por José do Vale Pinheiro Feitosa




Viva junto à alma mais próxima e compreenda que a proximidade é a medida da distância. Que a distância que os separa é este movimento maravilhoso da matéria e da energia. A maravilha é apenas esta surpresa porque esta proximidade é tão diminuta entre os dois e é a inesperada distância.

José do Vale P Feitosa



quarta-feira, 2 de maio de 2012

Punta Del Este - José do Vale Pinheiro Feitosa


Punta Del Este é a Miami do Cone Sul. Uma ponta no mar plena de mansões, edifícios de luxo. De Cassinos iguais aos Zigurates da Mesopotâmia onde os astros a serem observados são os semideuses desta mortalidade aderente ao sucesso. E girava por suas ruas. Todas em longitude de sua ponta, aquela espécie de bússola que parece nortear a imensa deságua do Rio de la Plata.

Um clima de Atlântico Sul: Leões Marinhos próximos ao píer, à espreita que os restos do tratamento dos peixeiros retornam às águas onde pescam. Uma face de endinheirados: inúmeras lanchas a condecorar o tédio de tanta riqueza sem norte de aplicação social. Quando passava em frente ao velho prédio da Marinha encontrou Che Guevara, o chefe da Missão Cubana, em passo apressado para o desfecho da Oitava Reunião de Consulta de Ministros de Relações Exteriores da OEA.

Bem na ponta da Punta as estátuas de sereias feitas com o lixo sólido que se depositam nos mares. Os restos carcomidos do capacho Colombiano de tanto uso pelo Império a convocar a Reunião. As teses e decisões que geraram as ditaduras militares de direita na América Latina sob o capuz da tortura de algozes americanos: intervenção estrangeira como desculpa para intervir; segurança contra a ação subversiva do comunismo internacional com senha para os golpes e a Aliança para o Progresso para consolidar “il capo de tutti capi”.

E os olhos tontos de tantas fachadas luxuosas, ruas desertas na fase do estio das douradas temporadas de verão. É tanto verde, verde rasteiro, ao rés do chão, verde sobre antigas dunas, verdes para ladear os caminhos sinuosos dos carrões de sonhos. Verdes no meio dos quais se erguem mansões de tantos cômodos com se uma grande hospedaria fosse para apenas algum casal, seus dois filhos e uma multidão de puxa-sacos e admiradores no frisson do verão.

Na praia, aquela face da Punta que se beira às ondas revoltas das Praias Oceânicas. Em qual delas os dedos gigantes de uma mão emergem das areias como se a mão de um zumbi fosse, a pedir socorro ao presente do enterro vivo da história. Em qual destes dedos encontrou Guevara, Brizola, tantos latinos americanos perplexos com a expulsão de Cuba. Na Oitava Reunião de Punta Del Este o dragão queimava o destino de uma geração e roubava dela a construção dos próprios passos.

Não parece, mas em Punta Del Este alguns pobrecitos clamam por comida. São poucos, invisíveis aos filtros de ar condicionado dos vidros fechados na velocidade de conta-giros enlouquecidos. São fugitivos do abraço que os retém bem para o interior da Punta, para longe das praias e dos balneários. Com Maldonado e San Carlos a reter-lhe o desejo de examinar os ricos como os ricos são.

Em Punta Del Este toda a Cachoeira de práticas escusas com o único fito de acumular. E se a esta queda da água fosse possível tratar-lhe no gênero masculino, o Cachoeira despejaria pedras e lamas, trapaças e artimanhas igual a qualquer sujeito em franco processo de amealhar, ajuntar, enriquecer. O Cachoeira tem o dom do mesmo ato de expulsar Cuba, exilar Brizola e matar Guevara.

Na saída rápida e desejada de Punta del Leste, tonto de tanta jactância, abobado com tanta gramínea, quase grita palavras de teor anarquista: Professor! Doutor! Professor! Doutor! Professor! Doutor! Num roteiro tão longo que a paisagem foi se transformando e o automóvel voou baixo na ruta 9.

Algumas horas após, uma vez havido ultrapasso o Arroio Chuí, ali onde ele se despeja no mar, o olhar para o sul enxergava a ironia de ter sido naquele carnaval de Cassinos que a Revolução Cubana que derrubara os Cassinos, fora vingada pelos contraventores.
  
  


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