por José do Vale Pinheiro Feitosa




Viva junto à alma mais próxima e compreenda que a proximidade é a medida da distância. Que a distância que os separa é este movimento maravilhoso da matéria e da energia. A maravilha é apenas esta surpresa porque esta proximidade é tão diminuta entre os dois e é a inesperada distância.

José do Vale P Feitosa



sexta-feira, 6 de junho de 2014

O Mascarado - Por Carlos Eduardo Esmeraldo

Jogador de futebol mascarado era um termo usado há mais de 50 anos, quando se desejava classificar um atleta que jogava exclusivamente por dinheiro, não por amor à camisa, como se dizia então. Além do salário recebido, tal jogador exigia um pagamento extra para entrar em campo, principalmente em jogos decisivos. Hoje esse termo está em desuso. Talvez porque num futebol em que milhões de dólares são reles quinquilharias, não ser mascarado, tornou-se uma grande exceção. Até início dos anos setenta, os clubes de futebol rejeitavam jogadores com essa fama. E não se ouvia falar que qualquer grande clube brasileiro tivesse um jogador mascarado. Quantos craques deixaram de vestir a camisa da seleção brasileira, aspiração máxima de qualquer jogador, por causa da maldita fama de mascarado! Naquela época, os jogadores eram retratos das organizações cujas cores defendiam com muito amor, suor e sangue. Passavam mais de vinte anos numa mesma equipe. Não havia este troca-troca de camisas que se vê atualmente. Quando se falava em Ademir da Guia, lembrávamos logo do Palmeiras; Pelé era a encarnação do Santos, assim como Dida e Zico, Ademir Menezes e Roberto Dinamite foram sinônimos de Flamengo e Vasco. 

O futebol do Crato de ontem também teve seus casos de jogadores mascarados. No meado dos anos sessenta, quando Anduiá ainda reinava absoluto no velho campo do Sport, surgiu um menino franzino, baixinho, de futebol muito vistoso. Imediatamente recebeu o batismo de Chico Curto. Do campo do Sport para a quadra bi-centenário foi uma ascensão rápida. Era um craque nas duas modalidades do futebol: salão e campo. Daí para nossa seleção que iria disputar o Campeonato Intermunicipal foi um piscar de olhos. Sem ele no time, as vitórias se tornariam muito mais difíceis. De repente, a fama do nosso craque ganhou as manchetes dos jornais de Fortaleza. Era a revelação do Intermunicipal. A nossa seleção estava classificada para semifinal contra a seleção de Maranguape. O jogo era no Estádio Presidente Vargas.

Conforme me contou o saudoso médico Valdir Oliveira, que presidia a delegação cratense de futebol que fora a Fortaleza, Chico Curto foi para ele motivo de grandes aborrecimentos. Por questões de custos, ele hospedou nossos atletas no Hotel Passeio, localizado à Rua Dr. João Moreira, bem defronte ao Passeio Público, conhecido ponto de encontro de prostitutas. A área, portanto, não era muito adequada para concentração de jogadores de futebol e, por isso, a vigilância deveria ser redobrada. No sábado, véspera do jogo, dirigentes do Ceará e do Fortaleza acorreram ao Hotel Passeio na busca de contratarem Chico Curto, a nossa revelação. O nosso Chico Curto se encheu de “pose” por saber que estava tão valorizado. No domingo pela manhã, o café dos atletas estava servido. Mesa farta, como nunca acontecera antes naquele hotel: mamão, melancia, laranja, cuscuz, tapioca, carne assada, leite, coalhada, bolos, sucos diversos e café. Verdadeiro banquete! Serviço cinco estrelas, longe dos padrões habituais do Hotel Passeio. Ao sentar-se à mesa, o nosso craque pediu maçã. O proprietário do hotel lhe informou que infelizmente não tinha maçã. Naquela época, até em Fortaleza era difícil encontrar maçã. Fruta que ainda não era cultivada no Brasil, vinha da Argentina, e devido às muitas restrições impostas aos produtos importados, poucas lojas de Fortaleza dispunham de maçãs à venda. Então Chico Curto se dirigiu ao Dr. Valdir e falou decidido: “Só jogo hoje se tiver maçã!” Foi um Deus nos acuda! Correria por todos os mercados de Fortaleza e nada de se encontrar uma maçã sequer. Já próximo do meio-dia, o dr. Valdir lembrou-se de que na Cooperativa dos Bancários do Crato tinha maçã, então, pensou ele, na de Fortaleza deveria ter também. Procurou um amigo bancário e junto com este foram atrás do gerente da Cooperativa para conseguir as maçãs exigidas pelo craque Chico Curto. Desejo atendido, às quatro horas da tarde em ponto, a nossa esperança entrava em campo. Tamanho sacrifício, entretanto, foi inútil. Nossa seleção foi humilhantemente eliminada. E o craque Chico Curto se arrastava em campo com o futebol do seu tamanho, provavelmente acometido de insidiosa indigestão, pois comeu maçãs até se fartar. Quanto ao meu saudoso amigo Valdir Oliveira, acredito que depois dessa experiência, não mais passou por perto de um campo de futebol.  

OBS.: Minhas homenagens ao saudoso amigo e médico Valdir Oliveira. Quanta falta faz sua alegria irradiante!

Por Carlos Eduardo Esmeraldo

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