por José do Vale Pinheiro Feitosa




Viva junto à alma mais próxima e compreenda que a proximidade é a medida da distância. Que a distância que os separa é este movimento maravilhoso da matéria e da energia. A maravilha é apenas esta surpresa porque esta proximidade é tão diminuta entre os dois e é a inesperada distância.

José do Vale P Feitosa



sábado, 20 de junho de 2015

RECORDAR É VIVER ??? - José Nilton Mariano Saraiva

Prá você, aí do outro lado da telinha, que tá surpreso com MAIS UMA palhaçada patrocinada pelo jogador Neimar-cai-cai, no último jogo do Brasil na atual Copa América, permitimo-nos transcrever o artigo que postamos aqui mesmo, em 14.07.2014 (portanto quase um ano atrás) após a extravagante derrota do Brasil para a Alemanha, na Copa do Mundo de Futebol, e que trata sobre o dito cujo (Neimar-cai-cai):

...”No mais (e nisso ninguém fala), tivemos também a derrota da mídia brasileira. É que, antes de se preocupar com os adversários do Brasil propriamente, a atenção maior foi, antes e durante a Copa (e até agora, após) tentar incutir da mente dos torcedores que a seleção tinha um novo “LÍDER” capaz de guiá-la ao Olimpo, levá-la aos píncaros da glória, guindá-la ao panteão dos heróis imortais: o tal Neimar-cai-cai, que é apenas um bom jogador e não esse fenômeno que propagam.
Ora, amigos, “LIDERANÇA” não se encontra disponível nas prateleiras das bodegas da vida do interiorzão brabo, nas gôndolas dos grandes supermercados das capitais ou nas bancas das feiras-livres da periferia; “LIDERANÇA” não se compra, não se impõe, não se transfere e nem se atribui via decreto, bilhete, norma, portaria ou coisa que o valha. “LIDERENÇA” é algo natural, de berço, carismática, única, personalíssima. E disso o tal Neimar-cai-cai é desprovido, do dedão do pé à cabeleira moicana.
Assim, nada mais hipócrita que a recorrente imagem da TV mostrando no túnel de acesso ao gramado o tal Neimar-cai-cai abraçando um a um os colegas, antes de cada partida, ao tempo em que o narrador global destacava sua forte “LIDERANÇA” ante os demais; nada mais cafona do que a imagem dos jogadores entrando em campo para uma semifinal de Copa do Mundo usando “bonés” personalizados, saudando o tal Neimar-cai-cai (fora do jogo, por contusão); nada mais ridículo que exibir, durante o canto do Hino Nacional, a camisa do tal Neimar-cai-cai, como se fora ele um “herói” já falecido, a quem todos devêssemos reverência (passa longe, bem longe disso). Deu no que deu.”

Agora, e voltando à atualidade: quem quiser saber das imoralidades, mutretas e falcatruas do mundo futebolístico, não pode deixar de ler o livro “O Lado Sujo do Futebol-A trama de propinas, negociatas e traições que abalou o esporte mais popular do mundo” (editora Planeta do Brasil, 2014, 382 páginas) onde... “os autores desmontam uma intricada rede de corrupção, que envolve grandes multinacionais, emissoras de televisão, empresários, clubes, políticos e jogadores”.

Lá, por exemplo, tomamos conhecimento que “NIKE”, patrocinadora da seleção brasileira de futebol, indicava quais os integrantes que deveriam compor a comissão técnica da seleção e, posteriormente, quais os jogadores que deveriam ser convocados por essa mesma comissão, os adversários que enfrentaríamos e por aí vai; também, em conluio com a CBF-televisão, que os jogos se realizassem em horários “apropriados” (quase meia-noite); chegou, inclusive, a impor ao comando técnico da seleção a escalação do Ronaldo Gordo Nazário, na final da Copa do Mundo da França, mesmo e apesar de dopado por analgésicos e protegido por coletes ortopédicos que literalmente o mantinham de pé; lá temos, também, todos os detalhes (inclusive valores e cópias de documentos) da transação-fraudulenta entre o então presidente do Barcelona, Sandro Rosell (representante da “NIKE”) e o pai do Neimar-cai-cai, visando sua transferência para o clube catalão (hoje questionada pelas justiças espanhola e brasileira); lembremo-nos que à época a imprensa brasileira considerou o “papai-Neimar” um autentico “mago das finanças” devido à esperteza demonstrada na transação. Deu no que deu.


Enfim, lamentavelmente temos que aceitar que os desonestos dirigentes do futebol brasileiro e seus jogadores não estão nem aí para com a antiga paixão nacional, e que o transformaram num antro de corrupção e safadeza, onde uns poucos se beneficiam com muito.

sexta-feira, 19 de junho de 2015

O Profeta Apoquetílico

                                                     
                                                         
                                                                                                                    J. Flávio Vieira

Robledo Ipueira terminou eleito, em Matozinho, com uma votação recorde. O poder político até então se alternava entre dois grupos acirradamente inimigos : Os Cangatis e os Carrapatos. De início, ninguém imaginou que a regra pudesse ser um dia estilhaçada. Robledo nem matozense era. Chegara por ali há pouco mais de dez anos e se meteu no ramo de mandioca, produzindo farinha, goma e beiju. Os negócios prosperaram , impulsionados por seguidos anos de invernos fartos. De conversa fácil e traquejo no ofício, Ipueira construiu muitos amigos. Toda Matozinho, no entanto, olhou com ceticismo sua candidatura a prefeito da cidade. Parecia fadada congenitamente ao fracasso. Depois de tantos e tantos anos de alternância dos mesmo lobos guarás de sempre, no entanto, os desgastes se vão tornando insuportáveis. A candidatura de Robledo apareceu, assim, como uma novidade tanto que, rapidamente , os Cangatis e Carrapatos se uniram pela primeira vez na história e apresentaram uma chapa concorrente a Ipueira, tendo como candidato Ronivaldo Cangati e , como vice, Garibaldo Carrapato. Se vencedores, claro, rapidamente brigariam, mas o intuito era tirar a possibilidade de um terceiro vir a dividir o bolo político.
                                   Teria sido, uns cinco  antes do período eleitoral,  que por ali aportou um beato de  barbas longas e  níveas como leite mugido. Vestia-se com roupas de saco , sandálias currulepes. Trazia aquele ar de quem não tomou o gardenal todo :  Olhos aboticados e cabelos desgrenhados. Instalou-se, numa palhoça, numa área próxima à subida da Serra da Jurumenha. Chamava-se Apurinã , tinha voz pausada e cavernosa e vivia, em seus sermões, relembrando grandes catástrofes bíblicas e ameaçando os pecadores com as labaredas do inferno e as sete pragas do Egito. O povo, carinhosamente, o chamava de Pai Nanã. Aos poucos, o beato foi acumulando seguidores, principalmente, quando, um belo dia, anunciou o final dos tempos. O mundo acabaria no dia 28 de Outubro de 1999 de um grande terremoto,  seguido de explosões vulcânicas, fogo e, finalmente, os mares invadiriam as terras num novo dilúvio.  Pai Nanã tivera essa visão , num sonho, em que a Virgem lhe aparecera e alertara: O criador, cansado de tantos pecados da humanidade, resolvera deletar o mundo e, talvez, começar de novo tudo, após um upgrade.
                                   O povo de Matozinho, cansado do mesmismo , empurrou a única porta que  viu à frente para fugir daquela enrascada. Robledo terminou eleito com quase 70% dos votos. Assumiu o governo em 1995, para a alegria de todos, transportando um caminhão de esperanças. Votação tão expressiva carregava consigo uma enorme responsabilidade, eram inúmeras  as demandas da cidade, após tantos e tantos anos de “venha a nós e nada a vosso reino”.    Rapidamente, no entanto, o povo de Matozinho descobriu que tinha trocado égua por biroba. Robledo não possuía qualquer tino administrativo. Envolveu-se com secretários piores que ele. Varava o terceiro ano do mandato e não se contava uma obra só de relevância no município. Postos de Saúde fechados, Escolas sem merenda escolar, ruas esburacadas. Ipueira andava escondido, despachava cada dia em um local diferente, temendo as cobranças.  Daí terá vindo talvez  seu apelido : ” Robledo Manipueira”.
                                   O último ano do mandato do nosso edil coincidiu com a terrível profecia de Pai Nanã. Vendo a cidade devastada, os matozenses descobriram outras razões para acreditar no fim do mundo. Os dias que antecederam o fatídico 28 de outubro daquele 1999 foram de intensa agitação na cidade. Todos carregavam um ar de desespero, como se estivessem perpetrando seus últimos atos . Pai Nanã, uma semana antes, conclamou todos a subirem para Serra da Jurumenha. Acreditava que lá em cima, talvez, houvesse ainda alguma chance de escapar do fogo e da inundação.
                                   Matozinho praticamente esvaziou naqueles dias que antecederam à previsão terrível de Pai Nanã. Uma multidão de maltrapilhos se acotovelava em cima da Serra, esperando as horas finais. Choravam, rezavam, se abraçavam. Pai Nanã exortava a todos pedirem perdão dos seus pecados e exercerem entre si  milagre libertário do perdão. O Dia 28  amanheceu  trazendo, já nos seus primeiros raios, claros sinais do apocalipse vindouro. Uma chuva persistente, com trovões de estalo que simulavam os tremores de terra previstos para logo mais.  O clima entre os fiéis era de gado indo para o matadouro. À tarde, porém, a chuva cessou e o céu se abriu. As horas se passaram sem mais atropelos. Quando o dia 29 por fim chegou, sem que nada tivesse acontecido,  trouxe, junto, uma mescla de alívio e desapontamento. Pai Nanã , desconfiado, tentava entender onde teria errado na interpretação da profecia. Começaram todos a descer a serra. Pela trilha íngreme da descida iam se aproximando de uma Matozinho  arrasada, suja, triste e esburacada e, pior, sem vivalma. De repente, Jojó Fubuia que resolvera , pelo sim, pelo não, providenciar seu próprio dilúvio etílico, com a voz tropa como se sofrera um ramo, virou-se para Pai Nanã e disse, olhando para Matozinho que se aproximava :
                                    --- Pai Nanã, fique triste não, homem de Deus , sua profecia tava certa! Você só errou a forma do acabamento do mundo. Num era de fogo nem água não !
                                   -- Como assim ? -- Quis saber, um Nanã cabisbaixo.
                                   O mundo se acabou foi de veneno, Pai Nanã!  De veneno !
                                   --- Veneno ? Que veneno ? Você tá é bêbado, seu Jojó !
                                   Jojó, então, como um profeta apocalíptico ou apoquetílico , lascou :
                                   --- Manipueira, Pai Nanã ! Manipueira foi que acabou o mundo !


Crato, 19/06/15

terça-feira, 16 de junho de 2015



É A NATUREZA ESTÚPIDO! - José do Vale Pinheiro Feitosa

“Riqueza são aquelas coisas materiais produzidas pelo trabalho humano que satisfazem desejos humanos e podem ter valor de troca”. -  John Atcheson, citando Adam Smith que disse: “Riqueza é material, não podemos considera-la uma habilidade física ou mental humana. Ela é produzida pelo trabalho. A terra tem todas as características, só que não é produzida pelo trabalho. O dinheiro não é riqueza, mas um meio de troca. A riqueza, no entanto, deve ter valor de troca”.


Frase de Delfim Netto no período mais negro da Ditadura Militar, logo após o AI 5, quando ele disse: “é preciso fazer o bolo crescer para depois dividi-lo” se coloca na mais pura falácia do capitalismo segundo a análise de dois séculos feita por Thomas Pikkety. Na verdade, a esperança distributiva do capitalismo industrial avançado, nunca se concretizou e a ideia não é original de Delfim Netto. Dizia isso Simon Smith Kuznets, russo radicado nos EUA que desenvolveu uma curva que relacionava crescimento do produto à desigualdade de renda.

Pikkety destrói a falácia ideológica predominante na guerra fria de que o capitalismo estaria sujeito a um determinante econômico onde o desenvolvimento das suas forças produtivas levaria automaticamente à distribuição de renda. O seu trabalho demonstra que não há uma lei econômica inexorável que conduza à distribuição de renda. E nem à concentração.

O seu trabalho, no entanto, revela muito bem que a porção mais pobre continua tão pobre como há duzentos anos, que neste intervalo surgiu uma classe média que aumentou sua participação na distribuição das riquezas e que os ricos, inicialmente, perderam participação, mas agora concentram mais retirando meios da classe média.

Mas tem um lado importante do trabalho do autor francês: o crescimento médio da economia mundial desde a revolução industrial (1700 a 2015) foi de 1,6% e metade deste crescimento (0,8%) devido ao crescimento populacional. Crescimento mesmo do PIB per capita foi de 0,8%.  Crescimentos mais acelerados só ocorrem em países se recuperando em relação aos outros ou após guerras destrutivas. Quer dizer: se for subtraída a parcela desnivelada e as perdas de guerra, o crescimento é muito menor.
A questão do crescimento, que faz com que uma geração tenha melhores condições que seus país é bem abordada pelo pensador francês, considerando níveis ótimos em torno de 1 a 2% e perigosa a ideia do crescimento zero, quando cada geração ficaria pior que seus pais. Não se esqueçam que crescimento nos termos estudados consideram aumento de população e do PIB real (riqueza sobre o número de pessoas existentes) e por isso taxa de crescimento demográfico zero ou negativa leva a mero consumo das riquezas já acumuladas.

Mas aí vem a questão central quando diz Pikkety: “Melhorar a avaliação e valorização do capital natural é uma questão central. A degradação do capital natural é um risco maior do que qualquer outro. Esta é a verdadeira dívida(...) O problema real é que não estamos em dívida com Marte, mas com o planeta Terra (...). No entanto, um aumento de 2ºC na temperatura do planeta em 50 anos não é apenas um jogo de palavras. E não dispomos de nada para resolver o problema do custo imposto ao capital natural.

E ele continua apontando a questão do meio ambiente na evolução e futuro do capital e seu crescimento: “É preciso levar em conta o que foi destruído, contabilizar o capital natural. Contabilizar o que é criado sem reduzir o que foi destruído é estupidez. Então a reportagem levanta com Pikkety que vivemos num impasse com um capital muito poderoso e uma impressa muito forte.

Pikkety responde - “Tendência passadas sugerem que as coisas podem mudar mais rápido do que imaginamos. A história da desigualdade, da renda, da riqueza e dos impostos é cheia de surpresas. O que vai acontecer ainda é totalmente incerto, e temos vários futuros possíveis. Além disso, há diferentes maneiras de resolver estes problemas: de forma mais ou menos rápidas, mais ou menos justa e mais ou menos cara”.



domingo, 14 de junho de 2015

Sempre no meu coração - José do Vale Pinheiro Feitosa


Porque as fotos coloridas, quando cores não existiam, no filme e na revelação. E elas eram coloridas. Suavemente coloridas, dégradée, assim como as sombras do nosso corpo.

E a correnteza do tempo não é apenas um fluxo vazante. Com frequência a ausência e o intervalo calendário nos comovem em esquecimento. Mas é certo que no recôndito de camadas de anos aquele permanente fato é como um remanso na correnteza.

Assim como as caras, apenas elas, em várias poses, que contam a estética da época, traduzem uma permanência tão sólida como meus dedos digitando estas palavras. As caras nas paredes imorredouras do domicílio de um tempo de gentes e acontecimentos.

E o cinema. Que ideia força a criar imagens! Poses sugeridas das estrelas e estrelinhas de suas salas em plenitude de domingos. E lá estava Marisol na imagem de uma menina da terra.

E os leões da “casa dos leões” ao ladear a entrada para o estúdio. Uma sala de cores neutras, focos de luz, assentos, guardas-luzes, efeitos do clic mais saliente que os arranjos de laboratório (na fase digital o Fotoshop).

Isso é uma era. E não o passado do verbo ser. É uma linguagem viva com integral léxico ao mundo atual. Quem não compreende as palavras não pode se apresentar no escapismo do novo ou do presente. E quem não compreende e desdenha, mostra uma lagoa seca. Sem novas fontes de abastecimento.

Assim como as fotos coloridas de Telma Saraiva, em sua elegância apresentada, ela e as fotos, dizem de um tempo em remanso. Que gira, acumula, retém, sem perder-se rapidamente a jusante.

Como canções que enterneceram minha mãe em seu eterno romantismo. Uma das últimas conversas que tive com ela, um pouco mais do que dezesseis anos de idade, narrava-me todo o enredo de um filme de encontro e desencontro de um homem e uma mulher em plena 2ª Guerra Mundial. Na ponte londrina de Waterloo.

Assim como Ernesto Lecuona, mais um dos gênios latinos da canção do século XX, o cubano compositor de Siboney, Malaguena e Babalu. Qual sua canção que ganhou um Oscar na trilha sonora de um filme. A canção que minha mãe sempre cantava.


Sempre no meu coração. O remanso da permanência sobre o desgaste do esquecimento.  

sexta-feira, 12 de junho de 2015

E OS LADRÕES DA FIFA? - José do Vale Pinheiro Feitosa

“Já alguma vez se perguntaram como é que acontece que estes governos e o capitalismo continuem a existir apesar de toda miséria e problemas causados ao mundo?” – Alexandre Berkman.

E a crise da FIFA?

O FBI mandou prender pessoas de várias nacionalidades na Suíça. Não se sabe quando serão deportados para as cortes americanas, mas já estão sob a tutela delas. Há alguma contradição nesta notícia?

Muitas. Mas uma central: fazer negócio, receber bônus, privatizar bens públicos, fazer lobby e se tornar um vitorioso biliardário é a própria natureza do sistema cuja alma se encontra nos EUA.

Então tome siglas para nos confundir: FIFA, FBI e EUA. Pois é esta natureza sintética das instituições que reproduz a bomba de efeito moral. O mundo está revoltado com os corruptos.

Não com os ricos. Os biliardários não, mas com os corruptos. Mas onde fica o limite entre os dois? Alguém em consciência desperta consegue demarcar?

E tem uma questão clara. Nem um dos mais vitoriosos produtos do mundo consegue esconder um volume tão acelerado e corrupto. Falo da Microsoft. Quantas pernadas, esmagamento, oligopolização, sabotagem praticou e pratica, inclusive com sonegações fiscais imensas.

As corporações lutam pelo domínio do patrimônio geral da humanidade, incluindo os bens tangíveis como solo, água e ar e bens intangíveis como a cultura. Querem cobrar um pedágio universal permanente por tudo que exista, inclusive o ar que se respira. Assim como a telefonia celular que cobra caro para você se comunicar com outro.

E aquela junta de siglas? Corre célere a desconfiança que os EUA, que têm uma vida caríssima, (imensa armada espalhada pelo mundo, bases aéreas nos quatro cantos, milhões de militares, tudo em plena atividade), precisam das reservas feitas por entes privados no fundos bancários.

Por isso os paraísos fiscais começam a entrar na mira tendo que revelar seus depósitos para autoridades americanas. E já começaram a buscar os fundos dos “ladrões” da FIFA. Depois, o americano médio suspeita, vão investir sobre todo tido de fundo de pensão, de renúncias fiscais tradicionais, depósitos individuais e outros mais para compensar o aparelho de guerra montado para manter os “negócios” de siglas como a FIFA.

A pergunta que imediatamente nos afronta. É possível manter um status desta natureza, quando se esfaqueia exatamente aquele meio social que sustentou com trabalho e crença este sistema capitalista? Normalmente é este tipo de fogo que aumenta a pressão até o momento em que o acúmulo entra em ebulição e uma revolução acontece.

Berkman, aquele da frase acima explica: “as pressões vindas de cima (opressão política e econômica); as pressões vindas de baixo (emancipação, ativismo e pensamento crítico); a disseminação e debate de ideias críticas que facilitem a emergência de subjetividades rebeldes (esclarecimento). Este é o ponto de mutação da realidade.

Slavoj Zizek afirma: “Estou convencido que numerosos problemas como os ecológicos, biogenéticos e novas formas de apartheid não podem ser resolvidos pelo capitalismo global.” Uma frase interessante no mínimo.

Hoje se noticia que Israel joga os judeus negros e asiáticos no fundo da escala social. Há o predomínio do judeu branco. Que veio da Europa e nem semita geneticamente deve ser.

Aliás a ideia de raça branca é indissociável do território Europeu. É no território que as etnias se fundaram. Não pelo dedo de Deus.  


O último clique da velha Rolleyflex

J. Flávio Vieira 


“A beleza pode ser vista em todas as coisas,
ver e compor a beleza é o que separa
 a simples imagem,  da fotografia”
Matt Hardy

                                              A aquarela caririense esmaeceu esta semana, quando caíram por terra a câmara e o pincel da nossa querida D. Telma Saraiva. Fechou-se, naquele instante, uma gloriosa página da Cultura do Sul do Ceará, quando plainou , a caminho do infinito,  a última pioneira da fotografia na nossa região. D. Telma descendia de uma plêiade de fotógrafos que , por quase cento e cinquenta anos, vinha registrando, meticulosamente, o cotidiano caririense, as mudanças e os impactos nas nossas paisagens exteriores e interiores. Desde Manoel Biserra de Mello , o primeiro fotógrafo itinerante que por aqui aportou em 1886; passando por Luiz Gonzaga Martiniano da Costa que firmou o primeiro ateliê fotográfico da região em 1901; por Pedro Maia, o artista da câmara mais importante  nos anos 20-30, até Júlio Saraiva Leão que entregou  o bastão à filha; somaram-se, sucessivamente,  os nossos cronistas fotográficos em terras de Frei Carlos. Esta semana, por fim, quebrou-se, indelevelmente, o último cálice de cristal da nossa prateleira. Estilhaçou-se o Daguerreótipo e, por incrível que possa parecer, um daguerreotipo colorido.  

                                   D. Telma descendia de uma tradicional família ligada umbilicalmente às artes . Seu Tio, Cesário Leão, fora ator e músico;  Salviano Saraiva , irmão, um dos mais renomados atores caririenses e , depois, o mais importante fotógrafo de estúdio da capital pernambucana. Sem falar em Júlio Saraiva, seu pai, um dos pioneiros da fotografia no Ceará  e um urbanista dos mais inspirados. A Júlio devemos os mais bonitos cartões postais de Crato nas décadas de 40-60.  D. Telma  nasceu neste berço artístico e teve sua vida congenitamente traçada. Dedicou-se, desde cedo, embebida pelo cheiro do colódio e da prata, à fotografia e especializou-se em fotos de estúdio, talvez porque lhe fosse mais fácil conciliar a arte que abraçava quase como predestinação, às  atividades domésticas. E mais, artista plástica intuitiva, descobriu que era possível sim, associar a fotografia à  pintura, com vantagens vultosas. Conseguia dar cores às fotos ( numa época do preto-e-branco) , tirar possíveis incorreções ou defeitos ( uma espécie de photoshop pré-histórico) e  dispensava as longas seções de pose dos modelos imprescindíveis em caso de pinturas. Essa técnica apurada , nos últimos tempos, terminaram por lhe dar renome internacional.
                                   A Fotopintura  havia sido inventada por Disdéri em 1868 e foi introduzida no Brasil por um dos únicos fotógrafos portugueses da nossa história  : Insley Pacheco. Aqui, no Cariri, a técnica fora empregada pela primeira vez pelo fotógrafo itinerante José Ribeiro em 1904. Telma Saraiva aperfeiçoou a técnica original,  montando-se na intuição e  nos novos avanços tecnológicos da arte fotográfica.
                                   Outro pioneirismo da nossa artista foi de gênero. A Fotografia no mundo sempre foi extremamente masculina.  No Brasil, nos primórdios da arte, apenas uma mulher havia se destacado: Henriqueta Harms que montara um ateliê no Rio de Janeiro em 1851. D. Telma Saraiva  teria sido um caso único no nosso estado e deve ser considerada a grande Dama da Fotografia no Ceará.
                                   Pacientemente, entre os cliques e  pincéis, nossa artista bordou um gigantesco painel iconográfico da região. Sua Galeria  não se encontra fechada entre muros : expõe-se no mural da Chapada do Araripe. Suas fotos estão expostas em milhares de lares,  registrando o verdor dos anos e os sorrisos abertos de muitas e muitas gerações. Foi um prisma que, entre nós, obrou o milagre estonteante da refração.  Hoje, depois do último clique da antiga Rolleiflex, o Cariri todo se dá conta de que,  quando D. Telma pintava as fotos de estúdio, transformando sépias em aquarelas , ela não apenas coloria rostos  e faces sorridentes, ela enchia de cores e de brilho a própria história caririense.  


Crato, 12/06/15    

O UNIVERSO NÃO DÁ MARCHA A RÉ - por José Almino Pinheiro

Das extraordinárias qualidades que Deus dotou o mundo, uma das  principais foi a de que nada tem volta, o universo não tem freio nem marcha a ré, ele gira, explode, expande, encolhe, mas não para, segue sempre em frente. Com esta simples constatação a vida fica mais simples, a convivência melhor compreendida. Como a vida faz parte do mundo, também não para nem dá marcha a ré, o jeito é tocar para a frente. Assim as decisões e escolhas ficam limitadas, mais fáceis de serem tomadas. Recomeçar qualquer coisa que deu errado, provavelmente também não dará certo.  O que precisa é melhorar o que já foi feito. Se brigamos ou sofremos algum acidente não tem como apagar, tem que sarar e tocar pra frente.
A humanidade começou a vida de uma maneira simples, sem muitas complicações além daquelas necessárias para a sobrevivência. Pena que Adão e Eva tenham atrapalhado o idílio Divino. Alguns milhares de anos depois, chegamos aos dias de hoje com guerras, dilúvios, pestes, escravidão, sacanagens de toda ordem para justificar a conseqüente exploração de uns por outros.  
Uma  lição que tiramos disso é que no início, e ainda hoje, nos aglomerados humanos um pequeno grupo de privilegiados manda e explora a imensa maioria, usufruindo e acumulando praticamente sozinho o resultado do trabalho da maioria. Mas, como o mundo não para e a luta pela sobrevivência continua, sempre ao custo de desesperadas lutas por uma divisão mais justa do produto do trabalho e das riquezas, a classe dominante, a contragosto, tem que ceder privilégios. Países antes com monarquias absolutistas, para sobreviverem, tiveram que mudar para monarquias parlamentaristas. Lembrando que algumas delas perderam a parada e hoje são repúblicas.
Infelizmente o avanço não é uniforme, mas não para. Por exemplo, no caso do Brasil, a escravidão foi extinta oficialmente em 13 de maio de 1888; após 55 anos, em primeiro de maio de 1943, veio a CLT - Consolidação das Leis do Trabalho - que alguns especialistas consideram como as primeiras leis “complementares” à Lei Áurea. A CLT aos poucos se aprimora como com a Lei de 19 de dezembro de 2000 que proíbe o trabalho infantil, e mais recentemente, em 26 de março de 2013,  com a  aprovação da Emenda Constitucional nº 66, a chamada PEC das Domésticas. De forma que passaram 125 anos para que, finalmente pelo menos na lei, todos os trabalhadores tenham os mesmos direitos.

Como mostra a história, não é difícil imaginar que o esforço das classes dominantes para manterem sozinhas os privilégios é uma luta perdida. Nessa guerra, no máximo ganham tempo. 

O VELHO "LENGALENGA" - José Nilton Mariano Saraiva

Definitivamente, a “tucanalhada” raivosa (e simpatizantes) não têm mesmo jeito: só foi o governo anunciar seu plano de “concessões” para alguns setores, a fim de injetar o necessário oxigênio-financeiro na economia, para que voltassem com o lengalenga de sempre, a surrada e batida conversa mole das “privatizações”.

Claro que o objetivo maior é confundir os incautos, porquanto até eles, que se consideram “experts” na matéria, involuntariamente “escorregam” quando tratam do tema, como restou constatado quando a notícia foi veiculada no tal Jornal Nacional: numa hora, no mesmo bloco, o “ledor de notícias” (o tal do Bonner) se referira à decisão do governo de “privatizar” para, na sequência, usar a expressão “concessão”.

Por essa razão, é necessário que a coisa seja posta à mesa “tim-tim-por-tim-tim”, da forma mais didática possível, na tentativa de encontrar entre a “tucanhalada” (e simpatizantes) uma mente aberta ao diálogo, um ser vivente desprovido das amarras do sectarismo e intolerância, que a nada levam, mas que parece ter feito morada entre os agitados “bicudos”.

Pois bem, saibam que “privatizar” é negociar o patrimônio público e entregá-lo de FORMA DEFINITIVA a quem por ele se interessar, independentemente que seja uma pessoa física (individual) ou uma entidade jurídica (coletiva), a fim que a partir de então, como legítimos donos, o usem como bem entender: podem repassar a um terceiro, mudar de ramo, demitir todo mundo e, até, acabar com o negócio se assim preferir; em palavras outras, pelas vias normais (jurídicas) não há a menor possibilidade que aquele bem volte a ser do governo. Exemplos: a CSN, uma empresa com extraordinário potencial de se desenvolver, já que detentora de uma “matéria-prima” que o mundo todo necessita (minério), foi entregue pela “tucanalhada” de mão beijada à iniciativa privada, com o criminoso argumento de que o “apurado” serviria para ajudar no pagamento da dívida externa; já o setor de “telecomunicações” foi “doado” ao mafioso Daniel Dantas, que até hoje não tem onde colocar tanta grana, em relação ao que foi investido. O tal “apurado” ??? Ninguém sabe ninguém viu, enquanto a tal dívida externa cresceu exponencialmente. O que se sabe é que muitos “bicudos” ostentem hoje um “patrimônio-marombado” em relação ao que detinham antes do ingresso no governo de FHC.

Já a “concessão” é uma espécie de TRANSFERÊNCIA PROVISÓRIA da posse de um determinado bem ou atividade econômica, com preço,  regras e prazo definidos (numa linguagem mais popular e rasteira, mas de melhor entendimento para os que não manjam da atividade econômica, poderíamos até usar a figura do “aluguel”), ao final do qual o vencedor da licitação (espécie de locatário) devolverá ao locador-proprietário (verdadeiro dono) aquele bem que temporariamente lhe foi outorgado ou “concedido”, inclusive com todas as eventuais benfeitorias que lhe tenham sido agregadas. Exemplos: pelos aeroportos, ferrovias, portos e estradas que o governo está agora “concedendo”, a iniciativa privada pagará ao governo um preço justo para explorá-los por determinado tempo e, ao final dos respectivos contratos os devolverá ao governo.


Portanto, é chegada a hora de acabar com essa embromação de tentar incutir na mente dos desavisados certas babaquices sem fundamento, e de encarar com seriedade e responsabilidade as momentâneas dificuldades que o país atravessa (não esquecer de lembrar ao “playboy” do Leblon, o tal Aécio Neves, que a eleição já acabou,  e não há possibilidade nenhuma de um terceiro  turno).

quinta-feira, 11 de junho de 2015

Miragem

por Vera Barbosa



Foi assim que a viu...

Como um horizonte aberto para um passeio de trem. Foram longos minutos mergulhando naquele olhar, tentando decifrar os atalhos. Embarcou e, por alguns segundos, avistou as mais belas paisagens. Pinceladas densas de um céu de sol ao entardecer. Crepúsculo de Van Gogh! Impressionada, atentou ao detalhe da mão. Entre as memórias eternizadas, avistou a marca da aliança. Mesmo assim, tocou-a. Carícias, enquanto se olhavam profundamente. Fitou-a mais uma vez antes de atrever-se no silêncio de um beijo - sem resposta. Recuou e despediu-se. Partiu levando consigo apenas o calor de seu olhar...

Flores Fechadas - José do Vale Pinheiro Feitosa


Flores fechadas. Grilos se repetindo ao infinito. Uma brisa que se injeta até aos ossos. Como este bocejo que diz inútil despertar-se numa potência de sono.

Luzes da cidade. Uma trilha a iluminar o vazio das ruas. Os operários acordados na madrugada para embarcar na condução até o chão da fábrica. Estas cidades dormitórios, que abrigam os leitos daqueles que apenas deitam em si no final dos tempos. Ademais vigilam seus corpos e mentes na mais valia dos sócios das máquinas.

Os ônibus, qual tamanduás sugando formigueiros, recolhem a mão-de-obra em seu vente para depois solta-la bem em frente ao relógio de ponto. E até se imagina que os pardais tornam a copa de alguma árvore uma zoeira só em denúncia das madrugadas acordadas.

O peso desta quadrilha puxada pelo trabalho e capital, numa luta de classe que torna a madrugada um escoadouro de lamentos e profundidades. Profundidades que não conscientizam, ao contrário, apenas é uma armadilha a quebrar as pernas dos transeuntes da história.

E siga-se além ou aquém destes personagens notívagos nas franjas dos momentos finais da noite longa, fria e escura. E tome-se a trilha das dunas, suba e desça como um pássaro lutando para se manter no ar.

Ofegante no mais alto destas montanhas móveis, tome o olhar que não lhe escape da realidade. Jamais ela lhe desamparará em conteúdo desta história crônica e mortal. Sempre lembrará destes destinos usados e abusados até o limite do tempo vivido e perdido no contracheque que lhe compra o tempo por si inventado.

E então descubra que afinal no limite da sede e da fome, ainda lhe resta esta consciência: o tempo quem inventa é você. E o tempo é a matéria prima onde a onipresença do dinheiro se inventa.

E sinta. Por estas terras, lagoas, ventos e mares, o sol iluminou as cenas de humanos que mediavam a vida diretamente, mesmo quando deuses se interpunham. Mediavam sem necessidade de tudo ser mediado pelo dinheiro.

Assim como pelas meninas dos meus olhos as flores se abrem, os grilos se calam e lá no meio do imenso e belo Oceano Atlântico, o sol surge em luz. Explodindo raios por todas as brechas das nuvens.


Surge criando um rastro iluminada nas águas que nunca param, apenas mudam de cor como a revelar que nada permanece a mesma cor. Que “é de manhã vem o sol, mas os pingos da chuva, que ontem caíram, ainda estão a brilhar. ” 

quarta-feira, 10 de junho de 2015

Semente

por Vera Barbosa


você me olhou
jardim plantado
(silêncio)
colheu a flor
da minha poesia


segunda-feira, 8 de junho de 2015

Crato diz adeus a uma das suas mais ilustres damas:Telma Saraiva!




-Arte eternizada!
Seu trabalho ficou reegistrado no coração e nos álbuns das nossas famílias.
Grande lacuna.Imensa saudade

sexta-feira, 5 de junho de 2015

A Bandeira do pau

                
Santo Antonio de Pádua tornou-se um dos  mais populares santos brasileiros. Nascido em Portugal, no Século XII, teria sido contemporâneo de Francisco de Assis e, numa vida missionária,  terminou consagrado como um dos maiores pregadores da Igreja Católica. No Brasil, talvez por conta da sua origem lusitana, terminou por se firmar num dos nossos mais amados santos.   Antonio é invocado em inúmeras situações dramáticas : na infertilidade, nos naufrágios, como protetor das grávidas, dos idosos, dos agricultores, dos amputados, dos animais e tido, no Nordeste, como um verdadeiro elixir contra o celibato.
                        Conta o folclore que ele  teria obrado inúmeros milagres,  entre eles  haveria restaurado todo um campo de trigo já maduro que havia sido estropiado por uma multidão que o seguia. Inúmeras cidades brasileiras o tem como padroeiro, entre elas, a nossa aristocrática Barbalha que há quase noventa anos realiza a sua tradicionalíssima Festa do Pau da Bandeira. As festas religiosas brasileiras carregam consigo aquela mescla típica do profano e do sagrado. Talvez por tradicionalmente terem advindo   das festividades pagãs da Idade Média como a Saturnália e as Celebrações de Fertilidade. Assim,  as  novenas e rezas se juntam a rituais pagãos que vão desde a libações alcoólicas ( “A Cachaça do Seu Vigário”), ao uso do pau da bandeira como símbolo fálico, à coreografias  eróticas em torno do prodigioso vergalhão.  A Festa se assemelha às celebrações de fertilidade ainda hoje presentes no Japão como a Hime no Miya e a Hounen Matsuri.
                        O Pau da Bandeira de Barbalha é , indiscutivelmente, uma das mais concorridas e bonitas festas populares do Ceará. Tem crescido de ano a ano, a cidade toda se enfeita e se engalana para a chegada do Santo casamenteiro. Claro que, numa festividade de tamanhas proporções, sempre existem riscos proporcionais ao público  por ela atraído. Este ano, ocorreu a trágica morte  de um dos carregadores do pau , o Sr. Cícero Ricardo, esmagado pelo imenso tronco durante o transporte. Havia já antecedentes de acidentes idênticos, com fraturas expostas em alguns participantes em anos anteriores. Haviam ocorrido, também, outros acidentes fatais com morte em  carregamentos de paus de santos, como em Caririaçu alguns anos atrás.
                        Em nome da tradição, argumenta-se sempre sobre a necessidade imperiosa de manter o script da festa, exatamente como se vem fazendo nos últimos noventa anos. Existem, no entanto, a meu ver, ponderações que precisam ser feitas. Tudo na vida é dinâmico e, se se reparar bem, a festa mudou imensamente durante todos esses anos. Além de tudo, não é justo se manter culturas nocivas sob o simples argumento que Cultura é para ser preservada. Os sacrifícios humanos fizeram parte de muitas civilizações , nem por isso hoje se defende a sua manutenção. Nossos  índios eram em grande parte canibais, essa Cultura deveria ter sido preservada ?  Por que Cristo se pôs contrário ao apedrejamento de adúlteras, se aquela selvageria era uma profunda tradição entre os hebreus ?
                        Acredito que não existem justificativas plausíveis para a derrubada anual de uma imensa árvore apenas pela simples alegativa da tradição da festa. O Ibama , o governo do Estado, a Prefeitura de Barbalha e a Igreja  têm o sagrado direito de interceder contra esta barbárie. O próprio Santo Antonio teria recuperado todo um campo de trigo , preocupado com o impacto ecológico. É justo, em seu nome, perpetrar anualmente um crime ambiental ? Por que não usar o mesmo angico centenário  deste ano, nos próximos cem ? Teríamos ainda a vantagem de duplicar a festa :  o fincamento do pau no início e a retirada no final das festividades.
                        Quanto à morte de Cícero Ricardo , as autoridades se adiantaram em afirmar que se tratou de uma fatalidade. Para mim, o acidente era  totalmente previsível. Imaginar o transporte de uma árvore de muitas toneladas, por muitos quilômetros , embalada por uma multidão de penitentes , na sua maior parte inebriados pela “Cachaça do Seu Vigário”, tendo que periodicamente pôr abaixo o imenso vergalhão, num movimento que necessita de precisão cirúrgica, certamente se trata de uma fábrica de acidentes. Por que não utilizar métodos mais modernos de transporte em que a segurança seja a principal normal a ser pensada ?  A festa agora envolve um público gigantesco, se comparada a anos atrás, a segurança de todos deve ser prioridade absoluta para evitar as famosas fatalidades previsíveis.  A integridade física dos festeiros deveria ser a principal bandeira do pau.
                        Ademais, numa festa de tamanho vulto, faltaram as blitzes  com seus bafômetros. A sensação que temos é que há ingerências políticas, fazendo  com que a polícia rodoviária maneire , lave as mãos , sob pena de prejudicar a diversão do pessoal. Quantos motoristas saíram da Barbalha sem a mínima condição de dirigir , pondo em risco não só suas vidas mas a de outros transeuntes ?  O Código Nacional de Trânsito não tem aplicação prática nas grandes festividades nacionais ?  
                        Diante da pretensa fatalidade, o público sequer se compungiu com o acontecido. A diversão continuou. Depois, sentada a poeira, as opiniões divergiram. Os organizadores sacaram a versão do fatalismo: o acidente estava escrito nas estrelas. Os incréus lembraram de imediato da pouca capacidade milagreira do Santo que sequer conseguira proteger seu pupilo Cícero Ricardo. E os crentes, preocupados com o profanismo da festa, sacaram o Velho Testamento e comentaram, abertamente, o acidente fatal como um castigo dos céus. À frente de tudo, no entanto, encontra-se o Estado, nas suas mais variadas instâncias,  que tem como função precípua proteger a população e dar-lhe a segurança necessária . Há necessidade , sim , de regulamentar a festa, de criar mecanismos para que acidentes previsíveis e evitáveis  não aconteçam. A Igreja, por sua vez, que tem, historicamente, o mando da festança, precisa tomar as rédeas da solenidade, pois o princípio básico de qualquer religião é sim a preservação da vida. O que aconteceu no último domingo não foi uma mera fatalidade, apenas a Crônica de uma Morte Anunciada. Outras tragédias continuam plantadas esperando a floração, regadas, ano após ano, pelas águas de uma perniciosa tradição. Quantos sacrifícios serão ainda necessários até descobrirmos que a Vida ,sim,  é que é a maior    festa ?

J. Flávio Vieira

Crato, 05/06/15 

terça-feira, 2 de junho de 2015

ZÉ DE TOM-IN - José do Vale Pinheiro Feitosa

Zé de Tom-in é o mais completo exemplo de um projeto perfeitamente executado.

Um projeto de feiura. Desmantelo de fim dos tempos.

Quando me deparei com a marmota foi aquele Louro da Oficina dizendo: “olhe ajude este desgraçado que a mãe não cuida dele de jeito nenhum. O outro irmão até já morreu de fome!”

Zé de Tom-in para resumo da estampa é mais ou menos assim (e pode botar menos): a bunda é murcha como se arriasse para dentro das pernas, tronco curto e uma cabeça que teima em ser maior que o resto. E os faróis da alma? São duas boticas saltadas como a feitura acabada daquele que os pais prometiam aos filhos: “Doca do Oião”.

E não fica nisso não! Zé tem orelhas de humilhar dois abanos. Aquele conjunto além do mais é de pouca estatura. É o tipo mínimo no tamanho e grande na estampa do que representa.    

E peguei o arremedo estético e entreguei para Catarina. Ela amamentava uma filha e Zé podia receber algo por aquelas mamas. E não foi que recebeu. Zé de Tom-in tem uma coisa, é feio no arranjo externo, mas tem uma gana de viver como ninguém.

Ora, ele se aproveitou dos peitos de Catarina como a verdadeira ponte entre o último suspiro e o fungado da satisfação. E assim Zé passou por todas as fases que a vida nos dá. Virou meninote danado, depois, sem mudar muito de tamanho, assumiu estampa de adolescente e pronto para deixar semente no mundo.

E deixou, o desgraçado. Catarina já teve uma prole de Zé de Tom-in, assim como a irmã de leite já está para parir.

E Zé sempre por ali, entre um prato de comida e um útero para juntar a herança dele com alguém que valorize a libido do danado, sem levar em consideração o apanhado físico resultante.

E assim Zé vai misturando o que lhe é abundante com a temperança de alguma beleza fêmea para agrado dos olhos.

Zé de Tom-in continua sendo um bom sujeito, embora de vez em quando some aquela irritação da raça Pinscher no seu diálogo conosco.


Esta narrativa me foi oferecida pelo Jansen, funcionário aposentado do BB e hoje concorrente no abate e distribuição de frangos em Paracuru. 

segunda-feira, 1 de junho de 2015


Crato: Acontece de 04 a 07 de junho de 2015 a XV Exproaf Cariri

Única feira do interior do Ceará dos produtos da agricultura familiar, a Exposição de Produtos da Agricultura Familiar – EXPROAF chega a sua 15° edição. Criada pelo Sindicato dos Trabalhadores Rurais do Crato, e hoje gerenciada pela FETRAECE- Federação dos Trabalhadores na Agricultura do Estado do Ceará, a Exproaf surgiu com o objetivo de integrar as atividades agrícolas e produção da agricultura familiar, além de ser um espaço de formação na linha de cooperativismo e associativismo e troca de experiência produtiva.

O evento acontece de 04 a 07 de junho de 2015, no recinto do Parque de Exposição Pedro Felício Cavalcante em Crato, com a presença de produtores rurais de toda a região e autoridades. Ao longo dos anos, a Exproaf vem consolidando-se como o maior evento da agricultura familiar do interior do Estado do Ceará, voltado para a exposição, divulgação e comercialização dos produtos de origem familiar.

A reportagem do site caririceara.com conversou com o coordenador da Fetraece Cariri Jonathan Magalhães sobre a feira. 

sexta-feira, 29 de maio de 2015

Coração de Clorofila.


O médico assassinado na lagoa e ambientalista, nada...
A mãe de família assassinada na porta de casa, e ambientalista nada...
A "novinha" estuprada, e a ambientalista nada...(ainda bufou contra o machismo)...
O estudante assassinado no bar, no ônibus, na garagem, quando saia de casa, quando entrava, quando tomava banho, quando comprava pão, quando tomava a hóstia...e ambientalista nada...

Mas no final de semana a ambientalista sai no jornal, pomposa em seu estandarte, faceira frente a TV em plena atividade. Furiosa contra a consciência do mundo, gente sem coração.
Acabara de estourar uma rinha de canários e galos de briga. Agora sim, poderia dormir tranquila e sonhar com bichos e florestas em seu colo verde que agora arfava mais calmo em seu coração onde bombeia sangue a base de clorofila.

terça-feira, 26 de maio de 2015


O Pecado de Clarice. Antonio Sávio.


Sempre são cinco da tarde na casa de Armando. Embora o tempo seja incerto, é certo que lá o tempo não passa, ou, pelo menos do modo como passaria em outros lugares. O lá, a que me refiro, é uma vila pretensiosamente burguesa, ou, para ser mais atual, rica. Na realidade não passa de um conjunto de casas pequenas enfiadas ao pé de uma serra no Ceará.
Evidentemente essa pretensa burguesia, que mimeticamente toma chá das padarias caras do centro as cinco horas -não aquelas da casa de Armando, mas de fato cinco horas -, tem sua teia de angústias, de dissabores, que no mar do sofrimento humano se resume a pequenez da inveja, da mentira e da frustração.

Armando que apesar de residir nesse mesmo ninho, onde por sinal sua família é uma das mais evidentes. Suas tias são empresárias de renome, outras donas de escolas, a mãe proprietária de uma infinidade de casas, cujas quais aluga e se mantém através delas. O pai, uma cicatriz que não para de sangrar na face da família, é conhecido como João. 

Na realidade João é um antigo celibatário, primo distante da família, que, nos idos anos setenta, a família vendo-se a jovem Clarice grávida, filha de família nobre, e, para piorar grávida de um filho que resultou de uma bebedeira cuja qual sequer pôde identificar o pai, optaram por arranjar um que, ao contrário do que era de costume, não foi as pressas.


- O que está feito está feito Clarice, não adianta chorar. O que nos resta agora é achar uma maneira para que seu nome de puta não se espalhe por todos os cantos.

A sutileza de fato não era uma prioridade de Armínia, que, não por falta de talento, mas por falta de paciência assim se expressava. No fundo era de fato uma pessoa reta, autêntica e verdadeira, e sabendo sua consciência disso, não aliviava com ninguém.

Sua mãe chorava pelos cantos, e olhava Clarice como a uma leprosa. As narinas se dilatavam em uma raiva indizível. Era algo que a violência física seria uma simplificação do seu sentimento. Ademais, não havia nada mais do que um saco de rugas em uma consciência ainda que afiada.


- Quem é o pai disso aí que está em tua barriga Clarice. Diz logo!

Com a boca entreaberta, sentada em um sofá de teias de vive de braços laçando as pernas e joelhos na boca, nada dizia. Apenas sentia as palavras como dardos e os olhos que ardiam como fogo lacrimejavam sem pressa. Na realidade Clarice estava em um estado de consciência paralelo, onde pouco do que lhe diziam era retido, mas que pesava em seus ombros um sofrimento sem par.

Clarice não sabia quem era o pai da criança. Apenas lembrava que em um sábado depois do carnaval havia ido a uma festa depois da escola. Ligou para a mãe do centro da cidade dizendo que demoraria: Passaria em um armarinho com as amigas, faria deveres escolares na casa de outra, a noite todas iriam ao cinema, e antes das dez como sem falta estaria em casa.

De lá atravessaram o centro, meteram-se em um bairro distante onde debaixo de um pé de mangueira em uma chácara, uma festa regada a vinho e cerveja ela que ninguém conhecia, se deixou levar pela bebida, pelo riso fácil, pela simpatia serpentina de um ruivo de olhos verdes. Lá, dentro de uma Rural velha, atolada atrás das bananeiras o concebeu. 

Enxugando as lágrimas lembrava da cena e nada dizia. Beatriz, que até então estava calada, tremendo as penas sentada, enfiando o dedo anelar na madeira do centro até estalar pela sala em um compasso impertinente e repetitivo, levanta. Bebe água de um filtro de barro vermelho em uma caneca de alumínio com seu nome sugere:


- Joãozinho bem que poderia ser o pai.

A sugestão solta como uma pedrada deixa todas atônitas, excitadas e inquietas. Cada uma achando mais absurdo que a outra. Armínia e a mãe entreolham-se como se afinassem a um instrumento. O nome de fato era perfeito. Joãozinho era um primo segundo que apesar de metido com coisas da igreja, claramente desejava Clarice. 
Nas festas em sua casa Joãozinho atendia a todas em uma educação e refinamento tipicamente francês, lembrava Armínia, que nunca conheceste um francês na vida e tampouco sabia sequer a capital da França. O olhar apesar de faminto, não era corajoso o bastante para fitar. Contido, acabava ela passando por mais malicioso do que de costume, sendo forçado a olhar para o corpo da menina – não que ele também não quisesse – que se espremia em um vestido de brim branco azulado.

Beatriz completa:

- Não sei e nem quero saber quem é o pai disso aí, mas, que ele tem que ter um pai ele ter que ter. Nem que nos o fabriquemos agora mesmo. Se é para escolher, que seja o Joãozinho.
Falava apontando para a barriga do irmão como se a criança tivesse alguma coisa da situação, ou pior, como se por isso mesmo tivesse ela algum direito de humilhar a irmã. Na realidade tinha. Não só ela, mas toda a família. 

Armínia que junto com a mãe, sorriam com os olhos. Já entendiam que de algum modo, o pobre João, menino devoto, que como único pecado tinha o de ser humano, e ter lá, em seu canto, sem dizer palavra, seus desejos que escorriam por vezes pelas retinas. 
Setaram-se à com os cigarros em brasa e cinzeiros cheios. Tiraram o ganço de louça que enfeitava a mesa e puseram-se a armar a ocasião que Clarice seria molestada. Isso era sujo, era feio, mas, frente a situação, se justificava. A mãe dizia em silêncio para si: - Nosso senhor há de entender.


- Próxima semana terá o aniversário de Bianca, nossa prima em comum. Provavelmente será na casa da serra, onde geralmente fazem as festas. Encontrei com Dona Roberta no centro e ela já me fez o convite. João estará lá com a família. Sempre educado e disposto como sempre.

- Sim, e onde entra essa “bendita” moça nisso? Beatriz, você não vai nos meter em um escândalo.

Sorria timidamente constrangida pela própria ideia, mas ainda assim:

- Só posso dizer que com minha ideia arrumo um pai para a criança, um marido para ela. Ninguém aqui tem a opção de escolher com escândalo e sem escândalo. Vai com escândalo mesmo.

A mãe que a princípio simpatizou com a firula começou a não gostar. Isso tudo mexia com sua moral tanto quanto a vergonha da filha, grávida de um filho sem pai. Repetia para si mesma: - Sem pai!

- Olhe Beatriz, se você supõe resolver um pecado com outro pior, fique sabendo que lhe coloco para fora de casa antes dessa… - olhava para Clarice com um furor nunca visto antes – antes daquilo ali.

A essa altura, Clarice já a muito tempo havia perdido a identidade. Não era mais Beatriz, era um objeto tão abaixo dos outros que compunham a sala que nem nome tinha. Logo o plano ficou exposto, o que não era nada sutil ou elaborado, mas nem por isso deixava de ser ousado.
A ideia é que na próxima festa em família, os olhares chorosos de do casto rapaz seriam atendidos, e não só sob um ponto de vista parcial. A irmã autoria da ideia enfatizava com a fanhosa fazendo um círculo com o indicador e o polegar na mão direita:


- Ele vai ter tudo que ele sempre quis. Tudo! Ouviu? Eu disse tudo!

Cabia a jovem mãe fazer de sua beleza um chamariz para Joãozinho, que por sua vez, levado entre um gole outro de bebida, deveria ser arrastado para algum local discreto. Na realidade, nem precisava consumar o ato, mas, fazer com que ele chegasse o mais próximo possível de perder o controle, simulando assim não um estupro propriamente dito, mas um deslize.
A mãe já coautora contribuía:

- Essas coisas acontecem dia e noite. Não seria incomum ele perder o controle e tentar agarrá-la. Muito menos seria ela ceder, como de fato já aconteceu sabe Deus com quem.


A verdade é Clarice já erguida perto da mesa onde se dava o estratagema recusava-se a acreditar. Olhava para mãe e irmãs sem reconhecê-las em suas personalidades. O encanto se desfizera com a notícia de sua gravidez por todas as partes naquela família. Não só ela se revelara uma inconsequente e pecaminosa, mas na mesma oportunidade, e quase tão rápido quanto, mostrou-se o número de sepulcros caiados com quem convivia. 

A irmã, capaz de comprometer a vida de um rapaz cujo qual só lhe direcionara respeito, educação, atenção em todas as oportunidades. A mãe mostrou-se um misto de tudo que ela mais desprezava. Falsidade, oportunismo, tudo em prol de uma boa aparência perante os outros, Quis chorar mas dessa vez a raiva quem lhe tolheu as lágrimas. 

Dias depois estava ela, a mãe e as irmãs na festa. Dona Roberta as recebia prontamente junto com a filha Bianca, já de fitas nos cabelos e os pés imundos de barro. Jamais saberia que a festa de sua filha não passava para aquela família simpática e sorridente de um mero alçapão para casamento.


- Clarice, já o vi atrás das barracas lá atrás. É certo que ele também nos viu. Você já sabe o que fazer. Tire-o da vista de todos, dois ou três copos de cerveja e pronto. Ele vai esquentar feito brasa, - e repetia com a mãe fechada em uma figa - feito brasa!

- Não vou fazer isso Armínia. Eu não consigo. Eu não quero.

A mãe beliscando-a pelas costas tremendo-se toda fala:

- Ninguém está nessa festa idiota por quê quer sua vagabunda. Nós só estamos aqui por sua causa, e para lhe fazer o favor de não deixar que saibam quem você realmente é. Ninguém aqui está lhe pedindo nada. Você vai fazer o que eu mando, se não eu arranco esse moleque de sua barriga com as unhas.
Sentiu latejar os músculos das costas costas calada. Os olhos fizeram-se em brasa no mesmo momento, mais ainda do alto da dignidade que lhe restava concordou. Rapidamente saiu e acenou para o casto. Joãozinho apareceu sorrindo e com um terço minúsculo entre as mãos. Saíram de perto de todos, conversaram alegremente.

De longe via-se Clarice colocar os dedos no nariz do rapaz. Este, por sua vez gargalhava indiferente para o mundo. Parecia mentira que em uma tarde daquelas a felicidade apresentar-se-ia para ele assim, facilmente, ao seu alcance como uma fruta pronta para ser colhida.

Em seu vestido de renda, caminhava com ele por toda a casa e jardim. Em cada canto, quando não vistos, bebiam alguns goles de cerveja preta. Ela, ainda trêmula de ira com plano que se fez sobre sua vida, onde de protagonista de uma história passou a ser um pião em tabuleiro, passou a odiá-lo a cada riso. A cada toque que ele tentava parecer acidental, mais o nojo daquilo tudo exalava. Pela janela dava para contemplar a satisfação que suas irmãs assistam ao teatro que ela representava.
De súbito o carregou para o fundo da casa onde não havia ninguém. O beijou sofregamente. As mãos de Joãozinho trêmulas teimavam com a tentativa de parecer seguro, de ser homem, de mostrar-se merecedor daquilo que tinha em mãos. Tudo inútil, tudo disfarce. Ela também era uma mentira de homem. Sem que ele visse, ela observou as ferramentas grudadas em um quadro de madeira atrás dele. Uma ideia estranha pousa-lhe a mente.

A mão de veludo pousa sobre uma chave de fenda. João, no delírio da própria carne não sentiu o primeiro golpe. Sente algo frio escorrer pelo pescoço quando olha de repente. O segundo entra em cheio peço pescoço e o terceiro no peito. Assim foram mais cinco por todo o corpo. Clarice se afasta para observar sua obra. O sangue se esvai abafado pelo barulho da festa escorrendo pela grama rala. Eram cinco da tarde e o tempo parecia ter parado. Parecia que em sua mente se repetira todos os fins de tarde que já vivera. O tempo se cristaliza as cinco da tarde. 
Antes que alguém visse levanta o arame e some atrás da casa vizinha. A contorna e ganha a rua. Não dera nem cem passos e ouvira os primeiros gritos. A festa em pânico com o casto nos braços, mas já era tarde. Joãozinho nunca estivera tão no diminutivo quanto agora. Clarice estava livre. Seria mãe de um menino chamado Armando.


Antonio Sávio. 2015.