por José do Vale Pinheiro Feitosa




Viva junto à alma mais próxima e compreenda que a proximidade é a medida da distância. Que a distância que os separa é este movimento maravilhoso da matéria e da energia. A maravilha é apenas esta surpresa porque esta proximidade é tão diminuta entre os dois e é a inesperada distância.

José do Vale P Feitosa



domingo, 4 de novembro de 2012

Fuja do Atacado e Venha para o Varejo - José do Vale Pinheiro Feitosa


Cidade Brinquedo - marcha de Silvino Neto e Sílvio Bretas - cantada por Orlando Silva

Uma longa e especial caminhada: do Bairro Jardim Botânico até a Rua Primeiro de Março no Centro da Cidade. Destino: Centro Cultural do Banco do Brasil. Isso tudo passando pelos palácios da Rua São Clemente, a claridade aguda da enseada de Botafogo e um dos mais lindos jardins botânicos do mundo: o Aterro do Flamengo.

A exposição sobre o impressionismo do CCB nos foi impossível após 13 quilômetros de jornada: fila com o mínimo de hora e meia de espera. Mas ali mesmo por volta do CCB, um quadrado envolvendo as ruas do Mercado de um extremo e dos Mercadores e Visconde de Itaboraí no outro e verticalmente as ruas do Ouvidor, Rosário e a Travessa Tocantins o Rio é continuamente o Rio. Claro com as novidades da época, mas são dezenas de bons e até sofisticados restaurantes inclusive com conjuntos de chorinho para seus frequentadores. Não sem razão terminamos numa Brasserie como foi central a cultura francesa na primeira metade do século XX aqui na cidade.

Aí o relato geográfico termina e começo outro sentimental. Relato esse vivido por quem nasceu e criou-se numa terra e depois se mudou para outra. Ou seja, grande parte da população brasileira, especialmente da minha geração. Quando chegamos à nova terra, trazemos todo aquele matulão de cores, sons, gostos e paisagens que somos nós. Chegamos com os falares, os costumes, roteiros e trilhas do viver do mundo original. De modo que tudo é novidade. O Rio de Janeiro de cada esquina era novidade, desde compreender o que fosse um condomínio para quem apenas em casa vivera até qualquer detalhe de sua arquitetura. Isso sem contar a mais bela geografia de todas as cidades do mundo.

Hoje as ruas são entes conhecidos, transitados, estacionados e usufruídos. Por uma razão especial trabalhei em toda a Rosa dos Ventos da cidade. De modo que a cidade como um todo é um planisfério igualmente transitado e equalizado na memória. Em outras palavras: poucas novidades. Mas então a beleza dialética entre o sabido e aprendendo, entre o conhecido e a novidade cessou? De certo modo aquilo que um dia foi novo, agora é cotidiano e isso reduz o sentimento que tão bem se fotografou como um flash na saída do túnel da Rua Alice e dali o Pão de Açúcar surgiu com um pedaço da Baia da Guanabara abaixo de onde me encontrava.

Naquela ocasião, é bem verdade que estimulado por uns dois copos de cerveja especialmente porque tomados numa birosca da Favela do Escondidinho com o povão mais carioca que existe, eu comemorei comigo por morar nesta cidade. A cidade que de algum modo fora a essência da realização urbana, cultural e política do país e que todos tínhamos como desejo de ida. Depois é que São Paulo tornou-se este atrativo em particular para os cearenses.

Como disse agora tudo é conhecido e aí tudo é reduzido em sentimento e emoção? Em parte para quem é muito caseiro, circula em veículos automotores, metrô ou trem é isso mesmo: um cotidiano acrescido de rotinas. Porém quem estica nos bares, planta os pés nas areias da praia, samba, ouve chorinho e frequenta praças, algo permanece de primavera. E agora sei de algo que os pensadores, poetas, pintores entre outros que foram cultivadores do bucólico nos séculos XVII e XIX em longas caminhadas rurais descobriram. Poetas como Byron, Shelley, por exemplo, ou pensadores como Kant ou Nietzsche.

Quem também descobriu foi o nosso Humberto Teixeira em conjunto com Luiz Gonzaga tal qual nos cantam na Estrada de Canindé: “vai oiando coisa a grané, coisas qui, pra mode vê, o cristão tem que andá a pé.” É isso aí: quando o físico recupera-se da preguiça do automóvel, tem força e liberdade para andar nas ruas, estradas e trilhas o novo que se esconde no velho se manifesta como não se imagina. É neste apanhar o mundo e sua vida a granel que o sentimento de pertença ao lugar retorna sem o zinabre do tempo. Andar a pé não é coisa pru matuto desentupir apenas as veias do coração. Andar nos trajetos da vida passo-a-passo é desentupir as manifestações do grande movimento do ser.

Estrada de Canindé - Luiz Gonzaga e Humberto Teixeira - cantada por Luiz Gonzaga


Mas o assunto tem mais e paro aqui, pois a postagem já está demasiada. Amanhã continuarei para quem conseguiu chegar nesta coisa a granel. 

Nenhum comentário: