por José do Vale Pinheiro Feitosa




Viva junto à alma mais próxima e compreenda que a proximidade é a medida da distância. Que a distância que os separa é este movimento maravilhoso da matéria e da energia. A maravilha é apenas esta surpresa porque esta proximidade é tão diminuta entre os dois e é a inesperada distância.

José do Vale P Feitosa



domingo, 1 de abril de 2012

Não existe hiato entre o nosso tempo e espaço - José do Vale Pinheiro Feitosa

Velha amiga eu volto à nossa casa – A nossa casa. A casa onde fui gerado e entre suas paredes interiores experimentei a vida por mim: respirei, vi e ouvi pela primeira vez. E nela posso voltar. Ainda está lá, mais do que secular, muito mais do que minha história no lado de cá.

Já não te encontro alegre, quase humana, Corpo pintado de branco e marrom E uma tristeza no olhar Como se conhecesse dor milenar – Para olhar o canavial da janela da frente, correndo na bagaceira indo brincar no engenho, faminto enquanto as vacas na cocheira abocanham aquela mistura de água, resíduo de algodão e palha de cana cortada. Abocanhadas tão molhadas e ávidas que sinto vontade de também dividir a cachoeira com elas.

Já não te encontro à espera ao pé da porta, Correndo viva e bela ou descansando, Tanto vazio por todo lugar, Tanto silêncio sinto ao chegar, Ao nosso território de brincar – As noitadas de esconde-esconde na suficiência misteriosa da lua cheia. Os corpos suados de tanto correr e o cheiro de terra no cabelo longo das meninas. Apartar-se, apertar-se, esconder-se como se ambos fôssemos ao mesmo tempo corpos resguardados, mas prestes a serem descobertos.

Almoço aos domingos, a velha farra, Todos vão inventando novos segredos, Fica a ausência branca e marrom, E uma tristeza milenar – O rádio participava dos almoços de domingo, mas se juntava, não tomava a cabeceira controlando todos e a todos dividindo como os computadores e as televisões. O rádio naquela melodia entre melancólica e exaltante, da trilha sonora de Moulin Rouge (o antigo filme dos anos 50). A voz ainda mais melancólica de Padre Gonçalo a falar dos filmes que se destacavam. Um contraponto à severidade medieval e a modernidade do cinema.

Mas os meninos voltaram a brincar, Como se ainda sentissem o teu olhar – E aquela casa secular, dos sentimentos milenares, ainda hoje respira vida humana. Uma prima respira, vê e ouve seus ruídos. As filhas da prima já geram outras vidas e a casa se perpetua. E a casa é secular e sujeita ao tempo e ao uso que dela se extraia, do mesmo modo que o nosso planeta. Milenar, gerador de fatos, mas sofrendo as feridas dos pregos em suas paredes, das lascas do seu piso solto e das telhas quebradas de sua cobertura.

Um comentário:

socorro moreira disse...

Diana...Lembro de uma menininha loirinha, chamada Diana.
Texto lindo, José do Vale!