por José do Vale Pinheiro Feitosa




Viva junto à alma mais próxima e compreenda que a proximidade é a medida da distância. Que a distância que os separa é este movimento maravilhoso da matéria e da energia. A maravilha é apenas esta surpresa porque esta proximidade é tão diminuta entre os dois e é a inesperada distância.

José do Vale P Feitosa



quarta-feira, 20 de agosto de 2014

Capitão do Mato Virtual


                                                                                                                             J. Flávio Vieira

                                               Em meio ao denso nevoeiro dos trágicos acontecimentos destes últimos dias, fica sempre difícil se perceber bem os detalhes das múltiplas imagens e situações que se vão projetando , quase que estroboscopicamente, à nossa frente.  Em meio à maratona eleitoral, então, quando os ânimos naturalmente se acirram de lado a lado, a visibilidade se torna bem mais prejudicada. A perda repentina de Eduardo Campos, numa dessas catástrofes típicas dos nossos sangrentos agostos, abate-se sobre o país com estardalhaço. Desaparece uma das mais promissoras carreiras políticas do Brasil, em tempos de escassez de novas lideranças, de novos discursos. Eduardo encarnava o novo, percebia, claramente, que dificilmente este ano seria o seu, mas plantava sementes para  colher um pouco mais adiante. O Nordeste viu-se tolhido duplamente : Eduardo conhecia de perto nossas vicissitudes e agruras. O Cariri, então, viu-se ferido triplamente :  saiu de cena  um grande político brasileiro e nordestino, com profundas raízes fincadas no Sul Cearense.
                                   Como sempre, em meio à tragédia que se arrastou por toda semana, a comoção tomou de conta do país. O brasileiro tem  em si este estado de comiseração epidêmico. É do nosso feitio absorvermos , rapidamente , as tragédias nacionais, trazendo-as para dentro da nossa casa. Foi assim com Tancredo, com Getúlio, com Ayrton Senna. A Mídia, por sua vez, de olho na audiência, nem sequer consegue maquiar o prazer quase sádico em veicular, reiteradamente, as notícias mais tenebrosas. Sempre vesga, com um olho no gato e outro no peixe, faz ampla e interminável cobertura dos fatos, sem tirar o foco, porém, no outro lado da moeda : quem vai se beneficiar, politicamente, do inesperado acidente. Aí, claro, sempre puxa a brasa para sua tilápia: o poder econômico que lhe dá sustentação e, esse se associa, explicavelmente,  ao que há de pior e mais retrógrado na política brasileira ( a Direitona que há cinco séculos mama nas tetas públicas e esperneia quando alguma gotinha escapa por acaso e cai na boca do povão). A dor incomensurável da família ninguém respeita, fica sempre em segundo plano, vale o espetáculo midiático. A comoção do povo , às vezes multiplicada, esta é sempre verdadeira, mas serve-se como recheio de notícias, como pano de fundo ao que interessa, como catapulta a futuras  intenções  de votos.
                                   Há um outro lado, mais perverso e sádico que costuma acompanhar nossas grandes tragédias. Depois de alguns dias, quase que fincando um marco do fim do luto, começam a aparecer as famosas piadas de humor negro. Os psicanalistas talvez tenham uma resposta melhor para esta prática. Possivelmente, depois de um período de tristeza coletiva, o humor venha, por fim, fazer com que as coisas voltem ao normal, que o riso possa novamente aflorar nos lábios, que as catástrofes possam ser engolidas como um mero tropeço no trajeto  da humanidade.
                                    Este ano, no entanto, por conta do acirramento da campanha , no entanto, piadinhas de mal gosto, carregadas do mais negro  e despropositado humor, começaram a pulular, nas Redes Sociais quase que imediatamente.  Elas faziam um contraponto importante à consternação generalizada por que foi tomado o país. E, aí, surge uma pergunta inevitável ? Quais são os limites do Humor ? Tem-se o direito de brincar e fazer chacota com a dor alheia, sem respeitar o luto das famílias? Podemos fazer piadas sexistas, homofóbicas, racistas ? Não estaríamos, com isso,  desrespeitando pessoas ou alimentando chagas e preconceitos que a modernidade busca firmemente combater? Além de tudo, uma coisa é contar uma anedota numa mesa de bar e outra é divulga-la nas Redes Sociais, ao alcance de um número infindável de internautas.
Todos sabem que gosto de escrever textos de humor. Acredito, no entanto, que devem existir critérios éticos . Sei que nado contra a corrente e que os comediantes da atualidade têm a forte convicção que não há limites para a comédia. Pois bem, acredito que ninguém tem o direito de ser achincalhado, pessoalmente, por quem quer que seja. Sou contra, por exemplo, numa peça de teatro ou num show, se utilizar um espectador como bode expiatório, sem o seu expresso consentimento: parece-me sempre isso uma grande falta de criatividade.  O humor em cima de instituições, aí sim, tira-se a impessoalidade: fale-se do Governo, da Previdência, da Câmara de Deputados, do Senado. Corte-se, também, a rotulação, o grande motor de qualquer arraigado preconceito : todo judeu é avarento, toda bicha promíscua, toda loura burra. Isso apenas ajuda a solidificar segregações perniciosas e  seculares.     
   No caso específico do prematuro desaparecimento de Eduardo Campos, o humor negro demonstrou, claramente, que junto ao povo humilde e simples do Brasil, continua a existir uma elite perversa que persiste lutando pela manutenção da escravidão e solta seus capitães do mato, agora, nas selvas virtuais.

Crato, 19/08/14


Rir ainda é o melhor remédio! - Por Carlos Eduardo Esmeraldo

Nestes últimos dias, em que nossas emoções foram postas à prova de resistência e bem exploradas a quem interesse nelas tinham, nada melhor do que seguir o que recomendava nos anos pós-guerra a revista norte-americana Seleções do Reader's Digest. Então vamos lá...
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Um bêbado que vagava sem destino pelas ruas da cidade, entrou numa casa na qual verificou um "entre e sai" de pessoas. Aproveitou-se disso e também entrou indo até a sala de visita, no centro da qual repousava um defunto em requintada urna funerária. O bêbado acomodou-se numa cadeira e ficou observando aquela triste cena. Chegava um e exclamava: "Meus Deus, ele morreu feito um passarinho"! A outro visitante alguém que assistira aos últimos suspiros daquele morto repetia o refrão: "morreu como um passarinho". Numa determinada hora em que a sala se encontrava vazia, somente o bêbado a velar o morto, entrou uma senhora e perguntou a ele:
- "De que foi que ele morreu?" - E o "bebum" na maior naturalidade respondeu:
-"Não sei se foi por falta de alpiste, tiro de espingarda ou de uma pedrada certeira da baladeira de algum menino..."(1)
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 Um desses coronéis do sertão, semianalfabeto e ex-prefeito de uma cidade do interior do Piauí, foi conduzido a Chefe de Polícia do Estado. Todas as segundas-feiras os repórteres dos jornais vinham lhe perguntar: "Quantas pessoas foram assassinadas nesse final de semana?"
-"Que diabo é que vocês querem saber para darem notícias incompletas? Passem antes nas maternidades e procurem saber quantos meninos nasceram! Então vocês vão ver que é muito mais meninos nascendo do que gente morrendo!" (2)
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Em outro governo, esse "coronelzão" foi nomeado diretor de uma espécie de "Codagro" de lá. Um dos programas do órgão era a venda de arame farpado a preços subsidiados. Certo dia o coronel escutou pelo rádio um inflamado discurso de um deputado, a dizer que seria assassinado dentro de poucos dias  na sua cidade, onde tinha seu colégio eleitoral. "Estou certo que serei assassinado pelo ódio dos pessedistas da minha terra!"  Ao se retirar da Assembléia, procurou o coronel para solicitar arame farpado para sua fazenda. Munido da autorização, estranhou ter recebido apenas um rolo de arame. Então voltou ao "coronel" para se queixar:
- "Como é que você autorizou somente um rolo de arame?"
- "Ora você acabou de dizer que vai morrer. Um rolo dá para cercar o seu túmulo e ainda sobra!"(2)

***
Na época da ditadura, aí pela metade da década de setenta, havia um senador cearense tão "voador",  que bem poderia integrar a lista da família do "Stanislaw Ponte Preta," personagem do jornalista e humorista Sérgio Porto, como  "Rosamundo, o distraído".  Ao visitar uma cidade do interior do Ceará, encontrou um ex-auxiliar, pessoa que gozou de toda sua confiança. Sem lembrar de onde o conhecia, emendou:
- "Mestre, como vai"? - Ao perceber que não fora reconhecido, o rapaz respondeu:
- "Senador, parece que o senhor não está me reconhecendo! É que estive na capital, passei uns quinze dias na praia e agora tou mais queimado"  - Ao que o senador emendou:
- "Ora Tomaz Queimado, como vai o teu velho pai, o meu grande amigo Júlio Queimado?" (2)
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De outra feita, nosso ilustre senador viajou de carro para Crateús em pleno mês de outubro. Foi acolhido na residência de um correligionário. Em dado momento, querendo puxar conversa, perguntou a uma rapaz que sentara-se ao seu lado:
- "E as chuvas? Tem chovido por aqui? - A essa pergunta o rapaz respondeu:
- Não posso responder Senador, porque fui eu que trouxe o carro que o senhor veio de Fortaleza até aqui. Sou o seu motorista. (2)

Por Carlos Eduardo Esmeraldo
(1) Conto de origem popular
(2) Extraídas e adaptadas de crônicas do jornalista Lustosa da Costa no jornal Diário do Nordeste 


terça-feira, 19 de agosto de 2014

Premonição ??? - José Nilton Mariano Saraiva

Dentre os significados e/ou definições para a palavra “premonição”, o Dicionário Houaiss (página 2288) nos ensina tratar-se de... “acontecimento que deve ser tomado como aviso, presságio, advertência” ou ainda... “sensação, pensamento, sonho, visão, etc. do que está para ocorrer” (ipsis litteris).

A transcrição acima, nos remete à divulgação pela televisão de um vídeo colhido menos de dois meses atrás, e só divulgado agora, após o acidente fatídico onde o presidenciável Eduardo Campos acabou por perder a vida, em razão de um desastre aéreo até agora não explicado.

Pois bem, ali vemos o presidenciável chegando apressado a uma reunião politica na Associação Comercial de Maringá-PR, quando, ainda de pé, se desculpa pelo atraso de cerca de duas horas. Ao tomar assento à mesa, de viva voz expõe e esmiúça aos presentes a razão da demora: é que o avião que usaria no trajeto Londrina-Maringá simplesmente havia apresentado uma pane elétrica na hora da decolagem, daí ter que fazer o percurso entre as duas cidades, via terrestre.

Bem humorado, brinca com a ocorrência e conclui, sorrindo: “ainda bem que foi em solo; imaginem se já tivesse decolado”

Pois é, o avião contratado para servi-lo durante toda a campanha por esse Brasilzão afora continuou sendo usado diuturnamente (talvez sem uma revisão mais rigorosa) e... deu no que deu.


O aviso fora ignorado.  

segunda-feira, 18 de agosto de 2014

"Nada de diferente" - José Nilton Mariano Saraiva

Em 13.08.14, o jovem candidato à Presidência da República, Eduardo Campos, teve seu sonho interrompido de forma abrupta e violenta, ao ser vitimado na queda do avião que o transportava para um ato político, em Santos-SP.  

Quatro dias depois (em 17.08.14), foi velado e enterrado na sua querida Recife. Nesse interregno (14 a 16.08.14), o jornal Folha de São Paulo houve por bem mandar seu pesquisadores às ruas a fim de auscultar a população sobre em quem pretendiam votar na eleição que se realizará daqui a menos de dois meses. Só que com um detalhe: já estampando o nome de Marina Silva como substituta de Campos, embora nem homologada pelo partido sua candidatura, ou seja, no auge da comoção fúnebre pela morte do candidato. Tabulados os dados, o resultado não poderia ser outro: Marina Silva suplanta Aécio Neves (despachando-o da corrida presidencial ???), e ameaça a então líder, Dilma Rousseff.

Ora, quem acompanha o noticiário político tomou conhecimento que meses atrás Marina Silva literalmente “detonou” todos os partidos políticos, por considerá-los um ajuntamento de pessoas com interesses não tão republicanos, daí sonhar em fundar a sua “Rede Sustentabilidade”, que seria algo diferente, conforme adiantou. Nunca, jamais parecida com um partido. A partir da própria denominação; "rede" ao invés de "partido".

No entanto, por não atender às exigências da legislação eleitoral, viu sua pretensão obstada e, então, esquecendo tudo o que dissera e declarara publicamente sobre os “partidos políticos”, Marina Silva  escolheu e filiou-se ao minúsculo PV, concorrendo à Presidência da República, obtendo surpreendentemente quase 20 milhões de votos.

Agora, de olho na possibilidade de “herdar” tão estupenda votação, o PSB se dispôs a funcionar como “barriga de aluguel” para Marina Silva, oferecendo-lhe o lugar de “vice” na chapa encabeçada por Eduardo Campos. E aí, picada pela mosca azul, Marina Silva mostrou que não tem “nada de diferente” dos políticos tradicionais e se prostituiu de vez (por mera conveniência pessoal), já que, por paradoxal, individualmente tinha o dobro das intenções de voto do próprio Eduardo Campos, candidato cabeça-de-chapa.  

E, como até hoje, tirante a questão ambiental ninguém sabe o que pensa Marina Silva a respeito das questões “macros” do país (metas inflacionárias, economia internacional, política energética, parceiros preferenciais, pré-sal e por aí vai) o melhor mesmo é não se deixar levar pelo “voto-comoção” e esperar que Marina Silva, se realmente for a candidata-herdeira, se desnude nos debates que virão mais à frente. Aí, veremos quem é quem.

Além do que e por enquanto, será interessante observar se os “falcões” do PSB aceitarão de bom grado que ela se eleja pelo partido e abandone-o mais à frente para fundar a sua “Rede Sustentabilidade”, como já o declarou em mais de uma oportunidade. Sem dúvida, uma desmoralização pública para o PSB, ou o atestado inconteste de “sigla de aluguel”.

No tocante à pesquisa do DataFolha, não há como não considerá-la “tendenciosa”, face ao inapropriado período em que se realizou: quando ainda se processavam as buscas pelos restos mortais do candidato e mesmo durante o seu velório. Claro que isso foi determinante para se chegar ao resultado hoje divulgado.


Assim, independentemente dos atores políticos envolvidos, resta-nos esperar pra ver se o “voto-fúnebre” prevalecerá nesse interstício de dois meses até a eleição. Uma coisa é certa: muita água ainda vai rolar por baixo dessa ponte.

Por João Nicodemos

sábado, 16 de agosto de 2014

Derrotado, mas... Vitorioso - José Nilton Mariano Saraiva

A “prova mais que provada” de que é possível se sair vitorioso, mesmo tendo passando por uma humilhante e vexatória derrota, nos foi dada recentemente após o desastre acontecido com a seleção brasileira de futebol, nos 7 x 1 que a Alemanha nos impôs sem nenhuma dificuldade, sem dó nem piedade.

É que, compreensivelmente pressionada pela mídia e torcedores brasileiros, a Confederação Brasileira de Futebol (CBF), à frente seus corruptos dirigentes, houve por bem demitir sumariamente todos os componentes da comissão técnica (convocando uma outra a peso de ouro), porquanto a repercussão negativa (inclusive internacional) foi de proporções amazônicas.

E como os integrantes dessa tal comissão técnica tinham um vínculo contratual de trabalho que só se expiraria lá na frente, a quebra de tal vínculo, de forma abrupta e unilateral, evidentemente que caracterizou demissão “sem justa causa”, daí os atingidos terem direito à indenização prescrita na lei trabalhista.

E aí, de forma absolutamente legal, transparente e incontestável, o técnico Felipão e o supervisor Parreira (principais responsáveis pela escalação equivocada do time) “lavaram a burra”, já que embolsaram cada um cerca de R$ 4.100.000,00 (quatro milhões e cem mil reais) o equivalente a 612 salários mínimos ou a 51 anos de trabalho de um mortal-comum), enquanto os demais integrantes perceberam valores menos significativo, mas mesmo assim expressivos.

Trata-se, ou não, de uma “vitória... na derrota” ??? Ou alguém se importaria de ser derrotado se ao final saísse com uma grana dessas no bolso ???

quinta-feira, 14 de agosto de 2014

O "garanhão" holandês - José Nilton Mariano Saraiva

Visualmente, ele não tem nada de especial ou que chame a atenção da mulherada: barriga tipo tanquinho, óculos fundo de garrafa e um tanto quanto desengonçado devido à altura, o holandês Ed Houben de repente virou celebridade, tornou-se um verdadeiro pop star, atração por onde anda, em razão da nova e interessante profissão que adotou: potencial “reprodutor humano” (tanto que apareceu no “Fantástico”, da Globo).

Sem cobrar nada, mas unicamente imbuído em “prestar favor”, ele vem ajudando mulheres de todo o mundo a engravidar, naquilo que ele considera “um dever moral”. A condição é uma só: que a “operacionalização” se dê através do método tradicional, ou seja, via prática do “ato sexual”. Magnânimo, para Ed não há nenhum tipo preferencial de mulher: pode ser alta ou baixa, negra ou branca, gorda ou magra, rica ou pobre, cabelo liso ou pixaim e por aí vai.

E a “coisa” parece que “pegou” de vez e de uma  forma tal, porquanto o distinto já engravidou mulheres na Holanda, Alemanha, Bélgica, Luxemburgo, Inglaterra, Itália, Israel, França, Áustria, Canadá e Vietnã (de tais encontros, garante o próprio, já vieram ao mundo mais de 100 (cem) filhos).

Pois bem, a fama do distinto é tanta que recentemente Ed “pintou” no Brasil a fim de atender pedidos de mais de 100 (cem) mulheres no eixo São Paulo-Brasília-Rio de Janeiro (e a próxima parada, já agendada,  será na longínqua China, onde já foi requisitado por dezenas de mulheres).

Todo gabola e picado pela mosca azul, o cosmopolita GARANHÃO HOLANDÊS garante que a qualidade e a quantidade dos seus espermatozóides são acima do normal, mas que... “essa rotina é muito estressante, já que eu perco um tempão nisso” (será que tá “abusando da fruta"???).

E atenção para o detalhe: o único custo para as mulheres que têm interesse em “encomendar” um rebento robusto e saudável é fornecer-lhe passagem e estadia. Só isso, nada mais.

E aí, será que Ed Houben deixará algum fruto por aqui ??? As mulheres cearenses vão encarar ??? 

terça-feira, 12 de agosto de 2014

E haja "reciclagem" - José Nilton Mariano Saraiva

Ricos, porém velhos, decadentes, cansados e normalmente “bichados” (condição física comprometida) e, portanto, sem mais nenhuma disposição para se submeter às exigências do profissionalismo vigente no futebol europeu, muitos dos jogadores brasileiros que atuam no “velho continente” são compreensivelmente premiados com o “bilhete azul”, representativo de que não mais interessam (ou que o mercado pra eles “já era”).

Só então, após despachados sumariamente dos respectivos clubes, não lhes resta alternativa senão lembrar que... o Brasil existe, daí voltar ao torrão natal (após anos) se lhes apresenta como única alternativa; e, para tanto, a alegativa hipócrita de que “amam o Brasil” e/ou que estavam “morrendo de saudades” da terrinha, e outras baboseiras mais.

Para tanto e sem nenhum escrúpulo, necessário valer-se dos amigos que militam na mídia esportiva tupiniquim (via oferta de propinas vultosas), objetivando anunciá-los como “reforço imprescindível” para aquelas agremiações que almejam cacifar-se a algum título em disputa. E como o futebol brasileiro adora uma “reciclagem” (???), tome leilão prá lá e pra cá, visando resgatá-los. E, por incrível que pareça, percebendo um salário respeitável, ou “top de linha”.

E haja enganação, a começar pela condição física deplorável, que não lhes possibilita atender às expectativas de dirigente e torcida. Não é preciso nem que entrem em campo, para que isso fique comprovado. O tal Kaká, por exemplo, contratado recentemente pelo time do São Paulo e anunciado como uma espécie de “salvador da pátria”, teve a estréia adiada... por um problema físico; posteriormente, entrou em campo uma única vez e já voltou ao Departamento Médico do clube, em função de uma lesão crônica na "batata-da-perna" (que os elitistas conhecem por panturrilha), diagnosticada já há anos, mas convenientemente escondida pra viabilizar seu retorno.

Já o “ciclista-palhaço-futebolista” Robinho (também em condição física suspeita), depois do fracasso monumental e fragoroso na Espanha, Inglaterra e Itália (onde serviu mais pra “divertir” os colegas que propriamente jogar bola), voltou às origens (Santos Futebol Clube) e a primeira providencia foi tratar de autopromover-se para a estréia contra o rival Corinthians (acabou não fazendo nada e saindo antes do final em razão de... problemas físicos).

Mas, como quem tem muito, avidamente sempre almeja mais e mais, e o futebol brasileiro está repleto de dirigentes mafiosos que ganham rios de dinheiro com essas desonestas transações (que o diga o senhor Gilmar Rinaldi, novo manda-chuva da seleção brasileira) depois de enganar por aqui, nada como aventurar-se (nem que se amparando em muletas) em países emergentes no futebol, mesmo que localizados no “fim do mundo” (o Oriente Médio e o Casaquistão, por exemplo), que ainda os recebem de braços abertos e como grande “atração”.  E aí, haja farras homéricas, drogas em abundância, desvarios mil, excessos de toda ordem, e por aí vai. E quando, finalmente, a “bateria” definitivamente não mais funciona, sempre há a possibilidade de serem contratados como “auxiliar” de algum ex-colega de profissão que encontrou um jeito de “treinar” alguma equipe por aqui.


Pois bem, enquanto os europeus investem na “base” (vide a Alemanha),  com resultados comprovadamente auspiciosos, o Brasil prefere trazer de volta esses "enfermos medalhões" da vida, que nada têm a oferecer. É assim, sem tirar nem por, que se processa e funciona a “reciclagem” (???) futebolística brasileira. 

E ainda reclamam dos resultados. São uns desonestos, definitivamente.

sexta-feira, 8 de agosto de 2014

Dom Pompom e o Velho Testamento

                                               Pompílio Evangelista de Mendonça carregava, junto ao nome pomposo, uma personalidade não menos respeitável. Atarracado, corpulento, voz de barítono, falava pausadamente como um bluesman. Nunca se o viu alterado, levantando a voz, discutindo ou tentando ganhar embates com sua retórica. De gestos largos, abraçava longamente a todos que o procuravam, com uma lhaneza de trato difícil de se encontrar naqueles confins de Matozinho. Extremamente bondoso, caritativo e solícito, nosso amigo atendia com muita presteza a tantos que o procurassem.  Dir-se-ia falar-se com um bispo ou um cardeal quando se procurava Evangelista, talvez, por isso mesmo todos o conhecessem por Dom  Pompom.
 
                                   Pompílio chegara em Matozinho há uns vinte anos e vivia tocando uma fazendola onde criava gado, bodes e carneiros. Morara em várias cidades , anteriormente, e comentava-se, a boca miúda e com cuidados redobrados,  que o passado do nosso bispo popular contradizia sua postura tão fina e recatada. Balbuciava-se, aqui e ali, que fora pistoleiro de aluguel dos mais afamados e que atrás daquela figura delicada e afável escondia-se uma cascavel de doze guizos.  Isso , de falar por falar, saltava, algumas vezes de algumas línguas bífidas da Vila. Para a mor parte dos matozenses, no entanto, estas questiúnculas nem interessavam, até porque todos gostavam da figura honrada  do velho Evangelista. Apesar da divulgada folha corrida de Pompom, as pessoas o amavam mais por reconhecimento que por temor.
                                   Sabia-se por ali que a família de Pompílio era um verdadeiro clã. Tinha parentes e aderentes espalhados por todo o estado e que se ajudavam mutuamente. Mexer com qualquer um deles, ofender alguma filha dos Mendonça era cutucar nu uma caixa de marimbondo de chapéu. De repente, sem que ao menos se esperasse, lá vinha uma bala perdida, um carro desgovernado, uma pedra rolando da ribanceira: tum ! No dia do velório lá estava nosso Dom Pompom, cabisbaixo, choroso, cumprimentando todos os familiares e se pondo à disposição para desvendar o crime ou acidente tão pavoroso.
                                   Contava-se dele, um caso exemplar. Soledade, a sua primogênita , casou com Pergentino, um sujeitinho meio boêmio, chegado a um carteado e a um violão. O pai nem queria o casamento, torceu o nariz, mas Soledade fincou pé e não teve como retroceder. Entrado na família, ele passou , imediatamente, a gozar da imunidade diplomática dos Mendonça.  Casava e batizava, seguro de que tinha guarda-costas. Pergentino chegava bêbado em casa e gostava de bater na esposa. Pompom soube das lapadas frequentes, mas não se meteu : ela é que tinha escolhido aquele caminho. O problema é que um dia, a surra foi tamanha que Soledade procurou o pai , em prantos, com a cara inchada e o braço quebrado : não aguentava mais tanta peia. Dom Pompom ouviu-a calmamente e informou que sabia de tudo mas não quisera meter a colher de pau naquele angu de caroço. Agora, que ela o procurara, sim, prometeu resolver a questão. Consta dos anais de Matozinho que nosso bispo contratou um pistoleiro e pediu que resolvesse a questão. Acertou o preço: R$ 2000,00. Deu-lhe a metade e combinou hora e local, para depois da consumação do fato, se encontrarem para o restante do pagamento. Dito e feito. Pergentino estava todo serelepe no Bar do Giba, de violão em punho, entoando “A Deusa da minha rua”, quando um sujeito entrou tranquilamente no bar, disparou um único tiro a queima roupa, no cocuruto de Pergentino,  e saiu como se nada tivesse acontecido. Soledade quase enlouquece, nunca imaginara que o tratamento seria tão radical, mas calou o bico. Dom Pompom, então, procurou a polícia e , visivelmente abalado, disse-lhes que tinha informações de onde estava o assassino. Prometeu-lhes , então, uma gratificação de quinhentos reais, sob uma condição: não queria que o atirador escapasse. A polícia concordou. Pompom, então, deu o local e a hora exatos que havia combinado com o pistoleiro para o recebimento da outra metade. A polícia já chegou atirando: o homem havia resistido à prisão.
                                   Sulpício Mendonça, filho mais novo de Pompílio, sempre foi chegado aos livros. Estudou com afinco e terminou se formando em advocacia. Daí para juiz foi um pulo. Assumiu em Bertioga.  Sulpício sabia  do passado  paterno, mas sempre o respeitou, embora admitisse, para si mesmo, que a profissão que escolhera , certamente, era uma espécie de contraponto ao obscurantismo contravencional da família. Quisera trazer algum ar de legalidade à família.  Dr. Sulpício fez carreira meteórica por ali. Brevemente se esperava uma promoção : ele deveria assumir uma Vara importante na capital.
                                   Um belo dia, Dr. Sulpício participou do julgamento de uma facínora que havia assassinado as próprias  esposa e a filha. Acabado o júri , o réu pegou vinte e cinco anos de xilindró. Ao ouvir a sentença, revoltado,  ele ameaçou:
                                   --- Doutor, reze para eu passar muito tempo no xadrez, viu ? Quando eu sair, o senhor vai me pagar. Se eu matei até a minha , que dirá a sua ! Acabo com você e sua família, seu miserável !
                                   Sulpício já estava acostumado com ameaças, de maneira que nem levou muito em conta o desabafo do assassino. Ficou , no entanto, mais  encafifado que aliviado quando, três dias depois, soube que o sentenciado tinha sido morto na cela, com mais de cinquenta perfurações de cossoco. Desconfiou que Dom Pompom poderia estar por trás daquela solução tão radical. Procurou o pai e sondou-o. O velho, pausadamente, informou que tinha mexido os pauzinhos e resolvido a pendência. Sulpício agitou-se:
                                   --- Papai, não acredito ! Não precisava esta loucura! Eu sou a justiça ! Não estamos mais nos tempos das cavernas ! Meu Deus !
                                   --- Meu filho, mas aí,  já não estava mais na sua jurisdição!
                                   --- Como não, papai ! Eu sou juiz! Lembra ?
                                   Dom Pompom, então, mostrou as rígidas regras do seu  velho testamento:

                                   ---- Meu filho, você é formado em Letras ! Eu é que sou formado em Tretas, viu ?

sábado, 2 de agosto de 2014

Dona Almina Arraes!






 Meu exemplo de feminilidade, elegância, sabedoria, inteligência, luz e força espiritual.
Amanhã  é seu aniversário. Meu coração  reverencia esta bela mulher todos os dias da minha vida.
Imensa ternura, num grande abraço!

"Passividade" rima com "Covardia" ??? - José Nilton Mariano Saraiva

Lembram da velha máxima, segundo a qual “cão que ladra não morde” ??? Pois bem, não é de hoje que o senhor Ciro Gomes insulta, agride e destrata aqueles que não rezam pelo exótico receituário-hipócrita do seu deturpado catecismo-político. E assim o faz porque, esperto e sabedor que determinado segmento da imprensa política deste país adora fanfarrões, pseudo-valentões e especialistas em plantar boatos, diuturnamente usa e abusa do artifício de provocar metade do mundo e a outra banda, objetivando estar sempre em evidência nas manchetes dos jornais. E como até aqui a passividade (ou covardia) dos atingidos é uma triste realidade, pra que mudar ???
Mas, eis que agora Ciro Gomes (também conhecido por “Ciro-tapioca”, por trocar - ou virar - de partido com a recorrência de quem muda de roupa) parece que encontrou uma tampa para o seu penico, na pessoa do ex-deputado, ex-prefeito de Maracanaú e atual candidato a vice-governador na chapa do senhor Eunício Oliveira, senhor Roberto Pessoa, que de há muito contesta com acidez os Ferreira Gomes. 
Fato é que, presumivelmente escalado pra se contrapor ao linguajar baixo e chulo do Ciro Gomes, em resposta às pesadas críticas que este houvera dirigido ao “cabeça-de-chapa” Eunício Oliveira, tachando-o de “aventureiro, lambaceiro e mentiroso” (e que teria “enriquecido de forma ilícita”), Roberto Pessoa, que não leva desaforo para casa, afirmou simplesmente (de forma até “cândida”, por paradoxal que pareça), que... “não discuto com drogado”.
Como não foi a primeira vez que tão séria e contundente acusação foi feita (sem que se conheça alguma contestação do atingido, na esfera judicial, pelo menos publicamente), cabe questionar: 1) a fala (pública e sem resposta) do senhor Roberto Pessoa, sinaliza e aponta serem pertinentes suas acusações contra Ciro Gomes, no tocante ao uso de drogas ???; 2) os recorrentes ataques apopléticos, seguidos de evidentes demonstrações de instabilidade emocional, que levam Ciro Gomes a descomposturas verbais dignas de um esgoto, seriam motivadas pelo uso de drogas ???
Pra complementar, não esquecer que o senhor Gaudêncio Lucena, sócio e coordenador-mor da campanha de Eunício Oliveira, que também houvera sido atacado por Ciro Gomes, colocou sua honestidade em dúvida, ao questioná-lo como se mantém (ou como vive nababescamente), já que há algum tempo “desempregado” e sem qualquer fonte de renda.
Alfim, como estamos apenas no começo da disputa eleitoral, a expectativa é se saber se nos próximos dias teremos alguma tréplica por parte de Ciro Gomes, porquanto uma outra velha máxima nos ensina que “quem cala consente”. 


sexta-feira, 1 de agosto de 2014

Forró das bolas dentro

J. FLÁVIO VIEIRA

                                               Não deu outra. Mal Sinderval Bandeira, prefeito de Matozinho, soube da realização do Copa do Mundo aqui no Brasil, ficou todo serelepe. Cedo começou a mexer seus pauzinhos, a futucar os políticos a ele alinhados, no estado; a cutucar o vazio dos deputados federais que foram apoiados, por sua administração. O sonho era fazer de Matozinho uma das cidades sede da World Cup. Far-se-ia, claro, necessário  fazer uma reforma ampla no estádio “Sinderzão”,com capacidade atual para 2000 torcedores,  melhorar a infraestrutura da vila, mas nada impossível, principalmente vindo dinheiro das estranjas. Antes mesmo de avançar nos primeiros passos, com o ovo ainda entalado no fundo da galinha,  Sindé, através da sua amplificadora -- os puxa-sacos locais-- já fez espalhar pelas redondezas , a notícia. E o povo já ficou mais agitado que picolé em boca de banguelo. Vendedores de rolete de cana, de din-din, de pipoca , passa-raiva e filhós sonharam, imediatamente, com um substancial incremento na venda dos seus produtos. As pensões de Matozinho, então, começaram a se mobilizar , no sentido de melhorar e ampliar suas acomodações. E o professor de inglês do Grupo Escolar Cacildo Jurumenha, conhecido como “Tobias or not Tobias”, imediatamente iniciou uma turma noturna, especial, para todos aqueles que se interessassem em aprender a língua inglesa, para melhor comunicação com os turistas.
                        Com o andar da carroça, no entanto, Sinderval começou a perceber que seu sonho ultrapassava os limites da realidade. Nem mesmo a capital do estado conseguiu se tornar sede da Copa, como diabos Matozinho poderia alimentar tamanha pretensão?  O enlevo alimentado pela Vila, no entanto, não podia ser tolhido de uma vez, sob pena de trazerem consigo suas indigestas consequências políticas. Sinderval, assim, foi comendo pelas beiradas, como quem degusta prato de angu quente. Espalhou, de início, que as verbas para ampliação do estádio tinham atrasado, depois que o pessoal da FIFA estava reestudando a divisão das sedes, por fim, jogou a culpa na administração estadual que por incúria e má gestão, havia prejudicado todo o estado, com a perda de tão importante evento. O povo que foi degustando o purgante, pouco a pouco, terminou por esquecer o amargor do remédio nas últimas doses.
                         Como prêmio de consolação, Sinderval resolveu organizar uma espécie de FIFA FUN FEST local. Botou um telão no meio do “Sinderzão”, contratou sanfoneiro, cobriu o estádio de bandeirolas verdes-amarelos e estampou acima do telão um nome mais regional : “Forrozão das Bolas Dentro”. A cada jogo do Brasil, reunia-se toda Matozinho no estádio , logo cedo, começava-se o tarrabufado até a hora do jogo e, terminado o espetáculo com a invariável vitória da nossa seleção, o rela-bucho continuava noite adentro. Matozinho virou uma festa até o fatídico jogo da semifinal.
                                   Naquele dia, quando começou o bombardeio de gols contra nosso escrete, o povo se revoltou e o pau comeu no centro. Antes que a desgraça se fizesse completa, depois do terceiro gol, os matozenses rasgaram o telão de cima abaixo e quebraram , por completo, o aparelho de retransmissão. Para todos os efeitos, assim, em Matozinho pelo menos, o Brasil perdeu da Alemanha de 3X0. Houve apenas uma exceção a esta regra.
                                   O velho Vanderico Salustiano estava na capital no dia da goleada e assistiu por lá nossa derrocada. Voltou capiongo e com o humor mais baixo que diferencial de cururu. Não comentou nada com ninguém, fechou-se como pequi verde. Uma semana depois teve uma congestão: morreu-lhe o lado esquerdo e ficou com a língua trôpega. Chamaram Janjão da botica que prescreveu a meizinha milagrosa:
                                   --- Tem que tomar Aguardente Alemã: uma gota ,  pelo menos sete vezes ao dia !
                                   Ao ouvir a prescrição, Vanderico entreabriu os olhos e, língua presa, suplicou:
                                   ---- Alemã? Alemã? Não ! De sete a um de novo, não !
                                   E bateu a caçoleta.


Crato, 01/08/14

quinta-feira, 31 de julho de 2014

As ameaças da Grande Transformação - Leonardo Boff

A Grande Transformação consiste na passagem de uma economia de mercado para uma sociedade de mercado. Ou em outra formulação: de uma sociedade com mercado para uma sociedade só de mercado. Mercado sempre existiu na história da humanidade, mas nunca uma sociedade só de mercado. Quer dizer, uma sociedade que coloca a economia como o eixo estruturador único de toda a vida social, submetendo a ela a política e anulando a ética. Tudo é vendável, até o sagrado.

Não se trata de qualquer tipo de mercado. É o mercado que se rege pela competição e não pela cooperação. O que conta é o benefício econômico individual ou corporativo e não o bem comum de toda uma sociedade. Geralmente este benefício é alcançado às custas da devastação da natureza e da gestação perversa de desigualdades sociais. Nesse sentido a tese de  Thomas Piketty em O capital no século XXI é irrefutável.

O mercado deve ser livre, portanto,  recusa  controles e vê o Estado como seu grande empecilho, cuja missão, sabemos, é ordenar com leis e normas a sociedade,  também o campo econômico e coordenar a busca comum do bem comum. A Grande Transformação postula um Estado mínimo, limitado praticamente às questões ligadas à infraestrutura da sociedade, ao fisco, mantido o mais baixo possível e à segurança.Tudo o mais deve ser buscado no mercado, pagando.

O gênio da mercantilização de tudo penetrou em todos os setores da sociedade: a saúde, a educação, o esporte, o mundo das artes e  do entretenimento e até grupos importantes das religiões e das igrejas.  Estas incorporaram a lógica do mercado: a criação de uma massa enorme de consumidores de bens simbólicos, igrejas pobres em espírito, mas ricas em meios de fazer dinheiro. Não raro no mesmo complexo funciona um templo e junto a ele um shopping. Enfim, se trata sempre da mesma coisa: auferir rendas seja com bens materiais seja com bens “espirituais”.

Quem estudou em detalhe este processo avassalador foi  um historiador da economia, o húngaro-norte-americano Karl Polanyi (1886-1964). Ele cunhou a expressão A Grande Transformação, título do livro escrito antes do final da Segunda Guerra Mundial em 1944. No seu tempo a obra não mereceu especial atenção. Hoje, quando suas teses se vêem mais e mais confirmadas, tornou-se leitura obrigatória para todos os que se propõem entender o que está ocorrendo no campo da economia com repercussão em todos os âmbitos da atividade humana, não excluída a religiosa. Desconfia-se que o próprio Papa Francisco tenha se inspirado em Polaniy para criticar a atual mercantilização de tudo, até do ser humano e órgãos.

Essa forma de organizar a sociedade ao redor dos interesses econômicos do mercado cindiu a humanidade de cima a baixo: um fosso enorme se criou entre os poucos ricos e os muitos pobres. Gestou-se uma espantosa injustiça social com multidões feitas descartáveis, consideradas óleo gasto, não mais interessante para o mercado: produzem irrisoriamente e consomem quase nada.

Simultaneamente a Grande Transformação da sociedade em mercado criou também uma iníqua injustiça ecológica. No afã de acumular, foram explorados de forma predatória bens e serviços da natureza, devastando inteiros ecossistemas, contaminando os solos, as águas, os ares e os alimentos, sem  qualquer outra consideração ética, social ou sanitária.

Um projeto desta natureza, de acumulação ilimitada, não é suportado por um planeta limitado, pequeno, velho e doente. Eis que surgiu um problema sistêmico, do qual os economistas deste tipo de economia, raramente se referem: foram atingidos   os limites fisico-químicos-ecológicos do planeta Terra. Tal fato dificulta senão impede a reprodução do sistema que precisa de uma Terra, repleta de “recursos” (bens e serviços ou ‘bondades’ na linguagem dos indígenas).
A continuar por esse rumo, poderemos experimentar, como já o estamos experimentando, reações violentas da Terra. Como  é um Ente vivo que se autoregula, reage para manter seu equilíbrio afetado através de eventos extremos, terremotos, tsunamis, tufões e uma completa desregulação dos climas.
Essa Transformação, por  sua lógica interna, está se tornando biocida, ecocida e geocida. Destrói sistematicamente as bases que sustentam a vida. A vida corre risco e a espécie humana pode, seja pelas armas de destruição em massa existentes seja pelo caos ecológico, desaparecer da face da Terra. Seria a conseqüência de nossa irresponsabilidade e da total falta de cuidado por tudo o que existe e vive.


(*) Leonardo Boff, teólogo e escritor. Autor de Proteger a Terra-cuidar da vida: como escapar do fim do mundo, Record 2010.