Domingo com Frank Sinatra.
Caprichei no almoço. Fiz camarão ensopado, arroz à grega e salada de acelga. Salguei o molho. Não sei se a batata salvou o paladar. O sal precisa de mãos leves e olhos experientes. Costumo tê-los, mas hoje eu errei a mão, e consertei o prato com os meus olhos de fome... Nem por isso menos exigentes.
Lembro a minha mãe e os seus conselhos: “a gente conquista o homem pelo estômago”.
Engordei meus amores. Quando aprendi a cozinhar, já me faltava a magia da sedução. Alimentar um amor faz parte do kit de manutenção. Está fora dos preâmbulos... Nos primeiros tempos visitamos juntos os rangos de todos os restaurantes.Depois utilizamos a verba, no supermercado, lotando o carrinho de temperos exóticos, vinhos e latinhas especiais.Já comprei “ Chat neuf du pape “, figos Ramy, tâmaras, “ Drambuie”, nozes...Já flambei meus quitutes com o melhor dos destilados.Depois começa a simplificação: café com torradas, baião de dois com ovos caipira, carne de sol com macaxeira, guisado com batata doce... E esse trivial, representado por café com pão, arroz e feijão, bife e batata frita é o cardápio que segura a união.
Minhas experiências culinárias evitaram doenças primárias, como: anemia, gastrite ... Ficaram as mais complexas: diverticulite, diabetes, hipertensão...
Agora sou adepta do arroz integral, do mingau de aveia, das sopinhas de legumes, frutinhas, integrais e grelhados. Saudades da quase total irresponsabilidade alimentar. Dos biscoitos amanteigados, dos molhos a quatro queijos, da comida incrementada com tudo que não pode.
Tenho a limitação da paixão... Ou melhor, tenho a transcendência da paixão. Ela hoje é ocular. Observo-a nos personagens do cinema e das novelas. Sei que representam um papel. Um papel que vivi, sem representar.
Frank continua na agulha. Danço em pensamento, e desacompanhada. A fila é finita. Não tenho um par de olhos que me enlace. Tenho um par de óculos, que me fazem enxergar o que está próximo. Rodopio, na ponta dos pés... “I’ve got you under my skin”.
Matematicamente não voltarei a ouvir todos os meus CDs, nem tão pouco aqueles, que ainda comprarei, por mais de uma vez.
Assim conto o tempo que me resta. Assim conto o que farei da vida nos intervalos do dia.Conto os tempos das surpresas. O melhor da vida é o que está fora do script... E o pior é o que está fora também.
Que venham as chuvas
Que venham os silêncios
Os encontros ensolarados
Os sonhos por baixo das cobertas ...
Olho a Chapada nesse marasmo domingueiro. Parece estática.Mas tudo é móvel , e é passado.Como é passado a manhã desse dia, que já se fez tarde, e precisa da noite para amanhecer.
por Socorro Moreira
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