QUA, 15/10/2014 - 15:28
ATUALIZADO EM 15/10/2014 - 16:30
Por Rodrigo Vianna, na Revista Fórum
Se Dilma ganhar, essa eleição vai
significar também a vingança de Getúlio Vargas contra o lacerdismo”.
Sei que o tempo presente nos chama.
Mas um pouco de História vai bem. Na verdade, vou falar de um passado que
é presente… Vocês sabem que Carlos Lacerda (foto ao lado) foi o
governador do Rio (e jornalista, e dono de jornal) que fazia oposição violenta
contra Getúlio Vargas e o trabalhismo – isso tudo lá nos anos 1950 e 1960. Chamado
de “O Corvo” pelos getulistas, Lacerda era bancado pelos EUA. E tinha apoio de
uma classe média furiosa com os direitos trabalhistas, com a criação da
Petrobrás e com a entrada em cena da “ralé” (que passava a definir eleições –
votando em Vargas ou nos candidatos apoiados por ele). Qual era o discurso de
Lacerda? Vargas seria um “corrupto”, um “bandido comandando uma quadrilha”. Isso lembra alguma coisa a vocês?
Em 1954, o cerco se apertou. A
imprensa passou a falar em “Mar de Lama” no governo. Vargas foi cercado no
palácio. E num gesto dramático (esse papo de que no Brasil não há conflitos, e
de que tudo se resolve “na boa”, é balela!) o presidente meteu uma bala no
peito. Ali, Vargas virou o jogo. O povão que começava a ser influenciado pela
campanha midiática anti-Vargas, ficou do lado do morto. Não preciso dizer que
“O Globo” e quase toda a imprensa estavam ao lado de Lacerda contra Vargas. O
povão queimou carros e gráfica da família Marinho em 1954 – pra se vingar.
Pois bem, o conservadorismo
brasileiro é tão pouco criativo que nem disfarça. Saltemos ao século XXI… Em
2006 (quando o PSDB imaginava que Lula seria derrotado fragorosamente graças ao
“Mensalão”), FHC lamentava “a falta que faz um Carlos Lacerda para tocar fogo
no palheiro” (leia aqui). Na falta
de um Lacerda de verdade, o PSDB terceirizou (eles são bons nisso): surgiram
dezenas de lacerdinhas nos jornais, rádios, TVs e na revista da marginal. São
blogueiros e jornalistas que fazem a agitação verbal para o PSDB – reproduzindo
o mesmo discurso que hoje escutamos nas ruas: “o PT é uma quadrilha que precisa
ser escorraçada”.
Na campanha de 2014, Aécio Neves
surfa nessa onda. Aproveita também os erros do PT e – sem programa que não seja
arrocho e desemprego – Aécio tenta ganhar a eleição no grito: “Fora, PT”,
“abaixo a corrupção”. No debate da Band, qual foi a grande “sacada’ de Aécio?
Dizer que o Brasil vive um “Mar de Lama”. Hehe… É a mesma palavra de ordem dos
que levaram Vargas ao suicídio em 1954. A direita é a mesma. Só que Dilma não
vai meter bala no coração. Não. Dilma disparou de volta, na testa de Aécio.
O rapaz mineiro (que fala em
meritocracia, mas vive do que herdou da família) ficou atônito quando Dilma
falou nos casos de corrupção do PSDB, e falou no episódio do aeroporto
construído dentro da fazenda de um tio de Aécio. Falou também dos casos de
nepotismo (Aécio empregou meia dúzia de parentes no governo de Minas). O rapaz
perdeu o rebolado.
Se Aécio fosse um monge budista,
ainda assim esse discurso moralista de que “todo o problema do Brasil é a
corrupção” não faria sentido (e a desigualdade? e o racismo? e a violência
policial? e o poder do sistema financeiro? e o poder da Globo? Nada disso
importa, né…).
Mas pior: Aécio não tem moral pra
falar em corrupção. Nem em bons costumes. Ele é o típico falso moralista –
acusado até de bater na mulher. Aécio foi desmascarado por Dilma no debate da
Band.
Verdade que o “Mar de Lama” de Aécio
foi parar na capa do “Estadão”. O combalido diário paulistano vibrou: a Família
Mesquita (dona do jornal, apesar de endividada) deve ter achado que voltaram os
bons tempos: uma manchete com cheiro de anos 50 - lembrou-me @pedrozm / Pedro
Malavolta via twitter (a mensagem dele foi a inspiração para esse textos).
Com seu “Mar de Lama”, Aécio cheira
(ôps) a naftalina. É o passado que volta à cena, com um terno bonitinho e
sotaque mineiro. E o passado precisa ser derrotado de vez. Dilma, como venho
dizendo desde 2010, significa o (re) encontro do PT com o varguismo. Dilma traz
a herança brizolista, trabalhista, foi do velho PDT. Ela se formou nessa
tradição. Se Dilma ganhar (e tem toda as condições pra isso, numa batalha que
será duríssima), será a vitória de Vargas contra Lacerda. Só que dessa vez o
tiro será disparado contra o outro lado. Um tiro no lacerdismo rastaquera de
Aécio, com seus aeroportos feitos em fazendas da família, com seus parentes no
governo, com sua irmãzinha que tenta calar a imprensa. Lacerda ainda tinha
estilo. Aécio só tem a Globo, a Veja e seus lacerdinhas amestrados.
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