por José do Vale Pinheiro Feitosa




Viva junto à alma mais próxima e compreenda que a proximidade é a medida da distância. Que a distância que os separa é este movimento maravilhoso da matéria e da energia. A maravilha é apenas esta surpresa porque esta proximidade é tão diminuta entre os dois e é a inesperada distância.

José do Vale P Feitosa



sexta-feira, 25 de fevereiro de 2011

Eu te amo meu Brasil - José do Vale Pinheiro Feitosa

Quem se espantará com alguém que diz amar. Principalmente se este amor é seu país e sua gente. É um amor lícito, sublime, pois amor à natureza deste território e à cultura que traduz gente. Pois foi isso que o compositor Dom da dupla Dom e Ravel fez com a música “Eu te amo meu Brasil” e divulgada pelos Incríveis.

A questão não era que a ditadura tivesse o direito de fazer a sua propaganda, pois ela não se importaria com algo em assunto de direito. A questão é que ela não amava os brasileiros, pelo menos na construção do seu marketing interno: o Brasil Ame-o ou Deixe-o, era uma verdadeira expulsão de brasileiros. E como deixar de ser brasileiro uma vez o sendo?

E os Incríveis cantaram quando seus colegas eram literalmente expulsos pelos militares do país: Caetano Veloso, Gilberto Gil, Chico Buarque etc. Eles podem cantar aquela música pensando em ser igual ao Brasil, meu Brasil brasileiro, meu mulato inzoneiro, mas tomaram o partido de uma ditadura.

A música começa com uma ordem unida: Escola...Marche...E aí toque praias ensolaradas, a mão de Deus abençoando, a mulher com mais amor, o céu com mais estrela e o sol com mais esplendor. E diz que vai plantar amor, buscam os chavões das mulatas e as tardes mais douradas. Dom, Ravel e os incríveis “Incríveis” eram o motor, acho que oportunistas, para alienar a juventude do Brasil.

Para baixar um manto sobre a censura e a expulsão de brasileiros. Era uma estratégia para esconder as práticas e a ética do regime militar. Um regime tão picareta que se aproveitava da rebeldia de alguns jovens de classe média que resistia a ela, como se ali fosse um dia de juízo final.

Caetano Veloso em recente entrevista a Geneton Moraes Neto sobre aqueles anos lembra um episódio que bem traduz o jogo duro tentando se esconder atrás de um marketing ameno. Estava exilado e a irmã Betânia negocia seu retorno para apenas uma visita aos pais que comemoravam importante data. Caetano chega com a ex-mulher Dedé e ao descer no Galeão é imediatamente recolhido num carro, sem ao menos justificarem nada para os companheiros de viagem.

É levado para um prédio no centro da cidade do Rio e lá submetido a enorme pressão. Queriam que declarasse coisas a favor do regime. Que ele estava fora do país por vontade própria, quando isso não era verdade. Queria o mais incrível, que ele compusesse uma música para servir de marketing ao regime. Ele se recusou, mas teve que aceitar fazer dois shows na televisão globo para demonstrar que o regime não tinha nada com ele.

Impuseram-lhe estes dois programas e a rede globo estava a serviço da estratégia. Acontece que naqueles anos Caetano escrevia no jornal O Pasquim e todo mundo sabia por que estava fora do Brasil. E quanto ao Dom e Ravel?

Eram de Itaiçaba no Ceará. Irmãos migrantes ainda jovens para São Paulo. Um deles tinha talento musical e o professor lhe apelidou de Ravel, o Dom veio depois. Em 1969 gravaram o primeiro LP, intitulado Terra Boa, no qual havia a música “Você também é responsável”. O Coronel Jarbas Passarinho, ministro da Educação do Presidente Médici, a tornou o hino do MOBRAL (movimento de alfabetização de adultos). O sucesso do Eu te amo meu Brasil, foi tal para quadros do regime que o governador paulista Abreu Sodré teria sugerido ao presidente Médici transformá-lo em hino nacional.

A dupla virou, para sempre, símbolo da bajulação da direita e do regime. Mas foi quando em 1973, revelando a trajetória de sua família pobre gravaram a música “Animais Irracionais” denunciando as injustiças sociais. Era o fim do Milagre Econômico e eles eram povo. A direita não gostou e os dois sentiram na pele aquilo que o ufanismo daquela Eu te amo, tentava esconder na pele dos outros.

Um comentário:

socorro moreira disse...

Você nos faz entrar em contato com a nossa história.
O relato foi novidade.
Eu nunca fui patricinha , mas era protegida do sombrio .Ficava o luminoso do "eu te amno"!
Algo se inquietava na minha alma.
Hoje consigo o entendimento.
Incrível como a arte veicula propostas de submissão e reacionalismo.
Incrível como a arte é prolífera!
Incrível como este escritor é sensível !

Abraços.