por José do Vale Pinheiro Feitosa




Viva junto à alma mais próxima e compreenda que a proximidade é a medida da distância. Que a distância que os separa é este movimento maravilhoso da matéria e da energia. A maravilha é apenas esta surpresa porque esta proximidade é tão diminuta entre os dois e é a inesperada distância.

José do Vale P Feitosa



quarta-feira, 9 de janeiro de 2013

"Tição" - José Nilton Mariano Saraiva

Definitivamente, é a inadmissível frouxidão da Justiça que contribui para que a desfaçatez e a cara de pau imperem na arena política brasileira, desde tempos imemoriais. Se não testemunhássemos a impunidade latente há séculos, se os maus feitos fossem punidos célere e exemplarmente, e se a cadeia fosse uma realidade e o destino compulsório para os que transgridem a lei, certamente que as coisas seriam bem diferentes por essas bandas.
Mas, o “lero” é o seguinte: como sabemos, dentre as 184 prefeituras do Ceará, a do Crato é uma das que consta de um relatório onde estão reunidas as 39 em que o Tribunal de Contas dos Municípios constatou a existência de IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA e, ainda, foi enquadrada entre as 14 em que deverá ser realizada uma TOMADA DE CONTAS ESPECIAL” (processo no qual a administração pública exige a restituição de recursos ao patrimônio público ou que os envolvidos apresentem sua defesa), em razão do desvio de significativas verbas públicas em atividades outras, não identificadas pelos auditores daquele egrégio colegiado. Segundo afirmação do promotor Eloilson Landim, do Ministério Público Estadual... “Há improbidade administrativa e crime em todos os 39 (municípios) e acho que em todos a Tomada de Contas Especial vai ser determinada” (jornal O POVO).
Portanto, o novo gestor da cidade, que certamente já ouvira falar, mas que oficialmente tomou conhecimento do fato depois de eleito, tinha como prioritária providência, após tomar posse, imediatamente contratar uma auditoria independente a fim de constatar (ou reafirmar) o óbvio ululante (aquilo que o próprio TCM já anunciara); portanto, pisou feio na bola não o fazendo e, só agora, candidamente, vem a público afirmar que...  "Encontramos uma prefeitura sem estrutura nenhuma. Uma prefeitura que não pode ainda atender às demandas da população. Fechamos, sim, para balanço” (novo prefeito de Crato, Ronaldo Gomes de Matos, do PMDB, segundo o jornal O POVO).
Pois não é que, apesar de acusado pelo TCM, das evidências palpáveis de irregularidades cabeludas encontradas na contabilidade da prefeitura e de sequer ter comparecido à solenidade de transmissão do cargo (saiu pelas portas dos fundos, talvez com receio de ser vaiado pela população) ao ser questionado pela imprensa o ex-prefeito da cidade literalmente sugeriu que os auditores do Tribunal de Contas dos Municípios são uns incompetentes, já que... "Deixei um governo limpo, que inclusive passou pela fiscalização do Tribunal de Contas da União" (Samuel Araripe, ex-prefeito de Crato, segundo ainda o jornal O POVO). É ou não muita desfaçatez ???
No mais, o ex-mandatário deve ter decepcionado certos áulicos, capazes não só de por a mão no fogo por Sua Excelência, mas, ainda, de partirem até para o confronto físico se alguém ousasse criticar sua administração; a esta hora devem andar à procura de atendimento urgente em algum hospital de alta complexidade, especializado em queimaduras graves; as mãos devem ter virado um “tição” só.  
Agora, é de se estranhar – e muito – e bem que o novo mandatário poderia oferecer uma explicação convincente aos seus munícipes, do “porque” de manter na principal secretaria do organograma da prefeitura, naquela por onde teoricamente passa todos os grandes projetos e as polpudas dotações respectivas (a de Infra-estrutura) o mesmo secretário que dava as cartas na administração passada (um parente do atual prefeito, segundo informações).
Como justificar isso ???

terça-feira, 8 de janeiro de 2013


Falando sozinha- por socorro moreira


Domingo não é fantástico. Um cansaço crônico lembra-nos cuidados. Os sinos badalam. Esqueço os chamados. Ligo pra todos os santos e eles silenciam. Alguns anjos de plantão respondem e se aproximam. Tocam harpa, quando desejo um violão vadio. Corrijo a ansiedade na ponta do lápis. Apago falas ditas por impulso, mas elas gritam irritadas, que estraguei tudo.
Os astros enlouquecem com meus dados. O I Ching insiste numa mesma resposta: insensatez juvenil. O Taro é brabo: não responde, e ponto!
Se a felicidade chegar pela porta da rua, expresso sorrindo: não saia de mim!

flashes de uma vida- por socorro moreira


Dona Júlia gritou da calçada:
Comadre Cida, Bianca quebrou a boneca de Sofia.
Choros, castigo, confinamento na nesga da casa( lugar dos morcegos, culpas e medos).
Começou a chuva e o chiado do rádio. Seu Tonho acompanha a voz de Orlando Silva, no banho de cuia.
- “... Foi a Camélia que caiu do jarro/ Deu dois suspiros, e depois morreu...”
Zoada do cepo. Carne batida com jerimum verde, arroz com piqui é o prato do dia. Comer pegando fogo, e rapar o pegado da panela, o doce do tacho.
Ranger do armador. Balanço pra quebrar clavícula.
Gata pariu seis gatos. Modesta ninhada! Eles são pardos com olhos cor de jabuticaba, céu e mar..Haja miado, e leite derramado.Em pouco tempo estarão quebrando telhados..Haja goteira nos dias de chuva.Bacias de alumínio amparando as águas.
De noitinha, sentada na calçada, Donana conta histórias pros meninos comportados. Poliana criança- Jogo do feliz!
É proibido ficar triste?
Chorar faz parte da alma. Depois vem o sono reparando estragos. Depois vem o sol clareando o dia... E assim a vida passa como o leiteiro, padeiro, lenhador, e o menino do pirulito. Passa também a velha das macaúbas (matéria prima do nosso jogo de xibio).
-Batente das casas e calçada – animada Rua da Pedra Lavrada!
No fim do quintal portal para o Rio Granjeiro. Barcos de papel buscando um destino. Desmancham-se. Viram argamassas- papel machê dos sonhos infantis.
Acordou dez anos depois, nos braços de Deodato. Bolsa vazia. Tédio da vida enganada.
Um moleque chuta nas paredes do ventre. Três meses depois, ele nasce. Moreno bonito, cor da canela do mingau de milho. Noites insones. Cega e muda, ela dança um samba. Ajoelhou e rezou.
Pra sustentar desatinos, tempos árduos. Comprar chinela de borracha pro menino que tem gilete nos  pés.
 Bola no campo. Cuca bolada. Virou homem, e casou com a loura dos seus sonhos.
Cá e lá, encontros em torno de uma mesa pequena com panelas grandes.
_Tremedeira atrapalha o traço do lápis que nos deixa feliz?
-Alô, alô Dr. Fábio. Avie nossa  receita, Queremos escrever no teclado.

segunda-feira, 7 de janeiro de 2013

"...das Chagas" - José Nilton Mariano Saraiva

Em 12 de abril de 1961, uma frase – “A Terra é azul” - assombrou o mundo, já que proferida do espaço sideral pelo cosmonauta russo Iuri Alekseievitch Gagarin, naquele momento passageiro solitário da nave Vostok 1, que orbitou o planeta Terra por 108 minutos. O "mignon" Gagarin, com 1,57m de altura e 69 kg, foi o primeiro e privilegiado homem a observar de uma ótica privilegiada o nosso planeta, a 315 km de altura e, naturalmente, mostrou-se extasiado com aquela visão maravilhosa.
Mas, principiando: entre meados da década de 50 e o decorrer da década de 60, quando o comunismo era “comunismo-puro” e não o “comunismo-capitalista” dos dias atuais, URSS e EUA, seus dois principais representantes, quase que iniciaram um confronto nuclear, objetivando mostrar ao mundo quem era quem e, consequentemente, qual dos regimes era mais forte. Foi a chamada “guerra fria”, já que movida pela ameaça nuclear iminente.
A coisa era tão acirrada que a discussão acabou indo literalmente parar no espaço. É que a corrida/exploração espacial dava seus primeiros passos, com russos e americanos querendo mostrar ao mundo quem era detentor da mais avançada tecnologia, capaz até de colocar um homem para orbitar a Terra e/ou até explorar outros planetas. Daí a importância do voo histórico de Gagarin.
No entanto, ao contrário do que se imaginava (que a auto-estima dos gringos fosse lá pra baixo) o fato de a URSS partir momentaneamente à frente serviu foi de estímulo para que os americanos caprichassem ainda mais no uso de sofisticada tecnologia, até porque, como dito antes, se achava em jogo a própria questão ideológica: comunismo ou o capitalismo.
E foi de olho nessa dualidade – avanço tecnológico-ideologia política - que o então jovem presidente americano, John Kennedy, numa reunião conjunta do Congresso, em 25 de maio de 1961, lançou o desafio de, antes de a década terminar, "enviar homens à Lua e retorná-los a salvo"; ano seguinte, em discurso na Universidade Rice, garantiu:  "Nós decidimos ir a Lua. Nós decidimos ir a Lua nesta década e fazer as outras coisas, não porque elas são fáceis, mas porque elas são difíceis".
Finalmente, em 20 de julho de 1969 (sem que o presidente Kennedy pudesse participar da festa, já que assassinado em Dallas, em 1963), o americano Neil Alden Armstrong entrou para a história ao ser o primeiro homem a pisar no solo então virgem da Lua.
De volta, Armstrong recebeu muitas e muitas homenagens no mundo todo (assim como em seu tempo Iuri Gagarin houvera recebido), inclusive aqui em Fortaleza, no nosso Ceará, quando um pai batizou o primogênito de Iuri Armstrong.
Pena que, na complementaridade da junção dos dois nomes famosos o sobrenome não ajudasse nem um pouco: Iuri Armstrong... das Chagas.
Nossos dois heróis não mereciam isso. Definitivamente.

Foto de Nívia Uchôa

Poesia que prescinde da palavra.

Dia de Reis na Praça da Sé

Foto de Samuel Gragório

foto by Samuk

Foto by Divani Cabral

domingo, 6 de janeiro de 2013

Encanto do Conto- pesquisador: João Nicodemos


Encanto do Conto


CONCEITOS DE ESCRITORES SOBRE O CONTO
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Estudos Literários
Edgar Allan Poe (1809 – 1849), o primeiro teórico do gênero:
“Temos necessidade de uma literatura curta, concentrada, penetrante, concisa, ao invés de extensa, verbosa, pormenorizada... É um sinal dos tempos... A indicação de uma época na qual o homem é forçado a escolher o curto, o condensado, o resumido, em lugar do volumoso”.
Mário de Andrade (1893-1945), em Contos e Contistas (1938):
 “[...] em verdade, sempre será conto aquilo que seu autor batizou com o nome de conto...".
Alfredo Bosi, História Concisa da Literatura Brasileira:
"O conto cumpre a seu modo o destino da ficção contemporânea. Posto entre as exigências da narração realista, os apelos da fantasia e as seduções do jogo verbal, ele tem assumido formas de surpreendente variedade. Ora é quase-documento folclórico, ora quase-crônica da vida urbana, ora quase-drama do cotidiano burguês, ora quase-poema do imaginário às voltas, ora, enfim, grafia brilhante e preciosa voltada às festas da linguagem."
Em seu livro O Conto Brasileiro Contemporâneo sobre o caráter múltiplo do conto:
"[...] já desnorteou mais de um teórico da literatura ansioso por encaixar a forma- no interior de um quadro fixo de gênero. Na verdade, se comparada à novela e ao romance, a narrativa curta condensa e potencia no seu espaço todas as possibilidades da ficção."
Afrânio Coutinho:
"O contista oferece uma amostra através de um episódio, um flagrante, ou um instantâneo, um momento singular e representativo."
Massaud Moisés, O Conto; em A Criação Literária:
"[...] o conto vem sendo praticado por uma legião cada vez maior de ficcionistas, que nele encontram a forma adequada para exprimir a rapidez com que tudo se altera no mundo moderno."
"[...] o conto é, do prisma de sua história e de sua essência, a matriz da novela e do romance, mais isso não significa que deva poder, necessariamente, transformar-se neles. Como a novela e o romance, é irreversível: jamais deixa de ser conto a narrativa como tal se engendra, e a ele não pode ser reduzido nenhum romance ou novela."
Moacyr Scliar (1937), um dos escritores mais representativos da literatura brasileira contemporânea, numa entrevista concedida ao jornal Folha de São Paulo, em quatro de fevereiro de 1996:
“Eu valorizo mais o conto como forma literária. Em termos de criação, o conto exige muito mais do que o romance... Eu me lembro de vários romances em que pulei pedaços, trechos muito chatos. Já o conto não tem meio termo, ou é bom ou é ruim. É um desafio fantástico. As limitações do conto estão associadas ao fato de ser um gênero curto, que as pessoas ligam a uma idéia de facilidade; é por isso que todo escritor começa contista”.

Tempos paralelos- por Socorro Moreira





Sarita adormeceu com quatro anos de idade. Leite na patinha, cortinado na cama Gerdau, lençol de algodão azulado, cheirando às águas das levadas.
Acordou com a caixa de diazepan faltando uma drágea. Estava zonza, desorientada. Foi até o espelho e viu um rosto de mulher envelhecido, marcado por expressões de dor e conformismo. Seus cachos ficaram lisos, e a pele sem viço. Deveria ter quase um século, pelo visto.
Procurou sinais de uma vida: um álbum de fotografia, um diário, uma agenda de aniversários. E foi retirando das cotoneiras rostos desconhecidos: mulher nova, gata pintada, bonitinha adolescente, tímida menininha. Cadê a foto do baile das debutantes? Do casamento cristão, formatura, batizado do último varão?
Não tinha! Era sozinha.
Onde foram parar os registros dos seus anos?
Olhou a cama de casal vazia. Nenhuma peça masculina cobrando a presença do dono. Onde ele se escondeu, onde estaria?
Na gaveta do armário, brincos descasados, maquiagem vencida, perfume adocicado, nauseante.
Descobriu na  varanda do quarto uma estrela cadente, uma lua sorridente tirando sarro da sua cara.

- Teu sol só chegará na eternidade, sabia?

Amanhã vai colocar cheiro de tinta fresca na casa. Casa com odores de tempos passados.
 Enquanto pensava, vestiu saia, calçou sandália rasteira, com destino ao beco de Pe.Lauro.
 O beco dos doces sapotis, e suspiros de namorados. O beco com nódoas de amoníaco, e fezes de gatos.
As luzes piscavam de todas as praças. Procurou um banco, uma música, um rosto conhecido... Quem sabe o dono do chapéu pendurado no armador da sala, ou do relógio de algibeira, esquecido na penteadeira do quarto?
Fez o pelo sinal na porta da Sé, e deixou esmola pras almas. Voltou pro seu canto, sem contos de reis.
Vai acordar todos os dias lembrando ou esquecida das vidas passadas, entrelaçadas com aquelas do porvir.
Voltou,entrou, fechou a porta de casa, e abriu a porta do sonho.
 Estava lá o engraçado, que lhe assusta com poesias. Nunca lhe promete anel de noivado, nem bodas na eternidade...Que ironia!
Quem é esse moço que Orfeu escolheu para sua companhia?
-Ele é presente de papel passado. Futuro amante. Amigo de verdade ou da verdade?
Nas paralelas tudo acaba unificado, e sem carne.