por José do Vale Pinheiro Feitosa




Viva junto à alma mais próxima e compreenda que a proximidade é a medida da distância. Que a distância que os separa é este movimento maravilhoso da matéria e da energia. A maravilha é apenas esta surpresa porque esta proximidade é tão diminuta entre os dois e é a inesperada distância.

José do Vale P Feitosa



quinta-feira, 1 de dezembro de 2011

Fortaleza Anos 70 - A primeira viagem comercial à lua - José do Vale Pinheiro Feitosa

Hoje já não me lembro de todos os jornais de Fortaleza nos anos 70 por isso busquei uma lista que imagino histórica: Tribuna do Ceará, Correio do Ceará, Gazeta de Notícias, O Povo, O Unitário, O Democrata, O Estado, O Nordeste, O Jornal. O jornalista Giacomo Mastroianni, que é veterano na imprensa de Fortaleza, talvez precise mais quem estava ativo naqueles idos entre 1969 e 1971.

Aconteceu assim. O almoço fazíamos no restaurante da Faculdade de Medicina, como já citei, ficava distante do campus da Gentilândia, onde ficava o CEU que era o restaurante de toda a estudantada da universidade. Mas de vez em quando saíamos para um almoço no CEU para encontrar quadros de outras faculdades e tramarmos as ações para o futuro.

Convenhamos eram muito mais se mexer no estreito espaço do AI5 e do Decreto 477, do que uma ação de causar dano ao ditador da ocasião. Então a literatura de vanguarda era uma opção revolucionária. Como os textos que precisavam ser lidos no reservado de quatro paredes. Ou as grandes discussões sobre um filme de Claude Lelouch ou a estética estranha de Blow up de Micheangelo Antonioni.

Costumava jantar no CEU. Terminava as aulas na medicina, jantava rápido, não tinha tempo de costurar mais algumas tramas, tinha que ir para as aulas na Faculdade de Economia. Pois é, para compreender melhor a sociedade que desejava transformar entendi por bem estudar economia. Mas convenhamos graduação é dedicação e eu não tinha gás e tempo para as duas faculdades simultaneamente. Além do mais era um estudante de restaurante universitário, morando na casa de uma tia e andando de ônibus.

Mas estou detalhando muito, volto ao fato. Num daqueles almoços coletivos entre estudantes de várias faculdades, o Leite, estudante de jornalismo, uma grande figura que morreu precocemente, propôs uma reportagem. Ele estava estagiando num daqueles jornais da lista lá de cima e tinha por pauta fazer uma reportagem do anúncio da primeira viagem comercial à lua.

Qual era a do Leite? Levar alguns de nós para nos inscrevermos como pioneiros das viagens espaciais, de natureza comercial, à lua, naquele clima festivo da sociedade americana com o pouso no satélite. E fomos: eu, o Tarcísio Baturité, José Jackson Sampaio e Júlio César Penaforte. Iríamos nos inscrever para viajar à lua.

E chegamos ao local da inscrição. Era a representação da PANAM (grande companhia aérea americana que faliu nos anos 90) e o homem de Marketing da empresa já nos recebeu de cenho franzido. Ele teve que fazer cena, pois o Leite fazia anotações e resolveu fotografar a cena da inscrição.

Mas não havia inscrição alguma. Era apenas uma jogada de Marketing da PANAM naquela altura atolada até o umbigo com a BOEING na aquisição e lançamento do JUMBO. A matéria era sobre o Jumbo. Vimos folhetos, maquetes, assentos, a primeira classe e tome Jumbo por propaganda e o Leite anotando.

Naquela altura eu soltava gargalhadas “in pectori”. Nunca tinha viajado nem num teco teco e meu máximo de imaginação de Ícaro era ser como os urubus a planar nos céu azul do sítio onde vivia no Crato. Ria ainda mais pelo marqueteiro ter que nos explicar aquilo tudo como se tivesses diante de um grupo de investidores e companhias de turismo carreando levas de passageiros para o interior do seu Jumbo.

O Leite nos fotografou: o americano em pé apontando os folhetos e os quatro viajantes da lua em volta dele. Todos com risos irônicos. No dia seguinte quando chegamos à Faculdade foi uma festa. Pegaram uma tábua e colaram a primeira página do jornal com a foto extraída da cena acima e a manchete em letras garrafais: Estudantes Cearenses se Inscrevem para a Primeira Viagem Comercial à Lua.

No dia seguinte às gargalhadas enquanto almoçávamos o Leite quase chorando de rir nos contou que o homem de marketing, em estado de pura agonia, avisara que a inscrição não valera. Mas é claro, e nem as viagens comerciais à lua. Tudo era blefe.

Mas nunca ri tanto mesmo com a exoneração da promissora vida de astronauta. Mas foi uma bela gozação com uma grande corporação do império.

3 comentários:

Ângela Lôbo disse...

É sempre uma delícia ler suas aventuras do tempo de estudante. Não pense que peca pelo excesso de detalhes. Nós apreciamos por isso também! Um abraço!

José do Vale Pinheiro Feitosa disse...

Ângela,

Obrigado pelo estímulo. Mas não vou fazer com você o que dizem a mulher do Sr. Pedro Felício fazia. Todo dia preparava paçoca e ele comia, deixando-a com a certeza que ele gostava de paçoca. Até que um dia numa bom entender ele declarou que não gostava de paçoca, comia por que ela punha sobre a mesa de almoço. Então ainda existem alguns destes relatos para o futuro, mas prometo não repetir a dose todos os dias.

Ângela Lôbo disse...

Quando expressei minha predileção pelos seus relatos estudantis, não pretendia menosprezar os outros textos de sua autoria. Vale salientar que a variedade de seu cardápio alimenta o nosso espírito.
Mas, como Seu Pedro, não faria a menor objeção em comer paçoca todo dia. A grande diferença é que ele comia sem gostar.