por José do Vale Pinheiro Feitosa
Viva junto à alma mais próxima e compreenda que a proximidade é a medida da distância. Que a distância que os separa é este movimento maravilhoso da matéria e da energia. A maravilha é apenas esta surpresa porque esta proximidade é tão diminuta entre os dois e é a inesperada distância.
José do Vale P Feitosa
quarta-feira, 26 de fevereiro de 2014
Recuerdos de Ypacarai - José do Vale Pinheiro Feitosa
A narrativa da composição de Recuerdos de Ypacarai foi retirada do Portal Guarani a partir da qual veio o texto, a música e a montagem. Aumentar a tela ajuda a ler. Aproveitem.
terça-feira, 25 de fevereiro de 2014
Anahi - José do Vale Pinheiro Feitosa
No espírito da postagem de ontem segue esta montagem de uma música-lenda muito conhecida e que tem o sabor das lendas tupi-guaranis.
segunda-feira, 24 de fevereiro de 2014
SÓ EXISTIREMOS SE TIVERMOS TERRA - José do Vale Pinheiro Feitosa
O parque Nacional Indígena do Xingu foi criado em 1961 pelo
Presidente Jânio Quadros. Tem 27 mil quilômetros quadrados, na área de
influência dos rios formadores da bacia do Xingu, fica na região norte de Mato
Grosso numa zona de transição entre o Planalto Central e a Amazônia. O parque
foi o resultado da luta dos irmãos Villas Boas (Orlando e Claudio) que viajavam
para a região desde os anos 40. Quem redigiu o projeto foi Darcy Ribeiro, então
funcionário do Serviço de Proteção ao Índio. E recebeu o apoio de figuras de
uma grandeza humana que são ricas pela narrativa e um espelho para estimular a
juventude a ser ousada e humana muito além desse individualismo consumista.
Falo do Marechal Rondon e do Noel Nutels.
O Marechal Rondon é herói na acepção da palavra. Um herói da
transformação e ocupação humana e econômica do vastíssimo território do oeste
brasileiro. Até então o Brasil era tão somente uma tripa litorânea que ia de
Belém a Porto Alegre (sei não são bem à beira mar). Existe uma vastíssima
literatura sobre Rondon. Noel Nutels, o chamado índio Cor de Rosa (Orígenes
Lessa escreveu um livro com este nome evocando Noel.)
Quero dizer que tenho histórias fantásticas do Noel Nutels.
Trabalhei num setor do Ministério da Saúde junto com a equipe do Noel. Mas vou
apresentar breves traços de sua história: nasceu na Ucrânia, membro de uma
família judia que migrou para Recife. Lá ele completa a infância, forma-se em
medicina e vai morar em São Paulo e é o médico da primeira expedição
Roncador-Xingu em 1943. Enfim: aproveita a expansão do Correio Nacional
(serviço da aeronáutica para transporte de postagens) o dirige para as selvas,
onde em clareiras era deixado com uma equipe e passava meses cuidando dos
índios que eram dizimados por doenças de brancos.
Terra quando pela primeira vez examinou as fotografias daquela, agora, pequena bola azul,
tão solitária no infinito e o poeta saudoso do seu exílio então atrás das grades de uma prisão
O que restou do povo Juruna (no século XIX eram dois mil) vive
em sete aldeias, próximas à Br-80 no baixo Xingu. Em 2001 o que haviam sido se
reduzira a 241 pessoas mas isso já era uma recuperação demográfica (no final da
década de 60 eles eram 50 membros, a maioria jovens). A língua deles pertence
ao tronco tupi e existe uma denominação que a chama de yudjá (significa dono do
rio) mas é dada por outros povos. A palavra juruna é um termo nheengatu dada ao
povo há vários séculos, que se traduz como “boca preta” que era uma tatuagem
perene na face. Essa tatuagem foi registrada há 150 anos, mas deixou de ser
usada e o povo juruna desconhece que existiu um dia.
Antes de seguir adiante: o nheengatu foi a segunda língua
geral criada no Brasil e era mais amazônica, a outra foi a paulista. Quando os
europeus penetraram o interior e foram criando uma economia sedentária, foi-se
criando a partir do tupi-guarani uma língua que pelo isolamento em relação à
Europa foi tomando corpo e se tornando a língua nacional (como vivos foram
duas). O Marquês de Pombal recriando as estruturas coloniais obrigou o ensino
do português. Mas era pelas línguas gerais que as diversas etnias se
comunicavam.
No anos 70 um índio da etnia Xavante se denominando Mário
Juruna, assim como o menino que disse que o rei estava nu, expôs as ditadura e
seus líderes. E foi de uma simplicidade fantástica. Com um gravador. Dos primeiros
gravadores portáteis e à pilha. Juruna desmentiu todas as falsidades dos
membros do governo apenas usando como instrumento o gravador.
Ele ia a Brasília para reivindicar coisas para o seu povo. Chegava
ao gabinete e gravava a conversa com a autoridade. Então falava com os
repórteres sobre o que haviam prometido e dito. Resultado o gravador do Juruna
passou a ser o desmascaramento da mentira oficial. Os jornalista para provocarem, perguntavam a
razão do gravador e ele respondia: “Para
registrar tudo o que o homem branco diz.” A repercussão foi tal que o
jornal O Pasquim chegou a entrevista-lo. E foi uma boa entrevista ele era muito
inteligente, com respostas rápidas e de muito bom humor.
Um Índio - música de Caetano Veloso aqui cantada por Milton Nascimento
Em próximas postagens pretendo falar mais do que ouvi sobre
Noel Nutels e relatar um dia inteiro em que passeie com Juruna pelo Rio, com
direito a almoço aqui em casa. Mas antes vou deixar mais uma frase do Juruna
para adoçar a amargura desses deslumbrados com o Agronegócio.
“ANTES DE TUDO, O ÍNDIO PRECISA DE TERRAS. ÍNDIO É O DONO DA TERRA. ENTÃO,
O BRANCO DEVE RESPEITAR A TERRA DO ÍNDIO”.
domingo, 23 de fevereiro de 2014
De "plantões" e "prendas" - José Nilton Mariano Saraiva
A notícia, inserta no
jornal O POVO, de 23.02.14, apenas confirma publicamente aquilo que todo mundo
sabe, mas tem medo de exteriorizar: no Poder Judiciário, que deveria constituir-se
um poder acima de qualquer suspeita, a corrupção também se faz presente. E em seus
escalões superiores, usando expedientes suspeitos.
É que determinadas bancas de renomados advogados de
Fortaleza espertamente optam por impetrar “habeas corpus” junto ao Tribunal de
Justiça do Estado, em favor de bandidos de alta periculosidade (já presos), só e
exclusivamente só, quando dos plantões judiciários de finais de semana (no fim do
ano passado, houve a tentativa de liberar pelo menos três criminosos de uma
quadrilha especializada em assaltos, seqüestro e tráfico de drogas, reincidentes
no mundo do crime e que já haviam sido condenados em pelo menos um processo).
E tem mais: 01) na busca para tentar evitar a liberação
“legal”, os advogados dos bandidos apresentaram mais de um pedido de habeas
corpus para o mesmo criminoso numa tentativa de confundir o sistema de
distribuição eletrônica e chegar ao “desembargador do acerto”; 02) em um dos
casos, três advogados diferentes (contratados pelo mesmo escritório) repetem a
solicitação em datas distintas; 03) apurou-se também que alguns escritórios de
advocacia esperam por plantões específicos de determinados desembargadores - a
lista dos escalados para cada plantão passou a ser pública, por determinação do
Conselho Nacional de Justiça.
Para tanto, sabem
quanto era a “prenda” de Sua Excelência o Desembargador de plantão ??? De
apenas e tão somente "irrisórios" R$ 150.000,00 (cento e cinqüenta mil reais) por cada “habeas
corpus” deferido (em um mesmo plantão do TJCE, nada menos que 64 recursos foram
apresentados).
Descoberta a maracutaia, pelo menos
duas investigações estão em curso no Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e
outras para serem encaminhadas. O desembargador Gerardo Brígido, presidente do
TJCE não quis comentar o assunto. Limitou-se apenas a dizer que os fatos estão no
CNJ.
sábado, 22 de fevereiro de 2014
"Cunhado generoso" - José Nilton Mariano Saraiva
Lembram de Patrícia Saboya Gomes, ex-mulher de
Ciro Gomes e cunhada do Governador Cid Gomes ??? Pois bem, sem nenhuma experiência
na área, foi nomeada recentemente “reitora” da Universidade do Parlamento (deve
ter alguma remuneração);
Mesmo desprovida do “douto saber”, necessário e exigido,
será nomeada (na próxima semana) pelo cunhado, governador Cid Gomes,
conselheira do Tribunal de Contas do Estado, cargo vitalício e que paga algo em
torno de R$ 25 mil mensais; para tanto, os “cordeirinhos” da Assembléia
Legislativa (deputados aliados) já garantiram a aprovação da mensagem
governamental.
Não esquecer que, quando Senadora da
República, notabilizou-se porque fez tanta traquinagem num voo internacional
(junto com uma amiga) que o comandante da aeronave, lá de cima, pediu à policia
de Roma, aqui embaixo, para recepcioná-las quando pousasse. Ficou retida até
que a diplomacia resolvesse o problema.
Com relação à sua vida parlamentar, como vereadora, deputada e
senadora, sempre foi de uma nulidade a toda prova, autentico zero à esquerda.
Tentou a prefeitura de Fortaleza em mais de uma oportunidade, mas o povo não permitiu.
Dedução disso tudo: nada mais legal do que ter um cunhado
generoso. Né não ???
Ação entre amigos - José do Vale Pinheiro Feitosa
Estamos
lendo, por meio de uma grande revista, a condenação de uma prática. Aquela
porta giratória em que o sujeito e o predicado trocam de lugar o tempo todo.
Terminam pelo que se chama de ação entre amigos. Um grupo se organiza para
dominar uma área do Estado e dele extrair vantagens financeiras. Este fenômeno
foi largamente identificado pelos americanos quando criaram as Agências
Reguladoras. O nome técnico foi de captura do agente regulador. É isso que se
encontra há muitos anos no corpo da burocracia estatal, seus programas e
atividades (ouvi longos relatos sobre Sebastião Camargo e contratos com a
Aeronáutica ainda no princípio do anos 50 do século passado).
Existe uma
proteção fenomenal da prática. Ela acontece dentro de partidos políticos que
permeiam vários governos e pela alternância de poder podem ter acesso à famosa
caneta que assina. Um dos parafusos desta prática é o financiamento privado de
campanhas eleitorais (que estão cada vez mais caras. Um vereador de município
com menos de 40 mil habitantes do interior do Ceará pode gastar até duzentos
mil reais para se eleger.
E no campo da
sociedade a prática adquire um valor simbólico, que a legitima de alguma
maneira, pela denúncia que estimula a alternância. A denúncia é uma das medidas
mais adequadas justamente para o sistema funcionar sempre, mesmo com outros
atores. Salvo denúncias surgidas das áreas de controle externo ou dos tribunais
de conta, o que funciona mesmo é quando um agente privado se sente prejudicado
nesse jogo, usa a imprensa para gerar o escândalo. Que tem repercussão política
sobre candidaturas, mas nem sempre contra o partido, força as peças para que o
jogo continue a funcionar. Continuar com os negócios proveitosos com o Estado.
Esse caso mesmo
que Carta Capital tão bem demonstra, que irá gerar acusações contra o PSDB,
inclusive com o viés de revanche, dado que este partido se tornou uma UDN a
denunciar nos outros as práticas que o movem. Mas movem também grandes partidos
e inclusive o PT que se dizia tão diferente. O PT usou tanto o expediente que
Darcy Ribeiro chegou a denominá-lo de "UDN de macacão." E agora o que
estamos falando?
Que a "ação
entre amigos" é comum em todos os governos, em obras públicas, serviços de
manutenção, serviços de propaganda e marketing (que na verdade é a chamada
comunicação), serviços de informática, serviços terceirizados de toda ordem e
nas ONGs e OS. Estas duas últimas modalidades chegam a ser fatiadas entre
aliados para que gerem recursos para a continuidade do "partido" a
ocupar o poder.
É nessa
questão que a política, a verdadeira política, deveria agir. Encontrar
mecanismos que economizem recursos e com os quais os ralos sejam vedados. E,
claramente, isso não é pós-fato, a vociferação de tribunais, o denuncismo, a
escaramuça para tirar vantagens e gerar manchetes. A revisão da lei de
licitações é uma grande questão. Não só a transparência é necessária, como a
participação no processo mesmo é necessário. Há que se reduzir a burocracia que
serve para esconder os malfeitos. Entre outras medidas que reduzam a
"captura da verbas públicas" pela "ação organizada entre
amigos". Acrescentando evidentemente o fim do financiamento privado de
campanhas eleitorais.
Vejamos um
paralelo com o que citado sobre os governos do PSDB e o desperdício da água. Quando
o atual Ministro da Saúde foi nomeado, setores do PSDB denunciaram esta porta
giratória entre ele com agente público e sua empresa privada de consultoria.
Qual a resposta principal do Ministro? Transferir a empresa para a esposa. Nada
mais cínico. Mesmo que ele não receba grandes volumes de dinheiro pelas
consultorias que presta aos governos, que sejam migalhas frente a essas
denunciadas pela Carta Capital, o que se verifica é a universalidade da prática
nos agentes públicos dos governos de muitos partidos.
Inclusive do PSDB e do PT, mas não só deles. Apenas se
destacam por serem os principais partidos em disputa no país.
sexta-feira, 21 de fevereiro de 2014
Chá Chá Chá da vida - José do Vale Pinheiro Feitosa
Que importam as eras. Uma criança sempre chega à sua por
memórias que se condensam em símbolos. Em símbolos que se misturam ao ser, que
dão sentido a ele ao dispô-lo num plano, nem sempre uma linha de tempo, mas
meteoros que riscam o céu.
O velho Cine Moderno. A porta que dava para os banheiros
vazava luz nas sessões matinais e a plateia gritava: feche aí. Lembro como se
fosse uma extensão de mim. Aquela plateia da sessão de uma hora, muito chegada
a uma série, a um cowboy preto e branco. Aos gritos, vaias e piadas.
E de repente uma cena no meio de um tumulto sem fim. Todas a
gafes de doer a barriga de tanto riso. E
aconteceu destas raras sessões, que abriam o universo do século XX para o
menino que vivia num tempo de passagem entre o século XVII e XIX. Se bem que
com inúmeros símbolos a lhes rodear a vida: máquina a vapor do engenho, o
trator, os automóveis e caminhões e até os restos do que fora no passado uma
iluminação elétrica.
O cena era uma tumulto qualquer, de filme que marcou-se como
Mexicano, mas poderia ser de qualquer outro país e a música devia ser Chá Chá
Chá de La Segretaria. Ou então não foi no cinema foi no rádio. Mas o símbolo
que se marcou foram as sessões das 10 e 13 horas no Cine Moderna.
Fui a muito poucas. Assim era a vida de um menino de sítio.
Mas foram suficientes para serem muitas. E o Chá Chá cuja cena lembro com muito
riso é uma canção de Renato Carosone.
Chá Chá Chá de la Segretaria - Renzo Arbore - composição Renato Carosone.
Renato Carosone é o encontro entre as culturas pela
divulgação do disco e rádios. Renato Carosone compõe um cha cha. Ele um
napolitano típico. Um dos mais reconhecidos músicos italianos na metade do
século XX. Formado em Conservatório de Música, Carosone viveu a migração italiana
que foi para o chifre da África. Especialmente com aventura de Mussolini na
Etiópia. E Carosone ficou por lá. Só voltou à Itália após o fim da guerra. Formou
grupos musicais de grande sucesso.
Um dos sucessos mundiais de Renato Carosone foi este que segue abaixo:
Tu vuo fa L´Americano - Renato Carosone com vemos uma letra em puro dialeto.
Aqui a mesma canção num filme americano em que aparece Sofia Loren.
O chá-chá-chá é uma variação do Mambo. É cubana da gema.
Como é típico daquela cultura é uma música e uma dança. Assim como o mambo, o
merengue e outros ritmos cubanos. Quem a lançou foi o músico cubano Enrique
Jorrin. A música fundadora do ritmo seria La Engañadora.
La Engañadora - Orquestra Americana - Enrique Jorrin.
O nome chá-chá-chá vem do ruído do reco-reco que em Cuba
chama-se güiro juntando-se ao ruído do dançarino arrastando os pés no chão.
Renzo Arbore é um artista multi-disciplinar. Conduziu
grandes programas na televisão, especialmente humorísticos, que lançou
grandes nomes da cultura italiana, incluindo Isabela Rosselini. Um showman de
primeira. Domina o palco como poucos. Diretor de cinema. Músico. Cantor. E fundou
a orquestra italiana com 15 músicos para divulgar a canção napolitana. Aqui novamente a abertura musical do povo italiano, com uma melodia que um samba brasileiro sem defeito algum. Além do mais bem humorado pondo o som da sílaba final da cacau em todas as palavras.
Cacao Meravigliao - Renzo Arbore
As chancas de Alphonsus
J. FLÁVIO VIEIRA
Alphonsus Publius Catarinus Maximus !
Esse nome, carregado de um latinório
trava-línguas, poderia fazer parte da Mitologia Romana. Como diabos teria
aterrissado em Matozinho ? Primeiro, é importante lembrar que o nosso
Alphonsus não trouxe esse epíteto da pia
batismal. Nascera, sem sangue azul, molhando fraldas esfarrapadas, como muitos
dos seus conterrâneos. Ainda adolescente, enfurnara-se num Seminário, na capital, e por muito pouco escapou da ordenação. Fora
aluno exemplar e seus superiores vaticinavam-lhe uma brilhante carreira
religiosa, coisa para arcebispo ou cardeal. Apaixonou-se, no entanto, por um rabo de saia , filha de uma das
copeiras do Seminário , e ela terminou arrancando-lhe a batina e ele, em compensação, assungou-lhe a saia . Partiu, então, nosso Catarinus para
a dura vida de chefe de família, como comerciário. Nunca, no entanto, abandonou
aquela mania de sacristia, falava apenas em latim vulgar e irritava-se por não
ter interlocutores fora das hostes sacerdotais. Foi aí que resolveu, num penoso
processo, mudar, em cartório, o nome de
matuto, Afonso Possidônio , de Catarina ( sua mãe) , para o pomposo : Alphonsus Publius Catarinus
Maximus. E foi de posse desse novo registro civil que um dia aportou em
Matozinho, carregando já uma récua de filhos. Com o dinheiro juntado, por
muitos anos, estabeleceu-se por lá com um pequeno Armarinho e, já madurão,
mudou-se para uma fazendola que adquiriu
e renomeou-a de “Parnaso”.
Em
Matozinho, teve que abandonar o
latinório, pois ninguém ali estava à
altura da sua sapiência lingüística. No
Seminário versara-se em autores clássicos portugueses como Herculano e Castilho
e sabia todo o “Eu” do nosso Augusto dos Anjos de cor. Negava-se, assim,
terminantemente, a falar em linguajar
reles, fugia dos galicismos e anglicismos como o capeta de água benta. Erros de
português, se legislasse, seriam punidos com prisão perpétua, salvo os de
concordância verbal onde deveria se aplicar, sem remorso, a pena capital. Publius mostrava-se, ainda,
totalmente a favor da redução da maioridade penal: a partir de 12 anos, se
desferir golpe de morte no vernáculo: galés perpétuas ! Ademais , nada de se
resumir a uma centena de verbetes apenas, num idioma tão rico como o português:
-- O ” Caldas
Aulete” tem trezentos mil verbetes é pra se usar ! --- Costumava
dizer Catarinus .
Até
na emissão quase que automática de palavrões , nosso vernaculista se policiava. “Filho da Puta” ,
virava “Rebento de uma deusa de lupanar”
; “Maricas” , dizia “Pederasta sub-reperício “; “Vá para PQP !” tornava-se nos lábios de Catarinus :
“Diriga-se à Messalina que vos concebeu!” . Personagens famosos de Matozinho,
também, ganharam denominações menos rasteiras : “Jojó Fubuia” terminou
rebatizado por Johann Etanol; Janjão da Botica transformou-se em Jonh Pseudo-
Esculápio.
Dias
atrás correu por toda Matozinho o ocorrido na Barbearia de Barba de Gato.
Alphonsus lá chegou tentando encomendar um corte de cabelo. Dirigiu-se para
nosso barbeiro, semi-analfabeto, com o seguinte palavreado :
---
Ó Fígaro ! Quanto queres de remuneração pecuniária para desbastar estas
excrescências córneas que se avolumam por sobre minha calota craniana ?
Barba
de Gato, mais perdido que cachorro em noite de São João, diante de tamanha
catilinária, interrogou-o:
---
Kumas ? Oxente , O homem endoidou ou
veio das estranjas !
Contrariado,
Alphonsus, raivoso, ameaçou :
---
Se dizes por insipiência, perdoar-to-ei ! Se,
no entanto, pretendes zombar da
minha alta prosopopéia, desferir-te-ei um golpe com este instrumento perfuro-contuso que o vulgo
o denomina “bengala” , no frontispício da tua caixa craniana, com tamanha impetuosidade, que ela há de metamoforsear-se , em iníquos
instantes, em meras cinzas cadavéricas !
Registra
ainda o folclore de Matozinho uma outra
epopéia do nosso vernaculista. Pela
manhã , ele despertou o filho caçula ,Dioclecianus Tertius, pedindo-o para ir
até ao mercado público a fim de comprar uns cuscuzes para o café da manhã. Convocou-o com este
petardo:
--
Tertius, prólio meu ! Levanta-te deste leito adormecente e caminha até àquele
aglomerado humano que o povo denomina de mercado e compra-me massas côncavas a
que o vulgo rotula de cuscuz, para que possamos saborear no nosso jantar
matinal !
Semana
passada, a praça da matriz parou diante de uma cena inusitada. Alphonsus buscou um engraxate, no intuito dar um trato
nos seus pisantes. O problema é que se
tratava de uma figura popularíssima em Matozinho e que carregava um apelido hilário : “Cu de Apito” . Imaginaram todos a
dificuldade que teria nosso emérito vernaculista em tipificar o engraxate de
forma mais erudita. Em alto e bom som, Publius aproximou-se e , com sua inconfundível voz tonitruante, encomendou
o serviço:
--- Insigne polidor de
pantufas ! Poderias genufletir-te ante mim e tornar luzidias estas minhas
pré-históricas chancas ! Vinde, ó Óstio anal chilreador !
Crato,
21/02/14
ANTOLHOS - José do Vale Pinheiro Feitosa
Antolhos. Aquele anteparo que cega a visão lateral. Pode ser
este o sentimento de alguém que leu a notícia da apreensão policial de um menor
de idade, tentando roubar um casal de turistas em Copacabana.
Acontece que o caso ainda arde na chapa quente do
noticiário. Este mesmo menor foi alvo de intenso debate nacional. Ele fora
espancado e acorrentado a um poste por um grupo de vingadores que circulam
pelas ruas do Bairro do Flamengo.
Em primeiro lugar a repercussão no Rio foi imediata. Yvone
Bezerra, que se tornou uma referência em defesa das crianças assassinadas na
Candelária no anos 90, foi quem desacorrentou o menor e denunciou o ato.
Depois uma apresentadora do SBT cometeu a burrice de, usando
um serviço concedido, estimular o ato de espancamento e tripudiar em torno do
menor. Aí o debate virou nacional. Muita gente não aceita este tipo de estímulo
à violência com o uso de serviços públicos.
Agora o menor foi apreendido numa tentativa de roubo e foi
encaminhado para um desses órgãos formais de recuperação por meio da justiça.
Aí vem a história dos antolhos. Quem não consegue visualizar a lateralidade do
mundo, imediatamente vai vociferar contra quem defendeu o direito humano.
Vai usar a reincidência ou comprovar que o menor era ladrão
e merecedor do que sofreu. Efetivamente justificando a justiça pelas próprias
mãos. As mãos mais fortes que inclusive podem ser pagas como os pistoleiros.
A apresentadora do SBT se não der a notícia por satisfação,
irá dar um jeito de mostrar que ela tinha razão. Afinal o debate é público. E a
vingança é uma das mais antigas ações do drama humano.
Mas aí vamos para a lateralidade. Um mesmo ator (o menor) recebendo
dois tratamentos distintos. No primeiro ele foi agredido em seu direito humano
(escrito na lei). E no segundo ele vai se submeter à normas sociais em razão do
seu ato.
Isso faz toda a diferença.
Por que é golpe? - José do Vale Pinheiro Feitosa
A instabilidade social e as manifestações populares, aliadas
a grupos políticos organizados militarmente, deixam no ar a ação de ruptura dos
regimes que hoje funcionam baseados no sufrágio de candidatos. A questão está
mais ou menos assim: um grupo deseja romper as políticas de renda, falta de proteção
social, desemprego, despejo por dívidas e se manifesta. Grupos distintos, com
outros propósitos políticos, aproveitam a ocupação das ruas e vão para o
confronto militar franco.
Na Síria, na Ucrânia isso é bem visto. (Claro que por fora,
acirrando posições países fortes tomam partido financiando um lado ou outro e
até os dois). A Ucrânia é mais grave porque há um problema crônico básico de
setores étnicos em relação à Rússia (imperial ou soviética). Estes setores
ocuparam o campo da extrema direita política, são organizados, perduram há
muitos anos de tal modo que aderiram ao Exército Nazista durante a invasão da
União Soviética na Segunda Guerra.
A situação na Ucrânia é de tal modo um retorno ao nazi-fascismo
original que judeus já são perseguidos por lá. Este Jam Koum, um dos
bilionários do WhatsSpp vendido para o Facebook, migrou há alguns anos para os
EUA em razão das perseguições feitas contra judeus. E isso foi no final da União
Soviética, em 1989, e no ano de 2004 aconteceu na Ucrânia a tal Revolução Laranja
que foi comemorada como um grande ato político pela mídia ocidental.
A revolução laranja, dez anos atrás, se deu com uma revolta
popular em razão de uma fraude eleitoral em que o segundo lugar Viktor
Yanucovych (esse mesmo atual presidente) foi confirmado no lugar do que teria
sido o primeiro colocado que é Viktor Yushchenko. A eleição foi anulada,
Yushchenko disputou e venceu. Acontece que o paraíso não chegou e Yuschenko se
desgastou e quem está no poder é o outro Viktor.
Mais do que uma insurgência contra o Governo, o que se tem
por trás é a ruptura do processo em que a maioria vence a eleição. No caso da
Venezuela isso é nítido e mesmo quem torce contra Maduro, deve imaginar que no
mínimo o país tem uma grande divisão e que por eleições vão fazendo projetos de
seguir adiante. O mesmo processo que elegeu Maduro, poderá eleger Capriles nas
próximas eleições.
O que deseja esse López? Provocar ruptura para ele mesmo ser
o autor e aí Capriles e companhia vai para o espaço. A oposição na Venezuela
nunca se uniu e por isso perde tantas eleições. É preciso compreender um pouco
a formação social da Venezuela. Por muitos anos uma parcela da população foi
privilegiada com o Petróleo do país. Tinha uma vida de classe média até
superior a de outros países latino-americanos.
Essa parcela educava os filhos nos EUA, tratava a família e
tinha casas por lá onde passava as férias. Essa parcela se alienou do seu
próprio país e do seu povo. O Leopoldo López fez a maior parte de seu ensino
básico e de sua formação universitária nos EUA. Isso significa que parte da
identidade e das ligações dele são com aquele país.
O que ele propõe nas ruas é a ruptura dos resultados das
eleições no curso do mandato do eleito. Além do mais ele tem usado táticas de
movimentação que recordam o ocorrido em 2002 no golpe contra Chávez. Por
exemplo o aparecimento de mortes por balas perdidas em manifestações para
depois gerar mais tensão social.
Leopoldo López não só participou do golpe de 2002 como,
nesse momento, se diz orgulhoso do fato. Ou seja defende abertamente um golpe.
A BBC Brasil o classifica assim: popular, carismático, imprevisível, arrogante
e sedento de poder.
quinta-feira, 20 de fevereiro de 2014
CRIANÇA SÍRIA PERDIDA NO DESERTO É SALVA PELA ONU - José do Vale Pinheiro Feitosa
Na mesma linha da postagem anterior. A CNN divulgou uma história com dois ingredientes hollywoodiano - drama e tragédia: uma criança sozinha andando no deserto. Havia se perdido da família. Eram sírios em fuga pelo deserto da Jordânia. Salvo por uma equipe do Alto Comissariado da ONU e registrado por repórteres e fotógrafos, ele carregava uma bolsa com umas migalhas para comer e uma garrafa para matar a sede.
A notícia virou o mundo. A jornalista Hala Gorani publicou a história no Tweet e despertou a emoção dos leitores. Foi este o trabalho pela informação?
Não!
Não passava de uma farsa. A criança não estava sozinha, acompanhava um grupo de pessoas em fuga, incluindo os familiares do garoto que caminhava alguns passos à frente dele. Um fotógrafo que seguia à frente tirou uma foto do grupo e ao ampliá-la quem estava lá? O menino que teria sido encontrado sozinho na solidão do imenso deserto.
Estes americanos são mesmo a moral suja imperial. Financiam a desgraça e ainda tiram proveito econômico até da notícia dos efeitos causados por eles.
Manchete encontrada em orgia no submundo - José do Vale Pinheiro Feitosa
A chamada da postagem é apenas um jogo para evidenciar os enorme papel que os títulos, chamadas ou manchetes têm para atrair o leitor. E como uma mensagem cifrada, cheia de símbolos, a manchete por vezes é a primeira impressão sobre a notícia senão a única.
A manchete dos jornais é resultado da hierarquização da
notícia (informação). O destaque mostra a importância do fato. Isso foi tão
marcante que se expandiu por todos as mídias. Rádio, Televisão, Internet etc.
Acontece que jornais e os sites são ligados a empresas que
prestam serviços e vendem ou apoiam opiniões. E é aí que a hierarquia toma a feição
da manipulação, da armação e das campanhas de natureza política.
Agora mesmo nas manifestações da Venezuela aconteceu uma enorme
leva de manipulações nos sites da internet. Fotos que eram tidas como sendo das
manifestações na verdade eram imagens de manifestações, conflitos e vítimas acontecidas
em outros países e muito antes.
Empresas do mercado de mídias chegaram a reproduzir tais
fotos, como por exemplo a CNN. Mas a novidade é que usando a internet como fonte
da falsidade, também rapidamente é a fonte do desmascaramento. Foi o que
aconteceu.
Acirrando-se posições os consumidores dos meios de
comunicação precisam ficar atentos para as tais “hierarquizações”. Só para se
observar um exemplo que está em curso desde o início da manhã de hoje.
Desemprego sobe em janeiro e fica em 4,8%, aponta IBGE. SITE GLOBO.COM
Desemprego fica em 4,8%, menor taxa em 11 anos. Site Brasil247
simpático ao governo.
Meia hora após Globo.com refaz a manchete: Desemprego
registra menor taxa para janeiro desde de 2003, diz IBGE.
Isso tudo em razão da pesquisa mensal que faz o IBGE sobre o
emprego no Brasil. Acabou de sair o relatório e o que acontece é que passado o
mês dos empregos temporário (dezembro com as festas de finais de ano) o
desemprego sempre aumenta quando se comparam os dois meses (janeiro com
dezembro pois o indicador do IBGE, sendo mensal, é bem dinâmico).
É tanto que mais vagas foram cortados no setor do comércio
seguida de educação, saúde e administração pública. De fato, em onze anos este
indicador de janeiro foi o menor, a taxa de pessoas empregadas cresceu em
relação a janeiro de 2013 assim como o rendimento real habitual do empregado.
O pouco que se planta alimenta a filharada. - José do Vale Pinheiro Feitosa
Lá o
pouco que se planta
Alimenta
a filharada
O
pouco com Deus é muito
O
muito com Deus é nada
A cada nota
musical a espuma azul cobre mais a sujeira que baixou do mundo. Novamente o refrão:
Lá o pouco que se planta.
Não é a
África. É a mama África. É o Rio de Janeiro destilando o seu código genético. Alimenta a filharada.
- Olha aí! Eu vou dar um tempo. Sair uns dez dias.
São férias mesmo. Não vou ficar mofando em casa. São dez dias.
A esponja
pinga água e esfrega a espuma azul sobre o metal. Botas longas. Roupa
padronizada com símbolos e tudo. Alto e esguio como um Watusi. Um Etiopiano da nascente
do Nilo Azul. O pouco com Deus é muito.
- Vou lá em Itacuruçá. Com sete contos vou
lá naquele parque e passo o dia inteiro. Vou dar uma olhadela naquela ilha lá.
Ela tá lá. Eu vou. Vou e volto por quinze contos.
Vai da traseira
à dianteira esfregando a espuma azul. Gira volta pelo outro lado. Vidros.
Limpadores levantados. Espelhos. Porta. Rodas. O muito com Deus é nada.
- De chumbada e molinete? Eu gosto com a
chumbada amarrada na barra e a gente em cima do barco.
- Aí. Eu fiz muito isso lá em Macaé. Ali
naquele lugar perto da Base da Petrobrás. Comprei uma chumbada legal. Uns
camarãozinho no maior caô. Deu legal.
As mãos
molhadas apertam o botão que liga a bomba do esquiço de água.
- E este interruptor não é um perigo? Vocês
todos molhados.
- De vez em quando vem um choquezinho
básico.
O jato de
água vai retirando a espuma azul misturada ao cinza da sujeira. E recomeça. Lá o pouco que se planta. Alimenta a
filharada.
- É um samba de partido alto?
- Zeca Pagodinho na parada. O Zeca pagodinho
é daquele jeito mesmo. Eu já cruzei com ele. Lá no posto de gasolina que eu
trabalhei na Barra. Ele chegou perto de mim, disse que eu esperasse que ia me
dar alguma coisa, meteu a mão no bolso e tirou umas notas toda amassada. Ele é
assim mesmo. Não tem farsa.
- É sincero.
- Autêntico. Outro dia um amigo deu carona
para ele ir lá naquele Pet Shopping que fica ali no Recreio. O Zeca pediu
carona e o amigo: mas Zeca é tu mesmo! Vá lá meu irmão, toca esse bicho para
frente que tá um calor danado.
- Não tem farsa. Pega o carro aí, dá uma
volta e põe ali na frente para eu enxugar.
Sujeito Pacato. Cantada por Zeca Pagodinho. Composição Serginho Meriti e Claudinho Guimarães.
quarta-feira, 19 de fevereiro de 2014
A Rama de Jerimum na Grota do Riacho do Meio - José do Vale Pinheiro Feitosa
Nas nove horas o sol já funga como o sopro da fornalha. O
chão desta terra nordestina é o espelho da luz. Espelha tanta energia que arde
como a trempe do fogão a lenha.
- Vó?
- Ôi meu fiii! – a
cada sílaba os tufos de fumaça falava com a paisagem levando a mensagem do
cachimbo.
- Eu tô cum vontade de
ir lá na grota perto do riacho do mei e apanhar uns jerimuns caboclo que
esperei dar no ponto.
- Vá meu fii! Vá! Dá
tempo....
- Eu vou trazer todos
eles. Tô com um vontade danada de comer jerimum.
- Traga meu fii! Traga
eu vô cuzinha eles e nós come.
- Come Vó! Vô ino.
Se eu tivesse tempo
ia mostrando todos os fragmentos que o mundo implantou dentro de mim. Mas são
tantos fragmentos que nem sei de onde tirar. E quanto mais tiro mais os bichos
aparecem. Assim como ouvir, pela primeira vez Nat King Cole, naqueles tempos
que somavam as melodias de volta da gente, as mais ali, as acolá e até lá das
lonjuras que nenhuma pisada conseguiria chegar.
Nat King Cole canta Mona Lisa feita para a trilha sonora de um filme da Paramount, composta por Ray Evans e Jay Livingston
Uma voz que se inveja matasse, eu já estava
morto desde os idos dos anos sessenta do século XX. Ele também morreu em 15 de fevereiro de 1965.
Uma vingança do tamanho da minha inveja: um câncer venceu sua garganta e a teia
se espalhou pela voz e por toda a vida.
Pretend gravada por Nat King Cole em 1952, composta por Lew Douglas, Cliff Parman e Frank Levere
Uma voz que honraria qualquer cultura. Qualquer família de
bem. Mas Nat King Cole foi uma vítima contínua da discriminação racial. No
Alabama, na cidade de Birminghan, ele foi derrubado no palco enquanto cantava
Little Girl. Eram membros da North Alabama White Citizens.
Little Girl - com letra do próprio Nat King Cole
No tempo em que a
Máfia mandava em Cuba junto com o ditador Fulgencio Batista, ele foi cantar,
mas proibido de hospedar-se no Hotel Continental porque era negro. Comprou uma
casa num subúrbio de Los Angeles, onde moravam brancos e de lá foi expulso.
Ay Cosita Linda - do disco em que Nat King Cole cantava em Espanhol a música foi composta por Pacho Galan, músico colombiano
Nat King Cole mora na grota do Riacho do Meio e de vez em
quando vou apanhar um jerimum por lá.
Além de descer até os povos de fala hispânica, Nat King Cole esteve entre nós, foi primeira página e alvo de reportagens da Revista O Cruzeiro. Até o presidente o recebeu.
Vá para Cuba! Vá para a Coreia do Norte! Vá limpar banheiros! - José do Vale Pinheiro Feitosa
Resolvo falar de um ícone da canção portuguesa. Chama-se
Fernando Tordo, tem 65 anos, viveu parte de sua vida sob a ditadura salazarista
e outra na democracia. Sonhou um Portugal melhor para os filhos e os netos.
Vencedor de prêmios de festivais da RTP, Fernando foi
gravado pela nata da canção portuguesa pós-ditadura como Dulce Pontes, Carlos
do Carmo, Mariza, Carminho, Simone de Oliveira e muitos mais. Fernando fez
belíssimas canções com o poeta José Carlos Ary dos Santos tais como Tourada,
Estrela da Tarde, Lisboa Menina e Moça, O amigo que eu Canto e mais esta Balada
para os nossos filhos, que poderemos ouvir abaixo na própria voz do compositor.
Um Portugal melhor para os filhos e netos, Fernando Tordo
viu sair pelo ralo com a crise que abala a Europa e Portugal em especial. Nos
último ano vivia de uma aposentadoria de um pouco mais de duzentos euros (R$
659,78) e, segundo seu filho o escritor João Tordo recebia uma pequena
aposentadoria da Sociedade Portuguesa de Autores que dava para pagar a gasolina
com a qual ia de cidade em cidade cantando suas músicas, ora com casa cheia,
noutra mais ou menos e noutras vazias.
Fernando Tordo pegou uma avião e veio morar em Recife. Não
conhecia bem o Brasil e o Brasil não conhece sua música admite o próprio filho
escritor (que ele cita na música acima) numa carta que escreveu e publicou no jornal
“Público” de Portugal. Mas veio e antes despediu-se no Facebook dos amigos e admiradores
que ainda tem.
Fazendo as contas Fernando veio tentar uma nova e
desconhecida vida aos 65 anos de vida.
No Face recebeu carinho e muitas pedradas no estilo que
estamos lendo em revistas como Veja, a extrema insensibilidade humana tal qual
aquela Australiana que disse que não iria se sujar ao se referir a uma manicure
negra num salão de beleza de Brasília ou a tal Rachel do SBT apoiando a tortura
de um menino de rua.
Para ilustrar estes tempos e intolerância anti-humana que é
gerada nas redes sociais vou colar o próprio texto que se encontra na carta
feita pelo João Tordo:
“Outros, contudo, mandaram-no para Cuba.
Ou para a Coreia do Norte. Ou disseram que já devia ter emigrado há muito. Que
só faz falta quem cá está. Chamam-lhe palavrões dos duros. Associam-no à
política, de que se dissociou activamente há décadas (enquanto lá esteve
contribuiu, à sua modesta maneira, com outros músicos, escritores, cineastas e
artistas, para a libertação de um povo). E perguntaram o que iria fazer: limpar
WC's e cozinhas? Usufruir da reforma dourada? Agarrar um "tacho"
proporcionado pelos "amiguinhos"? Houve até um que, com ironia
insuspeita, lhe pediu que "deixasse cá a reforma". Os duzentos e tal
euros.”
Esse tipo de
discurso Fascista tem muito da intolerância a reinar a cabeça de muita gente.
Por falar nisso um estudo americano recente feito numa amostragem bem calculada
demonstrou que os ignorante desconhecem que o são e têm maior tendência para a
arrogância. Claro que o ódio todo se deve às declarações de Fernando antes de
embarcar de Lisboa ao Recife.
“Ainda tenho muita coisa para fazer, muita
música para escrever, muita canção para cantar, muita gente para conhecer,
portanto é muito provável que aproveite estes últimos anos da minha vida porque
não os quero consumir aqui, eu não quero. Não aceito esta gente, não aceito o
que estão a fazer ao meu país” refere. “Não votei neles, não estou para ser
governado por este bando de incompetentes”.
“O
que é natural é que faça como foi aconselhado a muitos jovens mas também
poderiam ter aconselhado a mim. Tenho 65 anos, quero-me ir embora, mas sem
drama nenhum. Passou a ser insultuoso ao fim de 50 anos de carreira ter de
procurar trabalho desta maneira, ter que viver quase precariamente. Não quero,
não muito obrigado, vou-me embora. Mas satisfeito!”
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