OLHA ELA AÍ... DE NOVO
por José do Vale Pinheiro Feitosa
Viva junto à alma mais próxima e compreenda que a proximidade é a medida da distância. Que a distância que os separa é este movimento maravilhoso da matéria e da energia. A maravilha é apenas esta surpresa porque esta proximidade é tão diminuta entre os dois e é a inesperada distância.
José do Vale P Feitosa
sábado, 12 de setembro de 2020
OLHA ELA AÍ... DE NOVO - José Nilton Mariano Saraiva
GLORINHA - Dr. DEMÓSTENES RIBEIRO (*)
Sim, eu também tive um tempo feliz. Foi quando era menina sapeca na fazenda são Francisco, querida pela madrinha Sinhá e pelo coronel Assis de Almeida, mas o tempo destruiu tudo.
Pouco a pouco Seu Assisinho esquecia do mundo, e a família se mudou para a cidade. Já mocinha, eu fui junto. Estudaria para professora e cuidaria do coronel. Ele, cada vez pior. Vivia nos médicos, muitos remédios, e não tinha melhora. A noite era um inferno: não dormia e ficava cada vez mais agitado.
Havia um sofá ao lado da sua cama e decidiram que eu dormiria lá. Seu Assisinho se acalmava um pouco quando eu fechava a porta, sentava ao seu lado e alisava os seus cabelos brancos. Tempos depois, era a sua mão passando pelo meu rosto, descendo pelos meus seios, e a casa adormecia.
A todos surpreendia essa melhora. Agora, os remédios estavam certos, as noites eram de paz, e o velho cada vez mais assanhado comigo. Abria a minha blusa, soltava o meu sutiã, sugava o meu seio e caia em sono profundo como um neném amamentado. Prá mim pouco importava aquela boca desdentada, se isso era o preço por uma noite de paz.
Mas, num Natal, Josefina, a filha solteirona e histérica, de repente abriu a porta do quarto, acendeu as luzes e nos surpreendeu no ritual. Foi um escândalo: Glorinha, sua vagabunda, puta de idosos, vai ver onde você vai morar!
O jipe parou no cabaré de “Peituda”, eu chorava, eu a minha mala jogadas na calçada. “Peituda” abriu a porta e acostumada com aquela situação, tentava me consolar: “minha filha, vá dormir, não fique assim, “Peludinha” vai lhe trazer um chá...” No dia seguinte, Seu Assisinho morreu – como é triste esse tempo de Natal.
Quando o dia nasceu e lhe contei a minha história, “Peituda” prometeu me ajudar. Logo eu acharia um marido, seria professora e, se ficasse loura, tudo seria mais fácil. Ela oxigenou os meus cabelos e mudou o penteado.
Dias depois, um viúvo veio me conhecer. Um homem gordo e suado, de chinela japonesa e pedalando uma bicicleta apareceu por lá. “Coquinha” era barbeiro, se apaixonou mim e me levou prá sua casa. Ele queria exclusividade, mas pelo meu sonho de professora, não se importava que eu desse aula pra alguns meninos interessados enquanto ele trabalhava.
Pois bem, durante muitos anos, no final da tarde, cinco ou seis mocinhos esperavam pacientemente em frente à casa a aula individual. Ao escurecer, já com a turma debandada, “Coquinha” chegava bem cansado. “Loura” – ele falava – com as suas aulas e a barbearia, qualquer dia a gente tem geladeira e fogão a gás.
De saia justa e batom vermelho, loura e de salto alto, quando eu saía pela cidade os homens enlouqueciam e me comiam com o olhar. Até que um dia, o meu barbeiro não acordou e o mundo acabou prá mim. De novo, estava sozinha, não era mais a “loura do Coquinha”, chorei muito, não tinha amigas e fiquei desesperada. “Peituda” tinha se amigado com um sargento em Pernambuco e “Peludinha”, com um fazendeiro em Goiás.
Aos poucos refiz as forças, dei aula extra e juntei uns trocados. Fiz empréstimo e mudei de cidade. Voltei a ser Glorinha. Hoje sou uma empresária da alegria nessa terra de beatos. Várias meninas moram comigo, elas se dão bem e pela minha boate já passaram todos os figurões da sociedade.
Às vezes, eu fico triste e lembro “Cinzas de Amor”, cantada por “Chico de Zé Namorado”, e ontem Seu Assisinho me apareceu em sonho. O sem-vergonha andava doido por uma mamada.
Mas, hoje é a festa do município e não há lugar para saudade. Vou receber gatinhas de Recife, Salgueiro, Campina Grande e de outras cidades mais. Vai ter “baile de debutantes” e um vereador fará um discurso como no tempo chique do soçaite.
Apostei num futuro de sucesso, sou influente, todos gostam de mim e tenho certeza que quando o “Coquinha” voltar prá me levar, Glorinha ainda vai ser nome de rua nessa cidade.
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(*) Dr. Demóstenes Ribeiro é médico-cardiologista, natural de Missão Velha, residente e atuante profissionalmente em Fortaleza-CE
quinta-feira, 10 de setembro de 2020
UM "NEGÓCIO DA CHINA" - José Nilton Mariano Saraiva
Entorpecida por alguma promessa ou vantagem não detectável pelos mortais comuns (ou até mesmo por visceral desonestidade), a mídia tupiniquim deu quase nenhum espaço para um dos grandes escândalos da atualidade.
Referimo-nos à operação pactuada entre o Banco do Brasil e o Banco BTG PACTUAL, onde aquela estatal governamental cedeu por R$ 300.000.000,00 (trezentos milhões de reais) àquele representante privado, sem nenhuma transparência, toda uma carteira de créditos de (teoricamente) difícil recuperação, orçados em R$ 3.000.000.000.,00 (três bilhões de reais). Em português claro e cristalino: para se apropriar de vez daqueles títulos o BTG PACTUAL pagou ao Banco do Brasil o correspondente a dez por cento (10,0%) do seu valor de face.
Para os que desconhecem, o BTG Pactual foi fundado por Paulo Guedes e corriola e, muito provavelmente, nos dias atuais um seu “laranja” deve fazer parte do controle acionário do mesmo.
Aliás, o que não falta do BCG PACTUAL são “cobras criadas” que não dão murro em ponta de faca, já que verdadeiros "abutres" do sistema financeiro, porquanto acostumados a extorquir e se aproveitar de situação análogas e, claro, não meteriam a mão em cumbuca suspeita.
Como a “folha-corrida” do senhor Paulo Guedes não é das mais recomendáveis no mercado financeiro (há fortes suspeitas de ter metido a mão em alguns fundos de pensão das estatais, quando prestou assessoria a alguns deles, anos atrás), não seria de se estranhar que, na condição de Ministro da Fazenda, (ao qual o Banco do Brasil é subordinado) tenha oportunisticamente “vazado” para os sócios do PTG PONTUAL o “negócio da China” que seria a aquisição dos referidos títulos, a preço de banana (evidentemente que deve ter recebido uma boa comissão por isso).
Estranhável é que os “experts” em finanças, que pululam nos periódicos tupiniquins, não hajam se dado ao trabalho de uma simples análise do “porquê” de tal transação, já que de valor superlativo e claramente danosa aos cofres públicos.
segunda-feira, 7 de setembro de 2020
O "MENSAGEIRO DO CAOS" - José Nilton Mariano Saraiva
O “MENSAGEIRO DO CAOS” – José Nilton Mariano Saraiva
Se no começo dessa “longa noite de terror” que a humanidade atravessa por conta da tal “pandemia” tivéssemos, aqui no Brasil, alguém com responsabilidade, competência, respeitabilidade e discernimento no comando da nação, certamente que medidas sanitárias preventivas e urgentes teriam sido adotadas visando pelo menos minimizar o caos que se prenunciava e que atualmente experimentamos.
Afinal, em pleno mundo globalizado, impossível que num átimo de segundo não se saiba o que acontece do outro lado do planeta e, consequentemente, se possa prevenir da sua iminente chegada por essas bandas.
E, no entanto, já nos seus primórdios, o “traste” que está presidente da nação, ao se referir ao coronavírus (que àquela altura já migrara da China em voos de primeira classe e invadira toda a Europa, provocando um estrago monumental e letal face à agressividade), irresponsavelmente rotulou-o de “resfriadinho” e “gripezinha”, ao tempo que estimulava a população a não obedecer às determinações da Organização Mundial de Saúde e cientistas de todo o mundo, no sentido de adotarem o isolamento social, permanecerem em casa, evitarem aglomerações, objetivando pelo menos amenizar seus efeitos.
E então, para mostrar não temer o que já estava às portas, para dar a impressão de coragem e destemor, para parecer ser o dono da verdade, o irresponsável convocava e reunia-se com simpatizantes, participava de reuniões, abraçava e beijava pessoas (inclusive crianças) para, ao final, na condição de “mensageiro do caos”, apelar para a população sair às ruas, gozar a vida normalmente, não ligar para os pseudos exageros insistentemente veiculados pela mídia, porquanto mais importante que a própria vida era a economia do país (já em braba recessão) não estagnar de vez (afinal, afirmava a plenos pulmões, todos nós, inevitavelmente algum dia pereceremos).
E como os milhares de “bovinos” que a ele obedecem cegamente fizerem exatamente o que lhes foi pedido (saíram às ruas, confraternizaram, farrearam e, enfim, atenderam de bom grado à criminosa convocação do “traste”) temos aí 126.000 mortos e 4.100.000 casos registrados até aqui, com tendência de se chegar a cerca de 250.000 óbitos até o final do ano e o dobro dos casos registrados (otimisticamente).
E, no entanto, em recente pesquisa de um desses institutos que pesquisam de tudo, ao responderem se o presidente tinha algum culpa pelo atual quadro, irresponsavelmente a maioria o eximiu, numa prova inconteste de “memória curta”, descompromisso com a nação ou mesmo alheamento ante a morte sofrida de tantos irmãos.
Assim, como pessoas de bem e preocupadas com o destino dessa nação, não podemos olvidar que a absorção pela massa ignara das recomendações do “MENSAGEIRO DO CAOS” foram determinantes, sim (e como), para que chegássemos a uma situação tão dolorosa e sofrida.
sábado, 5 de setembro de 2020
DESIDERATA (Max Ehrmann)
Siga tranquilamente o seu caminho, entre a inquietude e a pressa, lembrando-se que HÁ SEMPRE PAZ NO SILÊNCIO.
Tanto quanto possível, sem se humilhar, mantenha-se em bons termos com todas as pessoas que o cercam.
Fale a sua verdade, mansa e claramente, e ouça a dos outros, mesmo a dos insensatos e ignorantes, pois eles também têm a sua história para contar.
EVITE AS PESSOAS AGRESSIVAS, AGITADAS E QUE FALAM ALTO; ELAS AFLIGEM O ESPÍRITO.
Se você se comparar com os outros, acabará se tornando presunçoso ou magoado, pois sempre encontrará alguém superior ou inferior a você.
Desfrute as suas realizações, bem como os seus sonhos e mantenha-se interessado em sua carreira, por mais humilde que seja, pois ela é um ganho real, na sorte mutante dos tempos.
Tenha cautela nos negócios, porque o mundo está cheio de astúcia, mas não se torne cético, porque a virtude existirá sempre. Muita gente luta por altos ideais e por toda parte a vida está cheia de heroísmos.
Seja você mesmo, sobretudo não simule afeição nem seja descrente no amor, porque, mesmo diante de tanta aridez e desencanto, ele é tão eterno quanto a relva.
ACEITE SERENAMENTE OS ENSINAMENTOS DO
PASSAR DOS ANOS, RENUNCIANDO AOS HÁBITOS PRÓPRIOS DA JUVENTUDE.
Alimente a força do espírito, que o protegerá no infortúnio inesperado, mas não se desespere com perigos imaginários: O MEDO NASCE DO CANSAÇO E DA SOLIDÃO.
A despeito de sua disciplina rigorosa, seja gentil consigo mesmo; afinal, você é filho do universo, irmão das estrelas e das árvores e tem o direito de estar aqui. E, quer se aperceba disso ou não, não tenha dúvida que o Universo segue na direção certa.
Portanto, ESTEJA EM PAZ COM DEUS, COMO VOCÊ O CONCEBA e, quaisquer que sejam seus trabalhos e aspirações na fatigante jornada da vida, mantenha-se em paz com sua própria consciência. Pois, apesar de todas as falsidades e sonhos desfeitos, este ainda é um mundo lindo e maravilhoso.
Seja cauteloso. Lute para ser feliz.
ACIDENTES DOMÉSTICOS - José Nilton Mariano Saraiva
Anos atrás, quando no exercício do mandato de Deputado Federal, em Brasília, Roberto Jefferson, ao depor numa certa CPI, desafiou o então todo poderoso Ministro Chefe da Casa Civil, José Dirceu, ao afirmar que este lhe despertava “os instintos mais primitivos”.
Semana depois, Roberto Jefferson apareceu em horário nobre, nos principais jornais televisivos, com um dos olhos arroxeado e bastante inchado e, instado a revelar a causa, afirmou candidamente que batera com a cabeça em um móvel doméstico, daí a grave contusão.
Embora todo mundo imaginasse, até com certa razão, que tal história não tinha nenhum fundamento, a mídia tupiniquim, corrupta, covarde e safada, simplesmente não procurou se inteirar da questão (e ficou valendo a versão do “desonesto” e mentiroso Deputado, de que sofrera um acidente doméstico).
A reflexão é só pra lembrar que, dias atrás, foi noticiado pela mesma mídia corrupta, covarde e safada, que o atual Presidente do Supremo Tribunal Federal, Dias Toffoli, houvera sofrido um vulgar acidente no recinto do lar.
Só que, dia seguinte, a ilustre personalidade foi transferida às pressas para um daqueles caros e luxuosos hospitais de São Paulo, a fim de tratar da contusão sofrida (dentro de casa, lembrem-se).
Passados alguns dias de internamento (quem pagou a conta ???), eis que o ministro Dias Toffoli nos aparece na TV, em horário nobre, com uma enorme cicatriz no meio da testa, o que nos leva a imaginar que não deve ter trombado com algum inocente móvel dentro de casa (como Jefferson) mas que a coisa foi bem mais séria, e fora de casa (como Jefferson).
segunda-feira, 31 de agosto de 2020
EXCENTRICIDADE - José Nilton Mariano Saraiva
Recorrente - mas ainda assim impressionante - como aqueles que atingem certo destaque em alguma profissão, principalmente os que lidam diretamente com o público, se transmutam da noite pro dia, tanto em termos comportamentais como em termos visuais. Dentre estes se sobressaem, justamente pelo contato mais próximo com o povo, jogadores de futebol e cantores dos mais diversos estilos (bregas, sertanejos, românticos e por aí vai), sejam nacionais ou internacionais.
Os primeiros (jogadores de futebol) normalmente oriundos de famílias paupérrimas, quando finalmente “chegam lá” fazem questão de ostentar, de exibir, de ser “diferente”, como a querer mostrar que não são inferiores a ninguém, compensando de certa forma a “vida-de-cão” que levaram no passado. Assim, visando mandar para o espaço o complexo de inferioridade enrustido durante tanto tempo, além dos carrões, roupas de grife, joias caras e mansões luxuosas, adotam os mais esquisitos e ridículos cortes de cabelo, que de pronto passam a ser adotados por seguidores fanáticos (que o diga o tal do Neymar e seu estilo moicano ou aquele horroroso corte exibido pelo tal Ronaldo Gordo Nazário, no final da Copa do Mundo do Japão, onde o Brasil foi vencedor).
Já no tocante aos cantores que se destacam a coisa é mais “seleta, refinada e eclética”, a saber: uns, embora teimem em falar e pregar a “humildade”, nos seus shows exigem dos patrocinadores uma determinada marca de água mineral importada (preferencialmente de um país distante); frutas, preferencialmente aquelas oriundas dos cafundós do planeta Terra; não dispensam uma bebida de primeira qualidade, evidentemente que também de outras plagas; já um outro só faz o show se o camarim for decorado unicamente na cor azul, com móveis confeccionados de uma madeira tal, e outras extravagâncias.
Tempos atrás, um deles nos apareceu com uma exigência que, muito mais que excentricidade, poderia ser confundida com “frescura pura” (e não é pelo fato de ser reconhecidamente um homossexual assumido); fato é que o renomado (e bom) cantor britânico Elton John exigiu para uma certa turnê (Follow the Yellow Brick Road), que empreendeu no Brasil, mimos que chegaram às raias do absurdo..
Assim, além do cachê altíssimo que recebeu, exigiu dos patrocinadores do seu show (aqui em Fortaleza), dentre outros itens: 01) que, toda a Arena Castelão, onde foi realizado o evento, fosse climatizada a 19 °C; (assim, embora normalmente a temperatura ambiente da Arena Castelão seja de 35/40°C, em todas as áreas por onde ele fosse circular, a temperatura não poderia passar dos 19 graus e PT saudações); 02) que, no seu camarim fosse instalado um telão de alta definição, a fim que pudesse assistir a canais esportivos; 03) que, fosse criado o “Espaço Elton John Hospitality” (espécie de sala de visitas) com ornamentação de plantas naturais com pelo menos 1,80 metro cada, preferencialmente palmeiras e fícus; e 04) que, para comer, estivessem disponíveis saladas de frutas, de legumes e sopas vegetarianas (aqui, até que não foi muito exigente). Descartou, entretanto, qualquer proteína animal.
Será que os patrocinadores do evento conseguiram atender a todas as exigências do bom, mas já decadente cantor ??? E se não o fizessem, será que o mesmo recusar-se-ia a cantar para seus adeptos do Ceará ???
No mais, para os que se dispuseram a ir ao show, foram colocados à venda 40 mil ingressos (a “preços de banana” em fim de feira, na mais recôndita periferia), a saber: gramado cadeira ouro (R$ 600), plateia inferior direita (R$ 140), gramado cadeira prata (R$ 460), gramado cadeira bronze (R$ 360), camarote vip open bar (R$ 500), camarote privativo (R$ 800), plateia inferior esquerda (R$ 140), plateia superior especial (R$ 300), plateia superior esquerda (R$ 110) e plateia superior direita (R$ 110).
E aí, você foi um dos que lá
compareceram ???
CARTA A UM JOVEM BRASILEIRO (Rogério Cezar de Cerqueira Leite)
CARTA A UM JOVEM
BRASILEIRO
(Rogério Cezar de Cerqueira Leite)
Eu gostaria de escrever-lhe uma carta
sobre poesia, embora sem o talento do alemão Rainer Maria Rilke, sobre a
importância da literatura, das artes, do conhecimento; enfim, sobre tudo o que
enriquece a humanidade. Mas eis que nossos líderes agridem
tudo que alicerça a cultura de um povo, tal seja a filosofia, a sociologia, a
história.
Eu queria escrever-lhe sobre a dádiva
da natureza ao brasileiro, sobre as nossas matas, os nossos rios, a nossa fauna
e a nossa rica e bela biodiversidade. Pois bem, nossos dirigentes
não apenas corrompem as providências para amenizar as inexoráveis e trágicas
consequências do aquecimento global como também incentivam o desmatamento e a
poluição da atmosfera.
Eu queria falar-lhe, jovem
brasileiro, da dignidade do trabalho e da necessidade de conhecimento para
enfrentar a dinâmica implacável do progresso tecnológico. Entretanto, esse
novo governo asfixia nossas universidades com cortes de verbas e obtusa
perseguição.
Eu queria falar-lhe de ciência e
tecnologia, da consequente industrialização do nosso país e dos benefícios
sociais e econômicos que adviriam de investimentos em pesquisas. Mas esses nossos
governantes continuam a desindustrialização começada nos governos Collor e FHC,
cortando recursos para ciência, tecnologia e formação pós-graduada, sem o que
não haverá industrialização possível já em futuro próximo.
Eu queria escrever-lhe sobre o valor
da cidadania, da liberdade, sobre a decência do homem de bem. Porém, “esses
arremedos de déspotas” que presidem sobre esta nação liberam a posse de armas,
cooptam e protegem milicianos, homenageiam extorsionários e torturadores,
estimulam a violência.
Eu gostaria de poder falar-lhe sobre
nosso país, sobre nossa história, nossa arte, nossos escritores, nossa música,
nossas conquistas. Mas não posso. Nosso país se curva aos interesses
imperialistas dos EUA.
Eu queria falar-lhe do ideal de
justiça, da solidariedade. Contudo, só vejo ostentação, narcisismo.
JUÍZES VIVENDO EM PALÁCIOS
"NABABESCOS", SERVIDOS A LAGOSTAS, PAGAS COM O SUOR DO TRABALHADOR
BRASILEIRO. O QUE UM JUIZ DO SUPREMO COME DE
LAGOSTA E BEBE DE VINHO IMPORTADO, DIARIAMENTE EM UMA ÚNICA REFEIÇÃO, EQUIVALE
AO QUE COME POR MES UMA FAMÍLIA QUE VIVE COM SALÁRIO-MÍNIMO.
E, ao contrário de suas excelências, o cidadão brasileiro paga por suas refeições. Eu pensava em conversarmos sobre seu futuro, seus sonhos. E olho para nossos congressistas, supostos guardiões da cidadania e de seu porvir. E só ostentam escandalosa cupidez.
Confesso que eu queria inculcar-lhe,
jovem brasileiro, uma certa compulsão por justiça social, um certo interesse
pelo próximo e pelo distante, um pouco de civilidade enfim. Mas seria um
esforço perdido, tendo em vista a dominação intelectual e ideológica desse
governo por um farsante, obsceno e fascista, uma espécie de Rasputin de bordel.
Eu gostaria de encontrar alguma
palavra de alento para apaziguá-lo. Eu não queria ser cínico ou parecer
desalentado, derrotado. Seria talvez bom se eu pudesse fingir, mentir um
pouco. Mas não. Só posso pedir-lhe que me perdoe, e a todos aqueles das
gerações que precederam a sua, pelo que lhe subtraíram e talvez também pelo que
lhe ensinaram.
O BRASIL QUER SABER - José Nilton Mariano Saraiva
O BRASIL QUE SABER - José Nilton Mariano Saraiva
Por qual razão o “integro”, “honesto” e “insuspeito” Presidente da República se exaspera quando lhe fazem uma pergunta tão simples:
"Presidente @jairbolsonaro, por que e para que sua jovem esposa, Michelle Bolsonaro, recebeu R$ 89 mil de Fabrício Queiroz e esposa ?"
Por qual razão os integrantes do Supremo Tribunal Federal se negam a participar de tão grave questão, questionando-o oficialmente ???
domingo, 23 de agosto de 2020
A “MUTRETA” DO VALE-REFEIÇÃO –
José Nilton Mariano Saraiva
Criado através da Lei 6321 de
15.04.1976, o vale-refeição (adstrito às estatais), ao contrário dos que muitos
pensam não se trata de nenhuma “benevolência” da empresa para com o seu
funcionário, ou de um gesto de magnanimidade do governo federal.
Na verdade, aqui se aplica
magistralmente aquela história do “dar com uma mão e tirar com a outra” e,
claro, beneficiando sempre o patrão (empresa), em detrimento do empregado.
É que, a posteriori, quando
for prestar contas ao fisco ao final do exercício fiscal, a empresa poderá
deduzir, do lucro tributável para fins de imposto de renda (das pessoas
jurídicas, evidentemente), o dobro das despesas realizadas em programas de
alimentação do trabalhador (o tal vale refeição).
Além do que, como tal valor é
excluído do conceito de “salário in natura”, nele não incide o custeio da
Previdência Social e o do FGTS (ou seja, a empresa ao subsidiar a refeição do
seu servidor, se beneficia de um quádruplo benefício fiscal).
Confira, abaixo, os artigos 1º
e 3º da tal lei:
Art. 1º As pessoas jurídicas poderão deduzir, do lucro
tributável para fins do Imposto sobre a Renda, o dobro das despesas comprovadamente
realizadas no período-base, em programas de alimentação do trabalhador,
previamente aprovados pelo Ministério do Trabalho na forma em que dispuser o
Regulamento desta Lei.
Art. 3º Não se inclui como salário de contribuição a parcela
paga "in natura" pela empresa, nos programas de alimentação aprovados
pelo Ministério do Trabalho.
É isso aí; vivendo e
aprendendo.
quinta-feira, 30 de julho de 2020
O Abominável Homem do Minhocão
20 de março de 1994, 20h:30min.: No subsolo do Minhocão, após uma aula noturna, Lisane, estudante de história, caminha em direção à escada. Ao passar em frente ao restaurante Natural, alguém a retém pelo braço. Lisane sente o cheiro, volta-se, grita e, por fim, desfalece. É encontrada por um segurança, minutos depois, ainda desacordada.
27 de março de 1994, 02h:05min.: Oswaldo, segurança da UnB, está a postos, dentro de sua guarita na entrada norte, assistindo à TV. Repentinamente um estranho ser, coberto de pêlos, sujo e hediondo invade a guarita. Antes que Oswaldo tenha qualquer reação, o monstruoso homem — parece um homem — o golpeia na cabeça com a TV portátil. O segurança desmaia. Quando volta a si, não encontra a marmita. Na TV passa o filme A Volta dos Mortos Vivos.
Estes não foram acontecimentos isolados. Desde 1976, ocorreram inúmeros encontros com o Abominável Homem do Minhocão. A diferença é que em todo esse tempo ele jamais surgiu duas vezes num único mês. E foi a primeira em que ele roubou comida. É certo que muito se especulou sobre a consistência e veracidade de tais narrativas. Dizia-se que tudo aquilo era um chiste, e que, na tentativa de eludir uma maior preocupação com a segurança interna do campus, inventava-se toda sorte de causos. Mas o que não era do conhecimento geral, senão um fato compartilhado por poucos, era a enorme pegada deixada pela criatura junto às vítimas. Uma pegada com cheiro de merda. Um horror.
12 de abril de 1996, 19h:40min.: Eunice, professora de biologia, caminha pelo subsolo sul do Minhocão. De repente, ela sente uma presença. Amedrontada, olha ao redor mas nada vê. Acelera o passo. Logo adiante, Eunice sente um forte mau cheiro e estaca. Volta-se novamente para trás e arregala os grandes olhos verdes que giram nas órbitas:
“Antônio!!”
“Eunice?!”
“É você mesmo, Antônio?”
“Sou eu sim, meu bem…”
Abraçam-se. Ela, na ponta dos pés, enlaça o pescoço dele com os braços, que se sujam com os fétidos cascões de sua nuca. Ele a cinge pela cintura, deixando manchas escuras na sua saia amarela. Beijam-se na boca ternamente. Os bigodes e a barba de Antônio, assim como os pêlos dos seus braços, estão duros como palha de aço. Eunice sente seu hálito de esgoto.
“Ah! É você mesmo, meu querido…”
Ela o conhecera exatamente um ano, dois meses e treze dias antes de seu desaparecimento. Amaram-se desde o princípio. Ela se tornara professora na UnB para ficar junto dele.
“Mas afinal, onde é que você tava?”
Antônio nunca fora adepto da toalete. Por isto a namorada não o estranhava neste sentido. Até gostava.
“Por aí… por aí…”
Quando o Abominável Homem do Minhocão foi avistado pela primeira vez, Eunice não se sensibilizou… Pensou que fosse apenas mais um boato do tipo “a anistia vem aí”. Um dia, lendo por acaso um relato sobre as antigas culturas andinas, deu com um nome familiar: Sacharuna. Era assim que um colega do basquete, um peruano, tratava Antônio durante os treinos. Queria dizer: o senhor das montanhas, o pé-grande da América do Sul. Leu mais sobre o assunto. No Canadá e norte dos EUA, chamava-se Sasquatch. No Himalaia, Yeti ou O Abominável Homem das Neves. Eunice ficou encucada: aquela criatura do minhocão… seria ele?
“Como assim por aí?”, perguntou espantada. “E por que você tá largado desse jeito? Vem comigo!”
“Não, Eunice! Os milicos… eles… eles vão me pegar!!”
Agora sim ela se sensibilizou. Quase chorou.
“Meu Deus, que absurdo!”, e olhou-o solícita. “Antônio, desde 84 que nós temos presidentes civis, eleições diretas… Já tivemos até impeachment! Em que maldito buraco você se meteu?”
Ela o levou para casa. Deu-lhe banho, roupas e sapatos novos — tamanho 52 –, cortou-lhe os cabelos, as unhas, fez-lhe a barba. Tornou-o reconhecível de novo. Exceto pelo cheiro, felizmente. E ele estava deslumbrado. Não acreditava que passara mais de vinte anos nos esgotos do Minhocão. Acabara o comunismo na União Soviética — acabara a União Soviética! — não havia mais o muro de Berlim e havia Mac Donald’s na China… Todos tinham um computador pessoal e cartões magnéticos… Sim, ainda havia fome, miséria e injustiça… Mas, meu Deus, quantas transformações! E ele perdera vinte anos de vida! Tudo por causa dum relógio russo, comprado em Cuba, que usara todo aquele tempo e cujo ponteiro mal se movia. Triste, muito triste.
Eunice fez o que pôde para convencê-lo de que ainda era jovem e de que tinha toda uma vida pela frente. Fê-lo assistir — para que se acalmasse e se reintegrasse ao mundo — TV a cabo durante cinco dias inteiros. Por fim, disse-lhe que o melhor que tinha a fazer era recuperar sua cadeira de professor. Logo que superou a depressão — quebrando a TV — Antônio seguiu os conselhos de Eunice. Foi recebido na UnB como herói. (Ninguém parecia recordar que ele encarcerara a si próprio.) Ganhou uma estátua ao lado da de John Lennon [1] — “Meu Deus, ele morreu?!!” — uma estátua enorme, com pés enormes. Ele estava novamente feliz.
Para reacostumar-se com o trabalho, recebeu a cadeira de Introdução à Sociologia. Na sala, um grande número de alunos de direito e de relações internacionais, todos calouros. Achou que o melhor a fazer naquela primeira aula seria discorrer sobre cidadania e, para isto, seria necessário abordar aqueles importantes fatos sociopolíticos dos anos 60 e 70.
“Lá vem a Abominável Ratazana dos Esgotos”, disse alguém logo que ele entrou.
Antônio tentou ignorar a provocação dando início à aula:
“Alguém sabe qual foi o acontecimento mais marcante neste país entre as décadas de 60 e 70?”
“Um idiota que se perdeu nos esgotos da UnB?”
Risadas e mais risadas. Antônio impacientou-se:
“Não estou aqui para brincadeiras. Seus pais, tios e avós passaram por maus momentos nessa época e vocês não estão nem aí…”
“Sou bisneto do general Médici!”, disse um.
“Meu pai era do DOI-CODI!”, disse outro.
Mais risadas. Assovios.
Antônio explodiu:
“Olha aqui, seus burguesinhos imbecis, vocês são muito pueris pra entender o sofrimento pelo qual muita gente passou naqueles duros anos. Vocês jamais imaginariam, por exemplo, a loucura que eu vivi…”
Uma garota levantou-se e dirigiu-se até a porta.
“Onde você vai?”, berrou Antônio. “Eu ainda não terminei”.
“Tenho mais o que fazer além de ficar ouvindo um professor histérico me chamar de burguesinha imbecil!”
O professor pôs-se furibundo. Via tudo embaçado. Estava fora de si. A sala ficou repentinamente silenciosa, ninguém parecia respirar. Ele caminhou com suas grandes e sonoras passadas na direção da garota, que ficou paralisada. Extasiados, alguns alunos esperavam presenciar um homicídio. “Um patricinhicídio”, contaram mais tarde. Antônio apenas passou por ela e saiu pela porta. Precisava encontrar Eunice. Aquilo era o fim da picada. Os alunos estavam mais mudados que a própria Rússia! Era difícil de suportar.
Quando chegou ao apartamento de Eunice, na Colina, foi direto à cozinha beber um copo d’água. Precisava se acalmar. Ao terminar, ouviu uns gemidos vindos do quarto. Foi-lhes no encalço. Eunice estava nua, sentada sobre outro homem, também nu.
“Eunice!!”, suspirou Antônio.
“Antônio! O que é que você tá fazendo aqui a esta hora?”
“Quem é esse cara, Eunice?”, balbuciou ele, ignorando a pergunta.
“Uê, Antônio”, começou ela, metendo-se sob as cobertas. “É o Marcos, meu marido.”
“Marido?!!”
“É claro. Você não achou que eu ia te esperar esse tempo todo, não é?”
“Mas eu não sabia…”
O marido levantou-se:
“Eu estava viajando e cheguei hoje”, disse, enrolando-se num lençol. “Muito prazer, a Eunice me falou muito a seu respeito”, e estendeu a mão.
Antônio apertou aquela pequena mão involuntariamente. Sua cabeça estava longe, muito longe.
“Desculpe, Eunice”, disse ele. “Eu preciso sair”, e saiu.
“Sujeito esquisito…”, admirou-se o marido.
1° de maio de 1996, 13h:02min.: Antônio arrasta-se pela tubulação de esgoto sob o restaurante Natural, no subsolo norte do Minhocão. Sente-se novamente em casa, de volta ao útero materno. Longe de todo absurdo e do ramerrão da superfície. Está procurando o Topo Gigio, cujo desaparecimento o fizera abandonar aquele tranqüilo lugar. Topo Gigio é o rato a quem ensinou a roubar e a trazer-lhe comida da despensa do Natural. Sim, pois como alguém sobreviveria tanto tempo naquele mundo subterrâneo? Como no mundo superficial? Tragando merda?
(Conto extraído de A Tragicomédia Acadêmica – Contos Imediatos do terceiro grau.)
[1] Caro leitor, atenção: realmente existe uma estátua do John Lennon, junto ao Bandejão, no Campus Darci Ribeiro – UnB.