por José do Vale Pinheiro Feitosa




Viva junto à alma mais próxima e compreenda que a proximidade é a medida da distância. Que a distância que os separa é este movimento maravilhoso da matéria e da energia. A maravilha é apenas esta surpresa porque esta proximidade é tão diminuta entre os dois e é a inesperada distância.

José do Vale P Feitosa



sexta-feira, 12 de abril de 2013

Pilates



 Pilatos perguntou: Que farei então de Jesus, que é chamado o
Cristo? Todos responderam: Seja crucificado!
 O governador tornou a perguntar: Mas que mal fez ele? E gritavam
ainda mais forte: Seja crucificado!
Pilatos viu que nada adiantava, mas que, ao contrário, o tumulto
crescia. Fez com que lhe trouxessem água, lavou as mãos diante do
povo e disse: Sou inocente do sangue deste homem. Isto é lá convosco!
Mateus 27: 22-24


                                   François não se abalou muito quando a notícia chegou subitamente à Delegacia , trazida por um desses meganhas de plantão. Assumindo aquele cargo há mais de dez anos, já se acostumara com o cheiro forte de sangue, correndo e fervendo pelo asfalto quente, em feitio de chouriço. Se os homens carregavam consigo um anjo e um demônio, ali , naquela seccional do inferno, não dava para perceber a face angelical. Viera substituindo o delegado anterior , aquele que tivera uma administração eivada de denúncias múltiplas : roubo, cumplicidade com o crime organizado, tortura de prisioneiros, vistas grossas para prostituição de menores, preconceito nas ações repressivas . Possivelmente fora escolhido não pelo histórico favorável de pureza e lhaneza de trato. François carregava consigo o mesmo pecado original : durão, não poucas vezes julgara pretensos bandidos à pena de morte e executara a penalidade sem nenhum remorso. Comparava sua função a de um urubu : “Temos que comer a  carniça e livrar a sociedade do mal cheiro! Mesmo assim todos vão ter nojo de nós !” Nosso Delegado tinha uma qualidade que o fazia bastante singular. Era tranqüilo,  transparecia uma aparente  calma budista, educação e segurança e possuía grande traquejo no trato com a mídia. Seus superiores tinham, em mãos, o candidato ideal : um esgotador de fossa séptica que conseguia não se imantar de qualquer cheiro pútrido.
                                   A chegada do samango, meio aflito, naquela tarde de sexta feira, não o tirou do sério. Com palavras que quase se abalroavam umas nas outras, contou o ocorrido. Estava havendo um grande B.O. , naquele momento, no centro da cidade. Um adolescente furtara um celular de uma vitrine e saíra em desabalada carreira. Várias pessoas presenciaram o ocorrido , firmaram trincheira e se puseram , na perseguição do menor. Cercaram-no na praça principal da cidade. O soldado tentara conter a turba, mas sozinho, corria o risco de entrar no pau, também. Viera então pedir ajuda ao Delegado para juntar contingente e evitar o pior.
                                   François levantou-se sem atropelo. Estranhamente, chamou apenas o seu subordinado e partiram céleres para praça, a apenas uns cem metros da Delegacia. Poderia ter arregimentado outros soldados, mas preferiu enfrentar a questão sozinho. Em lá chegando, deu de frente com os preparativos do massacre. No chão, um menino todo ensangüentado, olhos injetados de terror. Ao derredor,  a turba enfurecida , incontrolável, a espezinhar e chutar seguidamente o rapazinho. François tomou a frente e pediu calma que a justiça estava ali representada. A multidão, porém, como um estouro da boiada , não lhe deu ouvidos. O delegado estava armado e ainda pensou em dar um tiro para cima para amedrontar os circunstantes. Mas depois ponderou consigo mesmo : tinha que respeitar a democracia, a maioria sempre tem razão, não é mesmo ? Ademais, não existe crime possível cometido por tantas pessoas ajuntadas. Ele, por outro lado, fizera já a sua parte, bem que tentara, mas não conseguira evitar , né ?  Nisso , um paralelepípedo foi arremessada na cabeça do pobre infrator , como um golpe de misericórdia. O sangue espirrou . Algumas gotas terminaram por tingir a roupa e os braços do delegado. Ele saiu, calmamente, e lavou as mãos na fonte da praça. Saiu conformado. Bem que tentara ! Alguma coisa porém travava o seu peito, como se tivesse ali uma porta de ferro com tramela.
                        À tarde, deu uma esmola de dez reais a um mendigo que o estendera a mão na rua.  Saiu leve e reconfortado. Não fizera nada, afinal ! Fora apenas um mero espectador. Sou uma pessoa simples e caridosa , pensou com seu cassetete,  preenchendo um silêncio esquisito que ecoava de dentro da alma. Entrou na academia e foi fazer Pilates !

J. Flávio Vieira

quinta-feira, 11 de abril de 2013

Justiça, ainda que tardia. - Por Carlos Eduardo Esmeraldo


A chamada PEC das domésticas, emenda constitucional que veio igualar essa categoria de empregados aos demais trabalhadores regidos pela Consolidação das Leis Trabalhistas, tem causado indignação à grande parcela das elites, justamente aqueles que não se livraram da pose de "senhores de engenho."

Alardeiam o aumento do desemprego da categoria, numa espécie de terror injustificável por parte de pessoas que possuem residência de praia ou casa de veraneio nas serras com adega repleta de whiski e outras bebidas importadas, anualmente trocam de carro, viajam à Europa, Estados Unidos, Argentina ou Chile.

Embora muitos empregadores domésticos há anos assinam as carteiras de trabalho, pagam os direitos trabalhistas: INSS, FGTS, Plano de Saúde (que infelizmente "esqueceram" de incluir na lei.), férias de 30 dias por ano, além de outras vantagens, a reação das elites é forte.

Mal a legislação foi aprovada, um deputado paulista do PSDB, entrou recentemente com uma proposta de regulamentação da lei, em que propõe zerar a multa do FGTS nas demissões sem justa causa e baixar de vinte para oito por cento a contribuição ao INSS. E esse deputado que se diz porta voz das domésticas teve a coragem de dizer que deseja evitar o desemprego em massa. Na realidade, está atuando em favor dos patrões, isto é; das elites, como sempre foi a prática do seu partido. 

Fui criado numa família do meio rural, com muitos irmãos, onde não faltavam servidores domésticos, numa época sem nenhuma lei que protegesse esse pessoal. Mas logo percebi que deveria seguir a mesma legislação com a qual era tratado no meu emprego.

Finalmente fez-se justiça com a maior classe trabalhista brasileira, derrubando definitivamente a escravidão no nosso país.

quarta-feira, 10 de abril de 2013

"13 minutos" - José Nilton Mariano Saraiva


Todo mundo sabe que a indústria cinematográfica americana adora transportar (com extrema competência) para o cinema, aquelas ações do cotidiano que causam impacto à população (terremotos, furacões, tsumanes, ataques terroristas e por aí vai), até porque rende muita, mas muita grana mesmo.  Mas, em 2001, quando os árabes liderados por Osama Bin Laden impingiram à maior nação do mundo a suprema humilhação da sua história, ao seqüestrarem aviões americanos e os transformarem em bombas letais que derrubaram as Tôrres Gêmeas de Nova Iorque e parte do Pentágono (sede do comando militar), o governo americano teria reunido roteiristas, diretores e produtores do cinema americano e terminantemente “proibido” que tais ocorrências fossem imortalizadas, via cinema (embora a televisão tenha filmado e divulgado, ao vivo, parte do “show”). A exceção foi o filme o “Voo 83”, que pretendeu transformar a tragédia numa espécie de vitória americana, ao narrar que o quarto avião terrorista, que iria ser jogado sobre a Casa Branca, sede presidencial, teria sido derrubado de forma até heróica pelos passageiros, ao pressentirem para onde se dirigia e com qual objetivo; assim, melhor que todos morressem (suprema glória) para salvar o presidente da nação  (no entanto, há a suspeita de que, sem se importar com  as dezenas de americanos em seu interior, teria a força aérea yanque sido ordenada a derrubar o avião, antes que conseguisse o seu desiderato).
Nos dias atuais, saíram de cena os árabes e a “bola da vez” seria o exótico mandatário da longínqua Coréia do Norte e seus militares, que, insatisfeita com os Estados Unidos, estaria disposta a “bater de frente” com os americanos, inclusive com o uso de armas nucleares de longo alcance. Se realmente possuem “bala na agulha” pra isso ninguém sabe, mas o fato é que existe a ameaça diuturna e a conseqüente promessa de retaliação, de pronto.
Coincidentemente, está em cartaz nas telonas (cinema) o filme americano “Invasão à Casa Branca”, que nos mostra a facilidade com que, numa ação violenta e fulminante, um grupo de ...norte-coreanos, toma de assalto a sede do poder central americano, fazendo de refém o seu presidente e principais assessores para, a partir daí, se apossarem do seu  arsenal nuclear, através da obtenção forçada de um código específico. E aí, pequenas falhas dos produtores do filme:  01) no diálogo entre o chefe terrorista e o presidente americano, aquele diz para este: “...sua segurança gasta 15 minutos pra se deslocar até aqui; eu precisei de apenas 13 minutos pra se apossar da sua Casa Branca” (será que é isso mesmo ???); 02) numa discussão entre o Chefe do Estado Maior americano e o presidente em exercício, aquele diz pra este que o presidente deve se achar no “bunker” existente no subsolo da residência oficial, “...capaz de suportar até um ataque nuclear” (mais tarde, os terroristas explodem o tal “bunker” com “quatro bombinhas” introduzidas com uma furadeira mixuruca em uma das suas paredes laterais, saem com o presidente, usado como "escudo de proteção" e de lá se mandam;  03) por fim, o herói, um renegado ex-segurança presidencial se redime de uma falha anterior (quando a esposa do presidente foi morta), ao salvar o filho do presidente, abater todos os norte-coreanos (inclusive o chefão) e sair ovacionado de uma destruída Casa Branca, abraçado ao chefão, ambos feridos.
Ato final (e já tradicional nos filmes americanos):  já refeito, o presidente fala para o mundo enaltecendo os valentes americanos que perderam a vida na batalha, da certeza de que a América é indestrutível e, finalmente, como bom católico que é, não esquece de agradecer a Deus pelo desfecho final.
Apesar dos “efeitos especiais”, fraco o filme, mas que se destaca por ser lançado (coincidentemente ???) no momento  em que, na vida real, Estados Unidos e Coréia do Norte trocam “amabilidades”.

terça-feira, 9 de abril de 2013

Política - Cynara Menezes (Carta Capital)


O perfeito imbecil politicamente incorreto


No Brasil, é aquele sujeito que se sente no direito de ir contra as idéias mais progressistas e civilizadas possíveis em nome de uma pretensa independência de opinião. Saiba como reconhecê-lo.

Em 1996, três jornalistas –entre eles o filho do Nobel de Literatura Mario Vargas Llosa, Álvaro –lançaram com estardalhaço o “Manual do Perfeito Idiota Latino-Americano”. Com suas críticas às idéias de esquerda, o livro se tornaria uma espécie de bíblia do pensamento conservador no continente. Vivia-se o auge do deus mercado e a obra tinha como alvo o pensamento de esquerda, o protecionismo econômico e a crença no Estado como agente da justiça social. Quinze anos e duas crises econômicas mundiais depois, vemos quem de fato era o perfeito idiota.


Mas, quem diria, apesar de derrotado pela história, o Manual continua sendo não só a única referência intelectual do conservadorismo latino-americano como gerou filhos. No Brasil, é aquele sujeito que se sente no direito de ir contra as idéias mais progressistas e civilizadas possíveis em nome de uma pretensa independência de opinião que, no fundo, disfarça sua real ideologia e as lacunas em sua formação. Como de fato a obra de Álvaro e companhia marcou época, até como homenagem vamos chamá-los de “perfeitos imbecis politicamente incorretos”. Eles se dividem em três grupos:
1. o “pensador” imbecil politicamente incorreto: ataca líderes LGBTs (Lésbicas, Gays, Bissexuais e Trânsgeneros) e defende homofóbicos sob o pretexto de salvaguardar a liberdade de expressão. Ataca a política de cotas baseado na idéia que propaga de que não existe racismo no Brasil. Além disso, ações afirmativas seriam “privilégios” que não condizem com uma sociedade em que há “oportunidades iguais para todos”. Defende as posições da Igreja Católica contra a legalização do aborto e ignora as denúncias de pedofilia entre o clero. Adora chamar socialistas de “anacrônicos” e os guerrilheiros que lutaram contra a ditadura de “terroristas”, mas apoia golpes de Estado “constitucionais”. Um torturado? “Apenas um idiota que se deixou apanhar.” Foge do debate de idéias como o diabo da cruz, optando por ridicularizar os adversários com apelidos tolos. Seu mote favorito é o combate à corrupção, mas os corruptos sempre estão do lado oposto ao seu. Prega o voto nulo para ocultar seu direitismo atávico. Em vez de se ocupar em escrever livros elogiando os próprios ídolos, prefere a fórmula dos guias que detonam os ídolos alheios –os de esquerda, claro. Sua principal característica é confundir inteligência com escrever e falar corretamente o português.
2. o comediante imbecil politicamente incorreto: sua visão de humor é a do bullying. Para ele não existe o humor físico de um Charles Chaplin ou Buster Keaton, ou o humor nonsense do Monty Python: o único humor possível é o que ri do próximo. Por “próximo”, leia-se pobres, negros, feios, gays, desdentados, gordos, deficientes mentais, tudo em nome da “liberdade de fazer rir.” Prega que não há limites para o humor, mas é uma falácia. O limite para este tipo de comediante é o bolso: só é admoestado pelos empregadores quando incomoda quem tem dinheiro e pode processá-los. Não é à toa que seus personagens sempre estão no ônibus ou no metrô, nunca num 4X4. Ri do office-boy e da doméstica, jamais do patrão. Iguala a classe política por baixo e não tem nenhum respeito pelas instituições: o Congresso? “Melhor seria atear fogo”. Diz-se defensor da democracia, mas adora repetir a “piada” de que sente saudades da ditadura. Sua principal característica é não ser engraçado.
3. o cidadão imbecil politicamente incorreto: não se sabe se é a causa ou o resultados dos dois anteriores, mas é, sem dúvida, o que dá mais tristeza entre os três. Sua visão de mundo pode ser resumida na frase “primeiro eu”. Não lhe importa a desigualdade social desde que ele esteja bem. O pobre para o cidadão imbecil é, antes de tudo, um incompetente. Portanto, que mal haveria em rir dele? Com a mulher e o negro é a mesma coisa: quem ganha menos é porque não fez por merecer. Gordos e feios, então, era melhor que nem existissem. Hahaha. Considera normal contar piadas racistas, principalmente diante de “amigos” negros, e fazer gozação com os subordinados, porque, afinal, é tudo brincadeira. É radicalmente contra o bolsa-família porque estimula uma “preguiça” que, segundo ele, todo pobre (sobretudo se for nordestino) possui correndo em seu sangue. Também é contrário a qualquer tipo de ação afirmativa: se a pessoa não conseguiu chegar lá, problema dela, não é ele que tem de “pagar o prejuízo”. Sua principal característica é não possuir ideias além das que propagam os “pensadores” e os comediantes imbecis politicamente incorretos.

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OBS: Postagem original do Zé Flávio, no "Cariricult, que achamos por bem trazer pra cá, face à contundência embutida.  

sábado, 6 de abril de 2013

Previsível - José Nilton Mariano Saraiva


Depois do giro fracassado pela Europa, onde foi derrotada pela Inglaterra (2x1) e empatou (com dificuldade) com a Itália (2x2) e Rússia (1x1), dentro de alguns minutos a seleção do Felipão deverá obter sua primeira vitória, e de forma convincente. 
E o tal do Neymar deverá deitar e rolar, casar e batizar pra cima dos esforçados jogadores da seleção boliviana, de forma que as manchetes dos principais jornais do começo da semana o elevarão às alturas, destacando que apesar da altitude o “craque” comandou o Brasil numa vitória espetacular. Não se trata de palpite, mas algo bastante previsível (se não ganhar da Bolívia, ganhará de quem ???).
A reflexão acima é só pra lembrar que, no tempo do Botafogo de Garrincha e do Santos de Pelé, nossa turma ia lá e enfiava extravagantes goleadas nos adversários e nunca ninguém falou nessa tal de altitude. 
É por essas e outras que o futebol nos dias atuais se acha tão desgastado e sem credibilidade. 

sexta-feira, 5 de abril de 2013

Por que não, D. Lúcia ?



Há uma grande polêmica no Brasil , atualmente, perceptível na TV, nas ruas, nas Redes Sociais. Envolve o Deputado Federal, por São Paulo, Marco Feliciano,  do Partido Socialista Cristão. Ele sempre foi combatido por posições retrógradas e eivadas de preconceito,  no que tange a assuntos religiosos e morais. Vejamos, caros leitores,  algumas de suas pérolas, mesmo sob o risco de náuseas e de engulhos:  “A  AIDS é o Câncer Gay !”; “A podridão dos sentimentos homoafetivos , leva ao ódio, ao crime, à rejeição” . Se o leitor ainda não vomitou, vão mais algumas para teste : “Os africanos descendem de um ancestral amaldiçoado por Noé, isso é fato !”  ; “Depois da União Civil virá a adoção de crianças por parceiros Gays, a extinção das palavras Pai e Mãe, a destruição da família “. Todas estas citações, públicas, estão untadas de racismo e homofobia, inexplicáveis nos dias de hoje, passíveis de pena nos tribunais , impensáveis de serem citadas por um louco qualquer, muito menos por um representante do povo. Poderiam ter sido arrancadas do “Mein Kampf” e correm  o risco de horrorizar o próprio Bolsanaro. Não bastasse esta idiotice particular , o Congresso Nacional ( que tem dado seguidas demonstrações de incongruência e fragilidade ) uniu-se à insanidade do seu membro  e elegeu-o ( loucura das loucuras) : Presidente da Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara . Compara-se a eleger Hitler como juiz no julgamento de Nuremberg.  As minorias  que se encontram em invejável nível de organização nestes últimos dez anos, reagiram, como se deveria  esperar, foram às ruas, invadiram reuniões da Comissão e estabeleceu-se um impasse ainda sem solução no momento. Feliciano, que é pastor evangélico,  teve , de início, apoio do segmento que o representa, mas –pouco a pouco – o desgaste começa a corroer suas estruturas de sustentação. As críticas inicialmente endereçadas a ele se espraiam para suas hostes religiosas e o incômodo passou a ser nítido no setor evangélico. Feliciano resiste, mas não tem como se segurar , a queda é previsível e dá-se como favas contadas.
                                   Semana passada, seguindo seu apostolado de insensatez,  Feliciano confrontou , em Minas Gerais, um protesto contra ele, com outra citação bombástica : "Essa manifestação toda se dá porque, pela primeira vez na história desse Brasil, um pastor cheio de Espírito Santo conquistou o espaço que até ontem era dominado por Satanás". O mal estar, desta vez, invadiu sua praia, havia vários deputados de gestões anteriores e do setor evangélico na Comissão, e eles os acusou de sócios de Belzebu. Desculpou-se , depois, dizendo que citara Satanás, não como o Tinhoso, mas na acepção original do hebraico que , segundo ele, significa “adversário”.
                                   A questão Feliciano suscita vários questionamentos. Acredito que não devemos , simplesmente, jogá-la na vala comum da questão meramente religiosa. O pensamento dele representa, creio, um segmento expressivo dos evangélicos do Brasil, mas não de todos. Corre-se o risco de iniciar, mais uma vez, uma Cruzada, sem separar bem o joio do trigo. Há, a meu ver, duas vertentes interessantes para se refletir, uma de ordem política e outra ligada à Laicidade do Estado. Feliciano, amigos, foi eleito como o segundo mais votado em São Paulo. O Brasil está agora correndo contra o prejuízo causado, mas vem a pergunta inevitável: Por que elegemos um candidato com esse perfil ? Não teria sido mais fácil tê-lo filtrado com a malha das urnas ? Faltou-nos amadurecimento político para tanto ou , simplesmente, o seu pensamento retrógrado representa o de muitos nesse país, transcendendo, inclusive, as fronteiras meramente religiosas ? Os que o elegeram presidente da Comissão de Direitos Humanos foram, também, por sua vez, igualmente eleitos por nós. Escolhemos bem ou será que assinamos um cheque em branco e entregamos ao estelionatário e, agora, estamos reclamando porque o saque foi muito alto ? É preciso compreender que fomos nós mesmos , brasileiros mobilizados e nas ruas, que tentamos , agora, arrancar o microfone do insano, mas permitimos, por outro lado,  a Feliciano o espaço para difundir suas idéias nazistas.
                                   Fica cada vez mais clara a importância da laicidade do Estado. A história demonstra que os maiores crimes da humanidade foram cometidos sempre que se misturou de forma incestuosa Política & Religião. Esta combinação é sempre explosiva. Feliciano tem todo o direito de cuspir suas regras e suas sentenças para seus fiéis, desde que não confronte o Estado de Direito. Cada um cuide do seu rebanho ! Os Testemunhas de Jeová – com todo respeito que merecem-- têm o sagrado direito de proibir a transfusão de sangue a seus seguidores , mas não podem querer , por exemplo, influenciar o Congresso para criar uma lei proibindo a hemoterapia em todo país. Cada macaco no seu galho ! As questões atinentes , pois , ao Controle de Natalidade, ao Aborto, à Fertilização in vitro, à Eutanásia, às Células Tronco, devem ser regulamentadas pelo Estado. Às igrejas caberá a decisão de permitir ou não a utilização destes métodos( se acessíveis pelo Estado) por seus fiéis e exclusivamente por eles.
                                   Recentemente, Feliciano revelou – em outra entrevista bombástica-- que D. Lúcia Maria, sua mãe, era aborteira e que, ainda menino, “vira fetos serem arrancados, por ela,  de dentro de mulheres”. Nem imaginou  que , emitindo depois opiniões tão preconceituosas, estava dando um grande argumento, indireto, a favor do aborto. D. Lúcia bem que poderia ter procurado uma colega , devem estar pensando algumas minorias... Em qualquer dos sentidos possíveis, no entanto,  Feliciano terminou se tornando o grande Satanás desse país.

J. Flávio Vieira

A "metamorfose" do Felipão - José Nilton Mariano Saraiva



Numa época em que o futebol brasileiro andava de “crista baixa” e com perspectiva real de não participar de uma Copa do Mundo pela primeira vez na história (tal o descalabro reinante), às pressas convocaram, visando “arrumar a casa”, o treinador Luiz Felipe Scolari, então brilhando num dos grandes clubes de São Paulo. E aí ele chegou mostrando ter “luz própria”, objetivos definidos e tal, porquanto, mesmo sob enorme pressão da torcida brasileira e, especialmente, da crônica esportiva, não convocou o idolatrado (mas indisciplinado) jogador Romário. Foi um Deus nos acuda que só cessou quando o time começou a ganhar, findando por se sagrar mais uma vez campeão do mundo.
Ao tempo em que resgatou o respeito do mundo futebolístico pela nossa seleção, Felipão viu-se guindado à condição de top de linha, de estrategista genial, ícone de uma nova era; tanto que sua carreira deu uma alavancada fulminante e ele foi parar “nas Oropa”, onde dirigiu a seleção portuguesa, o respeitável time inglês do Chelsea e até milionários times da Rússia; voltou “podre de rico” e... repaginado.
“Repaginação” que se mostrou decepcionante agora, quando, novamente chamado às pressas para, de novo “arrumar a casa”, se nos apresentou cheio de conivências, de conveniências, de invencionices e de uma maleabilidade que outrora não possuía;  assim, desde que reassumiu não teve a coragem devida pra sequer substituir o “bibelozinho de luxo”, a nova coqueluche da imprensa esportiva (aquele que a TV Globo já decretou ser o único craque do time), o improdutivo e doméstico jogador Neymar, que quando tem pela frente os europeus “se caga todo”, treme mais que vara verde, vira uma peça absolutamente nula (mas, atenção: no próximo jogo enfrentaremos o “índios” da Bolívia e então tal jogador deitará e rolará, de sorte que, hipocritamente, a imprensa no dia seguinte o vangloriará e o elevará à condição de salvador da pátria); no mais e como que pra provar que a metamorfose foi impressionante e pra valer, o Felipão resolveu convocar para a seleção um goleiro que não é nem reserva do reserva do reserva do seu time (ou seja, é o quarto goleiro); só que é jogador do defensivo time do Corinthians, verdadeiro representante do anti-futebol, do futebol de resultados, e que tem à retaguarda uma cambada de grandes empresários sem escrúpulos e que não se importam em jogar sujo, desde que os fins, nem sempre nobres, sejam alcançados.
A dúvida é: será que até a Copa do Mundo o treinador Felipão se reciclará ??? Se não o fizer, estaremos ferrados.
Definitivamente. Sem choro e nem vela.

quinta-feira, 4 de abril de 2013

Universidade Federal do Cariri - José Nilton Mariano Saraiva


Quando da reunião final para a escolha da cidade onde ficaria localizado o "campus-Cariri", da Universidade Federal do Ceará, o então prefeito da cidade do Crato (Samuel Araripe), mesmo estando em Fortaleza, deixou de comparecer à sede da Reitoria da UFC, manifestando, pois, absoluto descaso para com a obtenção daquele importante preito. E, embora uma alentada caravana de verdadeiros cratenses tenha se feito presente, o resultado todos nós conhecemos: embora o Crato, por sua tradição no campo educacional, fosse o cotado para sediá-lo, o componente político se fez presente e aquele empreendimento foi “desviado” para Juazeiro do Norte.
A reflexão acima é só pra lembrar que, nesse momento em que nos chega a notícia de que o "campus-Cariri" da UFC será transformado na Universidade Federal do Cariri, com sede em... Juazeiro do Norte, é bom lembrar que a falta de visão, o desinteresse e o pouco caso para com a Educação do então prefeito do Crato nos fez perder tão importante equipamento.
Não esquecer que, naquela oportunidade, os áulicos do então mandatário da cidade, por miopia, insensibilidade, ignorância ou porque não queriam mesmo nada, trataram de mascarar ou esconder o real significado de tão importante perda, sob a alegativa estapafúrdia de que “... somos um só povo, uma só Região Cariri”.
O resultado não poderia ser mais trágico: a alardeada “capital da cultura do interland alencarino” dançou solenemente. De novo, outra vez, novamente.

sábado, 30 de março de 2013

Pilatos



Cá estamos em plena Semana Santa, já sem o g  lamour de tempos passados.cada dia mais raro e distante. Os comerciantes entendem a santidade desta semana como o momento oportuno para aumentar o preço do peixe e do bacalhau e levar um pouquinho mais ao caixa da empresa. Nas igrejas os santos se cobrem de roxo talvez mais pelo absurdo total do que vêem a sua volta do que pelo peso plúmbeo e culposo da memória terrível da crucificação.
 Algumas cidades brasileiras aproveitam o feriado da sexta feira para armar grandes festas perfeitamente profanas. A maior parte do povo perdeu a ritualística cristã e já não sabe bem o que significa o feriadão. Empanturra-se de vinho e aparenta um ar de santidade e transcendência. As crianças ligam imediatamente a páscoa ao coelhinho e ao chocolate. As classes mais desfavorecidas aproveitam a oportunidade para abastecer um pouco a despensa vazia e saem mendigando víveres para um jejum
Desde os tempos de juventude que a quaresma me suscita  a imagem  de Pilatos. Sei que o    nome Pilatos hoje remete imediatamente à academia de fisicultura. Os mais jovens lembram-se de pronto daqueles aparelhos para malhar  e sair por aí bombados e impressionando a garotada com músculos mais definidos. Assim, preciso explicar : falo de Pôncio Pilatos. Bem,  ele foi prefeito da Judéia entre 26 dC e 37 dC . Teria passado totalmente despercebido dos livros de história  se não houvesse participado de um dos mais importantes julgamentos de toda a história. Pilatos foi o juiz do processo de Jesus e terminou acatando a opinião da maioria e ao lavar as mãos condenou-o ao suplício no Gólgota. A sua decisão manchou definitivamente a sua história e, certamente, contribuiu para um julgamento histórico implacável de todas as condutas da sua vida. Tido como violento, venal, corrupto e de uma ferocidade sem limites em todos os júris que participou, segundo os historiadores Filão e Flávio Josefo. Nos séculos seguintes surgiram inúmeras lendas envolvendo o seu nome. Desde um final desastroso em Tevere ou em Vienne na França, o suicídio em 37 dC; até sua conversão ao cristianismo, influenciado por sua esposa Prócula que é considerada santa pela Igreja Ortodoxa. Ele mesmo  foi santificado pelas Igrejas etíope e copta. O “Credo”, oração surgida em torno de 200 dC,  no entanto,  lhe macula definitivamente a memória  : padeceu sob Pôncio Pilatos, foi crucificado, morto e sepultado...".
Em tempos de tanta liberalidade nos rituais religiosos da Semana Santa por parte da população, me ponho a imaginar o papel singular de Pilatos em toda a história sagrada ocidental. A primeira questão a ser levantada por tantos juízes de plantão é simples. Se todo o suplício de Jesus estava pré-estabelecido, inclusive previsto por profetas, é possível que o papel de Pilatos assim, também, estivesse determinado e que ele apenas tenha sido um veículo necessário à confirmação da profecia e dos desígnios divinos. Mesmo afastando esta hipótese, nos coloquemos no papel do juiz romano. Julgava um prisioneiro político que não conhecia e , como no direito romano, seguiu a opinião dos jurados. Opor-se seria, em tempos atuais, afastar-se da decisão do corpo de jurados e tomar uma decisão unilateral, um verdadeiro absurdo jurídico na visão contemporânea. Mesmo assim , Pilatos hesitou na sentença e preferiu tirar o corpo de fora. A posteridade escolheu o caminho mais cômodo e lhe imputou a culpa pela crucificação. Em nenhum momento se volta para a grande turba que preferiu Barrabás e que ano após ano, julgamento após julgamento, continua politicamente escolhendo sempre a pior parte.
Basta olhar em volta, em meio aos tonéis de vinho consumidos, ao comércio do jejum, às festas profanas reverenciando o sagrado, para se perceber que se Cristo voltasse, se o julgamento fosse hoje, a crucificação se repetiria. Os que hoje fazem a multidão e o corpo de jurados são descendentes fiéis de Barrabás. Pilatos ao menos lavou as mãos, os juízes de hoje as tingiriam, rapidamente, de rútilo sangue inocente.

J. Flávio Vieira

sexta-feira, 29 de março de 2013

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Ele nasceu no Crato, interior do Ceará. Foi para o Recife. Lá, integrando o grupo Nuvem 33, fez-se músico vanguardista. Anos depois rumou para São Paulo. Depois de trabalhar com Tom Zé (poucos são tão vanguarda como TZ) e criar o grupo Papa Poluição, pôs-se ainda mais à frente, desta vez na Lira Paulistana de Itamar Assumpção, Tetê Espín­dola, Premeditando o Breque (Premê) e Arrigo Barnabé. Resumidamente, essa é a trajetória do cara que pensou que poderia deixar a música de lado e embarcar no mundo da propaganda.
Em 1982 Tiago lançou Cabelos de Sansão, um LP marcante com o qual foi reconhecido por seus pares e por adeptos da vanguarda paulistana. E não só: impressionou também corações e mentes nos quais a modernidade latejava, impregnada do fruto tropicalista, e sonhavam em vê-lo frutificar e seguir calando fundo na alma da música popular.
Foi em Cabelos de Sansão que Zeca Baleiro ouviu Tiago pela primeira vez – e chapou. Passados trinta anos, dono de uma gravadora, a Candeeiro Records, Zeca relançou em CD o LP. E mais, agora em 2013 lança Baião de Nós, novo álbum de Tiago Araripe.
Abro um parêntese: Zeca Baleiro é um grande compositor. Ponto. Entretanto, e talvez por isso mesmo, sua atuação como diretor artístico do selo não tenha o merecido reconhecimento pelo bom trabalho. Graças ao faro apurado e a convicções musicais ímpares, Zeca volta e meia produz discos da maior relevância para a música brasileira. E não pensem que ele faz isso por dinheiro, não. Nem empata. Se bobear, põe grana do próprio bolso para lançar músicos nos quais acredita. Fecho o parêntese.
Em Baião de Nós, Tiago lança doze músicas inéditas, nove só dele, três em parceria com Paulo Costa e duas com Zeca Baleiro. Os arranjos têm a característica da obra que vestem. Misturam sons de órgão (tirados do teclado, que remetem aos anos 1970) com naipe de sopros, bateria, violões de seis, doze e sete cordas, cavaquinho, percussão, guitarras, baixo, gaita, piano, sintetizador, banjo, sampler, acordeom e coro.
A voz de Tiago tem personalidade. Diferente, ela empresta aos versos um timbre que os torna também peculiar. Assim é em “Feito Beatles” (TA): Todos os sonhos repousam no mar/ Em algum açude do sertão/ Memória das águas/ Nas linhas que traçam/ A palma da mão. E também em “Canção do Silêncio” (TA): A menor distância/ Entre a palavra e o silêncio/ Só o pensamento pode percorrer/ Só o pensamento.
Suas composições estão a serviço de um pensador que cria melodias. O ritmo tem de ser o que melhor se mostrar no ato da criação. Não há nada predisposto. Tudo soa natural como é da natureza do compositor assim ser. Um grande exemplo disso é “Nós” (TA), que no CD aparece em duas faixas, em versão original e atual.
A beleza desta e de outras músicas demonstra o talento que tem Tiago Araripe. Um cara que em boa hora volta do silêncio para entoar palavras, e que se atreve a voltar a esse olho do furacão que é o mercado discográfico.

Aquiles Rique Reis, músico e vocalista do MPB4

segunda-feira, 25 de março de 2013

BERNARDO ARRAES VALENÇA


 
   Bernardo (esquerda), com seu irmão gêmeo André.
Bernardo Arraes de Alencar Valença tem no DNA forte tendência para artes. Pelo lado materno, é sobrinho de Guel Arraes, diretor da Rede Globo, responsável  por programas inovadores e filmes de sucesso, e de Maurício Arraes, pintor consagrado. Do lado paterno, é sobrinho de Alceu Valença e parente próximo de Raul e João Valença, irmãos autores de muitos sucessos,  o mais conhecido a marcha Teu cabelo não nega.
Com apenas 23 anos, vários trabalhos publicados e dois livros escritos, o primeiro, com a idade de 12 anos, de circulação restrita. O segundo, “Onomatopeia do Silencio”, escrito quando tinha apenas 15 anos, editado pela Editora Bargaço.
Bernardo tem vínculos com o Ceará e com o Crato, pois é neto do Ex-Governador Miguel Arraes.
 
Procura-se emprego  

Deposite a moeda
que acaba a preguiça
se a engrenagem enguiça
tenho a solução

Insira o cartão
assine o cheque
me abane com um leque de notas de cem 

Aceito diamantes
ou barras de ouro,
tesouro pirata, moedas de prata,
marfim africano, quadro de Picasso,
escritura de prédio, mansão ou palácio,
pérola negra, barrís de petróleo,
direitos dos Beatles,
ações da Natura,
iate, helicóptero, Ferrari, avião,
um jato da Nasa que passe as barreiras do som...

Tem não?
Então se tiver um lanchinho tá bom…
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*para Totó

domingo, 24 de março de 2013

Objeto Sujeito
Paulo Leminski 

você nunca vai saber 
quanto custa uma saudade 
o peso agudo no peito 
de carregar uma cidade 
pelo lado de dentro 
como fazer um verso 
um objeto sujeito 
como passar do presente 
para o pretérito perfeito 
nunca saber direito 

você nunca vai saber 
o que vem depois do sábado 
quem sabe um século 
muito mais lindo e mais sábio 
quem sabe apenas 
mais um domingo 

você nunca vai saber 
e isso é sabedoria 
nada que valha a pena 
a passagem pra Passárgada 
Xanadu ou Shangri-lá 
quem sabe a chave 
de um poema 
e olha lá