos segmentos da mídia econômica brasileira, em razão do tal “rebaixamento” do rating do Brasil por parte da agência de classificação de risco americana Standard & Poor's, é por demais questionável. E por uma razão simplória: comprovadamente, foi uma decisão de cunho “político”, porquanto levou em conta o momento difícil que atravessa a economia brasileira (perfeitamente suplantável), mas deixou de considerar, como deveria e honesto seria, as imensas potencialidades que temos a médio e longo prazo, bem como o robusto e confortável “colchão” de 400 bilhões de dólares das nossas reservas, além do “imedível” mar de petróleo que possuímos (um “ativo” acima de qualquer suspeita e que os próprios americanos estão de olho já há bastante tempo).

Há que se considerar, ainda, que não só a Standard & Poor's, mas igualmente suas congêneres, as também americanas Moody's e Fitch, faz tempo que “pisam na bola”, ou “escorregam na maionese”, ao produzirem relatórios inconsistentes e mesmo desonestos (como o atual sobre o Brasil), porquanto estruturados num modelo questionado por economistas do mundo todo, mas que têm o poder (dada a inexistência de uma outra versão), de momentaneamente espalhar o “terrorismo” e destruir reputações mundo afora.

Tanto é que, 10 anos atrás, quando as três agências encimadas avaliaram o “rating” ou nota de crédito dos títulos hipotecários norte-americanos como AAA (grau máximo de confiabilidade), investidores de todo o mundo “aceitaram o pepino” como crível e quebraram a cara ao adquirir tais papéis, porquanto baseados em empréstimos garantidos por propriedades sobrevalorizadas.

Naquela oportunidade, como a “avaliação” das tais agências mostrou-se sem a menor consistência, porquanto assentada em “títulos podres” emitidos irresponsavelmente, não demorou muito (2008) para que a tal bolha do mercado imobiliário americano “estourasse”, levando o mercado de capitais a uma crise financeira mundial sem precedentes, resultando na quebra do (teoricamente) inabalável e sólido banco de investimentos americano Lehman Brothers, possuidor de uma robusta e alentada carteira de títulos hipotecários (que viraram pó, de uma hora pra outra). 

Assim, face a repercussão mundial da “quebra generalizada” das bolsas de valores mundo afora e do pandemônio causado internamente, o governo americano literalmente se viu obrigado a injetar na economia astronômicos 850 BILHÕES DE DÓLARES para “amansar o mercado”, ao tempo em que oficialmente considerou a agência de classificação de risco Standard & Poor's como inidônea e responsável pela crise na economia mundial. Processou-a na Justiça americana, assim como impingiu-lhe pesada multa face o ocorrido. De sua parte o austero diário Wall Street Journal acusou-a de má-fé e má conduta.

Como resultado, a Standard & Poor's virou “RÉ” em um processo movido pelo Departamento de Justiça dos EUA, que acusou-a de ter “mascarado” o grau de risco de investimentos nos chamados papéis subprime (vilões da crise financeira desencadeada em 2008). Segundo a acusação, a empresa teria sido desonesta ao, propositadamente, ter ocultado chances reais de prejuízos a quem embarcasse naquela canoa furada (como de fato aconteceu).

Sem saída ou argumentos, a Standard Poor's houve por bem reconhecer tal acusação (que errou, sim, e grosseiramente), ao firmar um compromisso extrajudicial concordando em pagar ao Tesouro americano uma multa equivalente a quase US$ 1,4 bilhão (R$ 5,4 bilhões na cotação atual). O episódio reacendeu o debate sobre a credibilidade das agências de classificação de risco e os possíveis conflitos de interesse envolvendo suas atividades (já que contratadas por “agentes do mercado”).

No mais, há que se atentar que o governo norte-americano não é o primeiro a processar a Standard & Poor's pelas equivocadas e grosseiras avaliações; também um tribunal lá do outro lado do mundo (da Austrália) condenou a agência ao pagamento de uma indenização milionária por ter confundido e induzido os investidores locais com suas “falsas avaliações”. Em Nova York, outro tanto de enganados investidores moveram ação similar.

No momento, como economistas de escol (inclusive lá fora) já se manifestaram sobre o equívoco grotesco da avaliação da Standard & Poor's sobre a nossa economia, não seria o caso do governo brasileiro partir para a ofensiva, contestando publicamente o método adotado e mostrando ao mundo as “mancadas-homéricas” por ela patrocinadas, via “ratings" inflados e sob suspeita, que objetivam prioritariamente elevar suas receitas e obter maior participação no mercado ???





quarta-feira, 9 de setembro de 2015

Essa tal "DESONERAÇÃO" - José Nilton Mariano Saraiva

Em termos fiscais, “desoneração” é uma espécie de ferramenta-instrumento de politica econômica, eventualmente utilizada pelos diversos governos, que consiste da “renúncia voluntária”, por um determinado período, da arrecadação de certo tipo de imposto que lhe é devido pelo setor produtivo (o IPI, por exemplo), objetivando debelar uma crise momentânea, via manutenção do mercado aquecido, e cujos benéficos reflexos serão extensivos à própria população.

No entanto, embora normalmente tenha a “nobre” finalidade de manter a produção das fábricas e, consequentemente, a garantia de milhares e milhares de empregos (em tempos de vacas magras ou períodos recessivos), facilitando a vida do consumidor final, o uso de tal ferramenta-instrumento oferece o sério risco de dificultar a imagem do próprio governo, se não for aplicado na dosagem correta e num tempo determinado (nem mais nem menos).

Exemplos: a) quantos brasileiros, nos últimos anos, em função da adoção de tal medida, conseguiram adquirir o sonhado “carro zero” (estalando de novo), ao tempo em que ajudaram seus semelhantes a continuar empregado, bem como as indústrias produzindo, mesmo com a crise braba que se abateu sobre todos os países, inclusive os “top de linha” do primeiro mundo ??? b) quantos patrícios, nos últimos anos, adquiriram TVs de última geração, artigos luxuosos da “linha branca” (geladeiras, fogões, máquina de lavar), computadores sofisticados e por aí vai, em razão dos preços atrativos (via desoneração) e do novo “poder de compra” propiciado por um aumento real do salário mínimo, acima do índice inflacionário (que catapultou milhões de trabalhadores da miséria) ???

Acontece que a persistência de tal beneplácito (“desoneração”) por um tempo considerado além do razoável (por injustificável descuido ou falta de atenção), tende a impingir ao seu mentor consequências nefastas e perigosas, porquanto no “caixa” do governo (Brasil) os “reais” necessários ao pagamento das suas despesas e manutenção da máquina rarearão e se fará presente no dia-a-dia, comprometendo a louvável iniciativa original (manter o emprego e as fábricas produzindo, lembremo-nos). E foi exatamente aí onde o governo patinou, pecou e cometeu uma falha clamorosa, que hoje se faz sentir. Basta atentar para os números: em 2014 a renúncia fiscal do governo atingiu assombrosos R$ 100,6 bilhões e para 2015 nada menos que estratosféricos R$ 104,7 bilhões estão previstos.

Há que se atentar, ainda, para um “pequeno-grande” detalhe: como o Brasil não é uma ilha e, pois, depende da boa saúde dos seus parceiros comerciais, ao fim da “desonerações” somou-se a atual crise econômico-financeira que se abateu sobre alguns dos seus potenciais compradores (a poderosa China e a claudicante Argentina, por exemplo) que, atingidos pela recessão, diminuíram sensivelmente suas compras do Brasil, daí a crise braba na área automotiva nacional e, consequentemente, o desemprego e o aumento dos estoques, por falta de adquirentes de tal setor.

Afinal, como tal segmento representa cerca de 5% do PIB nacional (a soma de todas as riquezas produzidas) e 23% do industrial, a queda foi de 12% nas vendas e de 30,4% nas exportações, em relação ao ano anterior (dados de 2014, de acordo com a Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores-Anfavea), daí o aumento progressivo na nossa “taxa de desemprego”, desde então.

Resta torcer para que, de par com os amargos (mas, excessivos, convenhamos) ajustes que se processam, os solavancos na economia mundial refluam, o comércio internacional volte à normalidade e o Brasil encontre uma maneira de driblar os percalços ora vigentes.

terça-feira, 8 de setembro de 2015

AMARRANDO OS CADARÇOS DOS SAPATOS

Alguns indicadores de como andamos “aos trancos e barrancos” como dizia Darcy Ribeiro. Nós aí como o momento histórico.

O papa tenta engajar a igreja no acolhimento humanitário dos refugiados do Oriente Médio e pede que igrejas, conventos, mosteiros, entre outras instituições, recebam pelo menos uma família de refugiados. Um bispo da Hungria diz que não são refugiados, mas invasores. Não importa o contra-argumento do bispo se antes ou após o pedido do papa.

Desde 1980 os EUA invadiram, atacaram ou bombardearam pelo menos 14 países de predomínio islâmico, segundo estudo de João Fernando Finazzi e Reginaldo Nasser. Em 2014 apurou-se que 59,5 milhões de pessoas deixaram suas casas por perseguição e violência generalizada.

Estes mesmos sírios de crianças mortas na praia sofreram as consequências da ajuda militar de 16 bilhões de dólares. Dinheiro para todas as facções em luta. Doze nações, seis europeus, dois norte-americanas e quatro do oriente médio financiaram a carnificina na Síria e por tabela no Iraque e Curdistão.

A medalha de ouro dos recursos aplicados vai para os EUA com 7,7 bilhões (48%), seguidos pela Rússia e o Qatar cada um com 3 bilhões, unilateralmente pelo Canadá (718 milhões), cinco países da União Europeia (818 milhões) e o restante com os demais países do Oriente Médio. A conta do horror: ninguém quer receber refugiados.

Algo se desmorona de fato. O dinheiro é um meio de troca de mercadoria. Como explicar, como estima Stiglitz, que de 2009 a 2012 de todo o crescimento da economia mundial, 91% foi apropriado por apenas 1% da população. 99% não viu nem a cor dos benefícios que este crescimento deveria ter trazido.

Amarremos os cadarços do sapato. Como dizia Mário Ciarlini, um cearense descendente de italianos, quando perguntaram porque tinha apenas um par de sapatos e ele respondeu que só tinha dois pés. Ou seja, se estes tais 1% são mesmo de carne o osso como pensamos que sejam, nem Imelda Marcos, em seu delírio de centopeia, teria como usar tanto sapato em uso próprio.


Seria este crescimento apenas fumaça? E os ricos apenas brincam feito tio Patinhas sobre uma montanha de moedas? Ou apenas serve para financiar destruição e desgraça? 

quinta-feira, 3 de setembro de 2015

NA LAGOA

Lagoa Rodrigo de Freitas, Sacopenapã ou Piraguá. Água, peixinhos, mangue, galhos e biguás. Num ouvido a coleção lacustre. No outro a feroz explosão dos motores sobre rodas.

Tudo em volta é presença humana. Até na lagoa. Nos céus e nos morros.

Na orla, uma faixa compartilhada. Bicicletas pedalando gente. Executivos, empregados, atletas para a academia, encontros em silenciosos ciclistas movidos a energia elétrica.

E uma mulher com rosto de pássaro passa correndo em sentido contrário. E tem uma regra média: cenhos angustiados, suados, pálidos e sufocados. Tudo isso pela vida. A vida igual à posição social e econômica: corrida.

E todos se movem na órbita de sete quilômetros e meio. Um homem de cabelos de nuvem vem por cima da mureta à beira lago num passo ágil como uma espécie de prevenção do Mal de Alzheimer.

Eis que alguém por trás se aproxima confessando que Daniela não fala mais com ela. E quanta gente mais não fala com ela. Na Lagoa apenas a sua companhia. Mas o afastamento de Daniela é a dor da proximidade.

E os prédios na margem da Lagoa. Há que nomear-se em alguma língua, como francês ou inglês, jamais português. Isso faz parte da escalação social. Há que negar sua origem. Agora é outra coisa. Mora na Lagoa.

E estudiosos da epidemia de suicídios em indígenas do Amazonas identificaram origens na perda da língua materna. E andamos na lagoa pensando que é imensa a população bilíngue do mundo e nem por isso suicida-se. Como os prédios dos moradores da Lagoa.

Mas a questão não são as duas línguas. É a extorsão de sua língua e imposição de novos valores na língua que matou a sua. É o português rasgando cada folhelho do fruto do coração.

E a mulher com rosto de pássaro passa novamente, já fez a órbita inteira. Não porei neste cesto as inúmeras obras, visões e cenas da Lagoa. Mas é impossível, ao passar em frente a Ipanema, olvidar um cantinho, o violão, o Corcovado, o Redentor que lindo.

São varandões escancarados para toda a visão da Lagoa e dos morros. Corcovado, Sumaré, Vista Chinesa e tudo que no largo do mundo exista. Porém todas varadas estão fechadas. No máximo uma pequena brecha.

Embaixo do arvoredo das margens o vendedor de coco despeja doçura e sedução sobre a cadela da madame. Despeja em tal volume que transborda para as delícias seduzidas que a madame não tem em casa.

A mulher com rosto de pássaro completa outra volta na Lagoa e eu nem a metade. E o alemão, aposentado de uma multinacional gentílica, a família desapareceu, hoje a Fonte da Saudade é o seu lar e a Lagoa sua caminhada. Todos os dias à mesma hora. Falando o tempo todo segue na companhia de um senhor com feições e corpo de general cearense aposentado.

A Lagoa é, agora, um sítio permanente de atletas trocando ideias com as consequências da Torre Babel. Tais visitantes, com suas mochilas, certamente pertencem à economia das Olimpíadas. Mas não é isso mesmo que se precisa, movimentar-se para sair da crise?

Sei. A caminhada é longa. Especialmente para o Facebook e ainda faltam mais de duzentos metros para completar a volta. E uma mulher passa dizendo que os helicópteros de passeio não mais voam por causa da crise.

Eu logo imagino. Silêncio nos céus do Corcovado.