por José do Vale Pinheiro Feitosa




Viva junto à alma mais próxima e compreenda que a proximidade é a medida da distância. Que a distância que os separa é este movimento maravilhoso da matéria e da energia. A maravilha é apenas esta surpresa porque esta proximidade é tão diminuta entre os dois e é a inesperada distância.

José do Vale P Feitosa



segunda-feira, 11 de abril de 2011

WALDEREDO GONÇALVES


WALDEREDO GONÇALVES ilustrou inúmeros cordéis, revistas e jornais. Durante muito tempo, foi o único xilógrafo da região (Foto Antônio Vicelmo).

Crato (Sucursal) — O Festival Folclórico do Cariri foi aberto ontem com uma notícia triste. Morreu o Mestre da Cultura Popular, Walderedo Gonçalves, 85 anos de idade. Na abertura do Festival, os coordenadores prestaram uma homenagem a Walderedo, apontado como um dos maiores nomes da xilogravura nacional, que já fez inclusive exposições internacionais. O enterro de Walderedo será realizado hoje com a presença dos grupos folclóricos que ele retratou em xilogravuras.

Menino pobre, mas de tradicional família do Crato, parente do ex-senador e ministro do Superior Tribunal Federal (STF), Wilson Gonçalves, Walderedo Gonçalves foi um autodidata que se tornou conhecido em todo o Brasil e no exterior graças a sua arte e inteligência. Filho de um carpinteiro e uma artesã, Walderedo dizia que nunca teve infância. Trabalhou desde menino, ajudando o pai e a mãe. Na escola, foi discriminado e expulso porque desenhou uma mulher nua. Saiu da escola para vender jogo do bicho, uma atividade clandestina. Mesmo assim, não perdeu o gosto pelos estudos. Revoltado com a expulsão, Walderedo estudou sem ajuda de professores. Leu os clássicos da literatura portuguesa. Seu sonho era ser inventor. Mas faltaram recursos, conforme lamentava.

Trabalhou como “guarda da peste”, quando teve oportunidade de percorrer “meio mundo” nos Estados do Ceará e Piauí. Walderedo lembra que, enquanto trabalhava, lia romances e cordéis. Tinha uma coleção de cordéis que ele costumava ler para os “matutos de Interior” que, segundo afirmava, gostavam muito desse tipo de literatura. Com isso, ele conseguiu hospedagem grátis.

O casamento com 20 anos de idade o obrigou a trabalhar numa tipografia. Uma de suas especialidades era fazer xilogravura em madeira para os jornais, em substituição aos clichês de zinco. Durante muito tempo foi o único xilógrafo da região. Ilustrou inúmeros cordéis, revistas e jornais . A arte, entretanto, o levou a prisão, sob suspeita de ter colaborado, com sua habilidade, para uma ação ilícita. Em entrevista ao professor Jurandy Timóteo Walderedo disse, com mágoa, que foi seqüestrado pela Polícia Federal.

“Foi uma vida marcada por sofrimento e alegrias”, disse Walderedo, acrescentando que o seu valor artística só foi reconhecido depois de velho, quando o governo do Estado, através da Secretaria de Cultura, o indicou como Mestre da Cultura Popular. O jornalista Huberto Cabral lembra que Walderedo não aceitou um convite feito pelo ex-reitor Antônio Martins Filho para participação de uma exposição de xilogravuras na França.

Irreverente, boêmio mas, sobretudo, inteligente, ele era também um abridor de cofres de segurança. Certa vez, foi convidado para abrir um cofre de um rico comerciante de Juazeiro. Abriu o cofre em menos de um minuto. Ao cobrar uma determinada quantia, o comerciante achou que era uma exploração para um trabalho tão rápido. Walderedo não mediu conversa, fechou o cofre e voltou para o Crato, sem ensinar o segredo. O proprietário teve que arrombar o cofre.

Na entrevista a Jurandy Timóteo, Walderedo confessou que sua história de vida é de um homem comum. “Eu vivo por viver. Pra mim, tanto faz viver como morrer, tudo é a mesma coisa. Já vivi muito e já fiz de tudo”, disse resignado.

"Diário do Nordeste", 17-8-2005 - http://diariodonordeste.globo.com/

*Figura da nossa cultura, lembrada pelo escritor Everardo Norões.

Um comentário:

Ulisses Germano disse...

A história da xilogravura do nordeste brasileiro passa por Walderedo Gonçalves. A memória curta e tacanha não consegue alcançar a grandeza da beleza de sua forma íntima de xilogravar. Repito para os desavisados: "A história da xilogravura Nordestina passa inevitavelmente por Walderedo Gonçalves". Não aceita? Pergunte para o Stênio de Diniz, ou mesmo para os xilogravuristas como Carlos Henrique ou Maecio! Eles são sabedores da escola formadora da xilo em nossa região: -Dê-me uma caixa de fósforo e alguns palitos, e eu abrirei as portas e os cofres do paraíso!

Ulisses Germano