por José do Vale Pinheiro Feitosa




Viva junto à alma mais próxima e compreenda que a proximidade é a medida da distância. Que a distância que os separa é este movimento maravilhoso da matéria e da energia. A maravilha é apenas esta surpresa porque esta proximidade é tão diminuta entre os dois e é a inesperada distância.

José do Vale P Feitosa



sábado, 12 de março de 2011

Monólogo- Novalis



O que se passa com o falar e o escrever é propriamente uma coisa maluca; o verdadeiro diálogo é um mero jogo de palavras. Só é de admirar o ridículo erro: que as pessoas julguem falar em intenção das coisas. Exatamente o específico da linguagem, que ela se aflige apenas consigo mesma, ninguém sabe. Por isso ela é um mistério tão prodigioso e fecundo - de que quando alguém fala apenas por falar pronuncia exatamente as verdades mais esplêndidas, mais originais. Mas se quiser falar de algo determinado, a linguagem caprichosa o faz dizer o que há de mais ridículo e arrevesado. Daí nasce também o ódio que tem tanta gente séria contra a linguagem. Notam sua petulância, mas não notam que o desprezível tagarelar é o lado infinitamente sério da linguagem. Se apenas se pudesse tornar compreensível às pessoas que com a linguagem se dá o mesmo que com as fórmulas matemáticas - Elas constituem um mundo por si - Jogam apenas consigo mesmas, nada exprimem a não ser sua prodigiosa natureza, e justamente por isso são tão expressivas - justamente por isso espelha-se nelas o estranho jogo de proporções das coisas. Somente por sua liberdade são membros da natureza e somente em seus livres movimentos a alma cósmica se exterioriza e faz delas um delicado metro e compêndio das coisas. Assim também com a linguagem - quem tem fino tato para seu dedilhado, sua cadência, seu espírito musical, quem percebe em si mesmo o delicado atuar de sua natureza interna, e move de acordo com ela sua língua ou sua mão, esse será o profeta; em contrapartida, quem sabe bem disso, mas não tem ouvido ou sentido bastante para ela, escreverá verdades como estas, mas será feito de palhaço pela própria linguagem e escarnecido pelos homens, como Cassandra pelos troianos. Se com isso acredito ter indicado com a máxima clareza a essência a função da poesia, sei no entanto que nenhum ser humano é capaz de entendê-lo e disse algo totalmente palerma, porque quis dizê-lo, e assim nenhuma poesia resulta. Mas, e se eu fosse obrigado a falar? e se esse impulso a falar fosse o sinal da instigação da linguagem em mim? e minha vontade só quisesse tudo a que eu fosse obrigado, então isso, no fim, sem meu querer e crer, poderia sim ser poesia e tornar inteligível um mistério da linguagem? e então seria eu um escritor por vocação, pois um escritor é bem, somente, um arrebatado da linguagem? -

Tradução de Rubens Rodrigues Torres Filho.
Novalis. Pólen; Fragmentos; Diálogos; Monólogo.
São Paulo, Iluminuras, 1988, pp. 195-196


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