por José do Vale Pinheiro Feitosa




Viva junto à alma mais próxima e compreenda que a proximidade é a medida da distância. Que a distância que os separa é este movimento maravilhoso da matéria e da energia. A maravilha é apenas esta surpresa porque esta proximidade é tão diminuta entre os dois e é a inesperada distância.

José do Vale P Feitosa



sexta-feira, 4 de fevereiro de 2011

a cadeira

a cadeira fica ali
quieta como um nó
sob a abóbada
sempre quieta, mas
com medo do espelho
desconhece tudo, jamais
precisa do mundo,
do grito no escuro jamais

o corpo pressente o sentar
o fim e o começo
antes mesmo de deixar
o cansaço fora de si

a cadeira aguarda assim
no medo do cego
uma calma que não se tem

sentado, serão um só
num fogo que arde muito além

" Tango Azul " - Los Tres Diamantes

"Tango Azul" - Uma Música Inesquecível !

AVE DE RAPINA - por Marcos Barreto de Melo

como ave de rapina
você chegou de repente
numa madrugada fria
sem estrela e sem luar
e o dia nasceu cinzento
sem o ter o sol a brilhar

veio trazendo na bagagem
dias de amargo sabor
e noites de escuridão
com o seu jeito indigesto
marcado por cada gesto
ao nascer de um novo dia

ainda tentou me envolver
com um aceno de paz
querendo me alegrar
mas, eu não acreditei
pois conheço o teu passado
sei de tu que é capaz

ao passar de cada dia
você foi se revelando
demonstrando a sua ira
e num gesto traiçoeiro
num momento de descuido
colheu tudo que queria

não sei se foi por maldade
ou mesmo por vaidade
de procura um troféu
pra exibir lá no céu
você levou minha prenda
e por isso eu te detesto
deixando aqui meu protesto
maldito mês de agosto

Marcos Barreto de Melo

Psique e Escola. Liduina Vilar.

Olhos humanos luminosos,
expectativa à tona,
no leito da alma
de cada aprendiz, o olhar
direcionado ao interior da
orientadora e educadora
que escuta, acolhe,
empatiza e sugere rumos.
O trabalho harmonioso bate
na porta do amor e vê surgir
efeitos, insights e prumos.
Amanhece o novo dia
os primeiros conflitos aparecem
e seguem em busca da palavra,
de um ouvido, de sintonia e calor.
O próprio existir detém
o que basta a cada um.
Portanto, a sabedoria e a vida possuem
o grande segredo da cura interior.

O pilão lavrou


O velho Frazão,lá do Belmonte, observou espantado o pilão( o pluviômetro do matuto) transbordando no terreiro, de manhãzinha e concluiu: “ --A chuva foi de lascar, dessas de fazer Noé se benzer em cruz!” Sensação não muito diferente teve o seu Neco Moreno ali nas proximidades do Palmeiral, fitando o estrondo da água rio abaixo: --A chuva foi de fazer cururu gritar “Maria Valei-me!” em cabeça de estaca. O certo é que , sexta-feira passada, boa parte dos cratenses teve a clara certeza de que a Pedra da Batateira tinha, por fim, explodido. As ruas viraram córregos, as casas lagos, o comércio cratense passou a ser submarino. Até os defuntos, no cemitério local, despertaram do descanso eterno, e alguns saíram surfando no topo da onda. Enquanto isso, os cratenses meio abismados, computavam as perdas e os rastros da destruição. Enquanto alguns outros, insensíveis à tragédia, saqueavam casas e lojas com o mesmo apetite dos corvos e urubus.
O que havia despertado tanta fúria no sempre cordato e quietinho rio Grangeiro? Ele que, aparentemente, agüentara sempre resignado a invasão seguida das suas margens; a opressão do seu leito por canais ; a transformação das suas águas translúcidas num esgoto pútrido; o desmatamento criminoso da sua mata ciliar. O que havia despertado a fúria do gigante há tanto tempo adormecido?
Como dizia Brecht : “Criticamos a Violência do Rio e esquecemos a violência das margens que o oprimem”. Aos poucos, à medida que as águas foram baixando, a população começou a digerir a hecatombe. Alguns puseram a culpa em fenômenos naturais episódicos; outros no aquecimento global ; alguns viram até a mão de Deus amparando os cratenses em meio à enxurrada. Como se uma força superior, brincando de fazer tragediazinha, preparasse a calamidade e, depois, se pusesse a proteger os munícipes, meio arrependida. Esta semana, a prefeitura de Crato apresentou a primeira avaliação do prejuízo público, na brincadeirinha celeste, excluídas, claro, as enormes perdas particulares : quase 90 milhões. Quem paga o pato ?
Antes de quebrar os porquinhos e reiniciar a reconstrução é bom pensar nas causas da calamidade que era previsível e anunciada. Anos e anos de impermeabilização do solo por asfaltos, loteamentos sem autorização, desmatamento nas nascentes, ocupação desordenada nas encostas apenas montavam o cenário para a tragédia que seria encenada e mais : em muitos e muitos atos. O Canal do rio já se fazia uma agressão à natureza nos anos 50 quando não existiam bairros populosos como o Pimenta, o Sossego, o Grangeiro, o Lameiro. Desde então a cidade explodiu populacionalmente, na mesma velocidade com que destruía seus recursos naturais da encosta da serra em nome do progresso. Agora que pensamos em começar os reparos é preciso, mais que nunca, discutir amplamente com a população o problema, buscar embasamentos técnico e ambiental e mais: começar ,ainda que tardiamente, a tratar com mão de ferro os abusos e desvios. Simploriamente remendar os estragos feitos, sem mexer nas profundas estruturas que os causaram é como tentar fechar com areia a boca do vulcão em plena erupção.
O Rio Grangeiro , na sexta-feira passada, apenas executou uma promissória há muitos e muitos anos vencida. Existem ainda milhares outras esperando a oportunidade de cobrança, com juros e correção monetária. A violência das suas águas é bem menor que a violência reiterada a que vem se submetendo por muitos e muitos anos.


J. Flávio Vieira

"Tocar como se estivesse cantando"- Dominguinhos e Yamandu !



O Programa de hoje, “Sem Censura”(Leda Nagle), contou com a participação especial de Dominguinhos e Yamandu.
A simplicidade nunca perdida daquele grande músico pernambucano, emocionou-me até as lágrimas. Como pode um ser humano ser tão lindo?
Depois, no segundo bloco, escutamos Yamandu tocando e cantando, uma música lindíssima do cancioneiro gaúcho.Fez depois um dueto, num chorinho de Jacob do Bandolim, Doce de Coco, sensacional !
Uma das músicas mais bonitas de Dominguinhos é "Contrato de Separação".
Ouvimos na interpretação da cantora Flávia Bittencourt, bem como "Xodó", na voz da filha do Dominguinhos.
O Nordeste arrasa, na sua musicalidade !
Mas, tudo é Brasil...Estou gostando mais ainda de Yamandu !





socorro moreira

começarei

começarei por dizer
que um dia te arrependerás
de não teres vindo 
e nos vermelhos olhos captar
teus segredos vertidos
em luz num relance
o que mal cabe nas palavras

palavras não dizem tudo
tu o sabes
o arrepender-se não fará
retornar o que era vidro
talhado com silêncios
parte da frase de árduo significado
amor que coincide com o que pensamos ser
o que todos buscamos

tua ausência
será presença
paixão que não se traduz
nos subterrâneos da linguagem
o ato de não escutar o tempo

o presente é indecifrável
dissolve-se em escritura
adubada de tensão
mas nele plantei meu peito
para o que a tua ausência
inventou com a dor
ameaça às cores das coisas
por não ter compromissos com elas




Do Livro Poeira nas Réstias - Everardo Norões

Tiradeira de leite


entre os dedos
o fulgor do leite
filtra a desordem solar
o curral aprisiona
o sossego dos bichos
o negro viscoso do olho
a refletir vasilhas
o ramo da árvore
a sombra do regaço
cedo a manhã cheira
e tudo se acorda
na precisão do mato
ou do alento
que chega do açude
no remanso das entranhas
dessas nuvens lentas
lentas
lentas
lentas

(Everardo Norões)

Enquanto dormes...- por Domingos Barroso

Tua camisola azul
é um lindo vestido
de fada.

As tuas sandálias brancas
dizem-me coisas debaixo
da cama.

Tu não ouves porque estás dormindo
enlouquecida tentando me jogar fora
da cama e dos teus sonhos.

As tuas sandálias são sapatos de puríssimo cristal
além de me encantarem também enlouquecem os insetos
que festejam todas as noites (champanhe e tudo mais)
debaixo da tua cama de princesa.

Podes rosnar e rasgar estrelas ao meio
mas logo estarei te fazendo companhia
ao teu lado direito te beijando a nuca.

Façamos barulho à vontade
os nossos filhos ainda
não nasceram.

Domingos Barroso
Fortaleza, Brazil

Foto do dia - Por Heládio Teles Duarte

Quando as águas encantam...!

*Depois de tantas águas barrentas poluídas pelos lixos, do choro da natureza, derramado no canal (antes leito de um rio), limpamos a vista com a água transparente e azul, de um recanto especial, fotografado por Dr. Heládio.
São doces as águas das nossas nascentes, que jorram em bicas.
O Crato, nos seus arredores, continua lindo!
Região geograficamente privilegiada pela natureza.
Não há como não desejar, que elas sempre nos encantem!
Têm sido muito discutidas as fórmulas de preservação da nossa cidade, mas o pensamento é uno: desejamos paz, na sua beleza natural!
-Proteção maior nas áreas de risco
-Urbanismo criterioso
-Direcionamento oportuno e correto dos seus recursos materiais, técnicos e humanos.
Que Deus ilumine os nossos administradores, e proteja a população de possíveis danos.

socorro moreira


PENSAMENTO PARA O DIA 4 DE FEVEREIRO

"EU SÓ SOU ENCANTADO POR CAUSA DA AUSÊNCIA. É NA AUSÊNCIA QUE A SAUDADE VIVE. E A SAUDADE É UM PERFUME QUE TORNA ENCANTADOS A TODOS OS QUE O SENTEM. QUEM TEM SAUDADES ESTÁ AMANDO. TENHO DE PARTIR PARA QUE A SAUDADE EXISTA E PARA QUE EU CONTINUE A AMÁ-LA, E VOCÊ CONTINUE A ME AMAR...”

(Rubem Alves)

Correio Musical- (esta eu escutaria o dia todo...)



Cadê Você (Leila XIV)
Chico Buarque
Composição: Chico Buarque

Me dê noticia de você
Eu gosto um pouco de chorar
A gente quase não se vê
Me deu vontade de lembrar

Me leve um pouco com você
Eu gosto de qualquer lugar
A gente pode se entender
E não saber o que falar

Seria um acontecimento
Mas lógico que você some
No dia em que o seu pensamento
Me chamou

Eu chamo o seu apartamento
Não mora ninguém com esse nome
Que linda a cantiga do vento
Já passou

A gente quase não se vê
Eu só queria me lembrar
Me dê noticia de você
Me deu vontade de voltar

O PERFUME DAS UVAS


O perfume das uvas sob o sol de outubro.
O rio cresce, as águas se avolumam, destroem
                        as barrancas e as locas dos peixes.
As águas correm dentro das árvores, correm dentro de nós.
As nossas raízes se vão com as águas vorazes.
E as uvas perfumam a tarde sob o sol do outono.

Os abismos do mar deságuam por nós a dentro.
No canto selvagem do mar a voz do afogado,
estrangeiro como nós, sem pátria como nós.

O sal do mar nas pétalas caídas no altar.
O grito do gavião nas fauces do mar.
As vagas morrem na areia, os rochedos cobertos
                           de espumas, lágrimas escorrendo.
O mar uiva, as uvas perfumam a montanha.

Vou deixando as minhas pegadas na areia da praia,
pesadas, com sombra.
Cai a sombra na minha alma.
Logo se apagam as pegadas.
Um sino tange o tempo antiqüíssimo e sempre novo.

As gaivotas trazem o mar nas asas.
As árvores em chamas despencam no mar.
Flores voam no ar do verão.
Espumas e sangue escorrem do rochedo dos mariscos.
Um navio joga grossas ondas contra a ilha.
Línguas de fogo elevam-se da terra.

Este é o tempo dos mortos.
As mulheres se abrem aflitas para o céu.
Desfia-se o tecido das coisas.
Não somos. Sombras que a sombra devora.
Ouvi a voz dos mortos, como sementes,
brotando à borda dos poços.
Os vinhedos já não estão ao sol, as uvas
ainda perfumam os pássaros, as águas, os peixes.
O sino tange no horizonte, com sangue.




caminhos da cidade

tuas esquinas cegam o passista
e doem  da ponta das unhas
até os anéis
no esquivar-se das mil armadilhas
que a tarde tem

a curva da ponte ressoa 
no dorso de novo
e o dia se faz um caroço
onde as alturas do grito
apequenam quem cala  

entre túneis e escuras galerias
esgota-se o coração
porque lá fora o mundo 
é um baú de feras

sob algo infinito
espera-se que a luta
não resulte em luto
para quem aguarda
o perfurar de setas
na sombra do outro



Igreja e Religião - José Nilton Mariano Saraiva

Por guardar profunda similitude com o que esposamos em termos de religião e Igreja (e porque nos julgamos incompetentes para produzir algo sequer parecido sobre), permitimo-nos “transcrever” o texto abaixo, embora sem conhecer o seu autor (um tal Rubem Alves, para quem tiramos o chapéu).
Apesar de longo, vale a pena conferir (os grifos não nossos).

José Nilton Mariano Saraiva

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Sobre Deuses, Pássaros e Gaiolas (Rubem Alves)

Eu não tenho religião. Não vou a igrejas, não participo de rituais, não acredito nos seus dogmas. Preciso não ter religião para amar a Deus sem medo, com alegria e, principalmente, sem nada pedir. Não tenho religião porque não concordo com as coisas que elas dizem de Deus. Deus é um Grande Mistério. Está além das palavras. Diante do Grande Mistério a gente emudece. Fica em silêncio. Discordo a partir do pronome “ele”. Deus “ele”, masculino? Onde foi que aprenderam sobre o sexo de Deus? Deus tem sexo? Se tem sexo, por que não ela, Deus mulher? Como a mulher do Cântico dos Cânticos? A Igreja Católica não conhece a mulher. Conhece apenas a “mãe” que foi mãe sem ter sido mulher. Deus: por que não uma flor, a mais perfumada? Por que não um mar sem fim onde a vida navega? Místicos houve que disseram que Deus é uma criança que nos convida a brincar... Mas pode ser também que Deus seja música, como pensaram os místicos pitagóricos.
Ter uma religião é falar as palavras sagradas daquela religião e acreditar nelas. As religiões se distinguem e se separam pelas diferenças das palavras que usam para se referir ao sagrado. Se elas nada falassem, se houvesse apenas o silêncio diante do Grande Mistério, a Babel das religiões não existiria. Diante do Grande Mistério apenas uma palavra é permitida, a palavra poética, porque a poesia não o diz, mas apenas aponta para ele. O Grande Mistério está além das palavras.
Se tenho uma religião e ela se chama poesia. Por isso, amo a Cecília Meireles, sacerdotisa profana, que quando queria se referir a Deus falava sobre um mar sem fim, misterioso e selvagem. Quem em silêncio contempla o mar sem fim ouve vozes em meio ao barulho das ondas. Também Fernando Pessoa sabia disso. Mas, prestando bem atenção, é possível ver, a voar sobre o mar sem fim, um pequeno pássaro que canta: “Leve é o pássaro: e a sua sombra voante, mais leve. E a cascata aérea de sua garganta: mais leve. E o que lembra, ouvindo-se deslizar seu canto, mais leve...”
Os poetas escrevem em transe: não sabem sobre que estão escrevendo. Faz muitos anos, escrevi um livro para minha filha. Ela tinha 4 anos. Eu iria fazer uma demorada viagem pelo exterior e ela ficou com medo de que eu morresse e não voltasse. Apareceu-me, então, uma estória, “A menina e o pássaro encantado”. Resumida, era assim: era uma vez uma menina que amava um pássaro encantado que sempre a visitava e lhe contava estórias; o pássaro a fazia imensamente feliz. Mas sempre chegava um momento quando o pássaro dizia: “Tenho de ir”. A menina chorava porque amava o pássaro e não queria que ele partisse. “Menina”, disse-lhe o pássaro, “aprenda o que vou lhe ensinar: EU SÓ SOU ENCANTADO POR CAUSA DA AUSÊNCIA. É NA AUSÊNCIA QUE A SAUDADE VIVE. E A SAUDADE É UM PERFUME QUE TORNA ENCANTADOS A TODOS OS QUE O SENTEM. QUEM TEM SAUDADES ESTÁ AMANDO. TENHO DE PARTIR PARA QUE A SAUDADE EXISTA E PARA QUE EU CONTINUE A AMÁ-LA, E VOCÊ CONTINUE A ME AMAR...” E partia. A menina, sofrendo a dor da saudade, maquinou um plano: quando o pássaro voltou e lhe contou estórias e foi dormir, ela o prendeu numa gaiola de prata dizendo: “Agora ele será meu para sempre”. Mas não foi isso que aconteceu. O pássaro, sem poder voar, perdeu as cores, perdeu o brilho, perdeu a alegria, não mais tinha estórias para contar. E o amor acabou. Levou tempo para que a menina percebesse que ela não amava aquele pássaro engaiolado. O pássaro que ela amava era o pássaro que voava livre e voltava quando queria. E ela soltou o pássaro que voou para longe. A estória termina na ausência do pássaro e a menina se enfeitando para a sua volta.
Minha intenção, ao escrever esta estória, era simples: consolar a minha filha. Mas quando foi publicada ganhou um sentido que não estava nas minhas intenções: começou a ser usada em terapia, com casais possuídos pela ilusão de que, engaiolado, o amor seria posse eterna.... Desde então passei a presentear noivos com uma gaiola da qual eu arrancava a porta. Mas, passado algum tempo, uma pessoa me disse: “Que linda estória você escreveu sobre Deus!” “Sobre Deus?”, eu perguntei sem entender. “Sim”, ela me respondeu. “O PÁSSARO ENCANTADO NÃO É DEUS? E AS GAIOLAS NÃO SÃO AS RELIGIÕES NAS QUAIS OS HOMENS TENTAM APRISIONÁ-LO?” APRENDI, ENTÃO, DA MINHA PRÓPRIA ESTÓRIA, ALGO QUE NÃO SABIA: DEUS COMO UM PÁSSARO ENCANTADO QUE ME CONTA ESTÓRIAS. AMO O PÁSSARO. ODEIO AS GAIOLAS. O Pássaro Encantado: não pousa em galhos para cantar. Não é possível fotografá-lo. Canta enquanto voa. Dele, o que temos é apenas a sua leve sombra voante e a cascata aérea de sua garganta... Quando ouço o seu canto, ele já passou. Só é possível vê-lo em seu vôo, por trás. Vai-se o Pássaro. Fica a memória do seu canto.
Um pássaro voando é um pássaro livre. Não serve para nada. Impossível manipulá-lo, usá-lo, controlá-lo. Pássaro inútil. E esse é, precisamente, o seu segredo: a sua inutilidade; ele está além das maquinações dos homens. Sua única dádiva é o seu canto. Só faz um milagre, um único milagre: quando, chorando, lhe peço “Passa de mim esse cálice”, ele canta e o seu canto transforma a minha tristeza em beleza. Por isso eu nada lhe peço. Sei que ele não atende a pedidos. O seu canto me basta: ao ouvi-lo transformo-me em pássaro. E vôo com ele...
MAS AÍ VÊM OS HOMENS COM AS SUAS ARAPUCAS E GAIOLAS CHAMADAS RELIGIÕES. E cada uma delas diz haver conseguido prender o Pássaro Encantado em gaiolas de palavras, de pedra, de ritos e magia. E cada uma delas afirma que o seu pássaro engaiolado é o único Pássaro Encantado verdadeiro...
Por que prenderam o Pássaro? Porque o seu canto não lhes bastava. Não lhes bastava a beleza. Na verdade, não o amavam. O QUE OS HOMENS DESEJAM NÃO É A BELEZA DE DEUS. O QUE ELES DESEJAM É MANIPULAR O SEU PODER. O que eles querem é o milagre. O canto do pássaro poderia lhes dar asas para voar. Mas não é isso que querem. O que desejam é o poder do pássaro para continuar a rastejar: Deus, transformado em ferramenta. Ferramenta é um objeto que se usa para se atingir um fim desejado. Assim são os martelos, as tesouras, as panelas... O QUE AS RELIGIÕES DESEJAM É TRANSFORMAR DEUS EM UMA FERRAMENTA A MAIS. A MAIS PODEROSA DE TODAS. A ferramenta que realiza os desejos. Como o gênio da garrafa. Pois não é isso que é o milagre, a realização de um desejo por meio da manipulação do sagrado? Só é canonizada santa uma pessoa que realizou milagres: o milagre é o atestado do seu poder para manipular o divino.
E é assim que as religiões se multiplicam, porque os desejos dos homens não têm fim, e os seus santuários se enchem de santos de todos os tipos, os santos milagreiros são nossos despachantes espirituais, todos eles a serviço dos nossos desejos, atenderão nossos desejos a preço módico, se rezarmos a reza certa e prometermos publicar o milagre em jornal, e pela televisão se anunciam fórmulas, sessões de descarrego, águas bentas milagrosas, exorcismo de demônios, os DJs de cada religião têm uma música na fala que lhes é própria...
Assim, a poesia do canto do Pássaro Encantado se transforma em manipulação do pássaro engaiolado. E não percebem que aquele pássaro que têm dentro de suas gaiolas não é o Pássaro Encantado, que não se deixa engaiolar, porque é como o vento, e voa como quer, e tem uma única dádiva a oferecer aos homens: a beleza do seu canto. À TRANSFORMAÇÃO DA POESIA EM MANIPULAÇÃO MILAGREIRA OS PROFETAS DERAM O NOME DE IDOLATRIA.

Jacques Prévert



Jacques Prévert (Neuilly-sur-Seine, 4 de fevereiro de 1900 — Omonville-la-Petite, 11 de abril de 1977) foi um poeta e roteirista francês.

Após o sucesso da sua primeira coletânea de poesias, Paroles (1946), Prévert tornou-se um grande poeta popular, graças à sua linguagem familiar, senso de humor, hinos à liberdade e jogo com as palavras. Como resultado de seu sucesso, seus poemas passaram a ser estudados em todas as escolas francesas do mundo, conquistando o reconhecimento internacional.

Poeta e roteirista, Jacques Prévert ironizou os usos e costumes, o clero, a igreja. Criou os roteiros e diálogos de grandes filmes franceses pertencentes à escola do realismo poético, realizados em sua maioria por Jean Renoir e Marcel Carné.

Como compositor, ele escreveu a música "Les Feuilles Mortes", que foi muito famosa em seu tempo, na voz de Ives Montand. Mais tarde, Serge Gainsbourg compôs uma música chamada "La chanson de Prevért" que faz referência à canção citada acima.

wikipédia



Tradução de Silviano Santiago.

PARA PINTAR O RETRATO DE UM PÁSSARO

Para Elsa Henriquez


Primeiro pintar uma gaiola
com a porta aberta
pintar depois
algo de lindo
algo de simples
algo de belo
algo de útil
para o pássaro
depois dependurar a tela numa árvore
num jardim
num bosque
ou numa floresta
esconder-se atrás da árvore
sem nada dizer
sem se mexer…
Às vezes o pássaro chega logo
mas pode ser também que leve muitos anos
para se decidir
Não perder a esperança
esperar
esperar se preciso durante anos
a pressa ou a lentidão da chegada do pássaro
nada tendo a ver
com o sucesso do quadro
Quando o pássaro chegar
se chegar
guardar o mais profundo silêncio
esperar que o pássaro entre na gaiola
e quando já estiver lá dentro
fechar lentamente a porta com o pincel
depois
apagar uma a uma todas as grades
tendo o cuidado de não tocar numa única pena do pássaro
Fazer depois o desenho da árvore
escolhendo o mais belo galho
para o pássaro
pintar também a folhagem verde e a frescura do vento
a poeira do sol
e o barulho dos insectos pelo capim no calor do verão
e depois esperar que o pássaro queira cantar
Se o pássaro não cantar
mau sinal
sinal de que o quadro é ruim
mas se cantar bom sinal
sinal de que pode assiná-lo
Então você arranca delicadamente
uma das penas do pássaro
e escreve seu nome num canto do quadro.


de “Paroles” (1945)

quinta-feira, 3 de fevereiro de 2011

João Nicodemos por João Nicodemos



Ernesto Nazareth




Ernesto Júlio de Nazareth (Rio de Janeiro, 20 de março de 1863 — 1º de Fevereiro de 1934) foi um pianista e compositor brasileiro, considerado um dos grandes nomes do "tango brasileiro" ou, simplesmente, choro.

Hilda Hilst




Hilda de Almeida Prado Hilst (Jaú, 21 de abril, 1930 — Campinas, 4 de fevereiro de 2004) foi uma poetisa, escritora e dramaturga brasileira.

Poemas aos Homens do nosso tempo


Amada vida, minha morte demora.
Dizer que coisa ao homem,
Propor que viagem? Reis, ministros
E todos vós, políticos,
Que palavra além de ouro e treva
Fica em vossos ouvidos?
Além de vossa RAPACIDADE
O que sabeis
Da alma dos homens?
Ouro, conquista, lucro, logro
E os nossos ossos
E o sangue das gentes
E a vida dos homens
Entre os vossos dentes.


***********

Ao teu encontro, Homem do meu tempo,
E à espera de que tu prevaleças
À rosácea de fogo, ao ódio, às guerras,
Te cantarei infinitamente à espera de que um dia te conheças
E convides o poeta e a todos esses amantes da palavra, e os outros,
Alquimistas, a se sentarem contigo à tua mesa.
As coisas serão simples e redondas, justas. Te cantarei
Minha própria rudeza e o difícil de antes,
Aparências, o amor dilacerado dos homens
Meu próprio amor que é o teu
O mistério dos rios, da terra, da semente.
Te cantarei Aquele que me fez poeta e que me prometeu

Compaixão e ternura e paz na Terra
Se ainda encontrasse em ti, o que te deu.

(Júbilo Memória Noviciado da Paixão(1974) - Poemas aos Homens do nosso Tempo - IX) [in Poesia: 1959-1979/ Hilda hilst. - São Paulo: Quíron; (Brasília): INL, 1980.]

"O Anjo Azul "- Filme




Um assunto puxa outro ... - Por Socorro Moreira

A Marcha da Apuração.

E o rádio, urna por urna, nos passava os números.
Pequena ainda, já anotava e examinava as possibilidades. Meu pai comentava: não fique triste... Quando chegar no Lameiro, S.José e Ponta da Serra, a gente dispara, e vence as eleições.Minha mãe não saia do pé do rádio, mas seu voto era secreto. Não declarava, nem a pau, em quem votava. Era comadre de Dr. Ossian, de Dr. Derval, e muito amiga de Seu Pedro Felício. Vivia no fogo cruzado, e apaziguava os ânimos do sangue político dos Moreira.
Comício era uma festa. Banda de música e carnaval nas passeatas, antes e depois das eleições. Na Escola, naquelas épocas (anos 50 e 60), a turma se dividia, se intrigava... Lembro que eu tinha receio de entrar em conflito com os meus amigos, mas vestia a camisa da UDN.
Torcia, como torço pelo Vasco até hoje. Era seguidora do homem que eu admirava por todos os seus talentos, principalmente artísticos: meu pai!

* A UDN foi derrotada, quando perdeu o apoio do S.José, e teve a Ponta da Serra dividida, acho!
Tudo isso é passado !

A nível nacional , anos depois, entendi melhor as propostas destes extintos partidos. Fui atrás de entender a filosofia de Marx...!
Graças A Deus ( não sou materialista) vi com bons olhos todas as doutrinas socialistas, e busquei o espírito democrático, sempre !
Gostaria que Carlos, Zé Flávio, Everardo, Zé do Vale,Joaquim , Mariano... Abordassem este tema.Eles teem a propriedade que me falta.

Uma lição de civilidade – Por Carlos Eduardo Esmeraldo

Vivíamos no Crato, em outubro de 1958, eleições disputadíssimas. Concorriam ao cargo de prefeito o senhor Pedro Felício Cavalcante pelo PSD e José Horácio Pequeno pela UDN. Os comícios eram concorridíssimos de cada lado. Os udenistas chamavam os pessedistas de “gogó”, e eu nunca soube o porquê, e estes replicavam que os udenistas eram os “carrapatos”, talvez numa referência a esse partido ter vencido várias e sucessivas eleições. O meu pai concorria ao cargo de vice-prefeito na chapa da UDN. Era a primeira vez que esse cargo, desnecessário ainda hoje, era disputado.

Gerson Moreira, um dos meninos mais udenistas que conheci, desde criança um líder natural, organizou um comício dos meninos que a cada dia ganhava mais adeptos. À medida que as eleições se aproximavam mais gente acorria ao comício dos futuros políticos da nossa cidade. Surgiram palanques, sistema de som, todo requinte que os comícios dos políticos de verdade tinham.

Pedro Felício concorria pela quarta vez e compuseram uma paródia musical cujo refrão eu guardo na memória: (“hei Pedro Felício, hei seu teimosão, hei esta será a quarta decepção...”).

Certa noite, houve um desses comícios dos meninos defronte a casa do senhor José Honor de Brito, na Rua José Carvalho, bem perto de onde eu morava. Gerson, quando me viu, me convidou para o palanque e após alguns oradores falarem muito bem, me surpreendeu dizendo: “Agora vamos ouvir o filho do futuro vice-prefeito do Crato!” E de súbito, eu me vi engasgado, com o microfone nas mãos, todo trêmulo e sem saber o que falar. Então cochichei para o Gerson: “O que é que eu digo?” E alguém não identificado respondeu: “Diga que Pedro Felício é um ladrão!” Repeti como uma marionete esse recado, sem ao certo imaginar o que estava dizendo e fui muito aplaudido pela platéia que enchia a rua defronte do palanque.

Ao final daquele comício mirim que se encerrava cedo, provavelmente às oito horas da noite, voltei para casa satisfeito, crente que havia colaborado para eleição do meu partido. Mas por cerca das dez horas daquela mesma noite, eu fui bruscamente acordado pelo meu pai. Após a aplicação do corretivo usual para a educação daquele tempo, uma expressão que meu pai usou ficou para sempre no meu íntimo: “Pedro Felício é um homem de bem, é muito honesto e meu amigo. Eu não admito que você volte a falar o que falou dele! E está proibido de ir a esses comícios.” Realmente observava que papai se dava bem com todos os políticos do PSD e com seus eleitores também. Certa vez ele viajou com Pedro Felício, Jósio Araripe e outros amigos a Minas Gerais para comprarem gado da raça gir e nelore, ainda não existentes na nossa região. Muitos dos primos e primas do meu pai, da família Pinheiro eram do PSD e jamais houve inimizade entre eles.

Terminada a apuração da cidade, naquela época apuravam-se em primeiro lugar os votos das urnas da cidade e depois a votação dos distritos, Pedro Felício vencia o pleito com uma boa maioria, algo em torno de mil votos, se não me falha a memória. Para vice-prefeito, votava-se em separado, meu pai tinha quase a mesma votação que seu Pedro. Os “pessedistas” já comemoravam a eleição como certa. Diziam que aquela diferença não daria para os currais udenistas desfazerem.

Assistíamos ansiosos os resultados dos distritos e zona rural. Estávamos nas últimas urnas e a diferença cada vez mais sendo desfeita. Encerrada a apuração registrou-se a vitória do prefeito José Horácio Pequeno por uma pequena maioria, creio que 58 ou 63 votos, não lembro ao certo, só que foi por um valor muito pequeno. Eu estava presente ao encerramento daquela apuração, observando de longe a reação dos derrotados. Pedro Felício colocou o chapéu na cabeça, desceu humildemente as escadas da antiga prefeitura, onde hoje fica o museu do Crato, e se dirigiu à Rua Nelson Alencar, residência de José Horácio Pequeno.

A molecada acompanhava cantando o hino do “teimosão”. Vi quando ele entrou na casa do prefeito eleito, cumprimentou-o efusivamente, desejou os maiores êxitos para sua administração, bebeu o que lhe foi oferecido pelo anfitrião, participou da alegria dos vitoriosos por alguns minutos e, em seguida rumou para nossa casa para cumprimentar meu pai. Aquela atitude foi uma das maiores demonstração de urbanidade que eu já presenciei num homem público.

Quatro anos mais tarde, a UDN foi derrotada, e o Senhor Pedro Felício elegeu-se prefeito do Crato, na quinta tentativa.
Em 1972, candidatou-se uma segunda vez e mais foi reconduzido à prefeitura.

Por Carlos Eduardo Esmeraldo

"Minha Tartaruga" -Escultura na areia - Por Lourenzo Federico


Lourenzo tem 15 anos, reside em Floripa, e é filho da escultura e restauradora de arte sacra, Gabriella Federico.

Parabéns, menino!

Pelas fibras da alma - Emerson Monteiro

Essas tardes cinzentas que emolduram o tempo chuvoso mexem com a gente. Mexem por dentro da gente feitas brocas revirando as entranhas onde transitam escondidos pensamentos de querer ver coisas diferentes acontecerem invés de algumas outras que sacudiram os derradeiros dias, na semana anterior. Entortar os acontecimentos, eis o tal desejo principal desses bichos vivos mexendo por dentro, a querer dominar a natureza, uma espécie de coisa animada impacientando as outras coisas vivas que moram nas entranhas da pessoa. Ondas de coisas vivas invisíveis, imateriais até, digamos assim, sem ter medo de errar, são o que, por que quiséssemos dominar os momentos fugitivos, a gente, parece perseguir, como quem corre atrás de sombras, e não consegue agarrar, que vai embora na correnteza barrenta; e o velho costume de procurar fantasmas apressados nas lamas escorregadias do passado; ou mesmo estirar o pescoço, pretendendo enxergar lá adiante, depois da linha do horizonte; longe; muito longe para obter o menor sucesso. Isto é, esquecer o momento especial do presente, único ser acontecimento que, na verdade, tem valor, nos interessaria com certeza, perante todas as demais frioleiras deste mundo de passados mortos e futuros ainda de vez, na semente.
Caso haja boa vontade para concentrar esforços no presente, acham-se todos os demais fatores que empurram a manada para o curral, nas jornadas individuais ou coletivas dos rebanhos. Ninguém permanece no passado, nem pisará o futuro por conta própria antes da hora. O minuto seguinte já ficou atrás quando virou presente. Essas intenções desesperadas dos ledores da sorte habitam só as casas de jogos, nas travessas da ilusão. Quem, não fossem os filmes, garantirá, um instante depois, o placar final do jogo, deixando de lado o polvo alemão da Copa do Mundo. Quem garantirá com a absoluta segurança isso de depois?
Apertar o cinto do agora, no entanto, qualquer cidadão pode, fora de cair da cama ou botar burros na água. Reger a valsa do instante torna-se, pois, a profissão universal do senso do realismo, nas empresas produtivas.
Diga-se bem isso tudo, quando perguntarem pelo pai da criança em face das tragédias da história. Alguém houvesse de sair na dianteira e as coisas mostrariam outra cara. Pisar maneiro, ordenhar as vacas na hora certa; fechar as portas e janelas antes do pior acontecer; saber escolher as opções ideais; bater na bola da vez; substituir peças e cuidar da revisão no prazo; essas ações inevitáveis aos bons resultados servem de aviso, nos casos posteriores.
Aprender, por isso, as lições, às vezes de preços elevados, porém ainda com os pés no caminho e no tempo do presente, oferece os braços aos estudantes atenciosos. Dias melhores virão, no suor da reconstrução. E a casa pertencerá sempre aos que souberem dela utilizar as oportunidades da milenar sabedoria.

Por Norma Hauer


SÃO BRÁS
Hoje é dia de São Brás e um autor praticamente desconhecido (de nome Melo Soriano), compôs uma marcha de nome "São Brás", em 1944 e foi gravada por Carlos Galhardo,

SÃO BRÁS

São Brás,
Meu valoroso padroeiro
Terás a tua festa em fevereiro.
Verás, na devoção deste teu filho,
A mesma fé com que partilho
A maravilha do estribillho.

Oh, meu São Brás
A minha voz protejei
Com muita fé
Sempre, sempre te amei.

Misturou os pronomes "Tu" e "Vós". Mas valeu a rima.

Diz a lenda que São Brás é considerado protetor da garganta e da voz porque curou uma criança de uma doença séria na garganta.

Hervê Cordovil- Por Norma Hauer

O dia era 3 de fevereiro; o ano era 1914.
Foi nessa data que nasceu, em São Paulo, HERVÊ CORDOVIL, que viria a ser um pianista, regente e compositor que marcou sua carreira com vários sucessos.
Também musicou peças para o teatro.
Estreou no rádio, como pianista, na Rádio Sociedade do Rio de Janeiro, depois atuou na Rádio Philips.
O que importa aqui é sua carreira de compositor.
Apesar de ter composto antes com Eduardo Souto, seu primeiro sucesso tinha Bonfiglio de Oliveira como co- autor e Carlos Galhardo como intérprete: “Carolina”, gravada para o carnaval de 1934. Foi o prineiro sucesso carnavalesco de Carlos Galhardo.


"Carolina, Carolina,,,
Vai dizendo por favor
Carolina, Carolona,
Se você me tem amor..."

Nesse mesmo ano, fez uma sátira à Madame Bouvary com o amba “Madame do Barril, em co-autoria com Lamartine Babo; só podia ser. Lamartine sempre foi um “gozador”.

Durante sua vida como compositor, gravou:
Com Isaurinha Garcia ,“Pé de Manacá”:

"Lá detrás daquele morro
Tem um pé de manacá,,,
Nós vamos casar e vamos p'ra lá
"Cê qué" ??...

Com Carmélia Alves, “Sabiá lá na Gaiola” ou “Cabeça Inchada”; com Sílvio Caldas, “Seu Gaspar”; e para o filme “Alô, Alô Carnaval” compôs o samba “Não Resta a Menor Dúvida”.

Em 1977 apresentou em São Paulo um “show” com Carmélia Alves, Luiz Gonzaga e Humberto Teixeira, onde, com grande sucesso ,foram apresentadas músicas dos três compositores.

Hervê Cordovil encontrava-se afastado de seu meio, quando, no dia 16 de julho de 1979, faleceu aqui no Rio de Janeiro, aos 65 anos.

Norma

Galeria Virtual - Fotos de João Nicodemos




Ele é músico, poeta, pintor , cordelista, escultor, artesão , professor de Yoga, e fotógrafo!
Sim, já foi ator, bancário, bailarino, jornalista...
Ele é o nosso amigo !
Nunca sei ,exatamente, o seu endereço. Com certeza tem um 3 x 4 , escriturado no meu coração.

Foi o fim do mundo no Crato- Por José do Vale Pinheiro Feitosa


Assis Valente, compositor, nascido em Senhor do Bomfim, na Bahia, um dos preferidos de Carmem Miranda, participou do tema com um samba de primeira: "Anunciaram e garantiram que o mundo ia se acabar. Por causa disso a minha gente lá de cada começou a rezar. E até disseram que o sol ia nascer antes da madrugada."

Como sabemos, Senhor do Bomfim tem tudo a ver com o Crato. Eqüidistante de qualquer capital nordestina, é o Crato o epicentro da região. Especialmente no miolo da praça, pois lá fica o centro do Universo. Nada escapa, qualquer acontecimento é onisciente. Desde uma fagulha que acende o falso sinistro da mercadoria para roubar do seguro até um sobrenome mundialmente famoso que tem parentes na cidade. Por isso mesmo que é natural se dizer: "só no Crato" ou mais ainda "nem no Crato". Mas um dia aconteceu.

Foi um dia qualquer. Clima ameno, sol claro, capaz de iluminar até pensamento escondido; estudantes na escola, trabalhadores no trabalho; os do escritório e os outros do balcão; a limpeza urbana e os da saúde curando doença. Tudo normal. A vida de sempre, entre uma calçada e outra, no labirinto das ruas; respirando nas praças; o "pelo sinal" na frente das igrejas; susto dos juros alto na porta dos bancos; as sementes para o plantio, tudo andando como sempre andava.

Se tudo andava, era o mesmo de sempre, quem haveria de suspeitar que o fim estaria próximo. Ninguém, menos ainda o adolescente com tanta paixão que é capaz de morrer por ela; o velho que lamenta a vida para espantar a morte; o perdedor que denuncia a quebra das regras ou o penitente que espia com olhos nos pecados futuros.

O professor Edmilson da geografia da Universidade Regional do Cariri acabava de chegar em sala de aula, era a 14ª hora daquele dia. Em tais horas, ao sair-se de dentro do ar condicionado dos automóveis no ambiente quente, os óculos se umedecem e por isso o professor os retirou para limpar-lhes os vidros. Os alunos na modorra pós prandial, de olhos cansados, esperavam o professor concluir a tarefa. Bosquinho atendia os últimos fregueses do almoço, por trás do balcão de seu box no mercado. Muita gente estava no embalo que costuma realizar os sonhos das sestas medianas. Os cratenses, como Sodoma, viviam na paz dos seus espíritos.

Os passarinhos estavam silenciosos devido ao clima daquela hora. Nenhum urubu enfeitava a vasta toalha do céu azul. Raros carros voltavam do almoço para o trabalho e alguns alunos atrasados suavam até chegar ao templo do saber. Todo o clero realizava a sesta, os comerciantes se recostavam nos balcões com a preguiça da baixa contagem de freguesia. Os bancários fechavam os balanços das operações, os motoristas de praça até esqueceram as histórias vantajosas e sob a copa das árvores, entre cochilos e pensamentos enevoados, aguardavam uma corrida ao menos "para fazer um chá".

Quer dizer a cidade estava despreocupada. Nada poderia tirar-lhe o sossego. Apenas era um morno silêncio dorminhoco. Quem trabalhava ou realizava alguma tarefa ou eram os restos que sobraram da manhã ou o começo lento do que viria pela tarde. Era tudo tão igual que nada poderia ser acrescentado, nem a última notícia da televisão ou mesmo a abertura do Vídeo Show tinha algo que não fosse o mesmo de sempre. Apenas esta narrativa monotemática.

E aí?

Nem suspeitem. Num segundo, antes que o professor Edmilson desse o último toque no enxugar das lentes dos seus óculos, que Bosquinho ensaboasse o último prato, o padre pigarreasse o seu ronco, aconteceu.

Nossos olhos piscaram e ao final os óculos do professor Edmilson já se espatifavam na lajota da sala de aulas. Bosquinho, de olhos arregalados, se agarrando às bordas do prato feito a última materialidade da vida. O padre mais ofegante pelo chamamento de Deus que pela apnéia do sono. Gente se abrigando do perigo por toda cidade. A cachorrada vadia, feito um gás se expandia em todas as direções, em seus latidos loucos e desesperados. Jumentos murchavam as orelhas em amplo sinal do inevitável. As verdureiras do mercado viraram seus balaios, esparramando mercadoria ao redor. Reações divergentes: quem dormitava encostado nos balcões tanto se soltara dos braços que apoiavam seus queixos, tendendo a arriar a cabeça, quanto se empertigaram de tal forma em sinal de alerta, com tanto vigor, que o fruto só poderia ser um torcicolo.

A lista do mundo se acabando, ao contrário deste, continuaria por muito mais. Ninguém ficou indiferente no Crato. As rolinhas voaram do ninho, os gatos faiscaram seus olhos desde os monturos em que se escondiam. Os ratos cruzaram a praça da Sé, as pessoas que estavam na praça ou correram para qualquer rumo ou ficaram congeladas de pavor. Vicelmo que descansava na rede após o noticiário do meio dia, levantou a cabeça acima da varanda, se lamentando por não ter mais tempo para alardear aquele fim de mundo. Perdia a reportagem, mas não o vício de querer sua manchete. Literalmente o Crato se acabou. Como alguém de lá certamente diria: só outro Crato. A mais dolorosa conclusão de que nada mais tinha jeito mesmo.

Mas sobre ruínas, embaixo do sufoco dos destroços, das lágrimas das perdas, dos gritos do fim, certamente que a curiosidade da cidade jamais se apagaria. Terminada aquela cena dos dois últimos parágrafos o que se ouvia:

- Qui diacho foi isto?

- É a guerra mundial. O estouro da bomba atômica.

- Não, foi o terremoto que destruiu tudo. Estamos todos mortos, naquela fase em que os espíritos ainda não concluíram que passaram para o outro mundo.

- Qui nada isso é a Pedra da Batateira que veio abaixo. Agora vem a água inundar tudo.

- Isso é maldade dos Americanos, são eles atacando o Brasil para os russos não pegarem nós para eles.

- São os pecadores. Estes meninos fumando maconha, os pais de família indo ao cabaré, as mulheres andando com a bunda prá fora. Isso é castigo do céu.

Mais um tempo e começaram a se preocupar com os parentes e amigos. O quê acontecera com eles? Do quê teriam sido vítimas? Onde estariam?

Daí concluíram que estavam ainda vivos e que o estrondo que viera do céu não provocara nenhum estrago material. A não ser os óculos do professor Edmilson. Tudo mais estava o mesmo. Quer dizer, a exceção do cérebro fervilhando de pavor e o coração galopando de ladeira abaixo, nada com seus corpos acontecera. O epicentro do fim do mundo teria sido bem aqui, bem junto ao peito e no centro do medo em suas cabeças. Sobras do fim do mundo foram em busca dos amigos e dos pontos de encontro para entenderem o que lhes havia acontecido.

Ali pelas quatro horas, após passar na ótica e por lá se demorar entre a encomenda e a troca de experiência com os comerciantes, o professor Edmilson foi para o box do Bosquinho, pois, certamente, lá se condensariam os vapores daquele incerto acontecimento.

As teorias foram tantas que somente pela vontade de um novo Diderot, quem sabe fosse este o médico José Flávio Pinheiro Vieira, em uma nova Enciclopédia, poderia catalogar o volume imenso do conhecimento recolhido. Bosquinho vendeu muito caldo, mas quase atrapalhava o próprio negócio pois sempre esteve no centro das inúmeras rodas que se formaram. Teve explicação para cada momento, cada ato, cada um com sua sentença. Ali pelas cinco e meia da tarde, chegou a notícia que uma senhora do sítio Currais morrera do coração perante os céus em explosão.

Naquela noite os sonhos foram revolutos. As infiltrações dos pesadelos foram muitas e variadas. Crianças tiveram que ser acalentadas pelos pais. Casais dormiram agarradinhos pelo sinal do renascimento. O Crato se acabara, mas, em um segundo, renascera novamente. Todos satisfeitos por serem redivivos.

Alguns dias após, através de colchas de retalho da mídia, afinal tudo se explicara.

Quem provocara o desastre no Crato fora o Presidente Miterrand da França.

O quê?

Você tem toda a razão de estranhar.

O Concorde dele, entre Brasília e a Venezuela, rompeu a barreira do som sobre o Crato e a cidade se acabou.

Foi o fim do mundo no Crato.

José do Vale Pinheiro Feitosa

foto: Nívia Uchôa


Pensamento do dia

...Sempre senti e sentirei o amor como aquela sensação sublime que nos impulsiona a pisar nas estrelas , mesmo que os nossos pés estejam fincados na terra .

( Rosa Guerrera)



Na Batucada Da Vida
Composição: Ary Barroso / Luiz Peixoto

No dia em que eu apareci no mundo
Juntou uma porção de vagabundo da orgia
De noite teve samba e batucada
Que acabou de madrugada em grossa pancadaria
Depois do meu batismo de fumaça
Mamei um litro e meio de cachaça - bem puxados
E fui adormecer como um despacho
Deitadinha no capacho na porta dos enjeitados
Cresci olhando a vida sem malícia
Quando um cabo de polícia despertou meu coração
E como eu fui pra ele muito boa
Me soltou na rua à toa, desprezada como um cão
E hoje que eu sou mesmo da virada
E que eu não tenho nada, nada
Que por Deus fui esquecida
Irei cada vez mais me esmolambado
Seguirei sempre cantando
Na Batucada da vida

Luiz Peixoto- Por Norma Hauer


Ele nasceu no dia 2 de fevereiro de 1889 em Niterói, recebendo o nome de Luiz Carlos Peixoto de Castro. Ficou conhecido como LUIZ PEIXOTO.

Dentro da arte de seu tempo, Luiz Peixoto foi completo: caricaturista, teatrólogo, diretor de teatro, poeta, pintor, escultor, letrista de nossa música ´popular...

Como caricaturista trabalhou nos órgãos mais importantes de sua época, como “O Malho”; “Revista da Semana”, “Fon-Fon”...e mais tarde no Jornal do Brasil.

Também montou cenários no Theatro Municipal e eram suas as alegorias da avenida feitas para os desfiles carnavalescos.

Era uma personalidade eclética.

Nem todos sabem, mas todos conhecemos a valsa “Lua Branca” de Chiquinha Gonzaga, Foi exatamente Luiz Peixoto quem colocou a letra permitindo a cantores e não apenas instrumentistas executarem tão famosa composição.

Quem disse que “numa casa de caboclo, um é pouco, dois é bom, três é demais?.Foi exatamente Luiz Peixoto, pela voz de Gastão Formenti., assim como descreveu uma casa na colina e a sempre lembrada “Ai, Ioiô, eu nasci p’ra sofrer ou Linda Flor... Essa música de Henrique Vogler recebeu duas letras diferentes. Uma foi de Luiz Peixoto. A primeira gravação foi na voz de Aracy Cortes.

Com o compositor Ary Barroso, Luiz Peixoto compôs “Na Batucada da Vida”,”Por Causa desta Cabocla” e a sempre recordada “Maria, o teu nome principia nas palmas da minha mão...

Quando Carmen Miranda,depois de uma temporada nos Estados Unidos, aqui esteve em 1940, não foi bem recebida no rádio nem no Cassino da Urca porque diziam que voltara “americanizada”...

Foi então que, com Vicente Paiva, Luiz Peixoto compôs

“Disseram que eu voltei americanizada,
Com o burro do dinheiro
Que estou muito rica”...

Parece que, de fato, ela voltou “americanizada, tanto que retornou aos Estados Unidos, onde morreu em 1955.

Luiz Peixoto também fez parte do “cast” do Cassino da Urca, nos anos 30 e 40, até 1946, quando os cassinos foram fechados.

Luiz Peixoto faleceu em 14 de novembro de 1973, aos 84 anos.

Norma

Aldo Cabral - Por Norma Hauer

ELE NASCEU EM 3 DE FEVEREIRO
Foi aqui no Rio de Janeiro que veio ao mundo, no dia 3 de fevereiro de 1912, Antônio Guimarães Cabral.

E quem foi ele?
Nada mais que ALDO CABRAL, jornalista, produtor de rádio, de teatro e, principalmente, compositor
Fez dupla com Benedito Lacerda e compõs uma série de sambas, valsas, canções...
Conheceu seu primeiro sucesso com a valsa "Boneca", gravação de Sílvio Caldas.

Esta valsa teve uma história, contada por Carlos Galhardo: Aldo Cabral prometeu a Galhardo que ele a gravaria, mas Benedito a entregou a Sílvio Caldas.

Que fez Aldo Cabral ? Propôs a Ataúlfo Alves que ambos fariam uma valsa para Galhardo gravar.

Eu?, uma valsa? perguntou Ataúlfo.
- E porque não?...

Assim, ambos compuseram a valsa belíssima gravada por Carlos Galhardo na Odeon: " A Você". E fizeram sucesso.
Anos mais tarde, em um LP Galhardo gravou a valsa "Boneca".

A dupla Aldo Cabral e Benedito Lacerda conheceu vários sucessos, como "Amigo Leal" e sua resposta "Amigo Infiel"; "Espelho do Destino"; "Voz do Dever" (todos gravados por Orlando Silva); Chico Alves gravou da dupla "Carnaval de Minha Vida, a música para a quarta feira de cinzas:
.
"Quarta feira de cinzas amanhece,
Na cidade há um silêncio que parece,
Que o próprio mundo se desmoronou
É a máscara que a vida jogou fora,
mostrando que a alegria foi-se embora
No som do carnaval que já passou..."

O maior sucesso de Isaurinha Garcia foi da autoria de Aldo Cabral e Cícero Nunes:
"Mensagem"
"Quando o carteiro chegou
E meu nome chamou,
Com uma carta na mão"...

Muito mais Aldo Cabral compôs e quase tudo foi sucesso.

Como todos os compositores de sua época, Aldo Cabral afastou-se depois que surgiu a bossa nova. Era um ritmo diferente e não adiantava mais lutar.

Aldo Cabral faleceu em 5 de junho de 1994, aos 82 anos.

Norma

Notícias do nosso livro !

Ainda em fase de revisão, (os textos em poder de Stela) vive a continuidade do processo de edição.
Seremos quase 50 escritores.
Cada autor contribuindo com dois dos seus trabalhos autorais.
Espero bastante deste resultado. Quero compartilhar esta alegria com vocês, num futuro próximo. Aqui, no Azul Sonhado!

O Jogo - Por Rejane Gonçalves




Procura-nos a Morte quando já somos tão pouco.
Quando o que nos dá a condição, senão a possibilidade de seguir ao lado dessa gente, é apenas um corpo semelhante aos que do nosso lado passeiam. Todavia mover os pés nesse ritmo próprio do caminhar, trotar com essas criaturas de uma calçada à outra, não nos confere a imponência de um puro sangue, nem tampouco oferece à Morte a garantia de que apertará nos braços um indivíduo, ainda, senhor absoluto dos seus restos de sonhos, ânsias e quereres
A Vida matreira e ladina com suas mortes cotidianas, sutis, mas atrozes, a nos infligir, dificilmente entrega um corpo cujo espírito ainda esteja envolto na integridade de suas emoções. Ela que dispõe e impõe, olha da janela envidraçada a ridícula figura da Morte que ao se abaixar para pegar o fardo o faz sempre com a convicção de que o peso a ser suportado vai ser imenso, e ao levantar-se com um urro como que para se ajudar, acaba desequilibrando-se com a leveza da carga. Nesse momento, Vida e Morte, como duas velhas comadres que estivessem em abstinência da companhia mútua, cruzam os olhares ávidos de uma para outra calçada; e gesticulam e gritam e gemem e movem-se como se existisse uma fluidez ao abraço ou à trincheira. As duas comadres enfrentam-se.
E nós somos um leve embrulho arremessado no ar num jogo frenético, destituído do calor das torcidas e da sonoridade das multidões. Bola disforme jogada cada vez com menos precisão de Uma para a Outra, até que a Morte, a mais sensata dentre elas, lembre-se de sua tarefa milenar, bote-nos debaixo do braço e saia praguejando.


Rejane Gonçalves

A poesia de Assis Lima


Água

Beleza mesmo é o Cariri no inverno,
época das chuvas.
Há quem prefira o seco e tórrido sertão,
e nele vislumbre uma beleza austera,
simples e luminosa como a antiga paisagem da terra santa.
O deserto esteve fincado dentro de mim,
áspera miragem.

Que me cubra o nevoeiro!
Relâmpagos e trovões:
estrondem na barra do meu horizonte
dias,
noites,
néctar.

Foto: (Assis Lima, Stela Siebra, Nicodemos e Ismênia Maia)- by Rosineide Esmeraldo

Cumplicidade - Por Socorro Moreira





Desconfio que nunca virás
E se algum dia chegastes
Eu dormia...
Quem sabe na meninice angelical
quando a saudade de outra vida
em mim vivia ?
Adoro o próximo ,
como desconfio do longínquo
Mesmo assim atiro-me,
coração e alma ,
na pira do amor benvindo.

Nos pingos de uma vela
eu sorvo
o meu Eros descortinado
Imploro a compaixão de Afrodite
Pago todo o meu pecado
de amar assim ,
o inusitado !

foto: Nívia Uchôa

Corpo - Por Everardo Norões


Teu corpo
se enxuga em minha água:
calafeta,
enxágua.
Completa
o que não vem de mim.
E por ser água e calma,
sonâmbula
como a
distraída voz do lume,
lembra um vago perfume
de jasmim.



Caros,

Natural de Crato, Ceará, o economista, poeta e crítico literário Everardo Norões (1944-) é um homem do mundo: viveu na França, Argélia e Moçambique e hoje está radicado em Recife. Estreou com o volume Poemas Argelinos, de 1981. Depois, publicou Poemas (2000); Nas Entrelinhas do Mundo (2002); A Rua do Padre Inglês (2006); e Retábulo de Jerônimo Bosch (2009). Norões escreve artigos e crônicas para jornais e também se exercita na criação teatral. É co-autor das peças Auto das Portas do Céu e Nascimento da Bandeira, de Ronaldo Correia de Brito.

Everardo Norões tem também seu nome ligado ao do poeta e engenheiro pernambucano Joaquim Cardozo (1897-1978). Ele organizou a obra completa de Cardozo, que acaba de sair pela editora Nova Aguilar.

Tive o primeiro contato com a poesia de Norões no ano passado, quando a poeta baiana Ana Cecília de Sousa Bastos me recomendou a leitura de alguns textos dele disponíveis na internet. Li e fiquei vivamente impressionado. Depois, a poeta nos aproximou virtualmente e tive a oportunidade de ler, de capa a capa, os dois livros mais recentes de Norões: A Rua do Padre Inglês e Retábulo de Jerônimo Bosch. A miniantologia deste boletim reúne poemas extraídos dessas duas coletâneas.

Norões é um poeta de dicção marcante. Não é possível passar impune pelos seus livros. Ora, ele nos captura atenção e emoção com o agreste de versos desabridamente nordestinos: "E na garupa / do cavalo, a sentença das esporas. / Pendentes dos estribos, estão as horas, / relampejos de facas. E o sono da jurema" ("Tristão"). Esses versos têm a mesma pisada seca que se ouve em "Os Encourados": A tarde chega, / a luz se dispersa. / É uma luz de sede / do sol dos Inhamuns: / branca e calada".

Mas, afinado em outro diapasão, o lirismo de Everardo Norões também nos aparece cantante e melodioso, como no breve poema "Corpo" ou em "Tua Fala": "Tua fala parecia / a rede, toda bordada, /
onde a noite amanhecia". Obviamente, o ritmo aí é ainda bem nordestino, porém marcado por um recorte íntimo, que passa longe da secura dos agrestes.

Há ainda uma terceira face do poeta cratense, que é aquela bafejada pelos ventos do mundo. Entre os poemas mostrados aqui, ela se manifesta especificamente em "Café". Ali se percebe o cruzamento das experiências pessoais e leituras do poeta com a sua sensibilidade lírica. Como um Proust, ele extrai de uma xícara de café (menos do aroma que da cor) um conjunto de sensações e divagações nostálgicas. "De onde vem o grão / dessa saudade?"

Carlos Machado

Mendelssohn



Jakob Ludwig Felix Mendelssohn Bartholdy conhecido como Felix Mendelssohn (Hamburgo, 3 de fevereiro de 1809 — Lípsia, 4 de novembro de 1847) foi um compositor, pianista e maestro alemão do início do período romântico. Algumas das suas mais conhecidas obras são a suíte Sonho de uma Noite de Verão (que inclui a famosa marcha nupcial), dois concertos para piano, o concerto para violino, cerca de 100 lieder, e os oratórios São Paulo e Elijah entre outros.


* Essa música deve ter marcado o começo de muitas vidas.
Não vivi esse momento mágico, mas vivi a mágica do estar amando, e desejar que fosse pra sempre.
Acredito no amor eterno, na responsabilidade de alguns , que deixam o amor crescer, enquanto envelhecem. E nesse processo, acredito que haja o rejuvenescimento.

Lembrando Edilson Sobreira ...