por José do Vale Pinheiro Feitosa




Viva junto à alma mais próxima e compreenda que a proximidade é a medida da distância. Que a distância que os separa é este movimento maravilhoso da matéria e da energia. A maravilha é apenas esta surpresa porque esta proximidade é tão diminuta entre os dois e é a inesperada distância.

José do Vale P Feitosa



sexta-feira, 1 de junho de 2012

Com ela - José do Vale Pinheiro Feitosa

Prelúdio para Ninar Gente Grande  música de Luiz Vieira. Nascido em Caruaru  e criado pela avó em Alcântara na região metropolitana de Niterói. Luiz Vieira era politizado, participou da campanha para vice-presidência de João Goulart. Mas a sua principal característica foram músicas líricas e belas como menino de braçanã, guarânia da lua nova, estrela miúda, na asa do vento e maria filó as três últimas com João do Vale.


COM ELA


Por que dói a tua falta? As horas solitárias badaladas por tua ausência. Por que dói o vazio sem teu conteúdo? Tua fala, teu rosto e este corpo que desejo igual fosse o desejo de copular todo o universo.

Toquei tua cintura e o tato eletrizou-se como uma linha de alta tensão. Beijei teus lábios, qual sejam todos os lábios, com gosto a sugar a fonte de teus suspiros explodidos. Senti teu odor como os insetos se atraem e os cães madrugam em busca da fragrância do cio. Ouvi os ecos de tua voz como sinos a reverberar e ouvi tua voz com a suavidade de seda e algodão. Olhei teu rosto, desci pelo pescoço, explorei teus ombros, teus peitos, o umbigo nas vizinhanças do acontecer e tuas pernas e coxas próximas ao sítio no qual me fiz acontecido.

Mas dói a tua ausência como o negativo de um fotograma tão pleno de ti. E dói, sobretudo por que a soma dos cinco sentidos é a ligação de um ao outro e estes ficam maiores do que fossem isolados. Minhas imagens estão embaçadas; o canto do passarinho isola-se em minha surdez; me paladar está sem fel, sem mel, um desgosto profundo; as mãos tocam o vazio enquanto minhas narinas buscam o aroma perdido.

Nas notas de um samba canção, no bolero e o violão, na canção do rádio propaga-se a música dos amores perdidos, das ausências em dor. São mais frequentes do que os cantos do encontro. E toco a me perguntar, qual a razão de tal preferência?

É por que quando estás comigo nenhuma palavra consegue revelar o momento, e tudo que tenho por dizer apenas ao teu rosto consigo revelar. Por isso nada mais tenho a dizer aos outros, ela está aqui.         



Um comentário:

socorro moreira disse...

Um texto de intensa beleza e emoção, tal qual a dor das ausências, dos amores encontrados, e por um fio, perdidos.
A poesia visita o solitário do nosso coração.
-Ele é quase sempre solitário...
Como não se identificar com todos os pedaços feridos, inebriados, ou doidos de paixão?
Como ficar indiferente à magia que transfigura o coração da gente?
A tradução do poeta é um texto comum a muitas vidas... Mas a tradução é única, e personalíssima.
Pensei que já tivesse lido todos os poemas escritos nos pedaços de céu das minhas janelas, decorados por luas em quarto - crescente ou minguante... Mas não!
Esse poema me surpreende. Igual a todas as canções guardadas na agulha da vitrola que já completou 60 anos.
"ELA" é justamente uma saudade comum, que se torna universal depois de projetada, no pedaço de azul de cada leitor.
Lindo, mil vezes lindo meu caro escritor!